1
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE – AVM
PÓS-GRADUAÇÃO “LATU SENSU”
A LEITURA E A ESCRITA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
AUTOR(A): ANA MARIA SOARES DE CARVALHO
ORIENTADOR(A): PROFESSORA NARCISA CASTILHO MELO
TERESINA, 20 DE ABRIL DE 2009
2
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE – AVM
PÓS-GRADUAÇÃO “LATU SENSU”
A LEITURA E A ESCRITA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Monografia apresentada ao
Instituto A Vez do Mestre da
Universidade Cândido Mendes
como requisito de conclusão do
curso de Pós-graduação Lato –
Sensu – Especialização em
Psicopedagogia da aluna Ana Maria
Soares de Carvalho.
3
AGRADECIMENTOS
À Trindade Santa, Deus Pai, Deus Filho e Deus
Espírito Santo, por nos ter dado força,
perseverança
e
sabedoria
durante
a
elaboração deste trabalho.
Às orientadoras Maria Esther e Narcisa Melo,
pela
gentileza
e
pelas
sugestões
enriquecedoras.
Ao meu esposo Raimundo, meu filho Márcio e
minha filha Danielle, pelos estímulos recebidos.
Ana Maria Soares de Carvalho
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho às crianças do Centro
Municipal de Educação Infantil João Mendes
Olímpio de Melo, de Teresina – PI
5
Resumo
O ensino visando a aquisição da leitura e da escrita por parte do
educando é importante ser trabalhado já na Educação Infantil. A leitura
favorece a construção do conhecimento e possibilita ao indivíduo
oportunidades de conquistas pessoais. Leitura e escrita são práticas
complementares e os benefícios que ambas proporcionam devem estar ao
alcance de todos para a formação de uma atitude crítica diante da sociedade.
A criança, antes de chegar à escola, já tem contato com a leitura e a
escrita. O seu desempenho na escola dependerá, de certa forma, do ambiente
familiar. A família é o primeiro grupo social que a criança participa. Se este
ambiente é favorável ao seu desenvolvimento cognitivo certamente ela terá
sucesso na escola. Caso contrário, esta criança mesmo sendo detentora da
capacidade de aprender, enfrentará dificuldades no processo de
aprendizagem, porém, cabe ao professor da Educação Infantil proporcionar à
criança o acesso ao mundo das letras, para isso, é importante que seja
observado e respeitado o nível de desenvolvimento de cada educando.
Embora, numa mesma turma as crianças tenham a mesma faixa etária, cada
criança tem em particular sua própria história, o meio familiar, as condições em
que foi concebida, tudo isso tem influência no comportamento e no
desenvolvimento dela na escola. Para proporcionar situações de aprendizagem
à criança, a escola precisa estabelecer uma seleção de conteúdos
relacionados ao nível da criança, específico para o processo de ensino e
aprendizagem, além de construir no espaço escolar, principalmente na sala de
aula, um ambiente letrado.
6
METODOLOGIA
A metodologia empregada na elaboração deste trabalho monográfico
será a pesquisa de natureza bibliográfica visto que se pretende conhecer e
analisar as concepções dos autores sobre a importância da leitura e da escrita
na Educação Infantil e como proceder diante das dificuldades enfrentadas pela
criança na sala de aula.
O estudo será realizado em várias etapas, começando com a escolha do
tema. Em seguida, será feito um levantamento bibliográfico, proceder-se-á a
leitura das diversas bibliografias levantadas selecionando-se aqueles que em
sua abordagem desenvolvem temas referentes ao objeto de estudo do trabalho
monográfico. Em seguida, será providenciado o fichamento das bibliografias
selecionadas: livros, capítulos de livros e reportagens.
Após o fichamento será feita a síntese de todo o material fichado. A
elaboração desta síntese será feita de acordo com a divisão dos capítulos já
previstos da monografia. Segue-se a elaboração do trabalho monográfico
dividido em três capítulos: concepções de leitura e escrita, a criança e o
ambiente familiar, e o processo de aquisição da leitura e da escrita na
Educação Infantil.
7
INTRODUÇÃO
Na prática pedagógica de educadores da Educação Infantil, que
trabalham com crianças de cinco anos, um dos problemas enfrentados é, sem
dúvida, a dificuldade que determinados educandos apresentam na construção
do conhecimento. Enquanto alguns desses educandos assimilam com
facilidade e num curto espaço de tempo o conhecimento construído na sala de
aula, apresentando o desenvolvimento esperado no que se refere à leitura e a
escrita, outros, porém, apresentam dificuldades de aprendizagem dentro das
mesmas condições de ensino, considerando-se ambiente, material didático e
disponibilidade do educador.
Por falta de um conhecimento especializado que pudesse auxiliar na
elaboração de um diagnóstico mais preciso sobre o que dificulta o
desenvolvimento do educando na sala de aula, muitos educadores, diante
dessa situação, são levados a concluir, de forma precipitada, que esse
educando é “desinteressado”, “preguiçoso”. Essas conclusões são levadas aos
pais em forma de reclamações. Os pais, em sua maioria, são desprovidos de
um conhecimento capaz de compreender e ajudar os filhos a superarem essas
dificuldades. A solução encontrada por eles, muitas vezes, é a punição, o que
na realidade não contribui para o crescimento do educando, podendo inclusive
atrapalhar o desenvolvimento dessa criança no processo de ensinoaprendizagem.
No final de cada ano letivo pode-se perceber na avaliação dos
educadores das classes de cinco anos da Educação Infantil uma situação
paradoxal: De um lado, o otimismo por aquelas crianças que conseguiram um
desempenho dentro do que era esperado e às vezes, um pouco além do
esperado referente à aquisição da leitura e na produção de texto. Por outro
lado, angústia pelo fracasso das crianças que apresentam dificuldades para
assimilação do conhecimento no processo de ensino aprendizagem, e ainda,
por se sentirem incapazes de solucionar o problema.
8
As crianças que saem da Educação Infantil com problema de
aprendizagem na leitura e na escrita, provavelmente poderão continuar com
esse problema nas séries iniciais do ensino fundamental. Umas podem
evidentemente superar as dificuldades e concluir com qualidade o ensino
fundamental. Outras não, e isso pode contribuir para a evasão escolar.
As dificuldades apresentadas pelos educandos da Educação Infantil são
de naturezas diversas. Para se fazer um diagnóstico preciso para identificar o
motivo da dificuldade que leva a criança a ser rotulada de “desinteressada”,
“preguiçosa”, se faz necessária a presença de um profissional especializado na
escola. Esse profissional é o psicopedagogo. É papel do psicopedagogo
acompanhar todo o processo de aprendizagem na escola e identificar os
problemas de fracasso escolar e incentivar o educando rumo ao sucesso da
aquisição da leitura e da escrita na Educação Infantil.
Diante dessa situação procurou-se refletir à luz da teoria, alguns
pressupostos, que pudessem contribuir na melhoria da prática docente,
considerando aqueles educandos menos estimulados, procurando identificar as
causas dessa falta de estímulo e as dificuldades que eles sentem para
aquisição da leitura e da escrita.
O presente trabalho está dividido em três capítulos: O primeiro capítulo
discorre sobre as concepções de leitura e escrita; O segundo refere-se à
criança de cinco anos e o ambiente familiar; e o terceiro capítulo trata do
ensino da leitura e da escrita nas classes de cinco anos da Educação Infantil.
9
SUMÁRIO
Introdução .......................................................................................................... 7
Capítulo I: concepções de e aquisição de leitura e escrita............................... 10
Concepções de leitura ..................................................................................... 10
Concepções de escrita .................................................................................... 16
Linguagem oral e linguagem escrita ................................................................ 22
Capítulo II: A criança e o ambiente familiar ..................................................... 24
A influência da família no desempenho escolar .............................................. 24
Educação formal e educação informal ............................................................. 28
A criança e a classe social da família .............................................................. 30
Capítulo III: o processo de aquisição da Leitura e da Escrita na Educação
Infantil – Classes de cinco anos ...................................................................... 37
O papel da escola ............................................................................................ 37
Sobre as dificuldades da criança na aquisição da leitura e da escrita............. 39
O papel do professor ....................................................................................... 40
Níveis de construção da escrita ...................................................................... 45
Seleção de conteúdos ..................................................................................... 48
A contribuição do psicopedagogo no contexto da aprendizagem na Educação
Infantil .............................................................................................................. 50
Considerações finais ....................................................................................... 52
Referências bibliográficas ............................................................................... 53
10
CONCEPÇÕES E AQUISIÇÃO DE LEITURA E ESCRITA
CONCEPÇÕES DE LEITURA
A leitura é o exercício constante, reflexivo e crítico da capacidade que
nos é inerente de ouvir e entender e que nos diz a realidade que nos cerca e
da qual somos parte integrante. A leitura favorece a remoção das barreiras
educacionais, concedendo oportunidades mais justas no que se refere a
possibilidade de conquistas pessoais de um indivíduo.
A leitura é um meio de aquisição de conhecimento. Professores, pais e
alunos devem ser conscientes da importância da leitura e da escrita para a vida
individual, social e cultural de um povo. Os benefícios proporcionados pela
leitura e pela escrita devem estar ao alcance de todos, principalmente, os que
se referem a formação de uma atitude crítica diante da sociedade.
Sobre a leitura e a escrita encontra-se nos Parâmetros Curriculares
Nacionais – PCN’s, volume 2(Língua Portuguesa, 1997: 1ª a 4ª séries: 52) o
seguinte:
Apesar de apresentadas como dois sub-blocos,
é necessário que se compreenda
que
a
leitura
e
escrita
são
práticas
complementares, fortemente relacionadas, que
se modificam mutuamente no processo de
letramento –
a escrita transforma a fala (a
constituição da “fala letrada”) e a fala influencia
a escrita ( o aparecimento de “traços de
oralidade” nos textos escritos). São práticas
que
permitem
ao
aluno
construir
seu
conhecimento sobre diferentes gêneros, sobre
os procedimentos mais adequados para lê-los
e escrevê-los e sobre as circunstâncias de uso
da escrita.
11
A compreensão da leitura como prática para a construção do
conhecimento da criança não deve estar desvinculada da compreensão da
escrita, na construção do conhecimento na sala de aula. Essas modalidades,
como se verifica nos PCN’s, são complementares. O ensino de uma dessas
modalidades, reforça o ensino da outra, na prática docente. Isso não implica,
necessariamente que a criança que lê bem produza bons textos. Porém, a
criança que adquiriu o hábito de ler é detentora de elementos que podem
contribuir na produção textual, principalmente elementos lingüísticos.
Ao nascer, a criança passa a fazer parte de um mundo em que a leitura
e a escrita se fazem presentes. Estão inseridas no ambiente familiar e no meio
social de diferentes formas como fotografias, imagens, objetos móveis, rótulos
de alimentos e de remédios, brinquedos, aparelhos eletrônicos, além de outros.
No meio social, pode-se observar como elementos portadores de leitura e de
escrita, a arborização de uma rua, as diferentes cores das casas e dos carros,
placas, as famílias vizinhas, etc. A criança, antes de freqüentar a escola, está
em contato cotidianamente com os mais diversos tipos textuais.
Sobre a leitura de mundo, Paulo Freire(1892 : 22)
A leitura do mundo precede sempre a leitura da
palavra e a leitura desta implica a continuidade
daquela. Esse movimento do mundo à palavra
e da palavra ao mundo está sempre presente.
Movido mesmo através da leitura que dele
fazemos. De alguma maneira, porém, podemos
ir mais longe e dizer que a leitura da palavra
não é apenas precedida pelo mundo, mas por
uma certa forma de “escrevê-lo” ou de “
reescrevê-lo”, quer dizer, de transformá-lo
através de nossa prática consciente.
Percebe-se no que diz Paulo Freire que o movimento do mundo à
palavra e da palavra ao mundo implica na evolução do nível de leitura, partindo
12
de uma leitura inicial, fundamentada nos sentidos, para uma leitura
intelectualizada e crítica do mundo com possibilidade de transformá-lo.
Martins (1989 : 31) sintetiza as diversas concepções de leitura, em duas
caracterizações:
1) Como uma decodificação mecânica de signos
lingüísticos,
por
estabelecido
a
meio
partir
de
do
aprendizado
condicionamento
estímulo-resposta ( perspectiva behavoistaakinneriana);
2) Como
um
abrangente,
processo
cuja
componentes
de
compreensão
dinâmica
sensoriais,
envolve
emocionais,
intelectuais, fisiológicos, neurológicos, bem
como
culturais,
econômicos
e
políticos
(perspectiva cognitivo-sociológica).
A leitura sem compreensão baseada apenas na decodificação dos
signos lingüísticos é uma leitura improdutiva. Quando a criança apenas
decodifica os signos lingüísticos não se pode afirmar que ela já domina a
leitura. Saber ler implica em compreender o que está escrito. A leitura com
compreensão eleva a capacidade da criança de aprender como um todo. A
leitura é um meio eficaz para aquisição de outros conhecimentos.
Sobre o ato de ler Martins (1989 : 40) propõe três níveis de leitura:
leitura sensorial, leitura emocional e leitura racional. Sobre a leitura sensorial
diz que:
A visão, o tato, a audição, o olfato e o gosto
podem ser apontados como os referenciais
mais elementares do ato de ler. A relação
inicial da criança com o mundo ilustra a leitura
sensorial.
De
certa
forma,
caracteriza
a
descoberta do universo adulto no qual todos
nós
precisamos
aprender
a
viver
para
sobreviver. Não se trata de uma leitura
elaborada; é antes uma resposta imediata às
13
exigências
e
ofertas
apresenta;
relaciona-se
que
esse
com
as
mundo
primeiras
revelações. Talvez, por isso mesmo marcantes.
Essa leitura sensorial começa, pois, muito cedo
e nos acompanha por toda vida. Não importa
se mais ou menos minuciosa e simultânea à
leitura emocional e racional.
De acordo com o que diz Martins, pode-se compreender que a leitura
utilizando os sentidos é a primeira leitura de mundo. A criança, logo ao nascer,
começa a relacionar-se com a outra realidade diferente da vida uterina: o
contato com a mãe, sente fome e sacia-se ao sugar o leite materno. Diverte-se
com os movimentos, com as cores, com o carinho das pessoas que estão mais
próximas e responde com choro ao contato com pessoas estranhas. Quando
começa a falar, vai articulando algumas frases soltas e consequentemente
evoluindo o seu nível vocabular. Antes de chegar a escola, a criança já é capaz
de relatar fatos que ela presencia em casa ou na rua, numa leitura encenada
que faz de tais fatos, num misto de leitura sensorial e leitura emocional. Essas
histórias ou relatos que a criança faz, sem minuiosidade, mas construídos na
essência, são na realidade, produções se texto orais.
A leitura emocional, comparada a uma leitura crítica é bastante
superficial, sem objetividade, leva o leitor ao imaginário, fazendo –o posicionarse como se fosse um integrante do texto , ora empolgado com as aventuras
que o texto pode apresentar; ora aborrecido com os percalços.
Sobre esse nível de leitura, diz Martins (1989 : 51 e 52):
Na leitura emocional emerge a empatia,
tendência de sentir o que se sentiria caso
estivéssemos na situação e circunstâncias
experimentadas por outro, isto é, na pele de
outra pessoa, ou mesmo um animal de um
objeto,
de
uma
Caracteriza-se,
personagem
pois,
um
de
ficção.
processo
de
participação afetiva numa realidade alheia, fora
de
nós.
Implica
necessariamente
14
disponibilidade, ou seja, predisposição para
aceitar o que vem do mundo exterior, mesmo
se depois venhamos a rechaçá-lo. A criança
tende a ter maior disponibilidade que o adulto
pelo simples fato de, em princípio, tudo lhe ser
novo e desconhecido e ela precisar conhecer o
mais possível a fim de aprender a conviver
nesse mundo.
A leitura emocional, sem dúvida, envolve a todos. O leitor se sente
vitorioso com o triunfo do protagonista, ou se decepciona com uma história que
não tem um final feliz. As narrativas são alvo de uma leitura emocional, nela a
possibilidade de envolver o leitor, quer seja adulto ou criança, nos
acontecimentos da vida de seus personagens. Na leitura de um romance, de
um conto, de uma fábula, o leitor é tomado por uma ansiedade para saber
como é o final da história, como esse ou aquele personagem conseguiu
superar os contratempos da história. A avaliação feita nesse tipo de leitura é,
dependendo do desfecho da história, ela é boa se os protagonistas
conquistaram seus objetivos, ou é ruim se ocorre o contrário.
Segundo Martins (1989 : 63) a leitura racional enfatiza o intelectualismo,
doutrina que afirma a preeminência e anterioridade dos fenômenos intelectuais
sobre os sentimentos e a vontade.
Trata-se, portanto, se nível de leitura elevado com uma visão crítica de
mundo por parte do leitor que conta com a capacidade de fazer inferências no
texto e atribuir-lhe significado.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s, Língua Portuguesa, 1997
: 53) diz que:
A leitura é um processo no qual o leitor realiza
um trabalho ativo de construção de significado
do texto, a partir dos seus objetivos, do seu
conhecimento sobre o assunto, sobre o autor,
de
tudo
o
que
sabe
sobre
a
língua:
características do gênero, do portador (livro,
revista, jornais), do sistema de escrita, etc. Não
15
se trata simplesmente de extrair informação da
escrita decodificando-a letra por letra, palavra
por palavra. Trata-se de uma atividade que
implica, necessariamente, compreensão na
qual os sentidos começam a ser constituídos
antes da leitura propriamente dita.
Nessa perspectiva, o leitor não é apenas um decodificador de palavras
escritas, mas um agente ativo que busca na leitura a consecução de objetivos
pré-determinados. Esses objetivos nascem a partir do conhecimento prévio do
leitor e para serem alcançados é necessário que se faça a seleção do texto a
ser lido. Essa seleção permitirá ao leitor confrontar as suas idéias com as
idéias do autor. O confronto de idéias construirá o significado do texto. Pode-se
dizer com isso, que o leitor atribui significado ao texto, tornando-se, desta
maneira, um co-autor. O conteúdo é compreendido pelo leitor e no momento da
compreensão instala-se o processo interativo entre o autor e o leitor. O texto é
a ponte dessa interatividade. Como se vê, o texto não é um produto acabado.
Os espaços deixados pelo autor, são preenchidos pelo leitor, que ao
preenchê-los faz as críticas ou inferências cabíveis.
Para Silva(1997 : 14) uma das funções principais da leitura no Brasil é a
de garantir ao cidadão a capacidade de pensar por conta própria.
É evidente que quando se fala que é função da leitura proporcionar ao
cidadão leitor “pensar por conta própria” está se referindo a uma prática de
leitura com criticidade, pois só a partir de uma leitura crítica, é que o leitor pode
formular o seu próprio pensamento e ter suas próprias idéias. A leitura apenas
decodificada ou baseada na emoção, sem o confronto de idéias entre leitor e
autor não possibilita o pensamento próprio. Dessa forma, pode-se perceber
que a leitura é o principal meio de aquisição de conhecimento e da criticidade.
Silva (1997 : 46) afirma:
(...) o processo de leitura apresenta-se como
uma atividade que possibilita a participação do
homem na vida em sociedade, em termos de
compreensão do presente e passado e em
16
termos de possibilidade de transformação
cultural futura.
Frente a isso, pode-se pressupor que a leitura tem fundamental
importância para a construção da vida em sociedade e a escola tem um papel
importante na formação de um leitor competente. Compreende-se como leitor
competente aquele que é capaz de escolher dentre os vários textos o que
satisfaz a sua necessidade de conhecimento.
Sobre a formação de leitor competente consta dos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN’s Língua Portuguesa: 1997. 1ª a 4ª séries: 54) o
seguinte:
Formar um leitor competente supõe formar
alguém que compreenda o que lê; que possa
aprender a ler também o que não está escrito
identificando
elementos
implícitos;
que
estabeleça relações entre o texto que lê e os
outros textos já lidos; que saiba que vários
sentidos podem ser atribuídos a um texto; que
consiga justificar e validar a sua leitura a partir
da localização de elementos discursivos.
Como foi dito, a leitura sem compreensão é uma leitura improdutiva. Ler
com competência implica dar significado ao texto, compreendendo o que não
está escrito mas pode ser inferido. O leitor competente tem a capacidade se
fazer análise comparativa entre os textos lidos.
CONCEPÇÕES DE ESCRITA
A escrita, nas sociedades urbanas, está exposta por todos os cantos:
são outdoors, panfletos, letreiros, bibliotecas, bancas de revista, etc. A todo
instante o cidadão urbano está em contato com o mundo letrado.
Com relação à escrita, Kato (1996 : 41) afirma:
A escrita desenvolveu-se de um simbolismo de
segunda ordem. A meta, porém, não foi
atingida, pois não há isomorfia perfeita entre os
sons da fala e os símbolos do sistema
17
ortográfico que resultou dessa evolução, isto é,
o alfabeto. Apesar do sistema alfabético, e por
causa dessa relação parcialmente arbitrária,
línguas como o português e o inglês têm
formas
escritas
que
favorecem
a
leitura
ideográfica.
Certamente essa é uma das razões que levam a criança da Educação
Infantil a sentir dificuldades na aquisição da leitura e da escrita. Ao pronunciar a
palavra CASA, a criança vai perceber que os sons emitidos são diferentes das
representações gráficas. C=/K/ e S=/Z/. Já na palavra SACI, essas mesmas
representações gráficas, ou seja, S e C representam outros sons, diferentes
daqueles que representam a palavra CASA. Enquanto não compreender essa
diferença entre o som e o símbolo gráfico que o representa, e ainda, que um
mesmo som pode ser representado por um mesmo sinal gráfico, a criança terá
imensa dificuldade para desenvolver a leitura.
Ferreiro (1990 : 12/13) assim se reporta com relação à escrita:
A invenção da escrita foi um processo
histórico de construção de um sistema de
representação,
não
um
processo
de
codificação. Uma vez construído, poder-se-ia
pensar que o sistema de representação é
aprendido pelos novos usuários como um
sistema de codificação. Entretanto, não é
assim. No caso dos dois sistemas envolvidos
no início da escolarização (o sistema de
representação dos números e o sistema de
representação da linguagem) as dificuldades
que as crianças enfrentam são dificuldades
conceituais semelhantes às da construção do
sistema e por isso pode-se dizer em ambos os
casos que a criança reinventa esses sistemas.
Não se trata de que as crianças reinventem as
letras nem os números mas que, para poderem
se servir desses elementos como elementos de
18
um sistema, devem compreender seu processo
de construção e suas regras de produção.
Reinventar o sistema no dizer de Emília Ferreiro significa compreender a
construção desses sistemas. Com relação ao sistema de representação da
linguagem, a sua reinvenção ou compreensão do processo de construção por
parte do educando, leva esse educando a aquisição da leitura e da capacidade
de produzir textos coerentes dentro do processo de ensino aprendizagem.
Ferreiro(1990 : 43) diz que:
A escrita não é um produto escolar, mas sim
um objeto cultural resultado do esforço coletivo
da humanidade. Como objeto cultural, a escrita
cumpre diversas funções sociais e tem meios
concretos de existência (especialmente nas
concentrações urbanas). O escrito aparece,
para a criança, como objeto com propriedades
específicas e como suporte de ações e
intercâmbios
sociais.
Existem
inúmeras
amostras de inscrições nos mais variados
contextos (letreiros, embalagens, tevê, roupas,
periódicos, etc.). os adultos fazem anotações,
lêem
cartas,
comentam
os
periódicos,
procuram um número de telefone, etc. Isto é,
produzem e interpretam a escrita nos mais
variados contextos.
A escrita é um elemento importante no processo de comunicação na
sociedade. O adulto e a criança encontram-se permanentemente envolvidos
pela escrita na sociedade em que vivem. Na zona urbana, as codificações
estão por todos os lados: nos nomes das ruas, nas placas, nos “outdoors”, nos
painéis eletrônicos, nas lojas, bancas de revistas, nos ônibus coletivos, etc. A
todo instante, o indivíduo é estimulado a praticar a leitura, desde pequenas
informações como o nome de uma rua ou o número de uma casa, o destino de
um ônibus coletivo, até leituras mais prolongadas como periódicos e livros.
Portanto, a escrita é também uma forma de interação social.
19
Com base em uma pesquisa realizada em cidades da Europa e da
América, Ferreiro (1990 : 44) afirma:
(...) existe um processo de aquisição de
linguagem escrita que precede e excede os
limites escolares. Precede-os na origem; e os
excede em natureza, ao diferir de maneira
notável do que tem sido considerado até agora
como o caminho “normal” da aprendizagem (e,
portanto, do ensino).
(...) Pode-se estabelecer uma progressão
regular nos problemas que elas (crianças)
enfrentam e nas soluções que ensaiam para
descobrir a natureza da escrita. A ordem de
progressão
de
efetivamente
condutas
um
ritmo
não
impõe
determinado
na
evolução. Aqui, como em outros campos do
desenvolvimento
grandes
cognitivo,
diferenças
encontramos
individuais:
algumas
crianças chegam a descobrir os princípios
fundamentais do sistema antes de iniciarem a
escola, ao passo que outras, estão longe de
conseguir fazê-lo.
A aprendizagem é um processo que se inicia muito cedo, antes mesmo
da vida escolar. As crianças que vivem em diferentes contextos da sociedade
têm o mesmo potencial e a mesma capacidade para a aprendizagem, por que,
então, ao chegarem à escola, algumas dessas crianças se desenvolvem mais
rapidamente e outras não tem o mesmo desempenho? Por que, por exemplo, a
aquisição da leitura e da escrita por parte de algumas crianças ocorre com
facilidade e outras sentem dificuldades e desenvolvem essa habilidade com
mais lentidão?
Ao ingressarem na escola, crianças que convivem em contextos
diferenciados possuem os mesmos potenciais, porém a quantidade de
informações e as experiências vivenciadas em seus diferentes meios são
fatores que podem influenciar diretamente no desenvolvimento dessas
20
crianças. Uma criança que nasce num ambiente letrado, que se sente
diariamente estimulada a manusear um livro, uma revista, ou rabiscar papéis,
essa criança certamente terá um desempenho melhor que aquele que não
dispõe de um meio favorável e estimulador da leitura e da escrita. O potencial é
o mesmo, porém, o desempenho é mais lento. É importante lembrar que cada
criança tem o seu próprio ritmo de aprendizagem.
Em Ferreiro (1999 : 27) encontra-se:
A aprendizagem da leitura entendida como o
questionamento a respeito da natureza, função
e valor desse objeto cultural e que é a escrita,
inicia-se muito antes que a escola imagina,
transcorrendo insuspeitados caminhos.
Que além dos métodos, dos manuais, dos
recursos didáticos existe num sujeito que busca
a aquisição de conhecimento, que se propõe
problemas e trata de solucioná-los seguindo a
sua própria metodologia.
No que diz Ferreiro, pode-se observar que a escrita como toda
representação, baseia-se numa construção mental que cria suas próprias
regras, que se constitui por uma sequência de níveis de complexidade da
compreensão que o sujeito vivencia em relação à leitura e a escrita. A
construção do objeto conceitual “ler e escrever”, faz-se portanto, durante algum
tempo através de um processo progressivo de elaboração pessoal.
Com base na concepção de que o conhecimento é algo a ser construído,
o aprendiz é o sujeito de aprendizagem, isto é, ele próprio constrói o seu
conhecimento. Nesse processo de construção, o aprendiz se apropria da leitura
e da escrita. Nesse contexto o professor é visto como um mediador, alguém
que vai criar situações de aprendizagem.
Sobre a aquisição da língua escrita, Ferreiro (1999 : 32) diz:
(...) isso não significa que o processo de
aquisição da língua escrita seja natural e
espontâneo, que o professor se limita a ser um
expectador passivo, nem que seja suficiente
21
rodear a criança de livros para que aprenda
sozinha. É um processo difícil para a criança,
mas não mais difícil que outros processos de
aquisição de conhecimento. É um processo
que exige acesso a informação socialmente
veiculada, já que muitas das propriedades da
língua escrita só se pode descobrir através de
outros informantes e da participação em atos
sociais
onde
a
escrita
sirva
para
fins
específicos.
Diante do exposto, é importante ressaltar a importância do professor no
processo de construção do conhecimento. Não como alguém que ensina a
outro alguém que, de repente, vai aprender. Mas, como um facilitador do
processo de aprendizagem. Alguém que cria as possibilidades para que a
criança possa desenvolver suas potencialidades e construir seu próprio
conhecimento, seja no que se refere à aquisição da leitura e da escrita, ou de
outros conhecimentos quaisquer.
O processo de aquisição da língua escrita, não depende somente das
habilidades de natureza motora, mas, passa por questões conceituais e
principalmente sociais. A apropriação da linguagem escrita leva o indivíduo a
inserir-se socialmente, amplia suas capacidades intelectuais e propicia uma
participação ativa na sociedade com possibilidade de contribuir para
transformá-la. Para a criança, a linguagem escrita deve ter um significado, para
que ele possa utilizá-la em suas necessidades.
Em Vygotsky (apud Lúria, 2003 : 143) verifica-se que:
O momento em que uma criança começa a
escrever seus primeiros exercícios escolares
em seu caderno de anotações, não é, na
realidade
o
primeiro
estágio
de
desenvolvimento da escrita. As origens deste
processo remonta a muito antes, ainda na préhistória
do
desenvolvimento
das
formas
superiores do comportamento infantil; podemos
até mesmo dizer que quando uma criança entra
22
na escola, ela já adquiriu um patrimônio de
habilidades e destrezas que a habituará a
aprender
a
escrever
em
um
tempo
relativamente curto.
Neste contexto, pode-se perceber que o desenvolvimento da escrita
passa por etapas sucessivas e sua aprendizagem emerge da interação entre
fatores internos e externos. Toda e qualquer função psíquica superior, inclusive
a escrita, se desenvolve impulsionada por fatores culturais e biológicos. A
aprendizagem não ocorre somente na escola, mas também nas interações que
a criança vivencia desde o seu nascimento.
LINGUAGEM ORAL E LINGUAGEM ESCRITA
Em Vygotsky (1934 : 324) apud Baquero; (1998 : 85), sobre a aquisição
da língua escrita encontra-se o seguinte:
(...) a linguagem escrita, na qual o pensamento
se expressa através dos significados formais
das palavras, dos quais depende muito mais
que a linguagem oral. Na linguagem escrita o
interlocutor está ausente. Por isso, deve ser
totalmente explícita e a diferenciação sintática
é máxima (...). Na linguagem escrita os
interlocutores
encontram-se
em
situações
diferentes, o que exclui a possibilidade de
compartilhar
um
mesmo
sujeito
em
seu
pensamento. Por isso a linguagem escrita
constitui, em comparação com a linguagem
oral,
uma
forma
de
linguagem
mais
desenvolvida e sintaticamente mais complexa;
para expressar a mesma idéia requer muito
mais palavras do que na linguagem oral.
Para Vygostky a linguagem escrita é bastante complexa e diferente da
linguagem oral. Na linguagem escrita as palavras são interpretadas e seus
significados dependem do contexto. Uma palavra tem inúmeros significados,
porém, o contexto dá indicativo de como essa palavra pode ser compreendida,
isto é, em que sentido ela foi empregada. O texto, na linguagem escrita, deve
23
ser objetivo e bastante claro, para que o interlocutor possa compreender, uma
vez que ele está ausente no momento de produção textual e não tem sequer
contato com o autor. A relação autor X leitor se dá por intermediação do próprio
texto. Trata-se de uma linguagem intelectualizada, bem elaborada seguindo os
padrões da norma culta. A linguagem escrita é posterior a linguagem oral.
Já a linguagem oral é simples e fácil de compreensão. Usa-se menos
palavras para se transmitir um pensamento, uma vez que o interlocutor está
presente e interagindo diretamente com a pessoa que fala. Os gestos, os
movimentos e as expressões corporais e faciais, o tom de voz mais agudo ou
um pouco mais grave, as imitações sonoras onomatopaicas são elementos que
ajudam na transmissão e compreensão de uma idéia entre os interlocutores.
Concluindo, pode-se dizer que a leitura e a escrita são elementos que se
complementam. A aprendizagem da leitura e da escrita não começa na escola.
Ali ela é construída e desenvolvida com as situações criadas pelo
educador, tendo a criança como sujeito ativo desse processo construtivo para o
domínio da leitura e da linguagem.
24
A CRIANÇA E O AMBIENTE FAMILIAR
A INFLUÊNCIA DA FAMÍLIA NO DESEMPENHO ESCOLAR
A família é o primeiro grupo social que a criança participa. Desde o
nascimento ela tem um convívio diário com o ambiente familiar. Recebe afeto,
brinca, aprende a andar, a falar observando os costumes e as tradições
familiares praticadas no lar.
É de suma importância para o desenvolvimento cognitivo da criança o
estímulo que ela recebe dos pais. Esse estímulo poderá ter influência no
desenvolvimento pessoal e no sucesso escolar.
Do nascer até o momento de entrar na escola, a criança está em
constante situação de aprendizagem. Entra em contato com o mundo da leitura
e da escrita em maior ou menor intensidade. A valorização dada ao
conhecimento, ao mundo letrado, e o incentivo que a criança recebe de suas
famílias ajudarão substancialmente no sucesso escolar. Como foi dito, todas as
crianças chegam a escola com o mesmo potencial, porém algumas fazem a
diferença no processo de construção do conhecimento. Quando mais cedo, a
criança é estimulada a manusear livros, fazer rabiscos, etc. Mais facilmente ela
desenvolve a prática da leitura e da escrita.
Sabe-se porém que grande parte das famílias brasileiras sobretudo
aquelas que vivem nas periferias, têm um nível de instrução muito baixo.
Muitos pais e mães não tiveram a oportunidade de estudar, sendo portanto
“desescolarizados”. No conjunto, pelo fato de irem até a escola e matricularem
os seus filhos, essas famílias demonstram que valorizam o conhecimento.
Porém, em casa, o ambiente não é favorável ao pré-conhecimento do mundo
letrado. Muitas vezes a situação econômica dessas famílias não permite a
aquisição de livros, revistas, periódicos, etc., para propiciar à criança um
ambiente de leitura. Como essas pessoas tem pouca escolaridade, ou na
realidade, não tem escolaridade alguma, a prática da leitura e da escrita é
quase ou totalmente inexistente.
25
Neste contexto, as conversas entre os familiares certamente não será
sobre a indicação de um bom livro para ler, ou sobre a valorização do
conhecimento. A criança não sendo estimulada pela família, ou seja, não vendo
pai ou mãe em contato com a leitura, os livros são vistos como um objeto
qualquer e que são “coisas” da escola. E todo um potencial que essa criança
tem não vai sendo desenvolvido. Ao entrar na escola, ela terá inicialmente
muitas dificuldades e o seu desempenho vai depender muito do educador e do
ambiente escolar. É importante que o educador procure conhecer a história
dessa criança e compreender com afeto a situação dela. E o ambiente escolar
deve ser acolhedor e atrativo.
Sobre a responsabilidade familiar na educação da criança, Fernandes
(1986 : XI-trad) assim se refere:
(...) a criança é cuidada pelo conjunto da
comunidade
familiar
que
ajuda
na
aprendizagem da vida. Nesta família do tipo
tradicional, a criança imita os gestos que vê
fazer, aprende a dançar, ouve ditados, contos,
provérbios e prescrição: aprende assim tudo o
que compõe as concepções do clã. Participa
das diversas tarefas da vida quotidiana, como
também de festas e do desenrolar dos
diferentes rituais.
Como diz Fernandes, a criança aprende interagindo com o meio familiar.
Nessa interação, observa a cultura do clã transmitida através das ações que os
integrantes do grupo desenvolvem no dia-a-dia. As festas comemorativas
realizadas são momentos de participação ativa da criança executando tarefas
de acordo com suas possibilidades. Assim, participando do quotidiano da vida
familiar, ela vai construindo um conhecimento sobre os costumes e as
tradições do seu povo.
Porém, esse tipo de família tradicional vai perdendo espaço nas
sociedades urbanas atuais, dando lugar a um modelo de família denominado
nuclear, composta apenas por pai, mãe e filhos com número reduzido.
26
A esse respeito, Fernandes acrescenta:
(...) mas em virtude da urbanização, do
trabalho das mulheres, da influência de certos
modos de vida, esse tipo de família, dita
“ampliada” tende a desaparecer, dando lugar à
família nuclear composta somente de pais e
filhos.
Deste
modo
a
sociedade
deve
encarregar-se da saúde, da educação da
estimulação da criança de idade pré-escolar,
preocupando-se
com
tarefas
que
eram
antigamente da família ampliada e que a
família nuclear não pode assumir.
A partir do que foi dito por Fernandes, pode-se dizer que a escola além
de desenvolver o seu papel no processo de ensino aprendizagem da criança
assume também a responsabilidade que era da própria família. Há de se
verificar também que esta falta de responsabilidade da família na educação dos
filhos antes da entrada destes na escola, além das questões apresentadas por
Fernandes, outras como o “desajuste” familiar, inclusive de famílias nucleares
com separação dos pais, e, relativamente à ignorância e imaturidade dos
responsáveis pela criança, são fatores que prejudicam o desenvolvimento
desta na escola.
Fernandes (1986 : 6/7 – trad.) sobre o ambiente familiar da criança, diz:
A criança pode sofrer durante sua evolução,
não devido a sua hereditariedade, mas pelo
fato do seu ambiente não ser estimulador;
educada numa atmosfera melhor, ela não terá
nenhuma cicatriz devido à mediocridade das
condições ligadas ao início da vida. Os
educadores que cuidam de crianças devem
estar
aptos
perturbações,
a
detectar
resultante
estes
de
tipos
um
de
meio
desfavorável, sobretudo nos casos de mães
pouco capazes e pouco disponíveis a fim de
aconselhá-los e orientá-los.
27
É importante destacar que diante do insucesso da criança na escola,
mães e educadores ao invés de se aproximarem e juntos buscarem uma
solução para o problema , muitas vezes preferem acusar-se mutuamente, uma
parte transferindo a responsabilidade para a outra parte.
Vale destacar, nessas condições, a competência do educador para
detectar as dificuldades que a criança tem fruto de ambiente familiar que
deixou de oferecer a ela as condições necessárias para o desenvolvimento
cognitivo. Isso não quer dizer, que a família tenha agido por pura
irresponsabilidade, mas, em função das condições em que vive na sociedade.
Pais com pouca ou nenhuma instrução e mães tendo que se ausentar do lar
para ocupar seu espaço no mundo do trabalho.
No Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (Introdução,
1998 : 13) encontram-se os princípios básicos para o exercício da cidadania
das crianças de zero a 6 anos.
•
O respeito à dignidade e aos direitos das
crianças, consideradas nas suas diferenças
individuais,
sociais,
econômicas,
culturais,
étnicas, religiosas, etc;
•
O direito das crianças a brincar, como forma
particular de expressão, pensamento, interação
e comunicação infantil;
•
O acesso aos bens socioculturais disponíveis
ampliando o desenvolvimento das capacidades
relativas à expressão, à comunicação, à
interação social, ao pensamento, à ética e à
estética.
•
A socialização das crianças por meio de sua
participação e inserção nas mais diversificadas
práticas sociais, sem discriminação de espécie
alguma;
•
O
atendimento
associados
à
aos
cuidados
sobrevivência
desenvolvimento de sua identidade.
essenciais
e
ao
28
A criança é um ser em desenvolvimento, detentora de uma
riqueza enorme de possibilidades e aberta a contribuições que possam
desenvolver as suas potencialidades. Cabe à escola e ao educador
desenvolver uma pedagogia centrada no educando, levando em
consideração as suas condições sociais. Os pais são os primeiros
educadores, muitas vezes, sem uma formação adequada e sem a
consciência de responsabilidade do que é educar um filho, esses pais ou
deixam o tempo passar esperando que a escola assuma sozinha esse
papel, ou impõem uma educação deformada e deformadora nos
primeiros anos de vida da criança. Ao chegar a escola essa criança
sentirá um choque: a educação de casa é diferente da educação da
escola. Em casa tudo é permitido, a escola é cheia de regras de
convivência social. Diante dessa situação, a criança pode rejeitar a
escola ou se sentir rejeitada por ela, e, certamente terá dificuldade na
aprendizagem.
EDUCAÇÃO FORMAL E EDUCAÇÃO INFORMAL
Para Chalita (2004 : 17/18).
Não se experimentou para a educação informal
nenhuma célula social melhor do que a família.
É nela que se forma o caráter. Qualquer projeto
educacional sério depende da participação
familiar: em alguns momentos, apenas do
incentivo; em outros, de uma participação
efetiva no aprendizado, ao pesquisar, ao
discutir, ao valorizar a preocupação que o filho
traz da escola. Por melhor que seja uma
escola, por mais bem preparados que estejam
seus professores, nunca vai suprir a carência
deixada por uma família ausente. Pai, mãe, avó
ou
avô,
tios
quem
quer
que
tenha
responsabilidade pela educação da criança
deve dela participar efetivamente sob pena de
a escola não conseguir atingir seu objetivo.
29
Pode-se observar em Chalita uma divisão da educação da criança
em informal e formal. A educação informal a criança recebe do meio em
que vive e o autor destaca a família como a principal instituição
formadora da criança. A educação formal, não mencionada pelo autor,
porém é subentendida como aquela buscada na escola. Evidentemente
que essas duas modalidades de educação são complementares: a
educação escolar depende da informal desenvolvida pela família. A
criança que recebe uma boa educação familiar traduz na escola em
valorização, respeito, responsabilidade, participação e reconhece seus
limites no convívio social na instituição. A educação informal não termina
com o início da educação escolar. Trata-se de uma educação
permanente.
A
criança
vai
crescendo
e
se
desenvolvendo
e
consequentemente passa a participar de outros grupos sociais além da
família. Aprende novos costumes e novas regras de convivência. Esse
aprendizado continua por toda vida.
Em relação a educação escolar ou formal é muito importante a
participação efetiva das famílias na formação da criança. A família deve
auxiliar no trabalho desenvolvido pela escola. Cabe a família
desenvolver o seu papel incentivando e valorizando o educando,
ajudando nos trabalhos de pesquisas e atividades diversas propostas
pela escola. Cada um: escola, professor e família desenvolvendo bem
aquilo que lhe é de responsabilidade, certamente o educando sentir-se-á
motivado para desenvolver suas habilidades e ter um bom desempenho
na escola.
É sabido que na sociedade atual, a instituição família passa por
situação de desestabilidade: pais separados, mães solteiras. Prevendo
essa situação, Chalita amplia o conceito de família “nuclear” e inclui
avós, tios ou qualquer pessoa que cuida da criança como responsável
pela educação desta.
30
Como diz Chalita (2004 : 20), a família tem responsabilidade de
formar o caráter, de educar para os desafios da vida, de perpetuar
valores éticos e morais.
O comportamento dos pais é o modelo que o filho segue, se os
pais tiveram uma boa formação moral e ética, os valores adquiridos por
eles, são vividos na prática, no dia-a-dia do lar. O filho vai se
apropriando desses valores vivenciados, aprendendo com o exemplo de
vida dos pais, e assim vai se formando o seu caráter, a sua
personalidade.
A criança e a classe social da família
A respeito da criança, Chalita (2004 : 25) diz:
A criança, a infância, os primeiros gracejos
comemorados
pela
família
ansiosa.
É
o
primeiro neto ou o primeiro filho, ou o caçula,
não importa. (...) o amparo das pessoas
queridas e o carinho são essenciais para o
desenvolvimento saudável desse novo ser que
veio ao mundo. Pena que isso seja privilégio de
alguns. A grande maioria se encontrará à
margem, são os frutos do relento, da pobreza,
da miséria. É o oitavo ou o nono filho, de quem
não ouviu falar em métodos contraceptivos, de
quem nem sabe o que está fazendo. E aí surge
um novo ser sem o devido respeito, sem a
necessária festa de quem veio para ficar.
Destaca-se no que diz Chalita a importância a afetividade para o
desenvolvimento cognitivo, físico e social, ou seja, o desenvolvimento
integral da criança.
Dependendo do ambiente familiar, a criança poderá viver uma
situação paradoxal: poderá receber afeto, proteção, carinho no processo
de educação informal, ou, conviver num ambiente de risco que poderá
comprometer seu desenvolvimento integral.
31
A vida nas periferias com baixo nível socioeconômico, a
desintegração familiar são fatores que podem contribuir para um
desempenho ruim do educando na escola. Infelizmente, esse grupo
representa a maioria das famílias, afirma o autor.
Como foi dito, a criança vai crescendo e consequentemente vai
interagindo com outros grupos. Cabe à família fazer o papel de
mediadora entre a criança e a sociedade, possibilitando a socialização
dela, isto representa um fator essencial para o desenvolvimento
cognitivo infantil.
Assim, é necessário dar assistência e valorizar a criança para que
ela se sinta confiante e com capacidade de realizações.
Sobre o processo de alfabetização da criança, Chalita (2004 : 27)
assim se pronuncia:
A alfabetização tem de ser acompanhada pela
família. Os primeiros escritos, o incentivo à
leitura, os brinquedos pedagógicos. É melhor
dar à criança um jogo de habilidades do que
uma arma de plástico. É melhor um programa
educativo do que uma novela, desde que o pai
e a mãe assistam juntos. Não adianta trancar a
criança com a babá no quarto para ver canal
educativo enquanto papai e mamãe assistem à
novela. Vai parecer castigo.
Considerando que grande parte das famílias, sobretudo aquelas
de baixa renda, em função de um nível escolar relativamente baixo e a
leitura não ser uma prática constante desse público, no que se refere a
programas da televisão, sem dúvida, é a novela que prende mais a
atenção. E em torno das ações que giram as conversas em casa e com
a vizinhança. Não é à toa que as redes de televisão investem nesse tipo
de programa, pois a audiência é garantida. Própria ou imprópria para a
sua idade, a criança assiste a tudo junto com os pais. Nessas famílias,
praticamente, a televisão, através das novelas ditam as normas e impõe
os valores a serem observados.
32
Os programas educativos, praticamente, não tem audiência nas
periferias. O nível cultural e institucional das pessoas requer algo mais
fácil e mais direto para a compreensão. Isso ocorre também na música.
O tipo de música mais ouvido é aquele cuja letra não necessita de
um espaço maior para compreendê-la. Outro tipo de programa de
televisão com bastante audiência na periferia é o programa policial. Com
essa preferência, pode-se deduzir que a criança, na escolha de um
brinquedo, prefere a arma de plástico ao brinquedo educativo. Quanto
aos pais, a preferência na hora de comprar tal presente, não é diferente.
A escolha casa-se com a escolha do filho. Em situações como
esta, a criança não é incentivada a desenvolver satisfatoriamente a
cognição.
Coria-Sabrini (1986 : 53/54) diz sobre este assunto:
As crianças provenientes de ambientes pobres
não encaram a situação de teste como algo em
que devem se sair bem ou dar o melhor de si,
como as de classe média. Estas últimas são
geralmente mais motivadas para o sucesso e
mais persistentes na tarefa.
As crianças de classe média se desenvolvem em um ambiente
que encoraja a encontrar semelhanças e diferenças entre objetos, a
montar quebra-cabeças, a descobrir regras, etc., habilidades exigidas
em teste de inteligência.
As mães de classe média interagem mais com seus filhos e lhes
apresentam maior quantidade de desafios intelectuais.
Não se que aqui, evidentemente, generalizar, que a criança de
classe média é bem projetada para o futuro e a criança pobre sem
perspectiva alguma. Entende-se que o poder aquisitivo das famílias que
determina o tipo de classe a que elas pertencem, é apenas um dos
diversos fatores de influência na vida da criança. É evidente que a
família de classe média pode oferecer mais ao filho. Porém, quantidade
não significa necessariamente qualidade. Outros fatores importantes
33
para o desenvolvimento cognitivo e social da criança é o nível cultural e
a formação intelectual dos pais. Estes fatores podem estar presentes
nas famílias de baixa renda e, às vezes, ausentes em famílias de classe
média. Ausência por falta realmente de conhecimento, ou por falta de
valorização deste.
É importante ressaltar que para a criança se desenvolver
integralmente e possa ter um bom desempenho na escola é essencial a
participação dos pais independentemente da classe social deles. Essa
participação implica na proposição à criança de ambiente favorável ao
desenvolvimento biopsicossocial.
Ainda sobre a criança de família socialmente desfavorecida,
Fernandes (trad. 1983 : 35/36) diz:
Muitas crianças vivem em famílias de nível
sócio-econômico e cultural baixo, onde se fala
pouco, onde a estimulação é insuficiente e
onde o bebê é abandonado sozinho. A afeição
que lhe é dada, no entanto, pode ser calorosa:
mas, apesar disto, a criança assim educada se
desenvolverá de maneira distinta da maioria
das crianças, sua forma de inteligência é
diferente. Mais tarde, na escola, um exame
superficial
poderia
classificá-la
como
“inadaptada” ou “débil” e isto, freqüentemente,
é um erro.
Em situações como esta, percebe-se que a criança carece de um
complemento educativo, que a família, por suas próprias condições
sócio-econômicas não pôde oferecer. Neste caso, cabe à escola orientar
esses pais e estimular a criança para que ela possa desenvolver suas
capacidades cognitivas.
Quando as deficiências apresentadas pela criança têm como
causa a má alimentação, a atenção dispensada a ela deve ser ainda
maior. Sabe-se que a desnutrição infantil é danosa ao desenvolvimento
34
cognitivo. O educando tem uma aprendizagem mais lenta. Porém, a
família e escola podem ajudá-lo a superar essas dificuldades.
Com relação a criança de família incompleta e desunida, assim se
refere Fernandes (trad. 1983 : 36)
(...) a criança educada somente pela mãe (caso
mães solteiras, viúvas ou separadas) pode ter
dificuldade de estruturar sua personalidade. A
criança deve poder ter idéia do pai ausente
através da imagem que a mãe lhe dá ou pelo
contato direto com pessoas do sexo masculino.
(...) A situação também não é boa quando um
dos
pais
apresenta
problemas
de
personalidade ou mentais, ou quando a criança
sente as conseqüências dos desentendimentos
conjugais, aos quais ela é particularmente
sensível.
Toda criança gostaria de ter uma família tipo tradicional. Viver ao
lado do pai e da mãe, receber carinho dos avós, dos tios e brincar com
os primos. A realidade, porém, é outra. Muitas famílias, na sociedade
atual, fogem a esse padrão. Pais separados, ou em constante
desentendimento, mães solteiras compõem um quadro social que
precisa ser melhor assistido pelas instituições. A criança não tem
maturidade suficiente para entender a ausência do pai ou os
desentendimentos conjugais quando os pais vivem juntos. Estes
problemas comprometem o seu equilíbrio emocional.
Vygotsky (1998), apud Revista Criança, (junho/2002 : 13) diz:
O convívio social e cultural entre os pares da
mesma faixa etária e adultos do mesmo grupo
ao qual pertence a criança, contribui de forma
relevante para o seu desenvolvimento e
aprendizagem. Nesse espaço privilegiado, são
intencionalmente proporcionadas experiências
lúdicas e com múltiplas linguagens, criadas
culturalmente, que as subseqüentes e tapas da
educação não enfatizam em suas propostas
35
curriculares.
A
educação
infantil
deve
estabelecer um diálogo constante com a
família.
Na formação inicial da criança há toda uma preparação para as
etapas futuras, isto é, para aquilo que lhe acontecer quer na vida
escolar, que no meio social em que ela vai viver: família, comunidade e
grupos diversos. Daí a importância dessa formação por se tratar de algo
que é para toda a vida. O ambiente familiar, é, na realidade, esse
espaço privilegiado da criança. Pais conscientes e responsáveis
transmitem, intencionalmente, experiências vividas de acordo com a
cultura familiar e que são importantes para a aprendizagem dos filhos.
Essas experiências começam a ser repassadas logo nos primeiros anos
de vida. Os primeiros anos de vida são de suma importância para o
desenvolvimento cognitivo da criança, da sua afetividade e de suas
relações sociais.
Fernandes (Trad. 1983 : 5/6) sobre a importância dos primeiros
anos de vida, diz o seguinte:
Os primeiros anos de vida têm uma importância
capital: o desenvolvimento da inteligência, da
afetividade, das relações sociais é tão rápido
que sua realização determinará um grande
parte
as
perturbação
capacidades
poderá
futuras.
também,
se
Qualquer
não
for
detectada a tempo e tratada de maneira
adequada,
diminuir
consideravelmente
as
capacidades futuras.
Pode-se observar que a criança, nos primeiros anos de vida
precisa de cuidados especiais. Não basta a preocupação com a
alimentação, com a saúde, que também tem a sua importância, mas os
pais devem estar conscientes de que a criança, além de se desenvolver
fisicamente, precisa desenvolver-se cognitivamente. Carinho, afeto,
afago são tão necessários quanto a comida e o remédio. Proporcionar à
criança situações que possibilite o desenvolvimento do intelecto do filho
36
é função dos pais. Assim estão colaborando com o filho para que ele
não enfrente problemas na aquisição das capacidades futuras.
Cury (2003 : 33) afirma que bons pais corrigem falhas, pais
brilhantes ensinam os filhos a pensar. Entre corrigir erros e ensinar a
pensar existe uma enorme distância,
O erro é fácil de ser detectado. E o castigo para corrigi-lo é muito
fácil de aplicar. Ensinar a pensar, porém, é mais difícil. Ensinar a pensar
implica primeiro em saber pensar ou aprender a pensar. Pensar requer
compreensão, paciência, respeito e foge à velocidade imposta pela
sociedade atual, que busca o prático, o fácil.
Diante do exposto neste capítulo pode-se concluir que as
influências se dão ao longo de toda a nossa vida, fazendo-se na família,
na comunidade, em instituições sociais, culturais e religiosas, e, dentre
estas, especialmente na escola. À escola, cabe grande parte da
responsabilidade pela formação do indivíduo.
37
O PROCESSO DE AQUISIÇÃO DA LEITURA E DA
ESCRITA NA EDUCAÇÃO INFANTIL
O PAPEL DA ESCOLA
A pré-escola, hoje denominada de Educação Infantil, surgiu com
uma função específica de receber crianças pobres e órfãs, ou filhos de
operários, no período da Revolução Industrial.
Mais tarde, adquiriu a função de dar assistência à criança para suprir as
necessidades dela, relaxada pela família como saúde, alimentação,
lazer, hábitos higiênicos, uma espécie de creche.
Atualmente, a Educação Infantil tem uma função pedagógica definida.
Sobre essa função pedagógica, assim se referem Sérkoz e Martins
(1996 : 40) :
A verdadeira função da pré-escola, é esta em
que
é
priorizado
o
encaminhamento
da
formação de conceitos básicos trabalhados
através de conteúdos formais que explicitam a
prática social.
O objetivo maior aqui é o desenvolvimento das
funções superiores (abstração, generalização,
atenção
voluntária,
linguagem,
memória,
inferência), através do ensino efetivo de
conhecimentos
científicos
que
auxiliam
a
criança a compreender o mundo.
Este é o papel que tem a Educação Infantil no fazer pedagógico
considerando que a criança tem suas potencialidades e é capaz se
construir o seu conhecimento na educação formal.
Uma questão levantada é com relação à idade da criança. Qual seria a
idade apropriada da criança para ser-lhe proporcionadas situações de
aprendizagem de leitura e da escrita?
Ferreiro (1990 : 98) diz que as crianças:
38
Iniciam sua aprendizagem do sistema de
escrita nos mais variados contextos, porque a
escrita faz parte da paisagem urbana. As
crianças urbanas de cinco anos geralmente já
sabem distinguir – dentro do complexo conjunto
das representações gráficas presentes em seu
meio – o que é desenho e o que é “outra
coisa”. Chamar de “letras” ou “números” a esse
conjunto de formas que têm em comum o fato
de não serem desenho não é crucial nessa
idade. Mais importante é saber que essas
marcas são para uma atividade específica, que
é ler, e que elas resultam de outra atividade
também específica, que é escrever.
Desta forma, pode-se perceber que a criança em convívio com
um meio letrado, logo cedo, começa a compreender, de acordo com a
sua capacidade, essas diferenciações entre desenho e aquilo que não é
desenho. A partir daí, já inicia o processo de aprendizagem de leitura e
escrita. No ambiente familiar a criança é estimulada a falar. À medida
que ela vai usando a linguagem oral, vai acrescentando novas palavras,
e assim vai ampliando o seu vocabulário.
Os parâmetros curriculares nacionais, já na introdução destacam
a importância da linguagem oral e escrita no processo de aprendizagem:
A educação infantil, ao promover experiências
de aprendizagem de língua, por meio de um
trabalho com a linguagem oral e escrita, se
constitui em um dos espaços de ampliação das
capacidades de comunicação e expressão de
acesso ao mundo letrado pelas crianças. Essa
ampliação
será
relacionada
ao
desenvolvimento gradativo das capacidades
associadas às quatro competências lingüísticas
básicas: falar, escutar, ler e escrever.
Proporcionar à criança o acesso ao mundo das letras, é sem
dúvida, o papel do professor de Educação Infantil. A aquisição da leitura
39
e da escrita por parte do educando é de grande importância para o
sucesso dele nas séries iniciais do Ensino Fundamental.
Bamberger (1995 : 24/25), assim se pronuncia:
Leitura
em
unidade
de
pensamento.
No
processo de alfabetização, é preciso encontrar,
desde o princípio, meios para evitar a leitura
mecânica de sílabas e palavras e para
aumentar a compreensão. Quando a leitura
oral é bem feita, os grupos de palavras
armazenadas são percebidos em unidade de
pensamento num duplo impulso-visualmente e
através da pronúncia.
De fato, uma leitura fragmentada dificulta a compreensão do
próprio leitor e daqueles que ouvem a leitura. A criança que faz uma
leitura mecanizada fragmentando sílaba por sílaba, palavra por palavra,
no final de uma frase mais extensa terá dificuldade em compreendê-la.
Mais complicado ainda fica a compreensão de um parágrafo, enfim, do
texto como um todo.
SOBRE AS DIFICULDADES DA CRIANÇA NA AQUISIÇÃO
DA LEITURA E DA ESCRITA.
Sobre as dificuldades que a criança apresenta para a aquisição
do conhecimento no processo de ensino aprendizagem na Educação
Infantil, Machado (1986 : 22) afirma:
Uma das grandes dificuldades da educação
infantil consiste no fato de que as necessidades
da criança, de ordem psíquica, precedem
sobremaneira às de ordem motora. Enquanto
nos animais o instinto anima o movimento,
quase desde o nascimento, nas crianças o
homem deve auto construir-se para finalmente
auto
determinar-se.
A
criança
move-se
continuamente, mas a harmonização da ação
ao espírito só pouco a pouco se processará.
40
Como foi dito, a criança é um ser em desenvolvimento e aberta a
contribuições
que
possam
desenvolver
as
suas
potencialidades.
As
dificuldades que ela apresenta no processo de aquisição do conhecimento e
especificamente do que tratamos aqui, a leitura e a escrita, vêm em muitos
casos, da “ausência” da família na educação da criança antes de outras na
escola e depois que a freqüenta. Pode-se perceber também, no que diz
Machado, que a criança vai adquirindo maturidade aos poucos e isso o
educador na sua prática docente precisa observar e respeitar o nível de
desenvolvimento de cada educando. Embora numa turma de educação infantil,
as crianças tenham a mesma faixa etária, cada criança tem em particular sua
própria história, o meio familiar, as condições em que foi concebida a tudo isso
têm influência no comportamento e no desenvolvimento dela na escola.
Para aprender a ler e a escrever, a criança
precisa construir um conhecimento de natureza
conceitual: precisa compreender não só o que
a escrita representa, mas também de que
forma
ela
representa
graficamente
a
linguagem. Isso significa que a Alfabetização
não é o desenvolvimento das capacidades
relacionadas à percepção, memorização e
treino de um conjunto de habilidades sensóriomotoras. É, antes um processo no qual as
crianças
precisam
resolver
problemas
de
natureza lógica até chegarem a compreender
de que forma a escrita alfabética em português
representa a linguagem, e assim podem
escrever e ler por si mesmas.
Nessa perspectiva, pode-se inferir que a aquisição da escrita por parte
da criança é um processo de construção. É praticando que a criança constrói o
seu conhecimento. Na leitura a criança não apenas decodifica, mas é capaz de
atribuir significado lógico ao texto. Para isso ela necessita de um ambiente de
práticas sociais de leitura e de escrita.
O PAPEL DO PROFESSOR
41
De acordo com os PCN’s da Educação Infantil o professor deve ler para
a criança que ainda não sabe ler, ouvir, isso já é uma forma de leitura que
possibilita a ela fazer algumas inferências no texto lido pelo professor.
É importante que a escola e principalmente o educador disponibilize
para a criança uma diversidade de materiais escritos para que possa manuseálos, tendo dessa forma um contato direto com a escrita.
A esse respeito, assim determina os PCN’s da Educação Infantil (1998 :
141):
Comunicar práticas de leitura permite colocar
as crianças no papel de “leitoras” que podem
relacionar a linguagem com os textos, os
gêneros e os portadores sobre os quais ele se
apresenta: livros, bilhetes, revistas, cartas,
jornais, etc.
E acrescenta:
As poesias, parlendas, trava-línguas, os jogos
de
palavras
memorizadas
e
repetidas
possibilitam às crianças atentarem não só aos
conteúdos, mas também à forma, aos aspectos
sonoros da linguagem, como ritmos e rimas
além das questões afetivas envolvidas.
Cabe ao professor proporcionar ao educando, momentos constantes de
contato prazeroso com a leitura e a escrita, quer seja na leitura de texto de
histórias infantis, gibis, ou na produção coletiva de texto que fazem parte do
quotidiano da criança, como bilhetes, convites para aniversários, exposição dos
nomes dos educandos, rótulos de embalagens, letras de música, dentre outros.
A esse respeito, pode-se verificar nos PCN’s da Educação Infantil (1998 : 142):
O professor, além de ler para as crianças, pode
organizar as seguintes situações de leitura para
que elas próprias leiam: situações em que as
crianças estabeleçam uma relação entre o que
é falado e o que está escrito (embora ainda não
saibam
ler
convencionalmente).
Nessas
atividades de “leituras”, as crianças devem
42
saber o texto de cor e tentar localizar onde
estão escritas determinadas palavras. (...) não
é qualquer texto que garante que o esforço de
atribuir significado à partes escritas coloquem
problemas que ajudem a criança a refletir e
aprender.
Nesse
caso,
os
textos
mais
adequados são as quadrinhas, parlendas e
canções
que
focalizam
a
sonoridade
da
linguagem (ritmos, rimas, repetições, etc.)
permitindo localizar o que o texto diz em cada
linha.
O educador tem bastante interesse por textos que sabem de cor. O
educador deve apresentar o cartaz com o texto e fazer a leitura apontada. Em
seguida, formar duplas, para que as crianças em duplas façam também a
leitura apontada. As duplas devem ser organizadas com crianças de níveis de
leitura diferenciados, ou seja, uma criança de nível pré-silábico com outra de
nível silábico, e assim por diante.
Maruny Curto (2000 : 43) afirma:
Algumas crianças, ao chegar à escola já são
capazes de representar o que lêem: pegam o
livro, põe na posição correta, abrem-no, olhamno atentamente, soltam um discurso num
determinado tom de voz – diferente do
coloquial – passando as páginas, etc. O
conteúdo do discurso pode ser o mesmo do
conteúdo do conto, caso o conheçam bem, ou
a explicação das ilustrações, ou outro qualquer.
Mas com freqüência, a linguagem que utilizam,
ao mostrar que lêem, não é exatamente uma
linguagem coloquial, própria da conversação,
mas uma imitação da linguagem que se
escreve.
O educando conta uma história constante de um texto que ele já ouviu
várias vezes a leitura feita pelo professor ou em casa feita por alguém da
família. Com isso ela quer mostrar ao professor que já sabe ler. Nesta pseudo-
43
leitura que a criança faz, inclusive com idéias concatenadas. O educador deve
elogiá-la, motivando-a e incentivando-a para que ela adquira o gosto pela
leitura e possa aprender a fazê-la de maneira convencional.
A respeito da responsabilidade do professor com seus educandos assim
se reporta Maruny Curto (2000 : 93):
As crianças não aprendem espontaneamente,
nem por si mesmas. Aprendem reflexivamente,
porque alguém as põe em situação de pensar.
Portanto o professor é o protagonista ativo da
aprendizagem de seus alunos. Em primeiro
lugar, é quem decide o que é que deve ser
ensinado,
os
conteúdos,
os
materiais,
a
organização do trabalho e da atividade, a
avaliação, etc.
Em primeiro lugar, o professor para despertar em seus educandos o
interesse pela leitura, deve ser ele um leitor e demonstre prazer em ler. Em
segundo a sala de aula deve ser um ambiente de leitura. Os textos
apresentados de forma criativa pelo professor levam a criança a refletir, e
pensar e até viajar na leitura.
É importante ressaltar o que diz Paulo Freire (2001 : 52): ensinar não é
transferir conhecimento, mas criar possibilidades para a sua própria produção
ou a sua construção. A aprendizagem é um processo que aos poucos vai se
construindo e o professor conduz esse processo possibilitando ao educando
fazer as suas descobertas.
Ainda sobre a prática docente, Freire (2001 : 28/29) diz,
O educador democrático não pode negar-se ao
dever de, na sua prática docente, reforçar a
capacidade
crítica
do
educando,
sua
curiosidade, sua insubmissão. Uma de suas
tarefas
primordiais
é
trabalhar
com
os
educandos a rigorosidade metódica com que
devem
se
“aproximar”
dos
objetos
cognoscíveis. E esta rigorosidade metódica não
tem nada a ver com o discurso “bancário”
44
meramente transferidor do perfil do objeto ou
do conteúdo.
Como foi dito, o professor deve ser um leitor. Acrescenta-se que ele
deve ser um leitor crítico, poderá passar a idéia de criatividade a seus
educandos. Pô-los em situação de pensar, de refletir, é sem dúvida, construir a
idéia de criatividade com eles. A criação do espaço democrático na sala de
aula é importante para a formação do educando.
Ensinar exige respeito aos saberes dos educandos, diz Freire (2001 :
33) e acrescenta:
(...) pensar certo coloca ao professor ou, mais
amplamente, à escola, o dever de não só
respeitar os saberes com que os educandos,
sobretudo os das classes populares, chegam a
ela – saberes socialmente construídos na
prática comunitária – mas também, (...) discutir
com os alunos a razão de ser alguns desses
saberes
em
relação
com
o
ensino
dos
conteúdos.
Sabe-se que a criança ao chegar à escola já é detentora de alguns
saberes aprendidos na família e no meio social que freqüenta. Muitos desses
saberes são historinhas contadas pelos pais, pelos avós; outros provenientes
dos programas de televisão como filmes, novelas, desenhos animados, etc.
Algumas já têm contato com o computador. São que precisam ser
consideradas e trabalhadas adequadamente pelo professor na sala de aula.
ressaltando ainda a prática docente do professor, assim se posiciona Piaget
(apud Mesquida 2000 : 83):
(...) os professores propunham às crianças
materiais
e
ocasiões
que
lhes
permitam
progredir. Não se trata de deixarem as crianças
fazerem o que quiserem, mas de colocá-las
diante de situações que façam surgir novos
problemas e de concatenar essas situações
umas às outras. É preciso saber dirigi-las,
deixando-as livres ao mesmo tempo.
45
A criança não consegue ficar por muito tempo
presa a uma mesma situação. É necessário
que o educador crie constantemente novas
situações, não somente para preencher o
tempo, mas, sobretudo para que esta criança
tenha novos problemas para resolver.
NÍVEIS DE CONSTRUÇÃO DA ESCRITA.
Discutir os fatores que dificultam a aprendizagem do educando tanto na
leitura quanto na escrita e as teorias apresentadas como elemento de
contribuição para se alcançar o sucesso desse educando no processo de
ensino aprendizagem é bastante complexo.
Com relação a aquisição da escrita, é importante que o educador
observe os níveis de escrita, determinados na Psicogênese de língua escrita
formulada por Emília Ferreiro e seus colaboradores, dentre eles, Ana
Teberosky. A psicogênese da língua escrita é uma teoria baseada em modelos
explicativos que procura descrever aquilo que é comum a todos os processos
individuais de alfabetização. As idéias propostas pela teoria mostram que os
sujeitos constroem para elaborar a compreensão do funcionamento do código
escrito. Ao invés de questionar como o professor deve alfabetizar, Emília
Ferreiro enfoca como o aluno se alfabetizar.
Nesta perspectiva, percebe-se a concepção construtiva, na qual o
conhecimento é algo a ser construído pelo aprendiz enquanto sujeito da
aprendizagem, através da qual ele se apropria da escrita e de si mesmo como
usuário e produtor desta. Nessa concepção, o professor tem a função de
mediador, alguém que toma decisões pedagógicas conscientes.
O construtivismo está embasado nos estudos de Piaget sobre
pensamento e linguagem. Para Piaget (1975) o conhecimento é construído
através da interação do sujeito com o objeto.
Sobre o processo de interação com o objeto a ser estudado, na qual o
sujeito constrói representações que funcionam como verdadeiras explicações e
se orientam por lógica interna, Ferreiro (1999 : 32) assim se refere:
46
Isso significa que o processo de aquisição da
língua escrita seja natural e espontânea, que o
professor se limite a ser um expectador
passivo, nem que seja suficiente rodear a
criança, mas não mais difícil que outros
processos de aquisição de conhecimento. É um
processo que exige acesso a informação
socialmente veiculada, já que muitas das
propriedades da língua escrita só se podem
descobrir através de outros informantes e da
participação em atos sociais onde a escrita
sirva para fins específicos.
Desta forma, vale ressaltar que para aprender a ler e a escrever, o
sujeito precisa construir o conhecimento de natureza conceitual e compreender
não só o que a escrita representa, mas também de que forma ela representa
graficamente a linguagem.
As pesquisas de Emília Ferreiro e Ana Teberosky buscaram descrever e
classificar as sucessivas etapas de aquisição da escrita. Suas conclusões
apontam quatro níveis básicos pelos quais passam a maioria das crianças,
independentemente do processo de ensino-aprendizagem:
- Nível pré-silábico
- Nível silábico
- Nível silábico-alfabético
- Nível alfabético.
No nível pré-silábico, a criança não tem ainda a compreensão da
correspondência entre grafia e som. Inicialmente, a criança produz riscos e/ou
rabiscos (garatujas) e desenhos sem figuração. Nesta fase, a criança sempre
usa os mesmos sinais gráficos (que podem ser letras convencionais ou outros
símbolos quaisquer).
Para as crianças do nível pré-silábico, os nomes das pessoas, dos
animais e das coisas têm relação com o seu tamanho ou idade. Ao escrever a
palavra boi ela vai utilizar muitas letras; no entanto, se a palavra for
formiguinha, colocará poucas letras na sua escrita.
47
Numa fase mais avançada do nível pré-silábico, a criança faz a
diferenciação entre letras e números, desenhos e símbolos e reconhece o
papel das letras na escrita. Percebe que as letras servem para escrever e para
ler, embora não saiba como isso ocorre.
No nível silábico, a criança constrói a hipótese silábica, ou seja, cada
letra ou sinal gráfico representa uma sílaba. É o momento em que a criança
faz a correspondência da escrita com a fala. É o período de maior importância
evolutiva no processo de alfabetização. No momento inicial, as grafias são
diferenciadas sem que as letras tenham seu valor sonoro convencional. Num
grau de evolução maior, as crianças empregam nas suas grafias vogais e até
consoantes, tendo já o seu valor convencional.
A hipótese silábica, segundo Ferreiro (1991) é uma construção original
da criança que não pode ser atribuída a uma transmissão por parte do adulto.
Essa hipótese é ao mesmo tempo um avanço no que se refere aos conceitos,
mas também uma geradora de conflitos cognitivos, pois cria diversas
contradições entre o controle silábico e a quantidade mínima de letras que uma
escrita deve possuir para ser legível (uma só letra não pode ser lida).
Ao tentar solucionar esses conflitos, a criança descobre outras letras,
outras combinações e avançam no desenvolvimento de construção da escrita,
na medida em que entram em contato com materiais impressos como livro,
revistas, cartazes, rótulos, jornais, etc., que o auxiliarão na construção de uma
nova hipótese. Assim, as palavras dissílabas que eram escritas com duas
letras passam a ser escritas com três letras para atender a hipótese de
quantidade mínima de som.
O silábico-alfabético é o nível marcado pela tentativa da criança em
solucionar os conflitos estabelecidos, pois precisa negar a lógica do nível
silábico. É o conflito gerado pela incapacidade de compreensão daquilo que ela
escreveu.
O nível silábico-alfabético é, portanto, um nível de transição entre o nível
silábico e o nível alfabético, caracterizado por uma escrita mista, ou seja, uma
letra para algumas sílabas e duas para outras. Assim, sem abandonar a
48
hipótese anterior a criança tenta se aproximar da escrita convencional. É nesse
momento em que ela começa a observar a distância entre sua escrita e a
escrita do adulto, então passa a acrescentar letras, principalmente na primeira
sílaba. Convém salientar que nesta fase, a criança já identifica o valor sonoro
de algumas vogais.
No nível alfabético considera-se que a criança já compreendeu que cada
um dos caracteres da escrita corresponde a valores sonoros menores que a
sílaba. Ela compreende que a palavra escrita é constituída de subconjunto de
letras que formam as sílabas.
Isso não significa que todas as dificuldades tenham sido superadas, pois
a partir desse momento a criança terá de se haver com as questões
ortográficas, uma vez que a identidade de som não garante a identidade de
letra, nem a identidade de letra a identidade de som. Essas questões já
compreendem a pós-alfabetização na qual será enfatizada a construção da
base ortográfica.
A passagem por esses níveis é feita pela criança de forma natural,
porém o desenvolvimento na escrita, assim como na leitura dependerá dos
estímulos e oportunidades que lhe serão oferecidas, principalmente pela família
e pela escola.
SELEÇÃO DE CONTEÚDOS
Sobre a função da escola de propiciar situações de aprendizagem ao
educando, o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil
(Introdução 1998 : 23) diz:
A instituição de educação infantil deve tornar
acessível
a
todas
as
crianças
que
a
frequentam, indiscriminadamente, elementos
da
cultura
que
enriquecem
o
seu
desenvolvimento e inserção social. Cumpre um
papel
socializador
propiciando
o
desenvolvimento da identidade das crianças,
49
por meio de aprendizagens diversificadas,
realizadas em situações de interação.
Para cumprir o seu papel de proporcionar à criança situações de
aprendizagem, a escola no planejamento de suas ações estabelece uma
seleção de conteúdos relacionados ao nível da criança e específicos para o
processo de aprendizagem.
Esses conteúdos estão distribuídos nas seguintes categorias como
propõe o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (Introdução,
1998 : 50/51):
•
Conteúdos conceituais referem-se à construção
ativa
das
capacidades
para
operar
com
símbolos, idéias, imagens e representações
que permitem atribuir sentido à realidade;
•
Conteúdos procedimentais referem-se ao saber
fazer. A aprendizagem de procedimentos está
diretamente relacionada à possibilidade de a
criança construir instrumentos e estabelecer
caminhos que lhes possibilitem a realização de
suas ações.
•
Conteúdos atitudinais tratam dos valores, das
normas e das atitudes. Conceber valores,
normas e atitudes como conteúdos implica
torná-los explícitos e compreendê-los como
possíveis
de
serem
compreendidos
e
planejados.
Objetivando alcançar resultados positivos de aprendizagem a
escola organiza os seus conteúdos que irão subsidiar o trabalho do
professor em interação com o educando.
É importante ressaltar que no processo de aquisição da leitura e
da escrita na Educação Infantil, família e escola devem trabalhar
harmoniosamente, no cumprimento dos seus deveres para que a criança
possa adquirir o máximo de conhecimento.
50
A contribuição do psicopedagogo no contexto da
aprendizagem na Educação Infantil
Como foi dito, a dificuldade na aprendizagem existe. Na realidade,
a aprendizagem decorre de uma dificuldade que é chamada por Piaget
de desequilíbrio. Se essa dificuldade não for superada pelo educando
com auxílio do professor, da supervisão escolar, da própria família,
enfim, pela comunidade escolar, esse educando cairá no fracasso em
relação à aprendizagem. O aprendiz cai ficar mais distante do sucesso
na aquisição do conhecimento, especificamente na leitura e na escrita.
O fracasso na aprendizagem da leitura e da escrita, pode custar à
criança o “rótulo” imposto pela família, pelos colegas de escola e até
mesmo pela própria instituição. Esse “rótulo” nada mais faz do que
incentivar a continuidade do fracasso a tal ponto que a própria criança
chega a admitir a sua incapacidade.
Em
situação
dessa
natureza
é
muito
importante
o
acompanhamento ao educando, de um profissional habilitado. Esse
profissional, sem dúvida alguma é psicopedagogo. Convém lembrar que
o psicopedagogo deve acompanhar a todos os educandos, não somente
aqueles que enfrentam extrema dificuldade. Porém, estes são os que
mais necessitam de um acompanhamento desse profissional.
Os motivos que levam ao fracasso escolar são vários e de diferente
natureza.
Cabe
ao
psicopedagogo
diagnosticar
o
problema,
compreendê-lo, contextualizá-lo e proceder com os encaminhamentos
de incentivo à criança. Em primeiro lugar é importante destituir o “rótulo”
proporcionando à criança acreditar em si mesma, na sua potencialidade,
a capacidade de emocionar-se ao descobrir-se como pessoa de
conquistar o sucesso na aprendizagem. Para isso, o psicopedagogo
precisa ver além do “rótulo”, além da criança fracassada que está diante
de si. Precisa ver a pessoa que está encoberta por essa “máscara”
criada por outros e aceita por ela, com todo o seu potencial de sucesso.
51
Na escola, o psicopedagogo, na prática de suas atribuições; no
acompanhamento do processo de ensino aprendizagem em seus
aspectos cognitivos, emocionais e corporais, atuando tanto no processo
normal de aprendizagem quanto na constatação de dificuldades através
dos diagnósticos, deve contribuir no planejamento escolar construindo e
desenvolvendo projetos que possam desenvolver a cognição dos
educandos, especificamente dos educandos da Educação Infantil, no
que se refere a aquisição da leitura e da escrita.
52
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com o que foi exposto neste trabalho, pode-se concluir
que a criança constrói o seu aprendizado naturalmente. O professor,
como mediador do processo, tem o papel de oferecer as condições
estimuladoras para o desenvolvimento das habilidades do educando. A
criança em contato com o material impresso, logo cedo vai se
familiarizando com o mundo letrado e aos poucos vai adquirindo
experiência para o aprendizado convencional da leitura e da escrita.
Percebem-se
também
a
importância
da
família
como
intermediadora indispensável para o processo de aquisição da leitura e
da escrita por parte da criança. É no ambiente familiar que a criança
entra em contato com a leitura e a escrita através da interação com os
livros, as revistas, os jornais e até mesmo com os rótulos dos produtos
consumidos pela família.
Com a chegada da criança à escola, a família e a instituição
educacional têm objetivos comuns em relação à aprendizagem e bem
definidos e complementares para o sucesso escolar dessa criança. É
importante valorizar o que a criança produz: riscar, rabiscar, garatujas,
desenhos, como motivação para que ela faça, sem receio, suas
hipóteses sobre o ler e o escrever na educação formal.
Ler e escrever são, portanto, atividades essenciais para a vida do
ser humano em sociedade, pois através da leitura e da escrita, ele
interage com o meio e com os outros indivíduos, expressa seus
sentimentos, tem possibilidade de crescimento na apropriação de novos
conhecimentos e de se desenvolver intelectualmente.
53
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Brasil, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de
Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a
educação infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998
________________, Parâmetros Curriculares Nacionais, 1ª a 4ª
séries. Brasília : MEC/SEF, 1997
BAMBERGER, Tcichard. Como Incentivar o Hábito da Leitura. São
Paulo: Ática, 1995.
Centro internacional da infância. O desenvolvimento da criança do
nascimento aos seis anos. Trad. Alfredo Antônio Fernandes, 2 ed.
São Paulo: Pioneira, 1983.
CHALITA, Gabriel: Educação: a solução está no afeto. 12ª Ed. São
Paulo: Editora Gente, 2004.
CURY, Augusto Jorge. Pais brilhantes, professores fascinantes. Rio
de Janeiro: Sextante, 2003.
FERREIRO, Emilia. Reflexões sobre Alfabetização. São Paulo. SP:
Cortez, 1990.
________________. Psicogênese da língua escrita/Emília Ferreiro e
Ana Teberosky, Trad. Diana Myrian Lienchtenstein, Liana de Marco
e Mário Corsa – Porto Alegre, RS: Artes Médicas Sul, 1999.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Antonomia. 19 ed. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 2001.
54
KATO,
Mary
A.
No
Mundo
da
Escrita:
uma
perspectiva
psicolingüística, São Paulo: Ática, 1996.
MACHADO, Izaltina de Lourdes: Educação Montessori de um
homem novo para um mundo novo 3ª Ed. São Paulo: Pioneira, 1983.
MARTINS, Maria Helena. O que é Leitura, São Paulo: brasiliense,
1989.
MICOTTI, Maria Cecília Oliveira. Piaget e o Processo de
Alfabetização, São Paulo: Pioneira, 1980.
SÉRKEZ, Ângela Maria Batista; MARTINS, Sandra Mara Bozza.
Trabalhando com a palavra viva. Curitiba: Renascer, 1996.
Download

Ana Maria Soares de Carvalho