Capítulo 1 Integração entre o meio ambiente e o desenvolvimento: 1972–2002 UNEP, Tom Nebbia, Ecuador, Topham PicturePoint Símbolos encontro convenção acidente publicação descoberta ação legal evento internacional nova direção E mbora o meio ambiente sempre tenha sido essencial para a vida, a preocupação com o equilíbrio entre a vida humana e o meio ambiente só assumiu dimensões internacionais durante a década de 1950. Nos anos seguintes, peças supostamente desconexas de um quebra-cabeças global começaram a se encaixar de forma a revelar um mundo com um futuro incerto. Livros e artigos inovadores, como “Primavera Silenciosa”, de Rachel Carson (Silent Spring, Carson, 1962) e The Tragedy of the Commons (“A Tragédia dos Bens Comuns”), de Garrett Hardin (Hardin, 1968), quebraram paradigmas, motivando vários países e a comunidade internacional em geral a agir. Uma série de catástrofes jogou mais lenha na fogueira ambiental: descobriu-se que a droga talidomida causa má-formação congênita em recém-nascidos, o navio Torrey Canyon derramou petróleo ao longo da pitoresca costa norte da França e cientistas suecos afirmaram que a morte de peixes e outros organismos em milhares de lagos da Suécia era resultado do longo alcance de poluição atmosférica vinda da Europa Ocidental. No final da década de 1960, as questões ambientais eram uma preocupação quase que exclusivamente do mundo ocidental. Em países comunistas, a destruição implacável do meio ambiente em nome da industrialização continuava de forma incessante. Em países em desenvolvimento, a preocupação com o meio ambiente era vista como um luxo do Ocidente. “A pobreza é a pior forma de poluição”, afirmou a primeiraministra da Índia, Indira Ghandi, que desempenhou um papel essencial no direcionamento da agenda da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo em 1972, às questões dos países em desenvolvimento (Strong, 1999). “Pensamos que, de todas as coisas do mundo, A tragédia dos bens comuns “A tragédia dos bens comuns como fonte de alimentos pode ser evitada pela propriedade privada, ou algo que se assemelhe formalmente a isso. Mas o ar e as águas a nossa volta não podem ser cercados de forma fácil, e assim, a tragédia do uso dos bens comuns como fossa sanitária deve ser evitada por outros meios, por leis coercitivas ou impostos que façam com que seja menos dispendioso para o poluidor tratar seus agentes poluentes do que despejá-los sem tratamento no meio ambiente.” Fonte: Hardin, 1968 as pessoas são o que há de mais precioso”, afirmou Tang Ke, chefe da delegação chinesa na Conferência de Estocolmo (Clarke e Timberlake, 1982). No início da década de 1970, a atenção se concentrou no meio ambiente biofísico, em questões como as relacionadas ao manejo da fauna e da flora silvestres, a conservação do solo, poluição da água, degradação da terra e desertificação – e o homem era considerado a causa principal desses problemas. No Ocidente, havia (e de certa forma ainda há) duas grandes escolas de pensamento sobre as causas da degradação ambiental: uma culpava a ganância e a busca implacável pelo crescimento econômico; a outra responsabilizava o crescimento populacional. Como observou um comentarista, “a poluição contínua e a falta de estabilidade da população são as ameaças reais à nossa maneira de viver e à própria vida” (Stanley Foundation, 1971). Essa visão foi resumida no estudo mais famoso da época, o modelo computadorizado sobre o futuro global, realizado pelo Clube de Roma, que atraiu a atenção do mundo. O Clube de Roma era um grupo de Co M nfe ei o rên Am ci bi a d en as te N Hu açõ m es an o, Uni In Es da to s s Un stit co ob id uiç lm re as ã o, o o pa d Su ra o P éc o ro ia M ei gra o Amma bi das en Pu te Naç b pe li (P õe c lo aç NU s Cl ão M ub A) d o e de liv Ro ro m Lim a ite s de Cr La es nç cim am en en to to do sa té lit e La Co nd sa do nve t Pa nç tr ão im d ôn a U io N M ES un CO di al sob Cu re ltu a ra Pr l e ot Na eçã tu o ra l nova instituição INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 1 9 7 2 Co Es nve de péc nç Ex ies ão tin da sob çã Fa re o (C una o C IT e om ES Fl or érc ) i a Se o In lv te ag rn Se en ac i pe ca s em ona ss na oa re Pe l da s gi rig s ão o do Sa he lm at a m ilh Pr õe im sd ei e ra cr is e do pe tr ól eo 2 1 9 7 3 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 cerca de 50 homens (e mulheres) autodenominados “sábios” que se reunia regularmente na tentativa de endireitar o mundo, como fazia o grupo de cientistas do movimento Pugwash em relação à Guerra Fria. Publicado com o título de “Limites do Crescimento” (The Limits to Growth, Meadows e Meadows, 1972), o modelo do Clube de Roma analisava cinco variáveis: tecnologia, população, nutrição, recursos naturais e meio ambiente. A principal conclusão do estudo foi a de que, se as tendências da época continuassem, o sistema global se sobrecarregaria e entraria em colapso até o ano 2000. Para que isso não ocorresse, tanto o crescimento populacional quanto o crescimento econômico teriam de parar (Meadows e Meadows, 1972). Embora o estudo “Limites do Crescimento” tenha sido muito criticado, ele tornou pública pela primeira vez a noção de limites externos – a idéia de que o desenvolvimento poderia ser limitado pelo tamanho finito dos recursos terrestres. A década de 1970: a base do ambientalismo moderno Princípios da Declaração de Estocolmo 1. Os direitos humanos devem ser defendidos; o apartheid e o colonialismo devem ser condenados 2. Os recursos naturais devem ser preservados 3. A capacidade da Terra de produzir recursos renováveis deve ser mantida 4. A fauna e a flora silvestres devem ser preservadas 5. Os recursos não-renováveis devem ser compartilhados, não esgotados 6. A poluição não deve exceder a capacidade do meio ambiente de neutralizá-la 7. A poluição danosa aos oceanos deve ser evitada 8. O desenvolvimento é necessário à melhoria do meio ambiente 9. Os países em desenvolvimento requerem ajuda 10. Os países em desenvolvimento necessitam de preços justos para as suas exportações, para que realizem a gestão do meio ambiente 11. As políticas ambientais não devem comprometer o desenvolvimento 12. Os países em desenvolvimento necessitam de recursos para desenvolver medidas de proteção ambiental 13. É necessário estabelecer um planejamento integrado para o desenvolvimento 14. Um planejamento racional deve resolver conflitos entre meio ambiente e desenvolvimento 15. Assentamentos humanos devem ser planejados de forma a eliminar problemas ambientais 16. Os governos devem planejar suas próprias políticas populacionais de maneira adequada 17. As instituições nacionais devem planejar o desenvolvimento dos recursos naturais dos Estados 18. A ciência e a tecnologia devem ser usadas para melhorar o meio ambiente 19. A educação ambiental é essencial 20. Deve-se promover pesquisas ambientais, principalmente em países em desenvolvimento 21. Os Estados podem explorar seus recursos como quiserem, desde que não causem danos a outros 22. Os Estados que sofrerem danos dessa forma devem ser indenizados 23. Cada país deve estabelecer suas próprias normas 24. Deve haver cooperação em questões internacionais 25. Organizações internacionais devem ajudar a melhorar o meio ambiente 26. Armas de destruição em massa devem ser eliminadas Fonte: Clarke e Timberlake, 1982 1 9 7 4 1 9 7 5 Fu Gr nda an çã de o Ba do rr Pa ei ra rqu de e M Co ar ra inh is ,n od a a Au st rá lia im pr O Si m pó si ei o ro qu m e icr le oc vo u om à pu ta De c do la ra ré çã o co m de er Co cia co liz yo c ad o Em 1972, o mundo era bem diferente do que é hoje. A Guerra Fria ainda dividia a maior parte das nações mais industrializadas, o período de colonização ainda não havia chegado ao fim e, embora o e-mail acabasse de ser inventado (Campbell, 1998), mais de duas décadas se passariam antes que seu uso se tornasse comum. O computador de uso pessoal ainda não existia, e o aquecimento global acabara de ser mencionado pela primeira vez (SCEP, 1970). Considerava-se que a principal ameaça à camada de ozônio seria proveniente de uma vasta frota de aviões supersônicos, o que nunca viria a se materializar. Embora empresas transnacionais existissem e estivessem se tornando cada vez mais poderosas, o conceito de globalização surgiria somente 3 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 vinte anos depois. Na África do Sul, o apartheid ainda vigorava e, na Europa, o Muro de Berlim ainda estava de pé. O mundo do início da década de 1970 era, portanto, extremamente polarizado, e de várias maneiras. Com esse pano de fundo, é surpreendente que a idéia “Uma das nossas principais responsabilidades nesta Conferência é produzir uma declaração internacional sobre o meio ambiente humano; um documento sem uma obrigação legal, mas – esperamos – com autoridade moral, que inspire nos homens o desejo de viver em harmonia uns com os outros e com o seu meio ambiente.” — Professor Mostafa K. Tolba, chefe da Delegação do Egito na Conferência de Estocolmo, diretor- executivo do PNUMA 1975-93 A origem do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente A Conferência de Estocolmo recomendou a criação de um pequeno secretariado dentro da Organização das Nações Unidas como núcleo para ação e coordenação de questões ambientais dentro do sistema das Nações Unidas. Esse órgão foi criado ainda no ano de 1972, com o nome de Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), comandado por um diretor-executivo cujas responsabilidades incluíam: dar apoio ao Conselho Administrativo do PNUMA; coordenar programas ambientais dentro do sistema da Organização das Nações Unidas; prestar assessoria na formulação e implementação de programas ambientais; garantir a cooperação da comunidade científica, assim como de outras comunidades profissionais de todas as regiões do mundo; prestar assessoria sobre cooperação internacional na área de meio ambiente; e apresentar propostas relativas ao planejamento a médio e longo prazos para programas das Nações Unidas na área de meio ambiente. Li in ber a Se dus çã ve tri o d so al e , n em dio a x It um ina ál ia a fá ca br us ica ad de a po ag r u ro m tó xi des co as O s t em tre ca err us em a um oto gr de an Ta de ng nú sh m an er , n o de o le m ste or to da Ch s M in ai a, um s de te rr um em m ot ilh o na ão d Gu e p at es em so al as a de sa br ig ad as po r A missão do PNUMA hoje é “desempenhar o papel de líder e incentivar parcerias na proteção do meio ambiente, inspirando, informando e capacitando os países e as pessoas a melhorarem sua qualidade de vida sem comprometer a das gerações futuras”. 1 9 7 6 de uma conferência internacional sobre o meio ambiente tenha sido até mesmo cogitada (pela Suécia, em 1968) e, mais ainda, que ela efetivamente tenha sido realizada (em Estocolmo, em 1972). E é impressionante que tal conferência tenha dado origem ao que posteriormente ficaria conhecido como o “espírito de compromisso de Estocolmo”, em que representantes de países desenvolvidos e em desenvolvimento buscaram maneiras de conciliar os pontos de vista extremamente divergentes de cada um. A Conferência foi realizada na Suécia, que havia sofrido sérios danos em milhares de seus lagos, em conseqüência de chuvas ácidas resultantes da forte poluição atmosférica na Europa Ocidental. A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em junho de 1972, foi o evento que transformou o meio ambiente em uma questão de relevância internacional. A Conferência reuniu tanto países desenvolvidos quanto em desenvolvimento, mas a antiga União Soviética e a maioria de seus aliados não compareceram. A Conferência de Estocolmo produziu uma Declaração de 26 princípios e um Plano de Ação com 109 recomendações. Algumas metas específicas foram estabelecidas: uma moratória de dez anos sobre a caça comercial a baleias, a prevenção a derramamentos deliberados de petróleo no mar até 1975 e um relatório sobre o uso da energia até 1975. A Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano e seus princípios constituíram o primeiro conjunto de “soft law“ (leis internacionais sem aplicação prática, apenas intencionais) para questões ambientais internacionais (Long, 2000). Os princípios encontram-se parafraseados de forma livre no box da página 3. Pr pr odu óx to im s as qu a ími Lo co ve s Ca vaz na am l, no par a s Es o Co ta po do rã pa nfe o s Un de Na ra rên id ca iró o C cia os s bi om In as ,Q b t uê ate ern a ni a à D cio es na er l d tif as ica N Fu çã aç (G nda o, õe re çã em s U en o ni d Be o da lt) m s no ovi Qu me n ên to ia Ci nt ur ão Ve rd e 4 1 9 7 7 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 A Conferência também instituiu o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA – ver box à esquerda) como “a consciência ambiental do sistema da Organização das Nações Unidas”. Pode-se dizer que vários dos marcos ambientais da década de 1970 foram conseqüência direta de Estocolmo. É importante lembrar, no entanto, que a Conferência de Estocolmo foi por si só um reflexo do espírito da época, ou ao menos da visão de muitos no Ocidente. Isso posto, é instrutivo listar algumas das principais mudanças que se seguiram a Estocolmo: Acordos ambientais multilaterais • • 1 9 7 8 A conservação da fauna e da flora silvestres foi uma área em que governos e outros grupos de interesse obtiveram sucessos notáveis durante a década de 1970. Isso foi o resultado de uma combinação de ações legais em âmbito mundial que foram (e ainda são) aplicadas em âmbito nacional com uma eficácia variável. A base para alguns desses sucessos foi fundamentada em acordos ambientais multilaterais como os seguintes: • • • 1971: Convenção sobre Zonas Úmidas de Importância Internacional especialmente como Habitat de Aves Aquáticas (Ramsar); 1972: Convenção sobre a Proteção do Patrimônio Mundial Cultural e Natural (Patrimônio Mundial); 1973: Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e Flora Selvagens em Perigo de Extinção (CITES); e 1979: Convenção sobre a Conservação das Espécies Migratórias de Animais Silvestres (CMS). A Convenção de Ramsar A Convenção de Ramsar é anterior à Conferência de Estocolmo, já que foi aberta a assinaturas em 1971. A Convenção, que entrou em vigor dois anos após a Convenção em Estocolmo, contava com 130 partes em dezembro de 2001. Ela foi desenvolvida principalmente a partir de atividades realizadas por ONGs na década de 1960 preocupadas com a proteção dos pássaros e de seu habitat. Embora o foco inicial da Convenção fosse a conservação de aves aquáticas e de seus habitats, hoje ela trata da qualidade da água, da produção de alimentos, da biodiversidade geral e de todas as zonas úmidas, incluindo zonas costeiras de água salgada. Gr Is ave la nd aci , n de os nte Es n ta a u do si n s Un a n id uc os le ar Pr de i m Ge Th e ne ira re e br M a, Con ile Su fe íça rên cia M un di Um al so M a é br pe xic man e tr o o ól se cha Cl eo im d f a, da orm e ó l Ix a a eo to d p ós e c a 640 ex pl km os Co ão no G de ol M nve ig n um fo d ra çã tó o po o ria so ço s d br de e ea An C im on ai se s S rv ilv aç es ão tr es das (C Es M pé S) ci es • En ca che af usa nte og s am a m no en or e to te sta e de do de 1 d st .30 e B ró i 1 0 p eng ,3 ess al, m oa na ilh s õe po Índ r s ia de , ca sa s • A Conferência expressou o direito das pessoas de viverem “em um ambiente de qualidade que permita uma vida com dignidade e bem-estar”. A partir de então, várias organizações, incluindo a Organização da Unidade Africana (OUA) e cerca de 50 governos ao redor do mundo, adotaram instrumentos ou dispositivos constitucionais reconhecendo o meio ambiente como um direito humano fundamental (Chenje, Mohamed-Katerere e Ncube, 1996). Muitas legislações nacionais sobre o meio ambiente seguiram-se a Estocolmo. Entre 1971 e 1975, 31 importantes leis ambientais em âmbito nacional foram aprovadas em países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), em comparação com somente 4 no período entre 1956 e 1960, 10 de 1960 a 1965 e 18 entre 1966 e 1970 (Long, 2000). O meio ambiente passou a existir ou entrou na lista de prioridades de várias agendas nacionais e regionais. Por exemplo, antes da Conferência de Estocolmo, havia apenas 10 ministérios do meio ambiente no mundo; em 1982, cerca de 110 países possuíam ministérios ou departamentos responsáveis por essa pasta (Clarke e Timberlake, 1982). 5 1 9 7 9 6 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 As partes são obrigadas a listar ao menos uma zona úmida de importância, estabelecer reservas naturais, ter bom senso na utilização dessas áreas, incentivar o aumento de populações de aves aquáticas em zonas úmidas apropriadas e fornecer informações sobre a implementação de políticas relacionadas a essas zonas. Há hoje mais de 1.100 áreas, cobrindo 87,7 milhões de hectares, designadas como sítios Ramsar, melhorando a conservação da fauna silvestre em diferentes regiões (Ramsar Convention Bureau, 2001). “Todos os povos têm direito a um meio ambiente geral satisfatório, propício ao seu desenvolvimento.” — Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, 27 de junho de 1981 A Convenção do Patrimônio Mundial A Convenção do Patrimônio Mundial, negociada em 1972, é administrada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). A Convenção contava com 161 Partes em meados de 2001. Desde 1972, quando as Ilhas Galápagos foram colocadas sob a égide da Unesco como uma “universidade natural de espécies únicas”, até dezembro de 2001, um total de 144 sítios em diferentes regiões haviam sido designados sítios de patrimônio natural. Outros 23 sítios foram considerados como sendo de importância natural e cultural (Unesco, 2001). O impacto da Convenção trouxe maior consciência sobre a importância desses sítios tanto para as atuais como para as futuras gerações. No entanto, o derramamento de petróleo perto das Ilhas A CITES Durante a Conferência de Estocolmo, foi relatado que mais de 150 espécies de aves e animais já haviam sido exterminadas e que cerca de outras mil espécies se encontravam ameaçadas de extinção (Comissão para Estudar a Organização da Paz, 1972). Uma Comissão da Organização das Nações Unidas recomendou a imediata identificação de espécies ameaçadas de extinção, a conclusão de acordos adequados, a criação de instituições que cuidassem da conservação da fauna e da flora silvestres e a regulamentação do comércio internacional de espécies em perigo de extinção. A recomendação da Comissão basicamente endossava uma resolução, de 1963, de membros da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), o que delineou a redação da Convenção CITES. A Convenção, que foi adotada em 1973 e entrou em vigor dois anos depois, controla e/ou proíbe o comércio internacional de espécies ameaçadas de extinção, o que inclui cerca de 5 mil espécies animais e 25 mil espécies de plantas (CITES Secretariat, 2001). Controvérsias em relação a espécies de maior destaque, como o elefante africano e as baleias, com freqüência desviam a atenção do que foi feito em prol de outras espécies. Outras realizações Em termos de ações tangíveis, a Conferência de Estocolmo parece ter conseguido muito. Embora muitas das suas 109 recomendações ainda não tenham sido aplicadas, elas servem – hoje em dia tanto quanto an- Pu Es blic a ta do ção s Un do id rel at os ór io Gl ob Es al t (W ab 20 CP ele 00 cim ) , no en s to do Pr og ra m a La M un M nça un m di al di en al do t pe o d Cl la a E im UI st a CN ra , p tég el ia o In PN de UM Con e ício Sa A se ne da e r D am é pe vaç la ão en cad W to a W In F te rn ac A io C na No om ld rt e e- issã Ág Su o ua Br l: um an Po d tá pr t p ve og u l b ra l i c m a ao pa r ra ela a tór so br io in ev ti iv tu ên la cia do “As pessoas não se satisfazem mais apenas com declarações. Elas exigem ações firmes e resultados concretos. Esperam que, ao identificar um problema, as nações do mundo tenham vitalidade para agir.” — Primeiro-ministro sueco Olof Palme, cujo país sediou a Conferência de Estocolmo, 1972 Galápagos no início de 2001, colocando várias espécies e seus habitats em perigo, mostra que os sistemas de gestão ambiental talvez nunca cheguem a ser infalíveis. 1 9 8 0 1 9 8 1 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 Imagens Landsat do Rio Saloum, no Senegal, em 5 de novembro de 1972 (superior) e em 31 de outubro de 1992 mostram quanto da floresta de mangue (áreas em vermelho escuro) desapareceu em vinte anos, mesmo em uma área protegida. Fonte: Landsat, 2001 • O problema básico de hoje em dia não é o de uma escassez material absoluta, mas sim de má distribuição e uso, do ponto de vista econômico e social. A tarefa dos estadistas é orientar os países em direção a um novo sistema mais capaz de satisfazer os limites internos das necessidades humanas básicas para todas as pessoas do mundo, e fazê10 • 1 9 8 2 m at am Ta ilâ nd ia na m on çã o Te m mp il pe esta ss de oa s de s A Ca Ass rt em a M blé un ia di al Ger da al Na das tu N re aç za õe sU ni da sa do ta Co Di nve re ito nçã do o d M as ar Na (C çõ NU es DM Un id ) as so br e o a tes – como metas importantes. De igual importância, no entanto, foi o sucesso da Conferência na redução da diferença entre os pontos de vista dos países desenvolvidos e dos em desenvolvimento. Uma primeira tentativa com tal objetivo havia sido feita em uma conferência em Founex, na Suíça, em 1969, e o Relatório de Founex de junho de 1971 identificou o desenvolvimento e o meio ambiente como “dois lados da mesma moeda” (UNEP, 1981). O Comitê de Redação e Planejamento para a Conferência de Estocolmo observou, em seu relatório de abril de 1972, que a “proteção ambiental não pode ser usada como pretexto para que se desacelere o progresso econômico de países emergentes”. Outros avanços ocorreram em 1974, quando foi realizado um simpósio de especialistas presidido por Barbara Ward em Cocoyoc, no México. Organizado pelo PNUMA e pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), o Simpósio identificou os fatores sociais e econômicos que levam à deterioração ambiental (UNEP/ UNCTAD, 1974). A Declaração de Cocoyoc, o relatório formal publicado pelo Simpósio, influiu na mudança de atitude dos principais pensadores ambientais. O que foi dito em Cocoyoc serviu como o primeiro parágrafo da “Estratégia de Conservação Mundial”, publicada em 1980 (ver página 10) e foi reafirmado no GEO-2000, de 1999: “Os impactos destrutivos combinados de uma maioria carente lutando para sobreviver e uma minoria rica consumindo a maior parte dos recursos terrestres têm comprometido os próprios meios que permitem a todas as pessoas sobreviver e prosperar.” (UNEP/UNCTAD, 1974). Outras afirmações feitas na Declaração de Cocoyoc demonstram uma consciência sobre a dificuldade de se atender às necessidades humanas de forma sustentável em um meio ambiente sob pressão: 7 1 9 8 3 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 A Declaração de Cocoyoc termina assim: “O caminho à frente não se encontra no desespero pelo fim dos tempos nem em um otimismo fácil resultante de sucessivas soluções tecnológicas. Ele se encontra na avaliação cuidadosa e imparcial dos ‘limites externos’, na busca conjunta por meios de alcançar os ‘limites internos’ dos direitos humanos fundamentais, na construção de estruturas sociais que expressem esses direitos e no trabalho paciente de elaborar técnicas e estilos de desenvolvimento que aprimorem e preservem o nosso patrimônio terrestre.” Um ca a us se a ca fo m exc e e na pc Et ion ió alm pi en a te Ac gr i av d m e ilh ent e ar e q lo es uí ng de m a pe ico ss em oa s Bho e Co fe pal re , n G e nfe m a r st ui Ín ã o ênc ta di i s Am a M ou a, m b i un tr en d as ata t a ial l da In dú O st de tufã ria ix so a o Ik br 1, 12 e m e m ata ilh õe 1.3 s d 00 p e de ess sa oa br s ig na ad s os Fil ip in as e Essa visão do caminho a seguir refletiu-se nas novas imagens detalhadas do planeta que surgiram na década de 1970 como resultado do lançamento do satélite Landsat em julho de 1972 pelos Estados Unidos. Tais imagens foram sem dúvida determinantes para a mudança de atitude das pessoas em relação ao estado do meio ambiente mun- 1 9 8 4 A década de 1980: definindo o desenvolvimento sustentável Os principais eventos políticos da década de 1980 foram o colapso do Bloco Oriental e o fim de um mundo bipolarizado, construído sobre o equilíbrio de poderes entre o Ocidente, de um lado, e os países comunistas e seus respectivos aliados em países em desenvolvimento, de outro. As mudanças resultantes de reformas e da Perestroika no Bloco Soviético seguiram-se a anos de um crescimento econômico aparentemente forte e enormes investimentos militares. pa ra a Ta Pr m ma ot ed nh eç ão id o o d da pe o b Ca la ur m pr ac ad im o a ei na ra ca ve m Co a z da Fu nfe de do nçõ rên oz Ef es cia ôn ei d I n to o io Es Dió tern tu xi a fa do cio ,e n m de C al Vi ar da lla b A ch on val , n o e ia ç a Áu out ão d st ros as ria Ga se s • dial. Infelizmente, as imagens fornecidas pelo Landsat nos últimos trinta anos também mostram que a atitude geral ainda não mudou o suficiente (ver fotos da página 7). Em termos de mudanças climáticas, a preocupação cada vez maior com o aquecimento global (em 1896, o cientista sueco Svante Arrhenius havia alertado o mundo sobre o “efeito estufa”) levou à realização da primeira Conferência Mundial sobre o Clima, em Genebra, em fevereiro de 1979 (Centre for Science and Environment, 1999). Durante a Conferência, chegou-se à conclusão de que emissões antropogênicas de dióxido de carbono podem causar efeitos a longo prazo sobre o clima. O Programa Mundial do Clima (WCP) foi estabelecido no ano seguinte, proporcionando uma estrutura para cooperação internacional em pesquisas e a base para a identificação de questões climáticas importantes ocorridas nas décadas de 1980 e 1990, como a destruição da camada de ozônio e o aquecimento global. Vi en a • lo sem violar os limites externos dos recursos e do meio ambiente do planeta. Os seres humanos têm necessidades básicas: alimentação, abrigo, vestimentas, saúde, educação. Qualquer processo de crescimento que não leve à sua realização – ou pior, que a impeça – é uma paródia da idéia de desenvolvimento. Precisamos todos redefinir nossos objetivos, ou novas estratégias de desenvolvimento, ou novos modos de vida, incluindo um padrão mais modesto de consumo entre os ricos. Co de nve Oz nç ôn ão io de 8 1 9 8 5 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 9 Em 1990, ao menos 900 milhões de pessoas em áreas urbanas da África, Ásia e América Latina viviam na pobreza. Fonte: UNEP, Topham Picturepoint Pi Ch or nu ern des ve ob as m yl tre ra , n di a nu oa U cle tiv niã a as o r d ob So o re vié mu m tic nd A ui C ta a, e o a m om s r sp co or at iss eg al nt ór ão iõ ha ec ia es nd e B so ale da o e br ei Eu um m ra e ro a a ca Int pa ça er co nac Um m io er na pr in cia l m odu cên l à imp or t d ba õe te os io le um de qu na ia a pe ími Ba ix co sil es s éi t at óx a, n é no icos a S u s Pa no íça ís Re , li es no be Ba e ra ix ca os us a a A situação era sensivelmente diferente em regiões em desenvolvimento como a África, a Ásia Ocidental e a América Latina e o Caribe, onde a maioria dos países registrou um aumento pequeno na renda (UNCHS, 1996). A região subsaariana retrocedeu ainda mais, com a renda per capita caindo 1,2% ao ano durante a década de 1980 (UN, 2000), devido a uma combinação de fatores, incluindo fortes secas e termos comerciais desfavoráveis. Para vários países em desenvolvimento, a década de 1980 ficou conhecida 1 9 8 6 como a década perdida. A começar pela crise da dívida que atingiu a América Latina em 1982, a situação ficou especialmente difícil em países onde milhões de pessoas se deslocaram por conta de guerras. O número de refugiados passou de cerca de 9 milhões de pessoas em 1980 para mais de 18 milhões no início da década de 1990 (UNHCR, 2000). Lidar com o ciclo da pobreza tornou-se um desafio em particular, uma vez que o crescimento populacional nos países em desenvolvimento não só continuou, como um número cada vez maior de pesAd Su oçã bs o tâ do nc ia P r o s qu t o c o e De lo d st e M ro em o n t a rea Ca l s m ob ad re No a s to so de su rna Fu Oz st pú tu ôn en r io tá blic o C o ve a a mu l id m éi a (R de el de ató se rio nv B ol ru O vi nd gr Con m en tlan u s so po el to d) ho br d e e A bi tr dm a od iv balh inis er t si o p rat da a i de ra vo d fo rm o PN ul U ar MA um co n a co voc nv a en um çã o A década perdida 1 9 8 7 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 Carta Mundial da Natureza: princípios gerais A viabilidade genética da Terra não deve ser comprometida; os níveis populacionais de todas as formas de vida, silvestres e domesticadas, devem ser ao menos suficientes para a sua sobrevivência e, com essa finalidade, os habitats necessários devem ser protegidos. Todas as áreas do planeta, tanto terrestres quanto marítimas, devem estar sujeitas a esses princípios de conservação; uma proteção especial deve ser dada a áreas singulares, a amostras representativas de todos os diferentes tipos de ecossistema e ao habitat de espécies raras e ameaçadas de extinção. Os ecossistemas e organismos, assim como os recursos terrestres, marinhos e atmosféricos usados pelo homem, devem ser manejados de forma a alcançar e manter uma produtividade sustentável e em condições favoráveis, desde que não comprometam a integridade dos outros ecossistemas ou espécies com os quais coexistem. A natureza deve ser protegida da degradação causada por guerras e outras atividades hostis. Um cli a hu má reso m tic lu an as çã id o ad com da e” o “u ONU m a rec pr o eo nh cu ec pa e a çã s o mu co m dan um ça O da s 75 fur a US 0 m cã e $ 1 il d o Gi no 0 l e s b s be Es ilh abr rt m ta õe ig a at do s s no dos a 3 Un C e 5 id ari ca 0 p os be us es , n a so o um as, M éx pr de ico eju ixa íz o de Fonte: UN, 1982 1 9 8 8 A Estratégia de Conservação Mundial Os eventos mencionados acima confirmaram que as questões ambientais são sistêmicas e que lidar com elas requer estratégias a longo prazo, ações integradas e a participação de todos os países e todos os membros da sociedade. Essa noção se refletiu na Estratégia de Conservação Mundial (World Conservation Strategy – WCS), um dos documentos mais importantes que ajudaram a redefinir o ambientalismo após a Conferência de Estocolmo. Lançada em 1980 pela União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), a Estratégia reconhece que a abordagem de problemas ambientais requer um esforço a longo prazo e a integração entre objetivos ambientais e relacionados ao desenvolvimento. de Be O rli de pet m r W lit ole ill ro i r ia s m de o Ex pe xo tr n V ól eo ald Co br ez ut de M nve o o no rra Pe vim nç Ca ma rig e ão na 50 os nto da lP m os s B rín ilh e Tra asil su n é cip õe a sfr ia e s p El o In im nt ara e s i i n o t M aç riç ud itu ão os Con an içã de tro ça o d Re le sC o sí de lim Pa du át ine os ica l I s nte rg ov er na m en ta ld e Medições relativas ao tamanho do buraco na camada de ozônio realizadas por pesquisadores britânicos e publicadas pela primeira vez em 1985 (Farnham, Gardiner e Shanklin, 1985) causaram surpresa tanto no mundo científico quanto na esfera política. O relatório Global 2000 reconheceu pela primeira vez que a extinção das espécies ameaçava a biodiversidade como componente essencial dos ecossistemas terrestres (US Government, 1980). Como a interdependência entre o meio ambiente e o desenvolvimento se tornava cada vez mais óbvia, a Assembléia Geral das Nações Uni- M ur o Novas questões e novos desastres das adotou a Carta Mundial da Natureza (World Charter for Nature), chamando a atenção para o valor intrínseco das espécies e dos ecossistemas (UN, 1982). Além das novas descobertas, a década de 1980 também presenciou uma série de eventos catastróficos que marcou de forma permanente tanto o meio ambiente quanto a compreensão da sua ligação com a condição humana. Em 1984, um vazamento de gases letais da fábrica Union Carbide deixou um saldo de 3 mil mortos e 20 mil feridos em Bhopal, na Índia (Diamond, 1985). No mesmo ano, mais de um milhão de pessoas morreram de fome na Etiópia. Em 1986, o mundo presenciou o seu pior desastre nuclear quando um reator da usina nuclear de Chernobyl explodiu na Ucrânia, república da União Soviética. O derramamento de 50 milhões de litros de petróleo no Canal Príncipe William, no Alasca, causado pelo petroleiro Exxon Valdez em março de 1989, mostrou que nenhuma área, por mais remota e “intacta” que seja, está a salvo do impacto causado pelas atividades humanas. do soas carentes passou a residir em centros urbanos. Com o aumento da população urbana, a infra-estrutura física das cidades começou a ficar sobrecarregada e sem condições de atender à demanda. Qu ed a 10 1 9 8 9 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 1 9 9 0 “A década atual (1980) tem sido marcada por um retrocesso das preocupações sociais. Cientistas chamam a nossa atenção em relação a problemas urgentes e complexos que dizem respeito à nossa sobrevivência: o aquecimento global, ameaças à camada de ozônio da Terra, desertos avançando sobre terras cultiváveis. preparadas para lidar com eles. Respondemos exigindo mais detalhes e passando os problemas a instituições mal preparadas para lidar com eles” (WCED, 1987). ilh in ões ce nd de ia litr do o sd sd ur e p an et te ró a leo Gu O er bru F ra to pa un do de ra do fin M Go rra an un lfo ma cia dia do s rc lp on ara ve o nç M õe eio Pu s Am es bli bi c tr en at a-s te ég e é ia Cu cr pa ida ia ra nd do o o fu do tu ro Pla da net vi a T da e rr a: um a A m noç et ão a pa de ra ec o a in efi dú ciê st nc ria ia Pr é so ime es br i r ta o be e o Re le aq la cid ue tó a r cim io co m en de o to Av gl ali ob aç Se ã a g li o Ge un m do ne da in en I P C br C a, on te C f Su al er er ê íça nc ta ia M un di Cr al Cl iaç so im ão br a d e o (G o S Cl CO is im S) tem a, a em Gl ob al de Ob se rv aç ão do No entanto, passar a mensagem de que o meio ambiente e o desenvolvimento são interdependentes requeria um processo que tivesse autoridade e credibilidade em ambos os hemisférios, em governos e no setor empresarial, em organizações internacionais e na sociedade civil. Em 1983, a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD), também conhecida como a Comissão Brundtland, foi criada para realizar audiências ao redor do mundo e produzir um relatório formal com suas conclusões. O relatório foi publicado após três anos de audiências com líderes de governo e o público em geral no mundo todo sobre questões relacionadas ao meio ambiente e ao desenvolvimento. Reuniões públicas foram realizadas tanto em regiões desenvolvidas quanto nas em desenvolvimento, e o processo possibilitou que diferentes grupos expressassem seus pontos de vista em questões como agricultura, silvicultura, água, energia, transferência de tecnologias e desenvolvimento sustentável em geral. O relatório final da Comissão, intitulado “Nosso Futuro Comum” (Our Common Future), definiu o desenvolvimento sustentável como sendo “o desenvolvimento que atende às necessidades das gerações presentes sem comprometer a capacidade de gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”, tornando-se parte do léxico ambiental (CMMAD, 1987). A Comissão enfatizou problemas ambientais como o aquecimento global e a destruição da camada de ozônio, conceitos novos para a época, e expressou preocupação em relação ao fato da velocidade das mudanças estar excedendo a capacidade das disciplinas científicas e de nossas habilidades atuais de avaliar e aconselhar. A Comissão concluiu que os arranjos institucionais e as estruturas de tomada de decisões existentes, tanto em âmbito nacional quanto no internacional, simplesmente não comportavam as demandas do desenvolvimento sustentável (WCED, 1987). M Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) “Esse é o tipo de desenvolvimento que proporciona melhorias reais na qualidade da vida humana e ao mesmo tempo conserva a vitalidade e a diversidade da terra. O objetivo é um desenvolvimento que seja sustentável. Hoje isso pode parecer visionário, mas é um objetivo alcançável. Para um número cada vez maior de pessoas, essa também parece ser a única opção sensata.” — Estratégia de Conservação Mundial – IUCN, UNEP e WWF, 1980 e A Estratégia sugeriu que os governos das diferentes partes do mundo criassem suas próprias estratégias nacionais de conservação, de acordo com um dos objetivos da Conferência de Estocolmo, o de incorporar o meio ambiente ao planejamento do desenvolvimento. Desde 1980, mais de 75 países iniciaram estratégias multissetoriais nos níveis nacional, estadual e local (Lopez Ornat, 1996). Essas estratégias são destinadas a tratar de problemas ambientais como a degradação da terra, a conversão e a perda de habitat, o desmatamento, a poluição da água e a pobreza. 11 1 9 9 1 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 1 9 9 2 Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas 1 9 9 3 Hu m an os , Di re ito s Co Vi nfe en rê a, nc Áu ia st Mu ria n di al do s ap en as co m in te rn et co nt a A Ar m as Qu ím ica s 50 pá gi na s Em 1989, o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, em inglês) foi criado com três grupos de trabalho concentrados na avaliação científica das mudanças climáticas, nos impactos ambientais e socioeconômicos e em estratégias de resposta, antecipando os vários desafios a serem enfrentados pela humanidade no início da última década do milênio. O IPCC, criado pelo PNUMA e pela Organização Meteorológica Mundial (OMM), ajudou a se chegar a um consenso sobre a ciência, os impactos sociais e as melhores respostas ao aquecimento global resultante da ação humana. O IPCC contribuiu muito para a compreensão pública dos perigos do aquecimento global, de Envolvendo outros atores Seguindo-se aos acidentes industriais da década de 1980, a pressão sobre grandes empresas aumentou. Em 1984, o PNUMA participou da organização da Conferência Mundial da Indústria sobre a Gestão do Meio Ambiente (WICEM), e no mesmo ano o setor químico do Canadá criou o programa Atuação Responsável (Responsible Care), uma das primeiras tentativas de se proporcionar um código de conduta para uma gestão ambiental saudável no setor empresarial. Ao final da década, o conceito de ecoeficiência estava sendo introduzido na indústria como uma forma de, simultaneamente, reduzir o impacto ambiental e aumentar a rentabilidade. Embora esses interesses em geral não fossem compartilhados por empresas que tinham base em países em desenvolvimento, já se debatiam as implicações da migração de indústrias para “paraísos de poluição” no Hemisfério Sul. Ficou claro que um número cada vez maior de atores teria de lidar com as dimensões ambientais de atividades que anteriormente não eram vistas como tendo implicações ambientais, e houve um crescente interesse acadêmico sobre o assunto. O meio ambiente e o desenvolvimento tornaram-se matérias legítimas de estudo em disciplinas sociais e naturais já estabelecidas, e novas disciplinas foram criadas para lidar com questões multidisciplinares. Economia ambiental, engenharia ambiental e outras matérias anteriormente periféri- cas passaram a ser campos de estudo legítimos e reconhecidos, desenvolvendo suas próprias teorias, mas também provando sua validade em contextos reais. O meio ambiente e a sustentabilidade ainda não figuravam muito nos princípios e especialmente na prática de assistência bilateral. Um dos primeiros sinais de mudança foi a instituição de um Comitê de Ajuda ao Desenvolvimento em 1987 pela OCDE, responsável por estabelecer critérios para a integração do meio ambiente e do desenvolvimento em programas de assistência ao desenvolvimento. A conclusão do Protocolo de Montreal em 1987 foi considerada como um modelo promissor de cooperação entre os hemisférios norte e sul, os governos e o setor empresarial, no tratamento de questões ambientais globais. Lidar com a destruição da camada de ozônio, no entanto, mostrou ser menos complicado do que lidar com outras questões ambientais que se apresentariam na década de 1980, mais especificamente as mudanças climáticas. Co nv en çã o Assim foi semeado um maior envolvimento com questões relacionadas ao meio ambiente e ao desenvolvimento. Como sinal do fortalecimento do setor não-governamental, várias organizações novas foram formadas. Na Europa, partidos verdes ingressaram na arena política, e a associação a organizações ambientais de base cresceu rapidamente. Co Am nfe Ri bi rên e o de nte cia Ja e das ne De iro se Naç , B nv õe ra olv s U si im ni l en da to s p (R ar io a Co -9 o nv 2) Me en , io çã o so br e Di ve rs id ad e Bi Co ol óg M nve ud ica n an çã ça odo Qua Cl dr im o a da s Na çõ es Un id as so br e 12 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 em especial nos países industrializados. Em vários países em desenvolvimento, onde os estudos sobre o clima são raros e praticamente não há especialistas no tema, as mudanças climáticas não são vistas da mesma forma. Essa situação levou algumas organizações dessas regiões a protestarem contra “uma enorme disparidade entre a participação dos hemisférios norte e sul. ... Países do hemisfério sul não possuem programas nacionais coordenados sobre o clima, contam com poucos climatologistas, e praticamente não detêm nenhum dado para elaborar projeções climáticas a longo prazo” (Centre for Science and Environment, 1999). “Os povos indígenas são a base do que poderia ser chamado de sistema de segurança ambiental. Para muitos de nós, no entanto, os últimos séculos significaram uma grande perda de controle sobre nossas terras e águas. Ainda somos os primeiros a sentir as mudanças no meio ambiente, mas agora somos os últimos a ser questionados ou consultados sobre o assunto.” — Louis Bruyère, presidente do Native Council do Canadá, audição pública da CMMAD, Ottawa, Canadá, Maio de 1986 iniciativa legal que compreende várias questões marítimas, incluindo a proteção ambiental. As suas cláusulas ambientais incluem: • Acordos ambientais multilaterais Alguns dos Acordos Ambientais Multilaterais (Multilateral Environmental Agreements – MEAs) mais importantes da década de 1980 são os seguintes: • • • a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), de 1982; o Protocolo de Montreal sobre Substâncias que Destroem a Camada de Ozônio, de 1987 (implementando a Convenção de Viena para a Proteção da Camada de Ozônio, de 1985); e a Convenção da Basiléia para o Controle de Movimentos Transfronteiriços de Resíduos Perigosos e sua Eliminação (Convenção da Basiléia), de 1989. Direito do Mar • • • • a extensão do direito de soberania sobre recursos marinhos, como peixes, a uma zona econômica exclusiva (ZEE) de 200 milhas náuticas; a obrigação de adotar medidas para gerir e conservar os recursos naturais; o dever de cooperar regional e globalmente em aspectos como a proteção ambiental e pesquisas relativas a essa proteção; o dever de reduzir ao mínimo a poluição marinha, incluindo aquela gerada em terra; e restrições a despejo de dejetos no mar por navios. O Protocolo de Montreal O Protocolo de Montreal sobre Substâncias que Destroem a Camada de Ozônio implementa a Convenção de Viena para a Proteção da Camada de Ozônio. O Protocolo, que entrou em vigor em 1989 e em dezembro de 2001 já contava com 182 Partes, é um dos exemplos mais bem-sucedidos de cooperação internacional sobre o meio ambiente. O sucesso do Protocolo é em parte resultado do Fundo Multilateral criado como um incentivo à participação de países em desenvolvimento (UNEP, 2001a). Pr Ca ime rn iro ou le enc s, o na ntr Fr o d an o ça Fa Co ct or De nve 10 se nç rt ão Cl ifi ub ca da ,e çã s N m o aç õe s Un Co id De nfe as se rê de nv nc Co ol ia vi In m m ba en tern te to ac à , C io Co ai na ro l s Su nfe ,E o De ste rên gi bre to se ntá cia Po nv v pu ol el Mu la vi do nd çã m o en s P ial e to eq so , B ue b Ro r n rid o e to mp ge s E o D Pe nel ime to st ní ad n w ad ese ns as to n, os n d ul Ba I vol a de p e t rb nsu vim de e u ad la Ko tró bula os re ent ri, leo çã s em o Rú br o d ss ut er ia o r a na m tu a c nd en ra te na na s de An o da Ta rt ar ug a M ar Cú in ha Co pu pe la M nh u ag nd ue ial , D pa in ra am o ar De ca se Qu nv ol Be art vi iji a C m ng o en , C nfe to hi So na rên cia cia l, M un O di S a fu eg ls ob Pr ncio und re ot oc na c o R a el M ol o ul m at o he de o u ór r, Qu m io d g e io to ran Av de ali Cr in açã ce De iaçã nt o do se o iv nv do o IP pa CC ol vi Con ra m s o en elh to o Su Em st pr en es tá ar ve ia lM l un di al pa ra o Embora tenha sido assinada em 1982, a CNUDM só veio a entrar em vigor doze anos depois, o que talvez seja um indício da complexidade de se negociar um MEA. A Convenção, que conta com 136 Partes, é uma 13 1 9 9 4 1 9 9 5 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 1 9 9 6 im pl em en ta çã o da 1 9 9 7 a av al ia 5 + A Ag Cúp en ul da a R 21 io Co As nfe Is sen rên ta c m tam ia bu e Mu l, nto nd Tu s rq Hu ial d ui a ma as N no s - açõ HA es BI Un Cú TA ida pu T la II s so M , br un e di os al da Al im en ta Cr çã i o, am açã Ro bi o d en m a, ta o IS It ln O ál a 1 ia in 4. dú 00 st 0 ria pa ra si Tr st em Nu ata as cle do d de ar e es P ge ro st ib ão içã o Co m pl et a de Te st es A Convenção resultou das preocupações em relação ao envio de despejos de países industrializados para regiões em desenvolvimento. Preocupados com tais envios para a África, Estados Membros da Organização da Unidade Africana (OUA) responderam com a Convenção Africana sobre o Banimento da Importação e Controle do Movimento e Gerenciamento de Resíduos Perigosos Transfronteiriços (Bamako), que entrou em vigor em abril de 1998. Qu io to reduzir os movimentos transfronteiriços de resíduos perigosos; minimizar a criação de tais resíduos; e proibir seu envio a países que não possuam a capacidade de eliminar os resíduos perigosos de forma ecologicamente racional. de • • • A década de 1990 caracterizou-se pela busca por uma melhor compreensão sobre o conceito e o significado do desenvolvimento sustentável, paralelamente às tendências crescentes em direção à globalização, especialmente no que diz respeito ao comércio e à tecnologia. A convicção de que havia um número cada vez maior de problemas ambientais no mundo que exigiam soluções internacionais se tornou mais forte. As questões ambientais também adquiriam uma dimensão maior no hemisfério sul à medida que as organizações começaram a exigir diagnósticos e soluções para países em desenvolvimento. O Centro Regional para o Meio Ambiente foi criado na Hungria em 1990 para tratar de questões ambientais na Europa Central póssoviética. Houve uma ação significativa por parte da indústria privada no sentido de se “compatibilizar” com as questões ambientais. Também houve um crescimento explosivo em relação ao uso da Internet e da comunicação eletrônica. A década começou mal para o meio ambiente, com a perda de milhares de vidas na Guerra do Golfo, em 1991, e um blecaute parcial em algumas áreas da região quando milhões de barris de petróleo foram propositadamente incendiados (Bennett, 1995). Para a Ásia Ocidental, isso representou uma catástrofe ambiental de grandes proporções. Avalia-se que a maré negra causada pelo derramamento de entre 0,5 milhão e 11 milhões de barris de petróleo bruto matou entre 15 mil e 30 mil aves aquáticas. Além disso, cerca de 20% dos manguezais do Golfo Pérsico foram contaminados, e 50% dos recifes de corais foram afetados (Island Press, 1999). A atmosfera também não foi pou- Pr ot oc ol o A Convenção da Basiléia A Convenção da Basiléia, que entrou em vigor em 1992 e contava com 149 Partes em dezembro de 2001, tem três objetivos principais: A década de 1990: implementando o desenvolvimento sustentável do As partes do Protocolo de Montreal devem fornecer para o Secretariado, na forma de relatórios nacionais, dados estatísticos anuais sobre a produção, importação e exportação das substâncias que destroem a camada de ozônio (SDO) controladas pelo Protocolo. Mais de 85% das partes entregam relatórios com seus dados. A implementação do Protocolo foi reforçada e ampliada de forma significativa através dos anos, por meio das Emendas de Londres (1990), de Copenhague (1992), de Montreal (1997) e de Beijing (1999) (UNEP, 2000). Ad oç ão 14 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 15 Bombeiros tentando apagar um poço de petróleo em chamas no Kuwait em 1991. Fonte: UNEP, Abdel Saurad-Mali, Kuwait, Topham PicturePoint 1 9 9 8 La tr nça ab m al ho ent ,d o d ire o ito Pa s h cto um G an lob os al s e pr obr ot e eç pa ão d am rõe bi s d en e A ta po l pu la çã o m un di al ch eg a a 6 bi lh õe s na Índia (IFRC, 2000). Segundo informações da Federação Internacional da Cruz Vermelha e Sociedades do Crescente Vermelho, pesquisa realizada em 1995 em 53 países revelou uma redução de 15% nas despesas com saúde por pessoa, após ajustes econômicos estruturais. Em 1997, já no final do século XX, cerca de 800 milhões de pessoas (quase 14% da população mundial) não só passavam fome como não sabiam ler ou escrever, habilidades essenciais para o desenvolvimento sustentável (Unesco, 1997). Em termos de gestão governamental, os eventos do final da década de 1980 continuavam a influen- Gr In and do es né in sia cê nd io sf lo re st ai sn a Ap Am so rov az b ôn Pr re ada ia de évi o P a e o C na Ce In ro on ce rt v f o as rm di en m çã Su a e bs do nto o d e tâ pa nc ra de Ro C t ia s o C on e r d Qu o se ã ím mé nti ica rci me s o I nt e Ag nte o ro rna tó ci xi on co s al An o m ai sq ue nt e do m ilê ni o pada: cerca de 67 milhões de toneladas de petróleo foram queimadas, produzindo cerca de 2,1 milhões de toneladas de fuligem e 2 milhões de toneladas de dióxido de enxofre (Bennett, 1995). Em outras regiões, embora o progresso tecnológico transformasse a sociedade industrializada, poucos países em desenvolvimento estavam se beneficiando com isso. O número de mortes causadas por doenças infecciosas (como Aids, malária, doenças respiratórias e diarréia) foi 160 vezes maior do que o número de pessoas mortas em conseqüência de desastres naturais em 1999, incluindo terremotos na Turquia, enchentes na Venezuela e ciclones 1 9 9 9 16 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 “A solução não pode implicar a interdição ao desenvolvimento daqueles que mais precisam dela; o fato é que tudo o que contribui para o subdesenvolvimento e a pobreza é uma violação patente à ecologia.” — Presidente cubano Fidel Castro, Rio-92, 1992 ciar o desenvolvimento político em todo o mundo. Nenhuma região ficou imune: as ditaduras e os regimes militares foram derrubados na África e na América Latina, e, em alguns países da Europa, governos de partido único foram relegados à oposição por um eleitorado ávido por mudanças. As pessoas haviam começado a exercer seu direito de eleger seus líderes e exigir prestação de contas. Embora radicais, essas mudanças em relação aos regimes governamentais tiveram pouco impacto imediato sobre o meio ambiente na maioria dos países. Nos países da antiga União Soviética, no entanto, a recessão econômica ajudou a diminuir as emissões poluentes e o consumo de energia. Resta saber se tais efeitos serão permanentes. No âmbito institucional, as idéias que tomaram forma no final da década de 1980, como a participação de múltiplos grupos de interesse e uma maior responsabilização em relação a questões ambientais e sociais, ganharam maior dimensão com uma série de eventos internacionais. O primeiro desses eventos foi uma conferência ministerial sobre o meio ambiente realizada em Bergen, na Noruega, em maio de 1990, onde tais idéias foram formalmente apoiadas pela primeira vez. Essa conferência foi convocada como uma preparação para a Conferência das Nações Unidas para Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), também conhecida como Cúpula da Terra, ou Rio-92), realizada em junho de 1992 no Rio de Janeiro, Brasil. pareceu à Rio-92 – 176 governos (UN, 1993), mais de 100 chefes de Estado, contra apenas dois que compareceram à Conferência de Estocolmo (Haas, Levy e Parson, 1992), cerca de 10 mil delegados, 1.400 organizações não-governamentais (ONGs) e aproximadamente 9 mil jornalistas (Demkine, 2000). A Rio-92 ainda é a maior reunião do gênero já realizada. Antes da Cúpula propriamente dita, as preparações em âmbito nacional, sub-regional, regional e global também envolveram a participação de centenas de milhares de pessoas em todo o mundo, garantindo que suas vozes fossem ouvidas. Organizações regionais e sub-regionais, como a Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), a Organização da Unidade Africana, a União Européia e várias outras, desempenharam um papel importante tanto antes quanto durante a Rio-92 e continuam a fazê-lo na implementação da Agenda 21, o plano de ação que resultou da Conferência. A Rio-92 produziu ao menos sete grandes resultados: • • • • • • a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (contendo 27 princípios); a Agenda 21 – um plano de ação para o meio ambiente e o desenvolvimento no século XXI; duas grandes convenções internacionais – a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) e a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB); a Comissão de Desenvolvimento Sustentável (CDS); um acordo para negociar uma convenção mundial sobre a desertificação; e a declaração de Princípios para o Manejo Sustentável de Florestas. A Cúpula da Terra, ou RIO-92 2 0 0 0 Os Princípios do Rio reafirmaram as questões que haviam sido formuladas em Estocolmo, vinte anos Pu Av bli c da alia açã s es ção o d tim d o at o IP Terc iv as CC, eiro de an R aq un ela ue cia tór cim nd io Co en o o d e Or nve to au gâ nç gl m ni ão ob en co al to s de Pe E rs sto is te colm nt es o s (P ob Te OP re r de ro s) Po lu Yo str rist en u a s W rk, ir te us as e o s hi ca Wo am ng u r a to sar ld T vi n da ra ões no de c s C o ao en mer Pe ter cia nt , e is ág m pa on No ra o, va em Bu m rac Amaior o n ér di a c ica me am do nsã ad Su o, a d af e o l et Ad an zôn B i oçã do io os o a ass s e do po u gu nt me r a Pro a n ç to da sua co a lo de Cú Ca No pu rt ag va la en Yo do a rk Mil so , E ên br i e st ad o (M os i l l A Un en in id niu te os m rn et Su co m nt m a it) co , m Fó 5 0 ru m m ilh M õe un sd di al e da pá gi Ág na ua s ,H ai a Um número sem precedentes de representantes de Estado, da sociedade civil e do setor econômico com- 2 0 0 1 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 antes, colocando os seres humanos no centro das preocupações relacionadas ao desenvolvimento sustentável, ao declarar que os seres humanos “têm o direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com a natureza”. A Rio-92 proporcionou um fórum para abordar questões relacionadas tanto ao meio ambiente quanto ao desenvolvimento e para enfatizar os diferentes pontos de vista dos hemisférios norte e sul. Após a Conferência, o desenvolvimento sustentável ganhou vida própria, impondo-se nas deliberações de organismos, desde conselhos municipais a organizações internacionais. Mais de 150 países criaram instituições nacionais para desenvolver uma abordagem integrada ao desenvolvimento sustentável – embora em alguns países os conselhos nacionais de desenvolvimento sustentável tivessem uma natureza mais política do que substancial (Myers e Brown, 1997). Uma grande variedade de setores da sociedade civil tem hoje envolvimento com a criação de agendas e estratégias. Mais de 90% deles foram criados em decorrência da Rio-92, a maioria em países em desenvolvimento. A ênfase dada ao desenvolvimento sustentável também teve um impacto considerável tanto em instrumentos legais quanto nas instituições responsáveis por eles. A CITES, por exemplo, que já se afastava do enfoque clássico de conservação, direcionou seu enfoque a uma abordagem que equilibra a conservação e o uso sustentável. A aplicação prática do uso sustentável na CITES provocou um debate substancial e acalorado durante toda a década. Agenda 21 Cú Su pu st la M en tá und ve ia l, l Jo so ha br ne e D sb es ur en go vo lv im en to A Agenda 21 é um plano de ação parcialmente baseado em uma série de contribuições especializadas de governos e organismos internacionais, incluindo a pu- 2 0 0 2 17 “Independente das resoluções que se tomem ou se deixem de tomar em uma conferência como essa, nenhuma melhoria ambiental genuína e duradoura pode acontecer sem um envolvimento local em escala global.” — Presidente da Islândia, Vigdís Finnbogadóttir, Rio-92, 1992 Agenda 21 A Agenda 21 estabelece uma base sólida para a promoção do desenvolvimento em termos de progresso social, econômico e ambiental. A Agenda 21 tem quarenta capítulos, e suas recomendações estão divididas em quatro áreas principais: Questões sociais e econômicas como a cooperação internacional para acelerar o desenvolvimento sustentável, combater a pobreza, mudar os padrões de consumo, as dinâmicas demográficas e a sustentabilidade, e proteger e promover a saúde humana. Conservação e manejo dos recursos visando o desenvolvimento, como a proteção da atmosfera, o combate ao desmatamento, o combate à desertificação e à seca, a promoção da agricultura sustentável e do desenvolvimento rural, a conservação da diversidade biológica, a proteção dos recursos de água doce e dos oceanos e o manejo racional de produtos químicos tóxicos e de resíduos perigosos. Fortalecimento do papel de grandes grupos, incluindo mulheres, crianças e jovens, povos indígenas e suas comunidades, ONGs, iniciativas de autoridades locais em apoio à Agenda 21, trabalhadores e seus sindicatos, comércio e indústria, a comunidade científica e tecnológica e agricultores. Meios de implementação do programa, incluindo mecanismos e recursos financeiros, transferência de tecnologias ambientalmente saudáveis, promoção da educação, conscientização pública e capacitação, arranjos de instituições internacionais, mecanismos e instrumentos legais internacionais e informações para o processo de tomada de decisões. blicação “Cuidando do Planeta Terra: uma estratégia para o futuro da vida” (Caring for the Earth: a Stratey for Sustainable Living, IUCN, UNEP e WWF, 1991). A Agenda 21 é hoje um dos instrumentos sem validade legal mais importantes e influentes no campo do meio ambiente, servindo como base de referência para o manejo ambiental na maior parte das regiões do mundo (ver box acima). 18 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 O custo de implementação da Agenda 21 em países em desenvolvimento foi estimado pelo Secretariado da Cúpula da Terra como sendo de aproximadamente US$ 625 bilhões ao ano, com os países em desenvolvimento cobrindo 80% do custo, ou seja, US$ 500 bilhões. Esperava-se que os países desenvolvidos cobrissem os 20% restantes, ou cerca de US$ 125 bilhões por ano, cumprindo com a sua meta antiga de consagrar 0,7% do seu produto nacional bruto (PNB) à assistência oficial para o desenvolvimento (ODA). Embora a Rio-92 se preocupasse com uma abordagem global, um resultado importante da Conferência foi a adoção de vários programas nacionais e regionais da Agenda 21 para o desenvolvimento sustentável. Na região da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), por exemplo, os Estados Membros adotaram a Política e Estratégia para Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da SADC em 1996. A União Européia adotou o Quinto Plano de Ação Ambiental “Em Direção à Sustentabilidade” (Towards Sustainability, EU, 1993). O Fundo Mundial para o Meio Ambiente O Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF) foi criado em 1991 como uma parceria experimental entre o PNUMA, o PNUD e o Banco Mundial para gerar dividendos ecológicos a partir do desenvolvimento local e regional, fornecendo subvenções e empréstimos a juros baixos para países em desenvolvimento e economias em transição. Após a Rio-92, intencionavase que funcionasse como o mecanismo de financiamento da Agenda 21 e que mobilizasse os recursos necessários. O Fundo ajuda a financiar projetos de desenvolvimento em âmbito regional, nacional e global que beneficiem o meio ambiente mundial em quatro áreas básicas – mudanças climáticas, biodiversidade, camada de ozônio e águas internacionais – e também economias e sociedades locais. Depois do êxito da sua reestruturação em março de 1994, o número de membros do GEF passou de 34 a mais de 155 países, cujos representantes se reúnem na Assembléia de Estados Participantes do GEF, o órgão de supervisão geral do Fundo, a cada três anos. O presidente e executivo principal do GEF, Mohamed T. El-Ashry, reconhece que ainda é cedo para avaliar o impacto dos mais de 220 projetos financiados pelo Fundo em termos de desenvolvimento sustentável. A diferença entre as promessas feitas pelos doadores e suas contribuições efetivas ao GEF causou uma certa preocupação, especialmente em países em desenvolvimento. Embora o compromisso dos países desenvolvidos fosse o de contribuir com 0,7% do seu PNB para a ODA anualmente, esta só recebeu 0,29% em 1995, o nível mais baixo alcançado desde 1973 (GEF, 1997). No entanto, fundações, indivíduos, grandes empresas e heranças consagradas ao desenvolvimento sustentável deram um novo sentido à palavra “caridade”, contribuindo com um total de US$ 129 bilhões em 1994 (Myers e Brown, 1997). Estima-se que essa quantia aumentou em 9% em 1995, alcançando US$ 143,85 bilhões. Acordos ambientais multilaterais A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima A capacidade do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) de fornecer evidências de que as mudanças climáticas significavam uma ameaça real incentivou governos, durante a Rio-92, a assinar a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC). A Convenção tornou-se a peça principal da Rio-92 e entrou em vigor em 1994; em dezembro de 2001, já contava com 186 Partes. A origem da Convenção remonta à Segunda Conferência Mundial sobre o Clima (1990), em que a declaração ministerial foi a forma de se levar adiante a elaboração de políticas e o estabelecimento de um Sistema Global de Observação do Clima (GCOS). O objetivo principal da UNFCCC é estabilizar as emissões de gases de efeito estufa em um nível que evite uma interferência antrópica perigosa no clima global. O princípio de “responsabilidades diferenciadas, embora comuns” da Convenção orientou a adoção de uma estrutura regulatória. Esse princípio reflete a realidade, ou seja, o fato de que os países industrializados são os maiores emissores de gases de efeito estufa. O Protocolo de Quioto, que estabeleceu metas reais para a redução das emissões, foi aberto a assinaturas em 1997. Em dezembro de 2001, 84 Partes haviam assinado e 46 haviam ratificado ou aderido ao Protocolo (UNFCCC, 2001). Uma exceção notável foi a posição dos Estados Unidos, que anunciou a sua decisão de não ratificar o Protocolo no início de 2001. Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) A CDB entrou em vigor em 1993. Foi o primeiro acordo mundial para a conservação e o uso sustentável da biodiversidade e serve como base para ações nacio- INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 nais. A Convenção estabelece três objetivos principais: a conservação da diversidade biológica, o uso sustentável dos seus componentes e a divisão justa e eqüitativa dos benefícios provenientes do uso dos recursos genéticos. Várias questões relativas à biodiversidade são abordadas, como a preservação de habitats, os direitos de propriedade intelectual, a biossegurança e os direitos dos povos indígenas. A Convenção é um marco importante no direito internacional, respeitada por sua abordagem abrangente, com base na noção de ecossistemas para a proteção da biodiversidade. O Tratado foi ampla e rapidamente aceito – em dezembro de 2001, um total de 182 governos já havia ratificado o acordo. Um acordo suplementar à Convenção, o Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança, foi adotado em janeiro de 2000 para tratar dos riscos em potencial causados pelo comércio transfronteiriço e pela liberação acidental de organismos geneticamente modificados. A adoção do Protocolo de Biossegurança é um sucesso para os países em desenvolvimento que o requisitaram. O Protocolo já havia sido assinado por 103 Partes e ratificado por 9 em dezembro de 2001. A CDB também influenciou a decretação de uma lei que busca regulamentar os recursos genéticos nas nações participantes do Pacto Andino – Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela. A lei entrou em vigor em O papel de países em desenvolvimento nas negociações da CDB Descontente com a versão inicial do CDB em novembro de 1991, o Centro Sul, com sede em Genebra, incitou os países em desenvolvimento a rejeitar essa versão e insistiu que qualquer negociação sobre a biodiversidade deve ser associada a uma negociação sobre biotecnologia e, de forma mais geral, aos direitos de propriedade intelectual. Essa tendência de privatização do conhecimento e dos recursos genéticos representa uma séria ameaça ao desenvolvimento do Hemisfério Sul e deve ser combatida. julho de 1996 (Centre for Science and Environment, 1999). Apesar do sucesso da Convenção, as negociações que precederam a sua adoção foram em geral um tanto quanto amargas (ver box). A Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação Embora as negociações só tivessem se completado em 1994, o processo de elaboração da Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação (CCD) teve início na Rio-92. No entanto, sua história remonta à década de 1970. A Convenção entrou em vigor em 1996 e contava com 177 partes em dezembro de 2001. A CCD foi descrita como uma “enteada da Rio-92” (Centre for Science and Environment, 1999), porque não recebeu a mesma atenção que a UNFCCC e a CDB. As nações industrializadas se opuseram à CCD porque não se dispunham a aceitar nenhuma responsabilidade financeira pela interrupção do processo de desertificação, que não é visto como um problema mundial (Centre for Science and Environment, 1999). Projeções indicaram que um esforço mundial de vinte anos para combater a desertificação custaria de US$ 10 bilhões a US$ 22 bilhões por ano, mas os países financiadores contribuíram com uma quantia mísera de US$ 1 bilhão em 1991 para o controle da desertificação no mundo (Centre for Science and Environment, 1999). Embora a CCD receba um apoio financeiro modesto em comparação à UNFCCC e à CDB, a convenção se distingue por dois motivos: • Durante as negociações, o Sul: enfatizou a soberania nacional sobre os recursos naturais; pediu que a transferência de tecnologia aos países em desenvolvimento fosse feita de forma preferencial; exerceu pressão para que a CDB tivesse supremacia sobre outras instituições, como a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) e o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT); e pediu o desenvolvimento de um protocolo sobre biossegurança. Fonte: Centre for Science and Environment, 1999 • Endossa e utiliza uma abordagem “de baixo para cima” (bottom-up) em relação à cooperação mundial para o meio ambiente. Pelos termos da CCD, as atividades relacionadas ao controle e à mitigação da desertificação e de seus efeitos devem estar sintonizadas com as necessidades e a participação de usuários locais das terras e de organizações não-governamentais. A Convenção possui anexos regionais detalhados, por vezes mais que o próprio corpo da Convenção. Esses anexos abordam as particularidades do problema da desertificação em regiões específicas como a África, a América Latina e o Caribe e o Norte do Mediterrâneo (Raustiala, 2001). O compromisso mais importante e central da CCD é a obrigação de desenvolver “programas de ação nacional” em conjunto com grupos de interesse locais. Esses programas delineiam as tarefas que as par- 19 20 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 Mandato da Comissão de Desenvolvimento Sustentável A CDS foi instaurada em dezembro de 1992 sob os auspícios do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas. Composta por 53 membros eleitos com mandato de três anos, a Comissão se reúne anualmente durante o período de duas a três semanas. A primeira reunião realizou-se em junho de 1993. De forma geral, o papel da Comissão é o de: examinar o progresso alcançado em âmbito internacional, regional e nacional na implementação de recomendações e compromissos contidos nos documentos finais da UNCED Agenda 21, Declaração do Rio Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e Declaração de Princípios sobre o Uso das Florestas; elaborar diretrizes e opções para atividades futuras como uma continuação à UNCED e para alcançar o desenvolvimento sustentável; e promover o diálogo e formar parcerias para o desenvolvimento sustentável com os governos, a comunidade internacional e os principais grupos identificados na Agenda 21 como os atoreschave fora de administrações centrais que desempenham um papel essencial na transição para o desenvolvimento sustentável. Fonte: UN, 2001 “Aqui nos Estados Unidos, precisamos melhorar. Com 4% da população mundial, produzimos 20% dos gases de efeito estufa do planeta. Então, precisamos melhorar. E melhoraremos.” — Bill Clinton, presidente dos Estados Unidos, Rio + 5, 1997 “É uma questão muito preocupante para a Índia que, cinco anos após a Rio92, haja um esforço visível para erodir a estrutura de parceria construída no Rio – mais especificamente o princípio de responsabilidades diferenciadas, embora comuns – com a demonstração de esforços voltados para aplicar obrigações e responsabilidades iguais a atores desiguais.” — Professor Saifuddin Soz, ministro indiano do Meio Ambiente e Florestas, Rio + 5, 1997 ticas econômicas, sociais e ambientais – uma exigência do desenvolvimento sustentável já expressa pela Comissão Brundtland – continua a se colocar como um desafio para instituições em todos os níveis. Rio + 5 Cinco anos após a Rio-92, a comunidade internacional convocou uma nova cúpula chamada Rio + 5 para rever os compromissos empreendidos no Rio de Janeiro em 1992. Durante o encontro, realizado em Nova York, houve uma preocupação em relação à lenta implementação da Agenda 21. A conclusão geral foi a de que, embora um certo progresso houvesse sido feito em relação ao desenvolvimento sustentável, várias das metas da Agenda 21 ainda estão longe de se concretizar (UN, 1997). Outras conferências internacionais importantes Os princípios do desenvolvimento sustentável foram reafirmados ao longo da década de 1990 em várias conferências internacionais, como por exemplo: • • • tes devem empreender na implementação da CCD. Por exemplo, as partes devem fazer da prevenção à desertificação uma prioridade em políticas nacionais e devem promover a conscientização sobre esse problema entre seus cidadãos. • • • A Comissão de Desenvolvimento Sustentável (CDS) • O estabelecimento da CDS em dezembro de 1992 foi uma conseqüência direta da Rio-92. Embora a meta de desenvolvimento sustentável tivesse sido estabelecida na década de 1980, foi somente durante a Rio-92 que um órgão internacional foi criado com o mandato de supervisionar e ajudar a comunidade internacional a atingir essa meta (ver box). Apesar de um grande passo, a Comissão foi criticada como sendo uma resposta fraca a problemas de capacidade institucional, além de deparar-se com a apatia de ministros de Estado (Long, 2000). A integração de polí- 1993: Conferência Mundial dos Direitos Humanos, realizada em Viena; 1994: Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, Cairo; 1994: Conferência Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável dos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento, Bridgetown, Barbados; 1995: Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Social, Copenhague; 1995: Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher, Beijing; 1996: Conferência Mundial das Nações Unidas sobre os Assentamentos Humanos (HABITAT II), realizada em Istambul; e 1996: Cúpula Mundial da Alimentação, Roma. A participação de grupos de interesse no desenvolvimento sustentável Essa atividade internacional refletiu-se amplamente em tentativas por parte do setor privado de melhorar o seu desempenho ambiental. Tal ação foi motivada pela criação do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (WBCSD), em 1995, que muito incentivou a indústria a examinar formas de melhorar a rentabilidade diminuindo o desperdício de recursos e de energia e reduzindo emissões. O WBCSD INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 hoje conta com centenas de membros, dos quais vários conseguiram alcançar uma economia notável tanto para si quanto para o meio ambiente (Rabobank International, 1998). Em 1996, a Organização Internacional para Padronização criou um novo padrão voluntário para sistemas de manejo ambiental na indústria, a ISO 14.000 (International Organization for Standardization, 2001). Ao final da década, grandes empresas transnacionais haviam melhorado muito a sua imagem ambiental; na realidade, o seu desempenho ambiental foi em geral melhor do que o de várias empresas de pequeno e médio portes (Kuhndt e Van der Lugt, 2000). A elaboração de relatórios ambientais por parte de grandes empresas também se tornou uma iniciativa comum durante a década de 1990, e a iniciativa Global Reporting Initiative – GRI foi criada para estabelecer uma base comum para os relatórios voluntários sobre o desempenho ambiental, econômico e social de uma organização (GRI, 2001). O GRI busca elevar o nível dos relatórios sobre o desenvolvimento sustentável realizados por empresas ao mesmo patamar de credibilidade, comparabilidade e consistência dos seus relatórios financeiros. A sociedade civil também teve um envolvimento ativo, principalmente em sua tentativa de criar a Carta da Terra, que expressa os “princípios éticos fundamentais para um modo de vida sustentável”. Centenas de grupos e milhares de pessoas se envolveram na criação da Carta; embora a intenção inicial fosse a de adotá-la durante a Rio-92, a Carta foi refinada em um processo liderado pelo Conselho da Terra e pela Cruz Verde Internacional. A Carta está disponível em 18 línguas no site da Internet do Secretariado (Earth Charter, 2001). Contudo, a sociedade civil não se limitou a campanhas como a da Carta da Terra, mas também organizou grandes manifestações em várias partes do mundo, muitas das quais contra a ameaça presumida da globalização. Tais iniciativas são por si só um reflexo do processo de globalização e do atual poder extraordinário da Internet, que passou por um crescimento explosivo. Se em 1993 a World Wide Web (WWW) contava com apenas 50 páginas, ao final da década elas já haviam se transformado em 50 milhões (UN, 2000), mudando radicalmente a maneira pela qual várias pessoas vivem e trabalham – principalmente nos países ricos e industrializados. Apesar do “custo baixo dos elétrons”, ao final da década de 1990, 88% dos usuários da Internet viviam em nações industrializadas, que conjuntamente representavam apenas 17% da população mundial (UNDP, 1999). Esta foi uma constatação 21 um tanto soturna do final da década de 1990: em ao menos um ponto significativo, os pontos de vista e as preocupações da maioria carente – apesar de toda a retórica da década – ainda eram deixados de lado nas discussões mundiais. Tratado de Proibição Completa de Testes Nucleares (CTBT) A adoção, em 1996, do Tratado de Proibição Completa de Testes Nucleares (CTBT) pela Assembléia Geral das Nações Unidas em Nova York representou um marco importante em termos de cooperação internacional com conseqüências para o meio ambiente. O CTBT, que proíbe todos os testes nucleares em qualquer meio ambiente, foi aberto para assinaturas em Nova York no dia 24 de setembro de 1996, quando foi assinado por 71 Estados, incluindo as 5 potências nucleares. Em agosto de 2001, 161 Estados haviam assinado e 79 haviam ratificado o Tratado. Um plano minucioso de verificação mundial está sendo desenvolvido pela Comissão Preparatória do CTBT para quando o Tratado entrar em vigor, o que deve acontecer oitenta dias depois da sua ratificação pelos 44 Estados listados em seu Anexo 2, dos quais 31 já o haviam feito até agosto de 2001 (CTBTO, 2001). “Os cinco anos passados desde a Rio-92 deixaram patente que as transformações na estrutura política e econômica global não foram acompanhadas pelos progressos necessários na luta contra a pobreza e contra o uso predatório dos recursos naturais.” — Fernando Henrique Cardoso, presidente do Brasil, cujo país sediou a Rio-92, Rio + 5, 1997 2000 e além: reexaminando a agenda Apesar de vários contratempos, os últimos trinta anos forneceram uma base sólida sobre a qual o desenvolvimento sustentável poderá ser implementado nas próximas décadas. O clima predominante em círculos ambientais é de um otimismo cauteloso em relação ao progresso futuro em geral, embora haja muitos fatores influentes desconhecidos, como as mudanças climáticas, que é o mais importante deles. A renovação da conscientização e do interesse ambiental Em 2002, a conscientização e o interesse ambiental foram estimulados pelas preparações para a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável. Uma série de outros fatores interessantes também pode ter 22 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 impactos duradouros. Um deles é a maior disposição por parte de grupos distintos de trabalhar em conjunto em prol de uma causa comum. O secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, apoiou o estabelecimento do Pacto Global (ver box abaixo), que visa estabelecer uma sinergia entre o setor privado e três organismos das Nações Unidas – o PNUMA, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (UN, 1999). Pela primeira vez, os princípios que tratam da proteção dos direitos humanos, de leis de trabalho justas e da responsabilidade ambiental serão abordados por esses organismos em um único acordo internacional. Produtos químicos Há trinta anos, vários produtos químicos tóxicos e persistentes eram considerados não somente como recursos, mas como poluentes que afetavam a saúde humana de forma negativa, especialmente quando se acumulavam no topo da cadeia alimentar ou eram transportados por longas distâncias no mundo. Hoje, no entanto, os produtos químicos são vistos como sendo ainda mais essenciais para o desenvolvimento e como um recurso que precisa ser administrado de forma a proteger ou mesmo melhorar a saúde humana e o meio ambiente. Esse manejo racional dos produtos químicos se aplica tanto aos produtos antropogênicos Princípios do Pacto Global Direitos Humanos Princípio 1: apoiar e respeitar a proteção dos direitos humanos internacionais; e Princípio 2: assegurar que as grandes empresas não sejam cúmplices de violações aos direitos humanos. Trabalho Princípio 3: liberdade de associação e reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva; Princípio 4: a eliminação de todas as formas de trabalho forçado e obrigatório; Princípio 5: a abolição efetiva do trabalho infantil; e Princípio 6: a eliminação da discriminação em termos de emprego e ocupação. Meio Ambiente Princípio 7: apoiar uma abordagem preventiva às questões ambientais; Princípio 8: tomar iniciativas visando a promoção de uma maior responsabilidade ambiental; e Princípio 9: incentivar o desenvolvimento e a disseminação de tecnologias ambientalmente saudáveis. Fonte: UN, 1999 Convenção de Estocolmo sobre Poluentes Orgânicos Persistentes A Convenção sobre Poluentes Orgânicos Persistentes cobre uma lista inicial de 12 produtos químicos: oito pesticidas aldrin, clordano, dicloro difenil tricloretano (DDT), dieldrin, endrin, heptacloro, mirex e toxafeno; dois produtos químicos industriais bifenilas policloradas (PCBs) e hexaclorobenzeno (que também é um pesticida); e dois subprodutos não-intencionais da combustão e de processos industriais (dioxinas e furanos). Uma isenção relacionada a questões sanitárias foi concedida até 2025 ao DDT, ainda necessário a muitos países para o controle do mosquito transmissor da malária. Os governos também podem manter equipamentos existentes que contenham PCBs de maneira que não haja vazamentos, para que tenham tempo de substituílos. Os PCBs têm sido muito usados em transformadores elétricos e outros tipos de equipamento. A Convenção também designa o Fundo Mundial para o Meio Ambiente como o seu principal mecanismo financeiro, de forma provisória, por meio do qual os países desenvolvidos canalizarão recursos novos e adicionais para ajudar países com economias em transição e em desenvolvimento a implementar suas obrigações. Ela também prevê um processo de base científica, incorporando o princípio de precaução, para examinar outros produtos químicos que possam vir a ser adicionados à lista anterior pela Conferência das Partes. Fonte: UNEP, 2001 quanto aos de origem natural, incluindo aqueles gerados por meio de processos biológicos. A comunidade internacional recentemente concluiu uma convenção importante para controlar o uso de um grupo de componentes orgânicos tóxicos persistentes (ver box acima). Em dezembro de 2000, representantes de 122 governos finalizaram o texto de um tratado com validade legal visando a implementação de ações internacionais em relação a certos poluentes orgânicos persistentes (POPs). A Convenção de Estocolmo sobre Poluentes Orgânicos Persistentes, assinada em maio de 2001 e que contava com 111 signatários e 2 Partes em dezembro de 2001, estabelece medidas de controle sobre 12 produtos químicos. As disposições de controle pedem a eliminação da produção e do uso de POPs produzidos intencionalmente e a eliminação de POPs produzidos de forma não-intencional, quando for possível (UNEP, 2001). INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 Desde a Conferência de Estocolmo, a indústria de produtos químicos cresceu quase nove vezes, e estima-se que tenha um crescimento anual de cerca de 3% durante as próximas três décadas, com um aumento considerável no comércio (OECD, 2001). Isso aumentará o risco de exposição de um número cada vez maior de pessoas e do meio ambiente a novos produtos químicos e o potencial de emergência de novas doenças de origem química. As informações sobre o despejo de produtos químicos no meio ambiente são de muito mais fácil acesso do que antes. Os Estados Unidos saíram à frente nessa área, em especial com a publicação do Inventário de Emissões Tóxicas (Toxics Release Inventory – TRI, 2001) promulgado por meio da lei do planejamento de emergência e do direito ao conhecimento da comunidade (Emergency Planning and Community Right-to-Know Act – EPCRA), de 1986. O propósito dessa lei é o de informar as comunidades e os cidadãos sobre os perigos dos produtos químicos em suas regiões. A lei exige que as empresas informem o estado e o governo local sobre a localização e a quantidade de produtos químicos armazenados na região. Por meio da EPCRA, o Congresso americano determinou que um Inventário de Emissões Tóxicas (TRI) se tornasse público. O TRI fornece informações aos cidadãos sobre produtos químicos com potencial de risco e os seus usos, para que as comunidades possam exigir maior responsabilização por parte das empresas e para que tomem decisões fundamentadas sobre como os produtos químicos tóxicos devem ser manejados. A Cúpula do Milênio As questões ambientais se sobressaíram durante a Cúpula do Milênio das Nações Unidas, realizada pelo secretário-geral da ONU, Kofi Annan, em Nova York, no ano 2000 (ver box à direita). Mas se o reconhecimento sobre a importância das questões relativas ao meio ambiente durante a Cúpula foi encorajador, o relatório de progresso não teve a mesma sorte. O secretário-geral foi bem franco em seus comentários sobre o manejo ambiental, declarando que a comunidade internacional não estava conseguindo assegurar às gerações futuras a liberdade de sobreviver neste planeta. “Ao contrário”, afirmou, “estamos pilhando o patrimônio futuro de nossos filhos para pagar pelas práticas ambientalmente insustentáveis do presente” (UN, 2000). 23 Propostas principais do secretário-geral da ONU apresentadas na Cúpula do Milênio A salvo da carência: a Agenda para o Desenvolvimento Pede-se a chefes de Estado ou de Governo que tomem medidas nas seguintes esferas: Pobreza: reduzir à metade a proporção da população mundial (atualmente 22%) cuja renda seja menor do que o equivalente a um dólar por dia até 2015. Água: reduzir à metade a proporção de pessoas que não têm acesso à água potável (atualmente 20%) até 2015. Educação: diminuir a disparidade entre gêneros na educação primária e secundária até 2005; e assegurar que, em 2015, todas as crianças tenham acesso ao curso completo de educação primária. HIV/AIDS: deter e começar a reverter a disseminação do HIV/AIDS até 2015, mediante: a adoção de uma meta explícita de redução das taxas de infecção por HIV em pessoas entre 15 e 24 anos, em 25% nos países mais afetados antes de 2005 e em 25% no mundo inteiro antes de 2010; o estabelecimento de metas preventivas explícitas: até 2005 ao menos 90% e até 2010 ao menos 95% dos homens e mulheres jovens devem ter acesso a informações e a serviços de prevenção ao HIV; e um pedido a cada país gravemente afetado pela doença para que estabeleça um plano de ação nacional dentro de um ano a partir da Cúpula. Eliminar as favelas: colocar em prática o plano Cidades sem Favelas lançado pelo Banco Mundial e pelas Nações Unidas para melhorar a vida de 100 milhões de moradores de favelas até 2020. Um futuro sustentável: a Agenda para o Meio Ambiente Pede-se a chefes de Estado ou de Governo que adotem uma nova ética de conservação e administração, começando pelo seguinte: Mudanças Climáticas: que adotem e ratifiquem o Protocolo de Quioto, para que este possa entrar em vigor até 2002, e que garantam que suas metas sejam alcançadas, como um passo em direção à redução das emissões de gases de efeito estufa. Contabilidade Verde: que considerem a incorporação do sistema de “contabilidade verde” das Nações Unidas às suas contas nacionais, para que as questões ambientais sejam integradas às políticas econômicas gerais. Avaliação de Ecossistemas: que prestem assistência financeira a, e que se envolvam ativamente na Avaliação de Ecossistemas do Milênio, um grande esforço de colaboração internacional para mapear a saúde do planeta. Rio+10: que preparem as condições para que os líderes mundiais adotem ações concretas e significativas na conferência de avaliação dos dez anos decorridos desde a Rio-92, a Cúpula da Terra de 2002. Fonte: UN, 2000 24 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 O clima e o consumo de energia No início de 2001, o IPCC anunciou que as evidências de mudanças climáticas de origem antrópica estavam aumentando, que o aquecimento global estava ocorrendo de forma mais rápida e que as conseqüências pareciam mais graves do que havia sido previsto. O Painel, formado por milhares de cientistas do mundo inteiro, previu que a temperatura média aumentaria de 1,4° C a 5,8°C durante o século XXI. O IPCC afirma que “há evidências novas e sólidas de que o aquecimento ocorrido nos últimos cinqüenta anos seja, em grande parte, decorrente de atividades humanas. ... Além disso, é muito provável que o aquecimento ocorrido no século XX tenha contribuído significativamente para o aumento observado no nível do mar, por meio da expansão térmica da água do mar e de uma perda generalizada de gelo terrestre” (IPCC, 2001). As implicações desse aumento rápido da temperatura mundial envolvem amplas áreas de preocupação econômica, social e ambiental e tornam mais urgente a necessidade de controlar os fatores que contribuem para o aquecimento global. O primeiro e mais importante desses fatores é o consumo de energia. Verifica-se uma queda no consumo per capita de combustíveis fósseis apenas na Europa, e ainda assim de forma muito lenta. El Niño Uma atenção cada vez maior está sendo direcionada ao El Niño, como resultado de um episódio especialmente grave ocorrido entre 1997 e 1998 que acarretou Níveis do mar durante El Niño, 1997-98 danos no valor de milhões de dólares. O fenômeno também deu origem a um estudo de grande porte por parte de várias instituições sobre o que foi aprendido nessa oportunidade e o que poderá ser feito para mitigar os efeitos de El Niños futuros (ver box abaixo). Melhor prevenir do que remediar: El Niño, 1997-98 Segundo um novo estudo internacional, milhares de vidas humanas e dezenas de bilhões de dólares em prejuízos econômicos serão desperdiçados pelos países em desenvolvimento a cada dois a sete anos até que seja feito um investimento na melhoria do prognóstico e da preparação em relação ao fenômeno El Niño. O estudo foi desenvolvido por equipes de pesquisadores trabalhando em 16 países na América Latina, Ásia e África. Quatro organismos das Nações Unidas colaboraram na preparação do estudo o PNUMA, a Universidade da ONU, a OMM e a Estratégia Internacional para Redução de Desastres junto com o Centro Nacional para Pesquisa Atmosférica, com base nos Estados Unidos. Previsões mais confiáveis em relação ao El Niño e uma melhor capacidade dos governos em reagir de forma rápida a essas previsões são cruciais. Sem elas, economias, infra-estruturas e populações vulneráveis em várias partes do mundo continuarão a sofrer periodicamente com eventos causados pelo El Niño, como enchentes, incêndios, secas, ciclones e surtos de doenças infecciosas. Poucos especialistas conseguiram prever o início do El Niño em meados de 1997, e nenhum foi capaz de compreender a magnitude do “El Niño do século” até que o fenômeno já estivesse bem avançado. Os serviços meteorológicos nacionais e regionais fizeram previsões um tanto quanto generalizadas em relação ao El Niño para que pudessem ser usadas de forma confiável por responsáveis pela tomada de decisões em âmbito regional e nacional. O prejuízo causado pelo El Niño em 1997-98 incluiu milhares de mortes e danos causados por graves tempestades, ondas de calor, incêndios, enchentes, geadas e secas. Estimativas em relação aos danos causados pelo El Niño no período variam entre US$ 32 bilhões e US$ 96 bilhões. Fonte: UNU, 2001 Imagem de satélite registra o nível do mar no Pacífico em 10 de novembro de 1997. O fenômeno El Niño caracteriza-se pelo aumento do nível do mar (áreas em vermelho e branco) no lado sul-americano do Pacífico Sul e por um nível mais baixo (áreas em azul) do outro lado. Fonte: Topex/Poseidon, NASA Progressos científicos Nos primeiros anos do Terceiro Milênio, os progressos científicos continuam a levantar questões éticas e ambientais. Uma conquista científica cujo impacto sobre a humanidade e conseqüentemente sobre o meio ambiente ainda é desconhecido é o mapeamento do genoma humano. Os benefícios de tal mapeamento incluem o conhecimento das cau- INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 sas subjacentes a milhares de doenças genéticas e a antecipação da probabilidade de ocorrência dessas doenças em qualquer indivíduo. As informações genéticas também podem ser usadas para prever uma vulnerabilidade a diferentes agentes industriais e ambientais. Embora haja preocupações sobre o mal uso e a perda de privacidade, muitas das ramificações do mapeamento do genoma humano só serão reconhecidas quando a ciência e a tecnologia se unirem nas aplicações futuras desse novo instrumento (Human Genome Project, 1996). Igualmente controverso é o uso crescente de organismos geneticamente modificados (OGMs). Como já foi descrito no GEO-2000 (UNEP, 1999), a rapidez de mutações em micróbios e vírus, aliada ao crescimento do transporte de animais representa surpresas em potencial neste milênio. A realidade por trás dessa afirmação foi demonstrada pela descoberta da encefalopatia espongiforme bovina (ou doença da vaca louca) no Reino Unido e em outras partes da Europa e, de forma mais dramática, pela propagação da febre aftosa no Reino Unido. Os efeitos de um transporte ampliado de gado e ração através das fronteiras intensificaram a disseminação dessas doenças, levando à matança de várias criações de animais e a uma grande preocupação em relação à transmissão a partir de, ou para, populações de animais silvestres. Apesar da febre aftosa ser comum em vários países em desenvolvimento, são as nações industrializadas que sentem seus efeitos de forma mais pungente. Embora a doença raramente leve à morte, ela é debilitante e reduz a produtividade. Em sistemas agrícolas intensivos de porte industrial, em que a margem de lucro é baixa por causa da superprodução, não há como se tolerar o impacto econômico de doenças. Globalização A globalização foi descrita por alguns como a nova Revolução Industrial. Há um receio de que ela possa resultar em uma polarização perigosa entre pessoas e países que se beneficiam do sistema e aqueles que são meros recipientes passivos dos seus efeitos. No seu Relatório de Desenvolvimento Humano de 1999, o PNUD afirma que a quinta parte da população mundial que vive nos países de renda mais elevada conta com 86% do PIB mundial, 82% das exportações mundiais, 68% do investimento direto estrangeiro e 74% das linhas telefônicas mundiais (UNDP, 1999). A quinta parte de menor renda, que vive nos países mais pobres, conta com cerca de 1% em cada categoria. Na década de 1990, mais de 80% 25 Os custos do aquecimento global Segundo um relatório feito por Munich Re, membro da iniciativa de serviços financeiros do PNUMA, as possíveis conseqüências financeiras das previsões do IPCC são as seguintes: Prejuízos causados por ciclones tropicais mais freqüentes, perda de terra em conseqüência de um aumento do nível do mar e danos aos recursos pesqueiros, à agricultura e ao fornecimento de água poderiam custar mais de US$ 300 bilhões por ano. Em termos globais, os maiores prejuízos seriam na área da energia. A indústria hídrica mundial enfrentará um custo adicional de US$ 47 bilhões por ano em 2050. A indústria agrícola e a silvicultura podem perder até US$ 42 bilhões em todo o mundo em conseqüência de secas, enchentes e incêndios se os níveis de dióxido de carbono alcançarem o dobro das suas concentrações pré-industriais. Programas de defesa contra inundações para proteger moradias, fábricas e usinas de energia do aumento do nível do mar e de tempestades repentinas podem custar US$ 1 bilhão por ano. A perda de ecossistemas, incluindo manguezais, recifes de corais e lagunas costeiras podem chegar a mais de US$ 70 bilhões em 2050. Fonte: Berz, 2001 do investimento direto estrangeiro em países em desenvolvimento e naqueles do Centro e do Leste Europeu foi destinado a apenas 20 países, principalmente à China. As grandes empresas transnacionais, as organizações de mídia transnacionais, as organizações intergovernamentais e as ONGs foram as principais responsáveis pelo fenômeno da globalização (Riggs, 2000). A globalização representa mais do que o fluxo de dinheiro e de mercadorias – é a interdependência crescente das populações do mundo por meio da “contração do espaço, da contração do tempo e do desaparecimento de fronteiras” (UNDP, 1999). Isso oferece uma grande oportunidade para o enriquecimento da vida das pessoas e para a criação de uma comunidade global baseada em valores compartilhados. Mas, segundo o relatório do PNUD, permitiu-se que os mercados dominassem o processo, e os benefícios e as oportunidades não foram compartilhados de forma eqüitativa. As várias manifestações da sociedade civil em todo o mundo foram uma resposta ao rápido crescimento da globalização econômica. A manifestação ocorrida em Seattle em novembro de 1999 durante o encontro da Organização Mundial do Comércio (OMC), em que milhares de pessoas fizeram campanha contra a globalização, foi um evento de grande repercussão. Maior conscientização pública também foi manifestada durante os encontros do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internaci- 26 INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 Uma das maiores represas do mundo: a usina hidrelétrica de Itaipu, no Brasil. Um novo relatório questiona o futuro de tais projetos Fonte: Julio Etchart, Still Pictures onal na cidade de Praga, em setembro de 2000, e em outros encontros desde então. Essas manifestações mostram que cidadãos do mundo inteiro querem ser ouvidos e exigem a implementação e o cumprimento de padrões ambientais, de comércio e de trabalho aceitáveis em todo o mundo. Várias organizações internacionais responsáveis pela regulamentação da economia global agora têm de adaptar suas políticas de forma a incluir a participação da sociedade civil em suas atividades. A ironia da globalização e do aumento da conscientização pública é que o consumo continua a crescer em nações industrializadas e a pobreza continua a piorar em países em desenvolvimento. Água A água desempenhará um papel de destaque na agenda do novo milênio. O Fórum Mundial da Água, realizado em Haia em março de 2000, levou à adoção de “perspectivas em relação à água” para as diferentes regiões do mundo, ajudando a definir um plano de ação referente ao uso da água para o século XXI. Cerca de 6 mil pessoas estiveram presentes no fórum global, mas milhares de outras participaram das preparações regionais. Espera-se que a participação em massa nesses eventos mantenha questões relativas à qua- lidade e à quantidade da água à frente da agenda ambiental, para que as perspectivas regionais possam ser implementadas de forma bem-sucedida. Nas últimas décadas, as grandes represas surgiram como um dos instrumentos mais significativos e visíveis para o manejo dos recursos hídricos. Em novembro de 2000, a Comissão Mundial de Barragens publicou o seu relatório “Barragens e Desenvolvimento: um Novo Modelo para Tomada de Decisões” (Dams and Development: A New Framework for DecisionMaking), afirmando que nos últimos cinqüenta anos as barragens fragmentaram e transformaram os rios do mundo, deslocando entre 40 milhões e 80 milhões de pessoas em diferentes partes do mundo (WCD, 2000). O relatório questiona o valor de várias represas no atendimento das necessidades de água e energia, em comparação a outras opções. Isso representa uma mudança significativa de visão em relação ao valor das represas e pode contribuir para que se adote uma abordagem diferente para a utilização dos recursos hídricos no futuro. Avaliações e um alerta antecipado A Avaliação de Ecossistemas do Milênio (Millennium Ecosystem Assessment – MA), lançada no Dia Mundial do Meio Ambiente em 2001, examinará os INTEGRAÇÃO ENTRE O MEIO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO: 1972-2002 ecossistemas que possibilitam a vida, como as pastagens, as florestas, os rios e lagos, as terras cultiváveis e os oceanos. Essa iniciativa, prevista em quatro anos e envolvendo US$ 21 milhões, contará com a participação de 1.500 dos cientistas de maior destaque no mundo (MA, 2001). “A Avaliação de Ecossistemas do Milênio mapeará a saúde do nosso planeta e preencherá dessa forma importantes lacunas no nosso conhecimento para que possamos preservá-la”, afirmou o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, ao anunciar o estudo. “Todos nós temos de compartilhar os frágeis ecossistemas e os preciosos recursos da Terra, e cada um de nós tem um papel na sua preservação. Para que possamos continuar a viver juntos nesse planeta, todos devemos nos responsabilizar por ele.” O estudo foi lançado para proporcionar aos responsáveis pela tomada de decisões um conhecimento científico confiável em relação ao impacto das mudanças nos ecossistemas terrestres sobre os meios de vida humanos e o meio ambiente. Ele fornecerá informações mais detalhadas a governos, ao setor privado e a organizações locais, sobre iniciativas que podem ser tomadas para recuperar a produtividade dos ecossistemas do mundo. A Avaliação foi reconhecida por governos como um mecanismo para atender às necessidades de avaliação de três tratados internacionais sobre o meio ambiente: a Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica, a Convenção de Ramsar sobre Zonas Úmidas e a Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação. Seguindo adiante, progredindo Um novo espírito de colaboração e participação é visível nestes primeiros anos do século XXI, que alguns associam ao “espírito de compromisso de Estocolmo”. Com a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável marcada para 2002 em Joanesburgo, há uma esperança renovada na adoção de ações eficazes e significativas pelos maiores responsáveis pela tomada de decisões em âmbito global. Os próximos quatro capítulos, ao apresentarem avaliações globais e regionais sobre o meio ambiente, observações sobre mudanças ambientais e vulnerabilidade humana, cenários futuros e implicações a serem consideradas na elaboração de políticas, pretendem prestar uma contribuição substancial a esse debate. Referências: Capítulo 1, Integração entre o meio ambiente e o desenvolvimento, 1972–2002 Bennett, M. (1995). The Gulf War. Database for Use in Schools http://www.soton.ac.uk/~engenvir// environment/water/oil.gulf.war.html [Geo-1-002] Berz, G. (2001). 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