E S TA D O D A PA R A Í B A
PODER JUDICIÁRIO
5 ª VA R A M I S TA D A C O M A R C A D E S A N TA R I TA
PROCESSO Nº 803-44.2015.815.0331 – AÇÃO ORDINÁRIA
AUTOR: SEVERINO ALVES BARBOSA FILHO
RÉU: MUNICÍPIO DE SANTA RITA
ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA
Trata-se de PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA EM
AÇÃO ORDINÁRIA movida por SEVERINO ALVES BARBOSA FILHO em face do
MUNICÍPIO DE SANTA RITA.
Na inicial, o autor alega o seguinte:
1. Que exerce o cargo de vice-prefeito do município de Santa Rita e desde dezembro de
2014 não recebe os subsídios a que faz jus pelo exercício do cargo.
2. O atual prefeito do município, “em um ato claramente ilegal e imoral, tem-se
recusado a pagar ao autor o subsídio de vice-prefeito que lhe é devido por lei”. E
acrescenta: “Desde 12/2014, o demandante, exclusivamente em razão de perseguição
política, tem sido excluído, de maneira injusta, da folha de pagamento do
Município”.
3. Atualmente o montante do débito com o promovente perfaz o valor de R$ 50.105,00
(cinquenta mil cento e cinco reais), referentes aos meses de dezembro de 2014 a abril
de 2015.
4. Alegando que o subsídio tem caráter alimentar e é essencial à sua subsistência,
pleiteia em sede de antecipação dos efeitos da tutela o imediato bloqueio da conta do
FPM do município de Santa Rita, no valor de R$ 50.105,00 (cinquenta mil cento e
cinco reais), relativo aos subsídios dos meses de dezembro de 2014 a abril de 2015.
Do mesmo modo, requer o bloqueio automático do numerário atinente ao mês de
05/2015 e dos meses subsequentes.
5. Requereu a concessão do benefício da justiça gratuita por não ter condições de arcar
com as despesas processuais.
Em despacho de fl. 25 foi determinada a intimação do representante judicial do
Município de Santa Rita para, para em 72 (setenta e duas) horas, se manifestar sobre tutela
antecipada pleiteada.
PROCESSO Nº 803-44.2015.815.0331
PROCESSO Nº 803-44.2015.815.0331
O Procurador Geral do Município, em petição de fls. 36/46, apresentou manifestação
escrita, nos seguintes termos:
1. Afirma que “a Câmara Municipal de Santa Rita, ao aprovar a LDO do ano de 2015,
excluiu a dotação orçamentária destinada ao gabinete do vice-prefeito, remanejandoa para outras secretárias do Município, conforme comprova a Emenda Modificativa
nº 0124/2014”(fls. 28).
2. Diz ainda que em face da inexistência de previsão orçamentária “é de claridade solar
que as verbas destinadas ao Gabinete do Vice-Prefeito foram excluídas da Lei
Orçamentária Anual do ano de 2015” e que isso “vem impossibilitando a
Administração de efetuar o pagamento do seu salário, bem como de qualquer outro
gasto relacionado ao seu Gabinete” (fls. 29).
3. Ao adentrar na seara política, a Procuradoria do Município argumenta que o VicePrefeito praticou inúmeras irregularidades quando investido no cargo de Prefeito o
que, nessa linha de raciocínio, “os prejuízos causados ao erário pelo Vice-Prefeito,
quando do exercício temporário do mandato de Prefeito, por si só já deveriam
justificar a suspensão do pagamento do seu salário” (fls. 30).
4. No âmbito processual, o Município alega que a inadequação da via eleita por
entender que o mandado de segurança não pode ser utilizado para fins de
recebimento de quantias salariais não pagas, cita a súmula 269 do STF.
5. Juntou documentos aos autos.
É o breve relato, passo a decidir o pedido de antecipação dos efeitos da tutela.
De logo, defiro o pedido de gratuidade processual e o faço com base na Lei 1.060/50.
1.
QUESTÃO PRELIMINAR 1 - INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL
ESCOLHIDA
Não prospera a questão processual trazida aos autos pela Procuradoria-Geral do
Município de Santa Rita, uma vez que a súmula 269 do STF trata expressamente do
mandado de segurança, enquanto que a presente demanda é uma ação ordinária com pedido
liminar.
Diante disso, indefiro de plano a defesa processual esgrimida pelo Município.
2.
QUESTÃO PRELIMINAR 2 – POSSIBILIDADE DA ANTECIPAÇÃO DE
TUTELA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA
Conforme leciona Leonardo Carneiro Cunha 1, atualmente não existe mais dúvidas
acerca da possibilidade de antecipação de tutela em face da Fazenda Pública, exceto nas
hipóteses elencadas nas Leis nºs 9.494/97 e 12.016/2009.
A Lei nº 9.494/97, para o que nos interessa, trata da proibição de concessão de tutela
antecipada nas hipóteses de reclassificação ou equiparação de servidores públicos ou à
1 A Fazenda Pública em Juízo, São Paulo, Dialética, 12ª edição, 2014, p. 412.
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concessão de aumento ou extensão de vantagens. Por sua vez, a Lei nº 12.016/2009, em
suma, proíbe a concessão de medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos
tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou
equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou
pagamento de qualquer natureza.
Quanto à limitação de obtenção de vantagem financeira, a doutrina e o STF vêm
atenuando a vedação legal no sentido de que “se da tutela antecipada, concedida para dada
finalidade, surjam consequências financeiras indiretas ou secundárias, não estará sendo
afrontada a decisão proferida na ADC 4. Em outras palavras, se a tutela antecipada não é
concedida para impor pagamento de vantagem, mas tal pagamento será realizado como
consequência da medida antecipatória, a hipótese não se encaixa na proibição do art. 1º da
Lei nº 9.494/1997, não havendo ofensa à decisão proferida na ADC 4. Assim, por exemplo,
é possível a tutela antecipada para impor a nomeação e a posse de candidato aprovado em
concurso público. É verdade que, uma vez empossado, o candidato passa a ostentar a
condição de servidor público, vindo a perceber remuneração, com inclusão em folha de
pagamento. Como os efeitos financeiros constituem uma consequência secundária da
decisão, a hipótese não se encaixa nas vedações do art. 1º da Lei nº 9.494/1997, não
arrostando o quanto decidido na ADC 449”2.
No caso em análise, a antecipação de tutela não visa a compensação de créditos
tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou
equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou
pagamento de qualquer natureza. Visa, exclusivamente, o restabelecimento do pagamento
dos subsídios a que faz jus o autor como Vice-Prefeito do Município de Santa Rita e que, a
pretexto da ausência de dotação orçamentária, foi suprimido pela atual Administração do
Município. As consequências financeiras da decisão são secundárias em relação ao
necessário restabelecimento da verba alimentar do autor.
A Fazenda Pública, em petição de fls. 28/33 dos autos, reconhece a suspensão do
pagamento dos subsídios. Em casos desse jaez, o STF vem se posicionando pela
admissibilidade da antecipação de tutela contra a Fazenda Pública, desde que se limite a
restabelecer a vantagem pecuniária suprimida indevidamente do servidor público:
SERVIDOR PÚBLICO. Magistrado. Vencimentos. Vantagem
pecuniária. Restabelecimento. Antecipação de tutela.
Admissibilidade. Inexistência de afronta à autoridade do acórdão
da ADC nº 4. Precedente do Plenário. Reclamação a que se negou
seguimento. Inaplicabilidade dos precedentes do MS nº 24.875 e
da Rcl nº 2.482. Agravo desprovido. Antecipação de tutela que se
limita a restabelecer vantagem pecuniária de servidor público,
impedindo-lhe redução de verbas salariais, não ofende a
autoridade do acórdão proferido na ADC nº 4." (Rcl nº 3.946/DFAgR, Relator o Ministro Cezar Peluso, tribunal Pleno, DJe de
25/4/2008) (grifei)
O restabelecimento de vantagem pecuniária a servidor público não se enquadra nas
hipóteses de vedação contidas nas Leis nº s 9.494/97 e 12.016/2009, o que significa que “nas
2 CUNHA, Leonardo Carneiro, 2014, p. 343-344.
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hipóteses não alcançadas pela vedação, resulta plenamente possível deferir a tutela
antecipada em face da Fazenda Pública” 3. Portanto, a situação dos autos não significa uma
extensão de vantagem ou um pagamento de qualquer natureza vedado pelas Leis
supracitadas, mas de manutenção da situação anterior ao ato administrativo omissivo que
indevidamente ocasionou a suspensão da remuneração do autor da demanda, conforme já
decidido pelo STJ no REsp 457.534.
Bem se vê, o caso em estudo trata exatamente do restabelecimento do pagamento dos
subsídios a que faz jus o autor no cargo de Vice-Prefeito do Município de Santa Rita, motivo
pelo qual entendo admissível, em termos processuais, o exame da pretensão antecipatória
proposta na exordial, restando ainda a análise de seus requisitos materiais.
3.
ANÁLISE SUMÁRIA DE MÉRITO DO PEDIDO DA ANTECIPAÇÃO DE
TUTELA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA
Ultrapassada com sucesso a fase da viabilidade processual da medida antecipatória em
face das limitações impostas pelas Leis nº s 9.494/97 e 12.016/2009, é necessário agora
proceder ao estudo pormenorizado do cumprimento dos requisitos materiais indispensáveis à
concessão da antecipação excepcional do mérito.
É cediço que “os provimentos antecipatórios decorrem do exercício de cognição
sumária, pressupondo uma situação processual de urgência ou de evidência e, igualmente,
uma necessidade de se conferir efetividade ao processo, com o deferimento de prestação
jurisdicional instante e apta a eliminar o dano ou a ameaça de direito, ou, ainda, o abuso do
direito de defesa”4.
3.1 DO PERICULUM IN MORA
No caso em estudo, evidencia-se uma situação de urgência, de periculum in mora,
diante do notório caráter alimentar dos subsídios do autor suprimidos pelo Município de
Santa Rita. A necessidade de se garantir a efetividade ao processo com o deferimento de
prestação jurisdicional instantânea também é constatável devido ao fato da sua demora
matar o próprio direito pleiteado e violentar a dignidade humana e os valores sociais do
trabalho, princípios fundamentais da República Federativa do Brasil elencados logo no
primeiro artigo da Constituição (art. 1º, incs. III e IV).
3.2 DA PROVA INEQUÍVOCA
A supressão unilateral do pagamento dos subsídios do autor pela Administração é fato
incontroverso nestes autos, tendo em vista que foi arguido pelo autor e expressamente
reconhecido nos autos pela Procuradoria-Geral do Município de Santa Rita.
A motivação do ato omissivo foi a alegada ausência de previsão orçamentária para as
verbas destinadas ao Gabinete do Vice-Prefeito, como se isso justificasse medida de
3 CUNHA, Leonardo Carneiro, 2014, p. 412.
4 CUNHA, Leonardo Carneiro, 2014, p. 325.
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tamanha gravidade praticada ao arrepio dos mais basilares princípios que regem o Estado
Democrático de Direito.
Além disso, é fato amplamente conhecido dos munícipes que o principal ponto fático
da questão não é a ausência de verba orçamentária, mas uma ferrenha guerra política,
infelizmente levada para o coração da Administração pública municipal ao arrepio do
princípio republicano que apregoa a separação entre os interesses político-partidários e os
interesses maiores da República, ou seja, em palavras mais simples, ao arrepio da necessária
separação entre o interesse público e o interesse privado/partidário do governante. Assim, a
motivação política do ato omissivo objurgado foi relatado tanto pelo autor na inicial, quanto
pela Procuradoria-Geral, ao desnecessariamente confirmar a tese autoral e adentrar numa
seara alheia a luta jurídica travada nestes autos para afirmar que o autor praticou inúmeras
irregularidades e que “os prejuízos causados ao erário pelo Vice-Prefeito, quando do
exercício temporário do mandato de Prefeito, por si só já deveriam justificar a suspensão do
pagamento do seu salário” (fls. 30).
Não bastasse isso, para mais caracterizar o viés político do ato omissivo da atual
gestão do Município, a Secretária Municipal de Administração e Gestão, Sra. Wilma Gomes
Lima da Silva, em ofício-resposta a Promotora de Justiça de Defesa do Patrimônio Público,
Dra. Anita Bethânia Silva da Rocha, informou o seguinte: “que os pagamentos dos subsídios
do Vice-Prefeito figuram suspensos em virtude da obtenção de indícios de que após 09
(nove) meses de instabilidade política e ilegítima ingerência dos desígnios municipais, o
Severino Alves Barbosa Filho impôs absurdamente ao Município uma dívida aproximada de
R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais)” (fls. 12, Ofício nº 076/2015 – SEADM –
PMSR, datado de 27/04/2015).
A prevalecer a incontroversa prova da motivação política do ato, revelada pelo próprio
Município réu, por intermédio de sua Procuradoria-Geral e da sua Secretária de
Administração e Gestão, a atual gestão municipal, partidarizando a Administração Pública,
sem o devido processo legal, julgou e condenou sumariamente o autor a não mais receber
seus subsídios de Vice-Prefeito, numa completa e desrespeitosa inversão dos valores e
princípios maiores da Administração Pública insculpidos na Constituição Federal.
Em resumo, a prova pré-constituída pelo autor e expressamente reconhecida pela
Procuradoria-Geral, revela que o Município admitiu a falta de pagamento dos subsídios e a
evidente e deliberada predisposição política em não fazê-lo.
3.3 DA VEROSSIMILHANÇA DO DIREITO
Bem se vê, a medida antecipatória pleiteada visa garantir hoje e agora o direito do
autor a sua remuneração, direito assegurado a todo e qualquer trabalhador. Neste sentido,
o gestor municipal é pessoalmente responsável por manter em dia os salários dos
trabalhadores por força de preceitos fundamentais de cunho universal que vedam o trabalho
escravo e elevam a dignidade humana a corolário maior do regime constitucional
proclamado em 05 de outubro de 1988 - “a proteção do salário na forma da lei,
constituindo crime sua retenção dolosa” (CF, inc. X do art. 7º).
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3.4 DA NATUREZA SATISFATIVA DA MEDIDA ANTECIPATÓRIA DE
MÉRITO PLEITEADA
Um eventual impeditivo a concessão da medida antecipatória de mérito almejada pelo
autor é a sua evidente natureza satisfativa, o que exige um estudo acurado para constatar a
sua real viabilidade jurídica.
De fato, o § 3ºdo art. 1º da Lei nº 8.437/1992 dispõe que “não será cabível medida
liminar que esgote, no todo ou em qualquer parte, o objeto da ação”.
Numa análise apressada, poder-se-ia, no caso presente, entender pela cabal
impossibilidade de concessão da antecipação da tutela, posto que realmente o deferimento
da medida interlocutória de mérito irá esgotar quase que completamente o objeto da
demanda. No entanto, o dispositivo somente é aplicável às medidas cautelares, conforme
preleciona Leonardo Carneiro Cunha ao afirmar que “a regra, aplicável às medidas
cautelares, não teria muito sentido quanto às tutelas antecipadas, já que estas são, em
essência, satisfativas. Parece, contudo, que a aplicação de tal vedação à tutela antecipada
reforça, apenas, o que já está contido no parágrafo 2º do art. 273 do CPC, ou seja, não se
permite a antecipação dos efeitos da tutela, quando houver risco de irreversibilidade. Assim,
se a antecipação da tutela contra a Fazenda Pública determinar, por exemplo, a liberação de
uma mercadoria apreendida, não se poderá antecipar a tutela, em razão da irreversibilidade
da medida. Aplica-se, nesse ponto, o princípio da proporcionalidade, pois se a denegação da
medida revelar-se mais irreversível do que sua concessão, deve-se suplantar o óbice e
concedê-la”5.
3.4 DO RISCO DE IRREVERSIBILIDADE DA MEDIDA – JUÍZO PRÉVIO
DE PROGNOSE – PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
No juízo prévio de prognose, tem-se que a eventual denegação da ordem liminar de
mérito poderá ocasionar maiores prejuízos que a sua concessão, comprometendo
irremediavelmente as finanças, a saúde e a sobrevivência da parte hipossuficiente na relação
– o autor –, o que, per si, denota a adequação da medida. Além disso, inexiste outra forma
menos gravosa de atender a demanda antecipatória.
A concessão da tutela antecipada não implica qualquer prejuízo direto para o
Município, posto que houve o reconhecimento expresso da dívida salarial que não pode
deixar de ser paga, por força da vedação constitucional ao trabalho escravo e ao
enriquecimento ilícito.
A necessidade da medida igualmente se impõe para garantia da dignidade humana do
autor e para evitar o agravamento da situação vexatória que vivencia com a privação de
recursos necessários ao sustento. Ademais, permitir a interrupção do pagamento dos
subsídios do requerente é, por via oblíqua, referendar a aparente “condenação política” feita,
ao arrepio da lei e da Constituição, pela atual gestão municipal que sumariamente acusou,
julgou e aplicou a pena de suspensão ao autor por alegados desmandos administrativos
praticados por ele quando no exercício do cargo de Vice-Prefeito.
5 A Fazenda Pública em Juízo, São Paulo, Dialética, 12ª edição, 2014, p. 420.
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Por fim, há uma proporcionalidade ou racionalidade, na dimensão de equilíbrio, da
decisão de concessão da providência antecipatória de mérito pretendida, uma vez que a
ponderação dos interesses em jogo favorece a pretensão da parte autora que, sumariamente,
demonstrou a preponderância dos interesses de garantia da sobrevivência e da dignidade do
cargo de Vice-Prefeito do Município de Santa Rita.
Evidencia-se que, na ponderação entre o direito de subsistência do autor e o interesse
econômico do município, o direito ampara o primeiro bem jurídico, que estaria, caso fosse
indeferida a liminar, sob sério risco de dano irreparável e irreversível diante da sua natureza
alimentar, do estabelecimento de condição análoga à de escravo e das sérias consequências
para o autor e para a sua família, afora o aviltamento do cargo exercido pelo autor de VicePrefeito.
3.5 DA ALEGADA AUSÊNCIA DE DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA
O Ministro Arnaldo Esteves Lima do STJ, nos autos AREsp nº 169351, que tratava de
situação de suspensão de pagamento de subsídios de Vice-Prefeito, análoga ao caso
concreto, decidiu que é inadmissível utilizar-se da letra da lei para agir de forma contrária a
ela: “ato ilegal e abusivo a conduta do Município/Apelante em reter o pagamento dos
subsídios do Apelado sem o devido processo legal. De forma que, a ordem jurídicoconstitucional repeli a vantagem indevida, sob pena de se admitir o enriquecimento ilícito
do ente Público em detrimento do particular. A Lei de Responsabilidade Fiscal visa proteger
o interesse público contra a má administração, não sendo admissível utilizar-se da letra da
lei para agir de forma contrária a ela” 6.
A ausência de dotação orçamentária é questão exclusivamente administrativa, uma vez
que a “a Carta Magna, em seu art. 7º, inciso X, exige o pagamento pontual do salário dos
trabalhadores, apontando como criminosa a sua retenção dolosa, o que se estende aos
servidores municipais, inclusive o Vice-Prefeito, haja vista tratar-se do pagamento de verba
de caráter alimentar, sendo desnecessário mencionar os inúmeros prejuízos que são causados
em virtude da impontualidade apontada” 7.
A remuneração por subsídio é um direito garantido constitucionalmente ao VicePrefeito (CF, art. 29, inc. V), sendo uma Despesa Obrigatória de Caráter Continuado, nos
termos do art. 17 da Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal). É
inadmissível, para não dizer vergonhoso, que o Executivo municipal não tenha feito constar
na lei orçamentária anual a verba para pagamento das despesas do Gabinete do VicePrefeito. Isso apenas reforça a lamentável motivação política da omissão eloquente que
silenciosamente diz tudo.
Nesse sentido, compete ao gestor, sob pena de responsabilidade pessoal, tomar todas
as medidas cabíveis para incluir na Lei do Orçamento a dotação orçamentária necessária ao
pagamento dos subsídios do autor, mormente porque é determinação do art. 29, inc. V, da
Constituição Federal o dever de pagar a remuneração do Vice-Prefeito por subsídio fixado
pela Câmara de Municipal. Ora, se o comando constitucional determina a fixação do
subsídio do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Secretários Municipais por lei de iniciativa da
6
7
STJ, 2ª T., AREsp 169351, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJe 20/06/2013.
STJ, 2ª T., AREsp 169351, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJe 20/06/2013.
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Câmara, obrigatória também é a sua inclusão na lei orçamentária e o seu efetivo pagamento,
devendo em caso de omissão e recusa de pagamento ser apurada a eventual ocorrência de
conduta dolosa, ante a gravidade da situação.
No caso em apreciação, sem embargo da eventual apuração de improbidade
administrativa e/ou criminal a critério do Ministério Público, inexiste qualquer vedação ao
pagamento judicial das despesas com pessoal, tendo em vista que o art. 19, § 1º, inc. IV, da
Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº 101/2000) ressalva a sua viabilidade, independente
de dotação orçamentária, mesmo que eventualmente exceda os limites percentuais da receita
corrente líquida previstos no art. 19, inc. III, da citada norma.
4.
DISPOSITIVO
Em suma, a prova pré-constituída pelo autor revela que o Município admitiu a falta de
pagamento dos subsídios e a motivação política do ato omissivo demonstra o
descompromisso de fazê-lo. A pretensão liminar do autor, no contexto em que se apresenta,
respalda-se no direito de todo trabalhador de receber a contraprestação pecuniária mensal
que tem caráter alimentar imediato e é corolário do princípio da dignidade humana,
encartado na Constituição. Diante disso, tenho por verossímeis, plausíveis e urgentes as
alegações acerca da necessidade de imediato pagamento dos subsídios do autor.
Para não transformar a presente decisão antecipatória de mérito em um ilegítimo
sucedâneo do precatório judicial, em afronta ao disposto no art. 100 da Constituição Federal,
entendo incabível o pagamento imediato dos subsídios anteriores ao ajuizamento da
demanda. Entretanto, com relação aos meses anteriores ao ajuizamento da presente ação
ordinária de cobrança, ressalvo a possibilidade da Administração pagá-los voluntariamente.
Pelas razões expostas, DEFIRO EM PARTE A MEDIDA ANTECIPATÓRIA DE
MÉRITO PLEITEADA para determinar que o Município de santa Rita proceda o
pagamento dos subsídios do autor, a partir do mês de maio de 2015, no prazo 48 (quarenta
e oito) horas.
Com relação aos subsídios vincendos, determino o seu pagamento na mesma data
em que forem pagos os subsídios do Prefeito que, segundo informações prestadas nestes
autos pela Secretária de Administração e Gestão (fls.__), se encontram em dia e não foram
suspensos.
Para efetivação da medida de antecipação dos efeitos da tutela, determino as seguintes
providências:
1. Oficie ao Senhor Prefeito, cientificando-o pessoalmente, para que determine o
imediato pagamento dos subsídios do Vice-Prefeito, a partir do mês de maio de
2015, no prazo de 48 horas, ou justifique a cabal impossibilidade de fazê-lo, sob
pena de não o fazendo incidir, em tese, no tipo penal previsto no art. 1º, inc. XIV, do
Decreto-Lei 201/67.
2. Cientifique o Senhor Prefeito de que, doravante, os subsídios vincendos do autor
deverão ser pagos na mesma data em que forem pagos os subsídios do Prefeito,
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devendo ser comprovado o pagamento mensalmente nos autos, também sob pena de
não o fazendo incidir, em tese, no tipo penal previsto no art. 1º, inc. XIV, do DecretoLei 201/67.
3. Consigne que o descumprimento das determinações anteriores poderá ensejar a
concessão da tutela específica da obrigação, com o eventual bloqueio judicial da
conta do FPM ou outra medida que assegure o resultado prático equivalente ao
cumprimento da obrigação, conforme previsto no art. 461 do CPC.
4. Nos termos do art. 40 do CPP e 7º da Lei nº 7.347/85, oficie ao Ministério Público,
com cópia desta decisão e das peças relevantes do processo, para, se entender
cabível, apurar a eventual ocorrência de ilícito penal e/ou a propositura de ação civil
por improbidade.
5. Cumpra o item 3 do despacho de fl. 25 dos autos.
6. Intime desta decisão a Procuradoria-Geral do Município.
P. I.
CUMPRA COM URGÊNCIA.
Santa Rita-PB, 17 de julho de 2015.
Juiz GUSTAVO PROCÓPIO BANDEIRA DE MELO
5ª Vara Mista de Santa Rita
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subsídios do vice-prefeito - proc. 0000803