Fascículo Semanal nº 36
FECHAMENTO: 06/09/2013
Ano XLVII
EXPEDIÇÃO: 08/09/2013
2013
PÁGINAS: 318/305
Sumário
DOUTRINA
– Considerações sobre a liberação de valores e do
adimplemento da execução trabalhista – André Filippe
Loureiro e Silva .................................................................317
JURISPRUDÊNCIA
Destaques
ainda que gozadas na época própria, mas pagas
em atraso ............................................................................311
Prescrição
– O termo inicial para a contagem da prescrição
corresponde à data de evento do qual decorre
o suposto dano, ou seja, a data do óbito do
ex-empregado, e não à data de extinção do
contrato de trabalho ............................................................310
Aviso-prévio
– É inválida a cláusula convencional que suprime o
direito ao aviso-prévio em razão da contratação do
empregado pela empresa que sucede a prestação
de serviços junto à tomadora..............................................311
Rescisão do contrato de trabalho
– Mesmo após a vigência da Convenção nº 132 da OIT
permanece o entendimento que o empregado
dispensado por justa causa não tem direito às férias
proporcionais ......................................................................310
Dano moral
– Efetuar o controle das idas do empregado eu banheiro,
bem como a reprimenda dos funcionários que excediam
o que a reclamada entendia como tempo razoável,
constrange ..........................................................................311
Empregado público
– A transferência do regime jurídico de celetista para
estatutário implica extinção do contrato de trabalho,
não sendo cabível, no entanto, o pagamento das
verbas inerentes à dispensa imotivada...............................311
Férias
– O TST firmou entendimento de que é devido o
pagamento em dobro da remuneração de férias,
DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA
Responsabilidade subsidiária
– O tomador dos serviços, ao escolher o caminha da
terceirização, deve diligenciar quanto à idoneidade da
prestadora de serviços, observando se as obrigações
trabalhistas estão sendo cumpridas ...................................310
Sucessão trabalhista
– O fato do autor não ter trabalhado para a sucessora
não exclui a sua responsabilidade ou descaracteriza
a sucessão, pois o crédito trabalhista tem natureza
similar às obrigações propter rem.......................................309
ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA
– Terceirização – Empresa de Telefonia Celular –
Vínculo de Emprego com a Tomadora dos Serviços..........309
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CONSULTORIA TRABALHISTA
Doutrina
CONSIDERAÇÕES SOBRE A LIBERAÇÃO DE VALORES
E DO ADIMPLEMENTO DA EXECUÇÃO TRABALHISTA
ANDRÉ FILIPPE LOUREIRO E SILVA
Advogado – Pós-Graduando em Direito do Trabalho e Processo do
Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG)
Sumário: Introdução; 1. Considerações sobre a Execução;
2. Garantia do Juízo e Liberação de Valores; Conclusão; Referências Bibliográficas.
Introdução
A execução trabalhista é a fase do processo em que se
impõe o cumprimento do que foi determinado pela Justiça, o que
inclui a cobrança forçada feita a devedores para garantir o pagamento de direitos. A fase de execução só começa se houver
condenação ou acordo não cumprido na fase de conhecimento,
em que se discutiu ou não a existência de direitos.
O processo de execução trabalhista é regido pela Consolidação das Leis do Trabalho, nos artigos 876 a 892, cujas seções
têm os seguintes subtítulos: das disposições preliminares, do
mandado e da penhora, dos embargos à execução e da sua
impugnação, do julgamento e dos trâmites finais da execução, da
execução por prestações sucessivas.
Na Justiça do Trabalho tem prevalência a execução por
quantia certa, em que o objeto é a expropriação de bem do devedor para pagamento do credor, e cuja forma de executar está
prevista no artigo 880 da CLT, sendo importante também o artigo
883:
Art. 880 – Requerida a execução, o juiz ou presidente do
tribunal mandará expedir mandado de citação do executado, a fim
de que cumpra a decisão ou o acordo no prazo, pelo modo e sob as
cominações estabelecidas ou, quando se tratar de pagamento em
dinheiro, inclusive de contribuições sociais devidas à União, para
que o faça em 48 (quarenta e oito) horas ou garanta a execução,
sob pena de penhora.
(...)
Art. 883 – Não pagando o executado, nem garantindo a
execução, seguir-se-á penhora dos bens, tantos quantos bastem
ao pagamento da importância da condenação, acrescida de
custas e juros de mora, sendo estes, em qualquer caso, devidos a
partir da data em que for ajuizada a reclamação inicial. (BRASIL,
1943)
Tal procedimento é de grande importância uma vez que a
maioria dos processos trabalhistas adentram esta fase devido o
não cumprimento voluntária da sentença ou a não concordância
com a mesma que enseja a interposição de recursos.
DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA
Importante também destacar o disposto no artigo 769 que
prevê expressamente a aplicação subsidiaria do direito processual comum:
Art. 769 – Nos casos omissos, o direito processual comum
será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto
naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.
(BRASIL, 1943)
Nas palavras do Doutor Francisco Gérson Marques de
Lima, tal aplicação deve ser analisada caso a caso e verificada
sua real aplicabilidade, não podendo generalizar o uso de tal
recurso:
A generalização é temerária, escancara as portas da
Justiça do Trabalho para a invasão pelo Processo Civil e submete
o Processo do Trabalho à degradação. As recentes alterações do
CPC, p. ex., são bastante empolgantes. A um olhar desatento,
elas aparentam ser mais benéficas e modernas do que as disposições processuais da CLT. Logo, a tendência é lançar-se mão
daquelas em detrimento destas. (LIMA, 2013).
Assim sendo, como se verifica, tal aplicação não é ilimitada
e irrestrita; tal recurso deve ser utilizado somente quando da omissão da legislação trabalhista, bem como compatibilidade do direito
processual comum aos ditames e preceitos trabalhistas.
1. Considerações sobre a execução
Inicialmente, deve-se distinguir à execução provisória da
definitiva não existe diferença ontológica entre as duas modalidades, tendo em vista que a provisoriedade é do título executivo e
não do procedimento executivo em si. O fato de a decisão judicial
poder sofrer algum tipo de reforma pelos tribunais é que determina
o caráter não definitivo da execução. (CORDEIRO, 2009, p. 858)
Assim sendo a distinção é somente quanto ao modo da
execução, pois pode ser que estejamos diante da execução definitiva, ou da execução provisória, dependendo do estado em que se
encontre o processo.
O art. 475 – I, § 1º, do Código de Processo Civil (CPC) nos
traz a distinção entre as duas formas de execução, a saber:
Art. 475-I – O cumprimento da sentença far-se-á conforme
os arts. 461 e 461-A desta Lei ou, tratando-se de obrigação por
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quantia certa, por execução, nos termos dos demais artigos deste
Capítulo.
§ 1º – É definitiva a execução da sentença transitada em
julgado e provisória quando se tratar de sentença impugnada
mediante recurso ao qual não foi atribuído efeito suspensivo.
(BRASIL, 1973)
Dentro destas considerações nos ensina Araken de Assis:
(...) é definitiva a execução fundada em sentença transitada
em julgado. E, ao revés, a execução provisória se origina de
sentença impugnada por recurso “ao qual não foi atribuído efeito
suspensivo. (ASSIS, 2009)
Verificamos assim que nas disposições estabelecidas no
CPC há clara distinção entre a execução definitiva, quando se
executa sentença transitada em julgado e a execução provisória
quando se executa sentença combatida por recurso, ao qual não
fora atribuído efeito suspensivo.
Já a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), ao tratar da
matéria no art. 876, não faz tal distinção entre as modalidades de
execução, mas tão somente afirma que as decisões passadas em
julgado ou das que não tenha recurso com efeito suspensivo são
passíveis de execução, a saber:
Art. 876 – As decisões passadas em julgado ou das quais
não tenha havido recurso com efeito suspensivo; os acordos,
quando não cumpridos; os termos de ajuste de conduta firmados
perante o Ministério Público do Trabalho e os termos de conciliação firmados perante as Comissões de Conciliação Prévia serão
executada pela forma estabelecida neste Capítulo. (BRASIL,
1943)
O fato de não existir distinção clara na CLT, decorre do fato
de que os recursos na Justiça do Trabalho, em regra, não
possuem efeito suspensivo, de forma que uma vez prolatada a
decisão já estará esta passível de ser executada, tal entendimento
encontra-se consubstanciado no artigo 899 da CLT:
Art. 899 – Os recursos serão interpostos por simples petição e terão efeito meramente devolutivo, salvo as exceções
previstas neste Título, permitida a execução provisória até a
penhora. (BRASIL, 1943)
Diante destas considerações, verificamos que a CLT,
permitem que se inicie a execução provisória, e que se pratique
atos executivos de realização até mesmo de constrição do patrimônio do devedor, no caso a penhora de valores ou bens que
garantam o pagamento do débito trabalhista.
Fica então nítida a distinção entre a execução definitiva,
que é baseada em decisão, ou sentença já transitada em julgado e
a provisória que ocorre quando da interposição de recurso que não
caiba efeito suspensivo, sendo que a última é limitada até a
penhora, não podendo haver atos de alienação.
Importante também destacar o princípio da menor onerosidade do devedor previsto no art. 620 do CPC e também aplicável a
Justiça Trabalhista: Art. 620 – Quando por vários meios o credor
puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo
modo menos gravoso para o devedor. (BRASIL, 1973).
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Assim sendo, a execução trabalhista deve também
balancear o interesse do credor em ter seu direito adimplido
com o do devedor de ter o procedimento de execução de forma
menos gravosa de maneira a não atrapalhar sua atividade
empresarial.
2. GARANTIA DO JUÍZO E LIBERAÇÃO DE VALORES
2.1. Da liberação de valores na Execução Provisória –
Aplicabilidade do artigo 475-O do CPC
Conforme anteriormente dito, o artigo 899 da CLT prevê
expressamente que a execução provisória tem seu processamento até a penhora, assim sendo não poderiam ser realizados
nenhum ato alienação dos mesmos.
No entanto, muitos defendem a aplicação subsidiária do art.
475-O do CPC, caso tal regulamento seja utilizado na Justiça
Trabalhista, poderiam ser levantados valores, independentemente de caução, respeitando o limite de 60 salários-mínimos,
bem como a situação de necessidade do credor:
Art. 475-O – A execução provisória da sentença far-se-á, no
que couber, do mesmo modo que a definitiva, observadas as
seguintes normas:
(...) III – o levantamento de depósito em dinheiro e a prática
de atos que importem alienação de propriedade ou dos quais
possa resultar grave dano ao executado dependem de caução
suficiente e idônea, arbitrada de plano pelo juiz e prestada nos
próprios autos. (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005)
(...) § 2º – A caução a que se refere o inciso III do caput
deste artigo poderá ser dispensada: I – quando, nos casos de
crédito de natureza alimentar ou decorrente de ato ilícito, até o
limite de sessenta vezes o valor do salário-mínimo, o exequente
demonstrar situação de necessidade; II – nos casos de execução
provisória em que penda agravo perante o Supremo Tribunal
Federal ou o Superior Tribunal de Justiça (art. 544), salvo quando
da dispensa possa manifestamente resultar risco de grave dano,
de difícil ou incerta reparação. (BRASIL, 1973).
Tal aplicação foi inclusive discutida na 1ª Jornada de Direito
Material e Processual na Justiça do Trabalho, realizada entre os
dias 21 e 23 de novembro de 2007, em Brasília/DF, promovida
pelo Tribunal Superior do Trabalho – TST, Escola Nacional de
Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – ENAMAT, com
apoio do Conselho Nacional das Escolas de Magistratura do
Trabalho – CONEMATRA, e Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho – ANAMATRA. (FURTADO, 2013).
A referida jornada culminou na redação de 79 Enunciados,
apesar da grande semelhança com as súmulas editadas pelo TST,
tais enunciados não possuem nenhum valor vinculante e se
mostram apenas como entendimento dos participantes do evento.
Em específico o Enunciado 69 trata da aplicabilidade do artigo
475-O ao direito do trabalho, a saber:
69. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. APLICABILIDADE DO
ART. 475-O DO CPC NO PROCESSO DO TRABALHO. I – A expressão “...até a penhora...” constante da Consolidação das Leis
do Trabalho, art. 899, é meramente referencial e não limita a
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execução provisória no âmbito do direito processual do trabalho,
sendo plenamente aplicável o disposto no Código de Processo
Civil, art. 475-O. II – Na execução provisória trabalhista é admissível a penhora de dinheiro, mesmo que indicados outros bens.
Adequação do postulado da execução menos gravosa ao executado aos princípios da razoável duração do processo e da efetividade. III – É possível a liberação de valores em execução provisória, desde que verificada alguma das hipóteses do artigo 475-O,
§ 2º, do Código de Processo Civil, sempre que o recurso interposto
esteja em contrariedade com Súmula ou Orientação Jurisprudencial, bem como na pendência de agravo de instrumento no TST.”
(BRASÍLIA, 2007)
Apesar de todos os entendimentos a favor da aplicação do
artigo 475-O à Justiça do Trabalho como meio de efetivar a execução e acelerar o andamento processual, a corrente majoritária
entende não ser possível levantar o depósito recursal ou outros
valores no curso da execução provisória, sendo este inclusive o
entendimento atual do TST:
Não é possível fazer o levantamento do depósito recursal
antes da fase de execução. Para a 8ª Turma do Tribunal Superior
do Trabalho, o artigo 475 do Código de Processo Civil não pode
ser aplicado na Justiça do Trabalho. Com esse entendimento, a
Turma negou o pedido de ex-vendedor do Ponto Frio – cuja razão
social é Globex Utilidades S.A. – para fazer o levantamento do
depósito recursal no limite de 60 salários-mínimos. O saque foi
autorizado pelo Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais,
mas cassado pelo TST. Para o ministro Márcio Eurico Vitral
Amaro, relator do Recurso de Revista, a decisão do TRT ofende os
artigos 128 e 460 do CPC. Ao esclarecer os motivos da decisão da
8ª Turma, o relator afirmou que o TRT, aplicando o artigo 475-O do
CPC, facultou ao trabalhador o levantamento do depósito recursal
sem o correspondente pedido do autor. Além disso, o relator
destacou que o TST “firmou entendimento no sentido de que o
dispositivo em questão – artigo 475-O – é inaplicável no processo
do trabalho. (MELO, 2013)
Em um primeiro momento parece que a aplicação do
artigo 475-O resolveria alguns problemas existentes atualmente
como a demora do credor em receber seus créditos, vez que é
necessário o trânsito em julgado da decisão; porém neste caso a
aplicação subsidiária do Código de Processo Civil vai de encontro a disposição expressa da CLT, portanto temerária sua aplicação.
Assim sendo, apesar dos entendimentos contrários, no
curso da execução provisória somente podem ser realizados atos
executórios até a penhora, sendo vedados quaisquer atos de alienação ou transferência de valores.
2.2. Depósito recursal
O depósito recursal foi criado através do Decreto-Lei nº 75,
de 21 de novembro de 1966, com o objetivo de frear a interposição
sistemática de recursos protelatórios por parte dos empregadores,
como vemos das considerações do referido Decreto-Lei:
Considerando o imperativo de coibir os abusos de direito
que se têm verificado na retenção ou retardamento indevidos de
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salários e de outros pagamentos devidos aos empregados por
parte de empresas, ainda mais prolongados por meio de sucessivos recursos judiciais protelatórios;
Considerando que esses fatos, geradores de tensões sociais, não só pela injustiça social que representam, como pelo
efetivo desamparo em que vem deixando, meses a fio consideráveis grupos de trabalhadores, têm levado o Governo a intervir
seguidamente para encontrar soluções momentâneas, sem que,
entretanto o abuso possa ser adequadamente suprimido;
Considerando que as tensões sociais, daí resultantes
afetam necessariamente à segurança nacional; (BRASIL, 1966)
Na CLT, o depósito recursal é previsto no § 1º do art. 899 da
CLT, e é exigência legal para a interposição de determinados
recursos, não possuindo, no entanto, a natureza jurídica de taxa
judicial ou emolumento, mas sim de “garantia de execução futura”
conforme interpretação dada pelo TST, através da Instrução
Normativa 03 de 12-3-93.
O depósito recursal é feito na conta vinculada do FGTS do
empregado ou conta para depósito judicial na CEF, os valores são
atualizados anualmente pelo Tribunal Superior do Trabalho.
(BRASIL, 1993)
De acordo com a referida Instrução Normativa com o trânsito em julgado da ação, os valores depositados em juízo durante o
curso do processo devem ser convertidos em penhora e abatidos
do valor total da condenação. Assim, o mandado de citação,
previsto no artigo 880 da CLT, deve conter apenas a diferença
restante (valor da condenação com o desconto do valor já recolhido). (BRASIL, 1993).
O depósito recursal é a maior garantia do empregado de ter
seus créditos adimplidos, vez que possui natureza de garantia de
execução futura e ocorrendo o trânsito em julgado já podem ser
liberados os valores até o montante da condenação, pela expedição de alvará para o reclamante.
2.3. Da penhora de bens e valores
Segundo Liebman (1980) “a penhora é o ato pelo qual o
órgão judiciário submete a seu poder imediato determinados bens
do executado, fixando sobre eles a destinação de servirem à satisfação do direito do exequente, tem, pois natureza de ato executório”
Os bens passíveis de penhora, bem como a gradação
que, via de regra, deve ser respeitada encontra-se no art. 655 do
CPC:
Art. 655 CPC – A penhora observará, preferencialmente,
a seguinte ordem: I – dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira; II – veículos de via terrestre;
III – bens móveis em geral; IV – bens imóveis; V – navios e aeronaves; VI – ações e quotas de sociedades empresárias; VII – percentual do faturamento de empresa devedora; VIII – pedras e metais
preciosos; IX – títulos da dívida pública da União, Estados e
Distrito Federal com cotação em mercado; X – títulos e valores
mobiliários com cotação em mercado; XI – outros direitos. (BRASIL, 1973).
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O artigo 649 do CPC nos fornece regras sobre a impenhorabilidade de alguns bens, entre eles os bens de família, salários,
bem necessários ao exercício da profissão entre outros. Porém tal
impenhorabilidade não pode ser tido como absoluta.
Acerca da relativização da impenhorabilidade, o autor Maurício Maidame, traz as seguintes considerações:
Por isso, propõe-se que o juiz possa, em certos casos, ultrapassar as barreiras rígidas da impenhorabilidade, desde que
respeite o núcleo essencial dos direitos do devedor. A proteção
dos interesses do credor encontra fundamentação no catálogo de
direitos fundamentais (fundamentação forte) e, por isso, mantendo-se a dignidade do devedor, propõe-se a penhorabilidade de
parcela da remuneração, de parcela da residência e, em casos
muito restritos, a penhora de bens públicos – o que não viola em
absoluto a segurança jurídica, posto que também estão no sistema a garantia de tutela jurisdicional efetiva, a propriedade do
credor e os deveres fundamentais da pessoa para com as outras
da comunidade. O sistema de garantias fundamentais é “via de
mão dupla”, e o legislador, ao contemplar soluções que protegem
somente o devedor, viola a igualdade, atraindo a “pretensão de
consideração”, o que permite, no caso concreto, o ajuste da ordem
jurídica pelo magistrado. Um regime muito liberal de impenhorabilidade, além de causar prejuízos ao credor, leva a uma degradação social ruinosa. Encarecimento do crédito, consumo e crescimento econômico refreados, descrédito na justiça, além de construir regra que convida a uma enorme gama de fraudes e burlas –
ante a proteção exagerada que dá ao devedor". (MAIDAME, 2007,
p. 184, apud MATTOS, 2013).
Assim sendo até mesmo o salário ou bens de família,
podem ser penhorados diante do caso em concreto, ainda mais
por considerarmos que os créditos trabalhistas possuem natureza
alimentar, desta forma, manter a impenhorabilidade total do salário parcela de mesma natureza não seria razoável.
Em relação a gradação de bens verifica-se que o dinheiro,
em espécie ou em depósito possui preferência sobre todos os
outros bens, devido a sua maior fungibilidade e facilidade de
repasse ao credor.
No entanto, em se tratando de execução provisória a penhora em dinheiro não deve prevalecer, caso o devedor tenha
oferecido outro bem a penhora, tal entendimento está consubstanciado na Súmula 417 do TST, a saber:
Súmula nº 417 – TST – Res. 137/05 – DJ 22, 23 e 24-8-2005 –
Conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 60, 61 e 62 da
SDI-II.
Mandado de Segurança – Penhora em Dinheiro – Justiça
do Trabalho
I – Não fere direito líquido e certo do impetrante o ato judicial
que determina penhora em dinheiro do executado, em execução
definitiva, para garantir crédito exequendo, uma vez que obedece
à gradação prevista no art. 655 do CPC. (ex-OJ nº 60 – inserida em
20-9-2000).
II – Havendo discordância do credor, em execução definitiva, não tem o executado direito líquido e certo a que os valores
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penhorados em dinheiro fiquem depositados no próprio banco,
ainda que atenda aos requisitos do art. 666, I, do CPC. (ex-OJ
nº 61 – inserida em 20-9-2000).
III – Em se tratando de execução provisória, fere direito
líquido e certo do impetrante a determinação de penhora em
dinheiro, quando nomeados outros bens à penhora, pois o executado tem direito a que a execução se processe da forma que lhe
seja menos gravosa, nos termos do art. 620 do CPC. (ex-OJ
nº 62 – inserida em 20-9-2000). (BRASIL, 2005).
Portanto, vez que a execução provisória se limita até a
penhora dos bens suficientes para garantir à execução, sendo
vedada a alienação dos mesmos, basta a empresa nomear bens a
penhora para evitar a constrição em dinheiro, vez que a execução
deve se processar de forma menos gravosa. Em se tratando de
execução definitiva o dinheiro ainda possui prevalência sobre ou
outros bens.
Em relação à ordem estabelecida de bens o Superior Tribunal de Justiça, também têm entendido que: “A ordem legal estabelecida para a nomeação de bens à penhora não tem caráter rígido,
devendo sua aplicação atender às circunstâncias do caso
concreto, à potencialidade de satisfazer o crédito e à forma menos
onerosa para o devedor” (RSTJ 127/343; no mesmo sentido temos
RSTJ 150/405).
Procedimento que merece destaque na Justiça do Trabalho
é a denominada penhora on-line, que é realizada a partir da solicitação eletrônica emitida pela justiça do trabalho através da internet.
Tal procedimento tem por objetivo agilizar o cumprimento
das decisões e acordos judiciais, dando maior celeridade aos
processos em fase de execução, o Banco Central, juntamente
com o Tribunal Superior do Trabalho (TST) firmaram esse convênio denominado BACEN-JUD para possibilitar a solicitação de
informações on-line sobre a existência de contas bancárias e aplicações financeiras de titularidade das empresas ou de seus
sócios, bem como de pessoas físicas devedoras.
A penhora on-line (BACEN-JUD) consiste na penhora de
valores existentes na conta do devedor até o limite da condenação
penhora em contas bancarias da empresa, o problema é que são
bloqueadas várias contas, às vezes todas, e o desbloqueio não é
tão rápido quanto o bloqueio. Alguns argumentam que violaria o
sigilo bancário uma vez que se tem acesso a todas as contas da
empresa, porém por ser ordem judicial tal fundamentação não é
válida. (VILLANOVA, 2013).
O sistema da penhora on-line veio apenas para facilitar o
cumprimento da execução, não alterando em anda as disposições
legais. No mesmo sentido:
Todos os procedimentos legais adotados anteriormente
estão sendo respeitados. Vale frisar novamente que, a única
mudança sentida e que agilizou o cumprimento da prestação jurisdicional, foi no sentido de que a ordem de bloqueio expedida pelo
magistrado, chega agora ao Banco Central, sem passar por
nenhum agente financeiro deste banco, ou seja, o sistema on-line
transmite a ordem para as centrais de computação dos bancos e
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não mais as agências bancárias onde os devedores têm conta,
evitando desse modo, que gerentes informem ao devedor que sua
conta-corrente estará sujeita a bloqueio. Observa-se que este
procedimento, não afeta em nada a legislação processual.
(MACHADO, 2004)
A penhora por tal sistema somente é realizada após a intimação do credor e somente se o mesmo se mantiver inerte não
garantindo o juízo, tal sistema garante maior agilidade à execução,
porém deve ser usado com cautela e discricionariedade para
evitar abusos e excessos na execução.
Fato que merece atenção quando se trata de penhora de
dinheiro, bem que ocupa o primeiro lugar na escala de preferência,
é a impenhorabilidade do capital de giro da empresa devedora,
dos valores necessários para manutenção da mesma, quando
existem outros bens livres capazes de garantir o juízo.
Entendimento similar se encontra na Orientação Jurisprudencial (OJ) 93 da Seção de Dissídios Individuais II (SDI-II), que
prevê a penhora parcial da renda mensal ou faturamento da
empresa:
OJ 93 SDI-II. MANDADO DE SEGURANÇA. POSSIBILIDADE DA PENHORA SOBRE PARTE DA RENDA DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL (inserida em 27-5-2002) É admissível a penhora sobre a renda mensal ou faturamento de empresa, limitada a determinado percentual, desde que não comprometa o desenvolvimento regular de suas atividades. (BRASIL
2002).
O capital de giro não deve ser penhorado para que não seja
paralisada a atividade econômica da empresa, o que acabaria por
afetar seus próprios empregados, ademais a preservação da
empresa não interessa apenas aos investidores, interessa ao
Estado e à sociedade. (NASCIMENTO, 2011)
2.4. Da Carta de Fiança
A Carta de Fiança Bancária está expressamente prevista
em nossa legislação no artigo 656, § 2º do CPC, o qual determina
que ao valor discutido seja acrescido o percentual de 30%. (BRASIL, 1973).
Referido instrumento também encontra previsão no artigo
9º, inciso II, da Lei 6.830/80, e a substituição de dinheiro por fiança
bancária está expressamente prevista no artigo 15, I da mesma lei,
perfeitamente aplicável ao Processo do Trabalho, face ao disposto
no artigo 889 da CLT:
Art. 889 – Aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente
Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais
para a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal. (BRASIL, 1943)
Tal espécie de fiança vem sendo utilizada com sucesso
para garantia dos débitos tributários em execuções fiscais promovidas pela Fazenda Pública (Lei 6.830/80), tendo em vista o tempo
de discussão em tais ações, não raro, exceder cinco anos. (ROMANO, 2013).
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A carta de fiança bancária equivale a dinheiro para efeito da
gradação de bens penhoráveis, tal é o entendimento da OJ 59 da
SDI-II, a saber:
OJ-SDI2-59 MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA.
CARTA DE FIANÇA BANCÁRIA. A carta de fiança bancária equivale a dinheiro para efeito da gradação dos bens penhoráveis,
estabelecida no art. 655 do CPC. (BRASIL, 2000)
A utilidade deste método é que garante a empresa a segurança de manejar recursos as instâncias superiores, sem a preocupação de ter suas contas ou as contas de seus sócios penhoradas ou bloqueadas.
Caso já tenha sido realizado o bloqueio ou penhora de valores, devido a equivalência da carta de fiança a dinheiro é perfeitamente possível a substituição desta por aquela.
Na prática não há qualquer diferença entre o dinheiro depositado e a carta de fiança bancária, bastando à prévia intimação da
instituição financeira fiadora para depositar o valor atualizado do
débito em uma conta do juízo, o que geralmente ocorre, sem questionamentos, em dois dias. (ROMANO, 2013)
2.5. Do artigo 475-J do CPC
Em se tratando de execução trabalhista e pagamento/liberação de valores cabe mencionar a discussão acerca da aplicação
ou não do art. 475-J do CPC:
Art. 475-J – Caso o devedor, condenado ao pagamento de
quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de
quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa
no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e
observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á
mandado de penhora e avaliação. (BRASIL, 1973)
Muitos tribunais e doutrinadores entendem pela aplicação
de tal regra ao processo do trabalho entre eles os Tribunais Regionais da 3º e da 18ª Região, que consubstanciaram tal entendimento em suas súmulas 30 e 18, respectivamente.
No entanto, o Tribunal Superior do Trabalho (TST),
contudo, vem adotando entendimento contrário.
Segundo a Corte Superior, o direito processual do trabalho
contém regramento específico para execução de sentenças, nos
termos do art. 876 e seguintes da CLT, não se justificando a aplicação subsidiária de regra do direito processual comum, cuja sistemática revela-se, ademais, incompatível com aquela aplicável na
execução trabalhista, em que o prazo para pagamento ou penhora
é de 48 horas (art. 880 da CLT). Entende-se ainda, que a normatização contida no art. 475-J do CPC tem previsão correlata no
artigo 883 da CLT, o que afasta a aplicação supletiva daquele
preceito legal. (MAIA, 2013)
De acordo com a 2ª Turma do TST: “A aplicação subsidiária
das normas de direito processual comum ao direito processual do
trabalho só é possível quando houver omissão nas normas celetistas e compatibilidade das normas supletivas com o direito do
trabalho. Tendo o direito processual do trabalho regramento específico para execução de sentenças, não se justifica a aplicação
subsidiária de regra do direito processual comum, cuja sistemática, ademais, revela-se incompatível com aquela aplicável na
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FASCÍCULO SEMANAL 36/2013
execução trabalhista. A normatização contida no artigo 475-J do
CPC para ausência de pagamento do executado tem previsão
correlata no artigo 883 da CLT, o que afasta a aplicação supletiva
daquele preceito legal, sob pena de afronta ao princípio do devido
processo legal...” (TST, 2ª T., RR – 107700-96.2007.5.20.0005,
Rel. Min. Guilherme Augusto Caputo Bastos, DJ de 11-6-2010).
Conclusão
O Direito do Trabalho possui regras especificas ao tratar da
execução, em vários aspectos se utiliza o Código de Processo
Civil de maneira subsidiária, porém tal utilização deve ser feita
apenas em casos de omissão e compatibilidade com o processo
trabalhista o que muitas vezes não ocorre.
Existem várias maneiras de se garantir o juízo e de se
cobrar os valores devidos na execução trabalhista, sendo utilizado
amplamente o sistema Bacen-Jud o que garante maior efetividade
e velocidade ao procedimento executório.
Cabe ressaltar que a liberação de valores somente é possível em sede de execução definitiva, quando há o trânsito em
julgado; sendo que na execução provisória, apesar de entendimentos contrários, não podem ser realizados atos além da
penhora e garantia do juízo.
Apesar dos esforços de se utilizar as inovações do Código
de Processo Civil para agilizar a execução trabalhista não há omissões na CLT que ensejem tais aplicações, tratam-se apenas de
disposições diferentes. Caso se deseje agilizar o procedimento
executório, possibilitando a liberação de valores na execução
provisória, bem como aplicação de multas deve-se rever o ordenamento atualmente vigente e não procurar supostas melhorias na
legislação comum.
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Revista dos Tribunais, 2009.
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Trabalho, e dá outras providências. Acesso em: 3 abril 2013.
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312
COAD
FASCÍCULO SEMANAL 36/2013
CONSULTORIA TRABALHISTA
Jurisprudência
ATLETA PROFISSIONAL – JOGADOR DE FUTEBOL –
DIREITO DE IMAGEM E DE ARENA – COMPETÊNCIA
MATERIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO
não dois como pretendia a recorrente. (TRT-1ª R. – RO 1175-25.
2010.5.01.0002 – Rel. Des. José Antonio Teixeira da Silva – Publ.
em 17-7-2013)
@144585
– Os direitos de imagem e de arena são pagos em virtude
do contrato de trabalho celebrado entre autor e ré, logo, as
pretensões a eles relativas devem ser julgadas pela Justiça do
Trabalho, nos termos do artigo 114/CF. Não é a natureza intrínseca da parcela postulada o critério definidor da competência,
até porque, para se obter uma decisão sobre essa natureza – de
mérito, pois –, primeiramente a lide deve ter sido conhecida por
um Juízo competente segundo as regras processuais em vigor.
O que fixa a competência material é a fonte da obrigação, no
caso, o contrato de emprego, do qual emanam a causa de pedir e
o pedido delimitadores da lide. Competência material da Justiça
do Trabalho que se confirma. Sentença mantida. (TRT-9ª R. –
RO 31580-2011-004-09-00-4 – Relª Desª Sueli Gil El-Rafihi –
Publ. em 2-7-2013)
@144726
DANO MORAL – RESTRIÇÃO AO USO DE BANHEIROS –
CONFIGURAÇÃO
AVISO-PRÉVIO – DISPENSA DE CONCESSÃO PREVISTA EM CONVENÇÃO COLETIVA – CONTINUIDADE DA
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PARA A MESMA TOMADORA – NULIDADE DA CLÁUSULA CONVENCIONAL
– A contratação do empregado pela empresa que sucede a
prestação de serviços junto à tomadora não autoriza a flexibilização
de direito elevado pelo sistema jurídico a um patamar mínimo inderrogável, como é o caso do aviso-prévio – art. 7º, XXI, da Constituição Federal. As tratativas de interesses da tomadora e das prestadoras de serviços não levam em consideração a bilateralidade do
contrato, pois, sob o pálio de continuidade da prestação de serviço,
na verdade apenas elas se beneficiam com a malversação da
disponibilidade do direito ao aviso-prévio, colocando o empregado
na dependência de uma eventual contratação pela empresa vencedora do pleito concorrencial. Nesta ordem, é inválida a cláusula
convencional que suprime o direito ao aviso-prévio. Recurso ordinário da Reclamada a que se nega provimento, neste ponto. (TRT-9ª
R. – RO 1169-2012-095-09-00-7 – Rel. Des. Ubirajara Carlos
Mendes – Publ. em 28-6-2013)
@144596
CONTRATO TEMPORÁRIO – POSTERIOR CONTRATAÇÃO DO EMPREGADO PELA EMPRESA – UNICIDADE
CONTRATUAL
– Se a própria empresa de trabalho temporário, em seguida
ao contrato supostamente amparado pela Lei nº 6.019/74, firma
contrato de trabalho com o autor em atividade terceirizada, prestando serviços para a mesma tomadora, afastado está o requisito
da necessidade transitória e, por conseguinte, a legalidade do
pseudocontrato de trabalho temporário, sendo forçoso reconhecer
a existência de apenas um contrato de emprego entre as partes e
DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA
– Não há como entender que essas práticas constituem
desdobramento da sujeição do empregado ao poder diretivo do
empregador, no qual se compreende o poder de controle. Na
realidade, ao adotar tais práticas, o empregador está entrando
na intimidade de seu subordinado, o que não está previsto no
contrato de trabalho por eles firmado, porquanto, efetuar o
controle das idas do empregado ao banheiro, bem como a reprimenda dos funcionário que excediam o que a reclamada entendia como tempo razoável, constrange, e por vezes até obsta
regular e necessário exercício de necessidades fisiológicas.
Recurso do autor a que se nega provimento quanto à majoração
da indenização por danos morais. (TRT-9ª R. – RO 1853-2012678-09-00-2 – Rel. Des. Archimedes Castro Campos Júnior –
Publ. em 9-7-2013)
@144711
EMPREGADO PÚBLICO – MUDANÇA DE REGIME CELETISTA PARA ESTATUTÁRIO – EXTINÇÃO DO CONTRATO
– A transferência do regime jurídico de celetista para estatutário implica extinção do contrato de trabalho, consoante
entendimento preconizado na Súmula nº 382 do TST. Contudo,
tal modalidade de terminação não se reveste dos mesmos efeitos conferidos à extinção sem justo motivo por iniciativa do
empregador. No caso, a alteração do regime se dá por imposição
legal, e não pelo mero exercício do poder potestativo do empregador. Assim, não é cabível o pagamento das verbas inerentes à
dispensa imotivada sem justo motivo. (TRT-1ª R. – RO 1190-54.
2011.5.01.0003 – Rel. Des. Flávio Ernesto Rodrigues Silva –
Publ. em 17-7-2013)
@144602
FÉRIAS – GOZO NA ÉPOCA PRÓPRIA E REMUNERAÇÃO FORA DO PRAZO – CABIMENTO DA DOBRA
– Discute-se nos autos a aplicação da dobra prevista no
art. 137 da CLT para o caso de férias gozadas no período concessivo, mas pagas em atraso. O art. 145 da CLT determina o pagamento da remuneração das férias e, se for o caso, do abono referido no art. 143, também da CLT, até 2 – dois – dias antes do início
do respectivo período, sem, contudo, fixar expressamente nenhuma penalidade pelo descumprimento desse prazo. Ocorre que
o completo gozo das férias depende tanto do afastamento do
trabalho quanto dos recursos financeiros necessários para que o
empregado possa usufruir do período de descanso e lazer para
311
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FASCÍCULO SEMANAL 36/2013
recuperar-se física e mentalmente para retornar ao labor. Tanto é
assim que este Tribunal Superior firmou entendimento no sentido
de que é devido o pagamento em dobro da remuneração de férias,
ainda que gozadas na época própria, mas pagas em atraso. Inteligência da OJ-SBDI-1-TST-386. Recurso de revista conhecido por
contrariedade à OJ 386 da SBDI-1/TST e provido. (TST – RR
192900-08.2011.5.21.0004 – Rel. Min. Alexandre de Souza Agra
Belmonte – Publ. em 21-6-2013)
@144693
PRESCRIÇÃO – RECLAMAÇÃO PROPOSTA POR SUCESSORES DO EX-EMPREGADO FALECIDO – DOENÇA
OCUPACIONAL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E
MATERIAIS
– O termo inicial para a contagem da prescrição corresponde à data do evento do qual decorre o suposto dano, ou seja, a
data do óbito do ex-empregado, que pereceu em decorrência de
doença ocupacional acometida no curso da relação de emprego; e
não à data de extinção do contrato de trabalho. Assim se conclui
tendo em vista que os autores, sucessores do ex-empregado falecido, vindicam direito próprio, razão pela qual a actio nata passou a
existir quando do falecimento do ex-empregado, pois até então
não havia direito próprio a exercitar. E, desta forma, enquanto não
existir a possibilidade de ação, não flui o prazo de prescrição ou de
decadência. (TRT-3ª R. – RO 3075-2012-091-03-00-0 – Rel. Des.
Cesar Machado – Publ. em 15-7-2013)
@144613
RELAÇÃO DE EMPREGO – CONTINUIDADE DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS APÓS RESCISÃO DE CONTRATO – PROVA ORAL
– O contrato de trabalho é um contrato realidade por força
do Princípio da Primazia da Realidade. Como se sabe, o Direito do
Trabalho tem como um de seus princípios informadores o da
primazia da realidade sobre a forma, sendo certo que a definição
da natureza da relação jurídica havida entre as partes depende da
análise das circunstâncias fáticas em que se desenvolveu a prestação dos serviços. E a prova oral confirmou a tese autoral de que,
apesar de ter encerrado formalmente o vínculo de emprego, continuou prestando serviços, sem solução de continuidade. (TRT-1ª
R. – RO 154700-78.2007.5.01.0019 – Rel. Des. Leonardo Dias
Borges – Publ. em 17-7-2013)
@144589
RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO – JUSTA
CAUSA – FÉRIAS PROPORCIONAIS – VERBA INDEVIDA
– Esta Corte, ao avaliar a matéria, sob o prisma da Convenção nº 132 da OIT – Decreto nº 3.197/99 –, entende que, mesmo
após a vigência da referida convenção, o empregado dispensado
por justa causa não tem direito às férias proporcionais. Incidência da
Súmula nº 171. Precedentes nesse sentido. Recurso de revista a
que se dá provimento. (TST – RR 2217-02.2011.5.15.0062 – Relª
Minª Kátia Magalhães Arruda – Publ. em 28-6-2013) @144688
DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA
CONSULTORIA TRABALHISTA
RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO –
REVERSÃO DE PEDIDO DE DEMISSÃO – TRANSFERÊNCIA ABUSIVA – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA
NECESSIDADE DO SERVIÇO
– Evidencia-se abusiva a transferência da empregada para
cidade distante do local de prestação de serviços contratado,
contra a sua vontade, sem qualquer ajuda financeira e sem a justificativa alusiva à necessidade de serviço da empresa. No caso,
criou a reclamada situação incompatível com a manutenção do
contrato de trabalho firmado entre as partes, o que possibilita o
reconhecimento dos requisitos da rescisão indireta do contrato de
trabalho, com a reversão da demissão a pedido em rescisão sem
justa causa. (TRT-9ª R. – RO 385-2012-026-09-00-0 – Rel. Des.
Luiz Eduardo Gunther – Publ. em 12-7-2013)
@144710
RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR – ACIDENTE
DO TRABALHO – NEXO ETIOLÓGICO
– Se a reclamada conhecia os riscos presentes no ambiente de trabalho do seu empregado e ainda assim não lhe proporcionou as medidas preventivas eficientes contra os efeitos deletérios
dos riscos, visando eliminar definitiva e totalmente a exposição,
praticou ato ilícito que enseja a reparação por danos estéticos e
morais. (TRT-3ª R. – RO 485-2012-142-03-00-7 – Rel. Convocado
Juiz Rodrigo Ribeiro Bueno – Publ. em 15-7-2013)
@144615
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA – TOMADOR DOS
SERVIÇOS – IDONEIDADE DA PRESTADORA – DEVER
DE FISCALIZAR
– O tomador dos serviços, ao escolher o caminho da terceirização, deve diligenciar quanto à idoneidade da empresa prestadora de serviços, observando se as obrigações assumidas no
contrato de trabalho dos empregados estão sendo cumpridas.
Caso contrário, responderá pelos débitos contraídos pela contratada – prestadora de serviços –, ainda que indiretamente – inteligência dos itens IV e V da Súmula nº 331 do C. TST. Recurso da
reclamada a que se nega provimento. (TRT-1ª R. – RO 1595-74.
2011.5.01.0461 – Rel. Des. Mário Sérgio Medeiros Pinheiro –
Publ. em 16-7-2013)
@144604
SEGURO-DESEMPREGO – INDENIZAÇÃO SUBSTITUTIVA – CISÃO EMPRESARIAL – RECONHECIMENTO DE
UNICIDADE CONTRATUAL
– O Tribunal Regional manteve a condenação da reclamada ao pagamento de indenização substitutiva do seguro-desemprego em face da previsão contida nos arts. 10 e 448 da CLT,
de acordo com os quais a alteração na estrutura da pessoa jurídica
não afeta os contratos de trabalho e o direito adquirido dos respectivos empregados. Além disso, considerando a situação fática dos
autos – unicidade contratual –, entendeu preenchido o requisito
atinente ao tempo para fins de atendimento à previsão contida no
art. 3º da Lei 7.998/90. Desse modo, não se divisa contrariedade à
Súmula 389 desta Corte, pois o entendimento adotado no acórdão
recorrido não infirma o conteúdo do aludido verbete, que nem
310
COAD
FASCÍCULO SEMANAL 36/2013
sequer aborda os fundamentos examinados pelo juízo de segundo
grau. Recurso de revista não conhecido. (TST – RR 97300-05.
2008.5.11.0016 – Relª Minª Delaíde Miranda Arantes – Publ. em
21-6-2013)
@144700
SUCESSÃO TRABALHISTA – CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO – CONTRATOS EXTINTOS
– A simples substituição de um concessionário de serviço
público por outro não acarreta a sucessão, salvo se o novo
concessionário aproveitar do anterior, mesmo que parcialmente,
seu acervo, contratos, ponto, clientela, aviamento etc. O fato do
autor não ter trabalhado para a sucessora não exclui a sua responsabilidade ou descaracteriza a sucessão, pois o crédito trabalhista, seja de contrato vigente, seja de contrato extinto, tem natureza similar às obrigações propter rem ou de ônus reais. As obrigações de ônus reais ou as propter rem se caracterizam nas obrigações que decorrem da coisa. Só existem em razão da propriedade
ou da titularidade que o sujeito tem sobre a coisa. Situam-se entre
o direito real e o direito obrigacional. Como consequência do direito real, de onde provêm estas obrigações, a dívida trabalhista
segue a coisa – efeito sequela –, acompanhando-a em suas mutações subjetivas, isto é, segue o novo titular ou o detentor. (TRT-1ª
CONSULTORIA TRABALHISTA
R. – RO 99000-83.2009.5.01.0040 – Relª Desª Vólia Bomfim
Cassar – Publ. em 16-7-2013)
@144599
TERCEIRIZAÇÃO – ATIVIDADE DE LOGÍSTICA – ATIVIDADE-FIM DA TOMADORA – ILEGALIDADE
– Não foi carreado aos autos qualquer documento apto a
esclarecer as atividades desempenhadas pela primeira Ré em
prol – ou não – da segunda, notadamente para demonstrar especialização no serviço de logística por aquela incontroversamente
prestado. Omitindo as Rés toda e qualquer informação sobre o tipo
de relacionamento civil existente, impossibilitam a análise, quanto
à licitude no que concerne ao contrato de trabalho. Não bastasse,
o ato constitutivo da segunda Ré arrola em seu objeto social o
serviço de logística. A terceirização de função diretamente ligada à
atividade-fim da tomadora é totalmente ilegal e infringe o disposto
no art. 9º da CLT. A contratação do Autor através da primeira
Reclamada é nula de pleno direito e tem como consequência o
reconhecimento de vínculo de emprego diretamente com a tomadora do serviço, pois se afigura nítida a hipótese de “terceirização
ilícita”. Recurso das Rés a que se nega provimento. (TRT-9ª R. –
RO 1140-2011-965-09-00-6 – Rel. Des. Ubirajara Carlos Mendes – Publ. em 19-7-2013)
@144571
Acórdão na Íntegra
TERCEIRIZAÇÃO – EMPRESA DE TELEFONIA CELULAR –
VÍNCULO DE EMPREGO COM A TOMADORA DOS SERVIÇOS
TST – RR 3604-09.2010.5.12.0050, publ. em 28-6-2013
ACÓRDÃO
RECURSO DE REVISTA – EMPRESA DE TELEFONIA
CELULAR – TERCEIRIZAÇÃO – VÍNCULO DE EMPREGO COM
A TOMADORA DE SERVIÇOS. Não se pode concluir que o
art. 94, II, da Lei nº 9.472/97, ao dispor acerca da contratação de
terceiros para o “desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço”, esteja autorizando a terceirização da atividade-fim das empresas de telecomunicações, sob
pena de ferir o disposto no art. 170, caput, VIII, da Constituição da
República, pois a intermediação de serviço em área-fim das
empresas de telecomunicações culminaria na desvalorização do
trabalho humano e no comprometimento da busca do pleno emprego. Incidente a Súmula nº 331, I, do TST, segundo o qual a
contratação de trabalhador por empresa interposta é ilegal, formando-se vínculo diretamente com o tomador dos serviços. Recurso de revista a que se dá provimento.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de
Revista nº TST-RR-3604-09.2010.5.12.0050, em que é Recorrente Célia Modesto Pereira e são Recorridas Tmkt Serviços de
Marketing Ltda. e Claro S.A.
O Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região, mediante
acórdão a fls. 799/813, negou provimento ao recurso ordinário
interposto pela reclamante.
DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA
A reclamante interpôs recurso de revista, às fls. 845/867,
com fulcro no art. 896, a e c, da CLT.
Despacho de admissibilidade a fls. 969/970.
Contrarrazões apresentadas pela TMKT (fls. 973/978) e
pela Claro S.A. (fls. 979/986).
Os autos não foram remetidos ao Ministério Público do
Trabalho para emissão de parecer (art. 83, II, do RITST).
É o relatório.
VOTO
CONHECIMENTO
EMPRESA DE TELEFONIA CELULAR – TERCEIRIZAÇÃO – VÍNCULO DE EMPREGO COM A TOMADORA DE SERVIÇOS
O Tribunal Regional, quanto ao tema, decidiu:
“A permissão dada na Lei nº 9.472/97 (que dispõe sobre a
organização dos serviços de telecomunicações), art. 94, II, para a
contratação de terceiros para a execução de atividades inerentes,
retira do âmbito da ilegalidade a prestação de serviços em debate
nos autos, e faz dela exceção à regra geral contida no Direito do
Trabalho. Isto porque no Direito do Trabalho, em princípio, não se
admite que uma empresa transfira para outra os serviços que inte309
COAD
FASCÍCULO SEMANAL 36/2013
gram a sua atividade-fim, ou seja, serviços que deveriam ser por
ela mesma executados, estando correta a autora ao nominar essa
situação de terceirização ilícita e de, ainda, ponderar, dentre suas
consequências, a do reconhecimento de vínculo diretamente
entre o trabalhador e o tomador de seus serviços.
Contudo, no caso da telefonia, a legislação específica aplicável a esse tipo de serviço autoriza a terceirização de serviços
essenciais, pelo que não se poderia concluir, aqui, pela terceirização ilícita, ao menos sob o aspecto formal.
Daí porque, inclusive, despiciendas as discussões levantadas pela autora quanto à especificação de suas atividades, e
mesmo intenção de trazer aos autos todos os documentos listados
em sua manifestação de fls. 269-270.
A discussão quanto à essencialidade das atividades da
autora em relação ao cumprimento, pela segunda ré, de seu objeto
social, perde o objeto, diante da norma legal. Não obstante, é meu
entendimento, tal como lançado na sentença originária, não estar
a atividade da autora inserida na atividade-fim da segunda ré,
considerando o disposto em seu objeto social, já que era a autora,
em suma, operadora de teleatendimento.
De qualquer sorte, como já dito, ainda que assim não fosse,
a lei autoriza a terceirização havida, o que afasta os argumentos
de que irregular a contratação, sob tal aspecto.
De resto, a prova testemunhal não apresenta prova de ingerência da segunda ré nas atividades prestadas pela autora, pelo
que também sob esse aspecto não há levantar irregularidade na
prestação de serviços da autora, em favor da segunda ré.
Mantenho a sentença." (fls. 803/804)
Nas razões do recurso de revista (fls. 847/867), a reclamante sustenta que é ilícita a terceirização dos serviços de telemarketing, pois é atividade-fim da primeira reclamada (Claro S.A.),
empresa de telecomunicação, e, por essa razão, deve ser reconhecido o vínculo de emprego diretamente com ela, tomadora dos
serviços.
Alega que foram violados os arts. 3º, IV, 5º, caput, 7º, V, e
170, caput, VIII, todos da Constituição Federal e que foi contrariada a Súmula nº 331 do TST. Transcreve arestos para cotejo de
teses.
À análise.
Trata-se de debate acerca da licitude ou não da terceirização de serviços firmada entre as reclamadas, com base no art. 94,
II, da Lei nº 9.472/97, e de pedido de reconhecimento de vínculo de
emprego diretamente com a segunda reclamada, Claro S.A.
O TRT consignou que a reclamante prestava serviços relacionados com a atividade-fim da tomadora dos serviços, mas
considerou lícita a terceirização desses serviços em face do
art. 94, II, da Lei nº 94.72/97.
Assim, é aplicável, no caso, o item I da Súmula nº 331 do
TST, que dispõe:
“331. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS –
LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI
à redação) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e
31-5-2011.
I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é
ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos
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serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de
3-1-74)."
Observe-se que, nos termos da jurisprudência desta Corte,
a contratação de trabalhadores por empresa interposta (ou seja,
trabalhadores para a execução da atividade-fim da empresa tomadora dos serviços) é ilegal, pois evidencia a intenção da empresa
tomadora dos serviços de se eximir da responsabilidade pelo
cumprimento das obrigações trabalhistas.
Nos termos do art. 9º da CLT, são nulos os atos praticados
com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos
preceitos estabelecidos nesse dispositivo. Assim, há o reconhecimento de vínculo empregatício diretamente com a empresa tomadora dos serviços, ainda que as provas dos autos não demonstrem
que ficaram configuradas a subordinação jurídica e a pessoalidade com essa empresa.
Sob outro prisma, não se pode concluir que o art. 94, II, da
Lei nº 9.472/97, ao dispor que a concessionária poderá “contratar
com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço, bem como a implementação
de projetos associados”, esteja autorizando a terceirização de
serviços inerentes à atividade-fim das empresas de telecomunicações, sob pena de ferir o disposto no art. 170, caput, VIII, da Constituição da República, pois a intermediação de serviço em área-fim
das empresas de telecomunicações culminaria na desvalorização
do trabalho humano e no comprometimento da busca do pleno
emprego.
A análise da legislação infraconstitucional não pode destoar dos princípios e regras albergadas pela Constituição Federal,
especialmente os previstos nos arts. 1º, III e IV, 7º, 8º, 170 e 173,
que compõem o núcleo socioeconômico norteador do estado
democrático brasileiro.
Vê-se, pois, que, quando a legislação ordinária traz a possibilidade de as empresas tomadoras de serviços, em especial as
concessionárias de serviços públicos, contratarem terceiros para
o desenvolvimento de atividades “inerentes, acessórias ou complementares ao serviço”, faz uma correlação entre a atividade
desenvolvida pela empresa, nos limites do que se entende conceitualmente por terceirização.
O vocábulo “terceirizar”, segundo o Dicionário Aurélio, significa “transferir a terceiros atividade ou departamento que não faz
parte de sua linha principal de atuação”. Ou se entende que o
conceito de terceirização implica atividades de terceiros, portanto,
não alcança a atividade primária e finalística da empresa tomadora dos serviços, ou se entende pela sua ampliação e, por consequência, amplia-se a responsabilidade da contratante, que passaria a ser solidária com a empresa de intermediação. Carece, data
venia, de lógica formal ou jurídica a autorização irrestrita da “terceirização”, inclusive para a atividade-fim, sem a extensão da
responsabilidade da empresa.
Outro aspecto a destacar, debatido na audiência pública
sobre “terceirização”, realizada pelo Tribunal Superior do Trabalho, é que uma legislação genérica dirigida às empresas concessionárias (telefonia, eletricidade, entre outras), não revoga ou
substitui o Direito do Trabalho, referindo-se, em geral, à regulação
308
COAD
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entre as concessionárias e consumidores e à organização dos
serviços sob sua responsabilidade.
Tratando-se de questão de índole trabalhista, é aplicável o
“princípio da norma mais favorável”, em sua dimensão interpretativa, conforme esclarece Maurício Godinho Delgado:
“Princípio da Norma Mais Favorável – O presente princípio
dispõe que o operador do Direito do Trabalho deve opta pela regra
mais favorável ao obreiro em três situações ou dimensões distintas: no instante de elaboração da regra (princípio orientador da
ação legislativa, portanto) ou no contexto de confronto entre
regras concorrentes (princípio orientador do processo de hierarquização de normas trabalhistas) ou, por fim, no contexto de interpretação das regras jurídicas (princípio orientador do processo de
revelação do sentido da regra trabalhista).
(...)
Como princípio de interpretação do Direito, permite a escolha da interpretação mais favorável ao trabalhador, caso antepostas ao intérprete duas ou mais consistentes alternativas de interpretação em face de uma regra jurídica enfocada. Ou seja, informa
esse princípio que, no processo de aplicação e interpretação do
Direito, o operador jurídico, situado perante um quadro de conflito
de regras ou de interpretações consistentes a seu respeito, deverá
escolher aquela mais favorável ao trabalhador, a que melhor
realize o sentido teleológico essencial do Direito do Trabalho." (in
Curso de Direito do Trabalho, 6ª ed., São Paulo: LTr, 2007,
p. 199-200)
Assim, cabível o reconhecimento de que o art. 94, II, da Lei
nº 9.472/97 não autoriza a terceirização das atividades-fim das
concessionárias dos serviços de telecomunicações.
E, de fato, embora a livre iniciativa seja um dos princípios
fundamentais da República Federativa do Brasil, no mesmo patamar encontram-se os valores sociais do trabalho e a dignidade da
pessoa humana, que se materializam, entre outras, nas diversas
normas de proteção ao trabalhador, como aquelas relacionadas
no art. 7º da Constituição Federal. Assim, devem ser apreciados
com reserva dispositivos que aparentemente venham a enfraquecer o arcabouço jurídico de proteção ao trabalhador.
O ordenamento jurídico pátrio, conforme consagrado na
Súmula nº 331 do TST, repele a intermediação de mão de obra,
salvo em casos muito específicos, considerando-se que essa
prática dificultaria ou inviabilizaria a proteção do hipossuficiente
em face da empresa que usufruiu a sua força de trabalho. Sob
outro prisma, a terceirização da própria atividade empresarial, no
caso de concessionárias de serviço público, implicaria aceitar-se
que uma empresa que recebeu a incumbência de prestar determinado serviço mediante delegação do Poder Público se fizesse
substituir em suas atividades por outras, ficando com o papel de
mera administradora do serviço que lhe incumbia executar.
Por fim, outro aspecto importante à análise da controvérsia
diz respeito ao requisito da subordinação (art. 3º da CLT). O TRT
registrou que “a prova testemunhal não apresenta prova de ingerência da segunda ré nas atividades prestadas pela autora”
(fls. 804).
Porém, no caso dos autos, em vista da situação peculiar
das empresas de telefonia, não se leva em conta a clássica visão
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da subordinação subjetiva. Analisa-se a questão à luz do conceito
da subordinação objetiva, que permite o reconhecimento de vínculo de emprego pela constatação da subordinação jurídica estrutural.
Vale citar a reiterada jurisprudência desta Corte:
“I – RECURSOS DE REVISTA DE TELEMAR NORTE
LESTE S.A. E CONTAX – (...) ATIVIDADE DE CALL CENTER –
TERCEIRIZAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – CONFRONTO COM
PRINCÍPIOS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E FUNDAMENTO DO VALOR SOCIAL DO TRABALHO. I – Qualquer
interpretação dos artigos 25, § 1º, da Lei nº 8.987/95 e 95, II, da Lei
nº 9.472/97 devem ser conforme os valores e princípios positivados na constituição, garantindo-se, ainda, a máxima efetividade
das normas constitucionais. Ou seja, deve tal interpretação homenagear o princípio da dignidade da pessoa humana, bem como o
fundamento republicano de valorização do trabalho (artigo 1º da
Lei Maior). II – Daí, não ser possível a venda do labor humano nas
atividades-fim das empresas de telecomunicações. Portanto, não
se apreende, em nosso sistema jurídico, a existência de qualquer
autorização legal para que haja terceirização nas atividades-fim
das empresas de telecomunicações, assim entendidas como
essenciais ao dinamismo do empreendimento. III – A própria legislação do trabalho temporário (Lei nº 6.019/74), ao possibilitar a
terceirização em atividade-fim, o fez em caráter excepcional e
precário, com prazo exíguo, constituindo-se num mecanismo em
que o trabalhador é colocado em uma vitrine para o mercado de
trabalho, possibilitando a sua contratação pela tomadora de serviços ao final do exíguo pacto com a tomadora de serviços. Justifica-se, portanto, a exceção. Não há, portanto, nenhuma norma que
permita a inserção do empregado, de forma permanente – nas
atividades-fim do tomador de serviços, o que, aliás, se fosse reconhecido às concessionárias de telecomunicações, instituiria uma
discriminação odiosa em relação aos demais ramos de atividade
econômica. Se tal houvesse, ainda que fosse oriunda do legislador
constituinte derivado, seria de duvidosa constitucionalidade, por
atentar contra os artigos 1º, III, e 5º, caput, da Lei Maior. IV – Nesse
contexto, a jurisprudência desta Corte tem se pronunciado, de
maneira reiterada, no sentido de que os serviços de call center
estão dentre as atividades-fim das empresas de telecomunicações. V – Portanto, a decisão regional que entendeu ilícita a terceirização ocorrida em tal atividade, está em consonância com o item
I da Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho. Impõe-se a
manutenção da decisão que decretou inválida a terceirização
havida – porque atentatória contra os preceitos trabalhistas – e
reconheceu o vínculo de emprego diretamente com a concessionária de serviços públicos, notadamente pela constatação de que
presente a subordinação jurídica estrutural. Precedentes. Recurso de Revista não conhecido. (...)” (RR – 1240-42.2010.5.03.0009,
Relator Ministro: Emmanoel Pereira, Data de Julgamento:
9-5-2012, 5ª Turma, Data de Publicação: 18-5-2012)
“AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA TIM CELULAR S.A. RITO SUMARÍSSIMO – VÍNCULO
DE EMPREGO – EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS DE
TELEFONIA – TERCEIRIZAÇÃO – CALL CENTER – IMPOSSIBILIDADE. A Constituição Federal, viga-mestra do Estado De307
COAD
FASCÍCULO SEMANAL 36/2013
mocrático de Direto implantado na República Federativa do Brasil
desde 1988, prevê tanto em seu artigo 1º, IV (que versa sobre os
fundamentos da República), quanto no artigo 170, caput (que
elenca os princípios gerais da atividade econômica), a coexistência principiológica do valor social do trabalho com a livre iniciativa,
não sendo de forma alguma possível cogitar-se de prevalência de
uma sobre a outra. Fixada essa premissa, impõe-se a origem
histórica da controvérsia. Em razão de questões econômicas e
ideológicas predominantes no Poder Executivo Federal, em 1995
foi promulgada a Emenda Constitucional nº 8, que abriria caminho
para a privatização das telecomunicações no Brasil, ao alterar o
artigo 21, XI, da Constituição Federal de 1988 e prever a exploração daqueles serviços por meio de autorização, concessão ou
permissão, nos termos da lei que disporia sobre ‘a organização
dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos
institucionais’. Pois bem, a lei referida pela Emenda Constitucional
nº 8 veio a ser editada em 1997 (Lei nº 9.472/97), e em seu artigo
94 estipula que, ‘no cumprimento de seus deveres, a concessionária poderá, observadas as condições e limites estabelecidos pela
Agência, (...) contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço, bem
como a implementação de projetos associados’, que ‘em qualquer
caso, a concessionária continuará sempre responsável perante a
Agência e os usuários’ (destacamos). Ora, a possibilidade prevista
pelo dispositivo supramencionado de ‘contratar com terceiros o
desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço’, não corresponde à autorização legislativa
para a terceirização da atividade-fim das empresas prestadoras
do serviço de telefonia. Afinal, é importante jamais perder de vista
que tanto a Lei em exame quanto a própria Emenda Constitucional
nº 8/95 em nada alteraram os artigos 1º, IV, e 170, caput, da Constituição Federal – e nem poderiam, diga-se de passagem, por força
do artigo 60, § 4º, da própria Constituição, combinado com o
entendimento do excelso STF acerca da abrangência das chamadas cláusulas pétreas da Constituição (v.g., STF-ADPF-33-MC,
voto do Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 29-10-2003,
Plenário, DJU de 6-8-2004; grifos não constantes do original).
Acrescente-se que a interpretação do artigo 94 da Lei nº 9.472/97
que leva à conclusão de que há nele autorização para a terceirização da atividade-fim das empresas prestadoras de serviço corresponde não apenas a uma inconstitucional prevalência da livre iniciativa sobre o valor social do trabalho como também à prevalência até mesmo das relações de consumo sobre esse último –
quando é certo que a Constituição adotou um eloquente silêncio
acerca de tais relações nos principiológicos artigos 1º, IV, e 170,
caput. Com efeito, o próprio legislador ordinário estabeleceu no
§ 1º do artigo 94 que, para os usuários, a eventual contratação de
terceiros na forma do inciso II não gera efeito algum, pois a
empresa prestadora de serviços permanece sempre responsável;
não há como negar, portanto, essa mesma responsabilidade
perante os trabalhadores, senão tornando-a inferior à relação de
consumo. Por fim, é entendimento pacífico deste c. Tribunal que
não é lícita a terceirização dos serviços de call center pelas empresas operadoras de telefonia, por se tratar de atividade-fim dessas
últimas. Agravo de instrumento a que se nega provimento.” (AIRRDOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA
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462-39.2011.5.03.0138, Relator Ministro: Horácio Raymundo de
Senna Pires, 3ª Turma, DEJT 27-4-2012)
“RECURSO DE REVISTA – COOPERATIVA – FRAUDE –
TERCEIRIZAÇÃO DE ATIVIDADE-FIM – ART. 94, II, DA LEI
9.472/97 – SÚMULA 331, I, DO TST – FORMAÇÃO DO VÍNCULO
DE EMPREGO COM A TOMADORA. (...) 2. A interpretação sistemática do art. 94, II, da Lei 9.472/97 ‘ a chamada Lei Geral de Telecomunicações’ atenta aos fundamentos constitucionais da República, à polissemia da palavra ‘inerente’, à natureza da norma em
exame, ao princípio da isonomia, à necessidade de observância
do objeto social da pessoa jurídica e da função social da empresa,
bem como à luz do conceito de subordinação objetiva e dos princípios informadores do Direito e, em especial do Direito do Trabalho,
e à própria compatibilização que entre eles se impõe, conduz à
conclusão de que o dispositivo não autoriza a terceirização no
pertinente à atividade-fim das concessionárias de telecomunicações. (...) Recurso de revista integralmente não conhecido.”
(Processo: RR – 66600-64.2009.5.03.0103, Relatora Ministra:
Rosa Maria Weber, 3ª Turma, DEJT 26-8-2011)
Digna de transcrição a fundamentação desse último acórdão:
“(...)
Diante da dicção legal autorizadora da terceirização para o
desenvolvimento de atividades inerentes, indaga-se se o diploma
em debate, rompendo com a tradição de vedação ao instituto do
marchandage na atividade-fim, introduziu novo paradigma no
ordenamento jurídico nacional.
A propósito, faço breve digressão para recordar que, informada pela constante preocupação com a mercantilização e precarização do trabalho humano, esta Corte sempre se pautou pela
cautela na admissão do fenômeno terceirizante, em virtude, justamente, da inexistência de diploma legal que regulamente o instituto em sua inteireza.
(...)
Traçado tal panorama, volto ao cerne da controvérsia para
dizer que, a meu juízo, a autorização legal para a terceirização de
atividades inerentes das concessionárias do serviço de telecomunicações não representa admissão de terceirização de atividade-fim, prática que, salvo na hipótese de trabalho temporário,
remanesce no campo do ilícito, pelo que encerra de aviltante à
dignidade da pessoa humana e ao valor social do trabalho, ambos
erigidos à condição de fundamentos da República (art. 1º, III e IV,
da Lei Maior).
Em abono da tese, registro a polissemia própria ao vocábulo ‘inerente’, que tem as seguintes expressões como sinônimas:
atinente, dependente, específico, inseparável, intrínseco, ligado,
peculiar, pertinente, próprio, relativo e subjetivo.
Nessa esteira, mesmo sob o enfoque da interpretação
gramatical ou literal – consabido a mais pobre de todas –, inúmeras as acepções que a palavra ‘inerente’ comporta, que não
correspondem necessariamente ao conceito de atividade-fim. Até
mesmo a atividade-meio de limpeza e conservação, v.g., é ‘inerente’ à atividade das empresas concessionárias, desde que seja
compreendida na acepção dos sinônimos ‘ligado’ ou ‘pertinente’.
306
COAD
FASCÍCULO SEMANAL 36/2013
É dizer, a ambiguidade do termo não permite a ilação de
que se está a tratar de permissivo legal à terceirização de atividade
finalística do setor de telecomunicações, até porque a previsão em
estudo se situa entre as disposições atinentes ao contrato de
concessão de serviços públicos – regulamentação conferida por
lei de caráter manifestamente administrativo e que em nenhum
momento explicita a intenção de imiscuir-se na senda laboral –, a
qual sucumbiria, de todo modo, diante de uma interpretação
coerente com o ordenamento jurídico pátrio.
Assumindo-se, pois, o viés da interpretação sistemática,
pode-se, inclusive, cogitar da incompatibilidade da compreensão
da terceirização em atividade-fim com o princípio da isonomia e
com as noções de objeto social e da função social da empresa, a
se entender pudesse o legislador autorizar a terceirização da atividade-fim apenas às concessionárias de serviços públicos (a propósito, o art. 25, § 1º, da Lei 8.987/95), em discriminação desprovida de razoabilidade em relação a todas as demais pessoas físicas e jurídicas que oferecem serviços no mercado. O fato de uma
empresa ser concessionária de serviço público, ou seja, de ter
obtido a concessão para a exploração de serviço de titularidade
de um ente público, após submissão a processo licitatório, não
parece constituir fator de discrimen hábil, lógico e razoável para
tratamento diferenciado em relação aos demais empresários ou
sociedades empresárias.
Assim, à luz do princípio da isonomia, previsto no caput do
art. 5º da Magna Carta, tenho que apenas duas opções são possíveis: a) entender que os arts. 25, § 1º, da Lei 8.987/95 e 94, II, da
Lei 9.472/97 autorizam o fenômeno terceirizante de forma plena, e
estender tal permissão a todas as pessoas físicas e jurídicas; e
b) interpretar que o marchandage em atividade-fim da tomadora
de serviços segue vedado na ordem justrabalhista pátria, inclusive
quanto às concessionárias de serviço público.
Como já antecipei, sou adepta da segunda vertente, qual
seja, a de que a terceirização de atividade-fim segue como prática
sem respaldo legal. Aliás, a adoção de corrente contrária significaria conferir interpretação ampliativa a norma restritiva de direitos
sociais, pois, como é notório, alguns dos efeitos nocivos da terceirização, potencialmente ampliados no caso de sua adoção no
tocante à atividade-fim, são a impossibilidade de acesso ao
quadro de carreira da empresa tomadora e o esfacelamento da
categoria profissional, com todas as implicações sindicais correspondentes.
De outra parte, consabido que a existência da pessoa jurídica tem início com a inscrição do ato constitutivo no respectivo
registro (art. 45 do CC) e que o registro tem como requisito essencial a declaração de seu objeto social, ou seja, da finalidade da
pessoa jurídica (art. 46, I, do CC), não há dúvida de que o ente
moral somente se justifica na medida em que tenha uma finalidade
e a busque, por intermédio de seus prepostos.
A este respeito, cabe recordar que a pessoa jurídica concessionária de serviço público, na qualidade de sociedade empresária, submete-se também à exigência de inscrição no Registro
Público das Empresas Mercantis (art. 967 do CC), da qual igualmente deve constar o seu objeto social (art. 968, IV, do CC).
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Assim, e tendo em vista que a empresa consiste na atividade econômica organizada exercida de forma profissional e
voltada à produção ou circulação de bens ou de serviços (art. 966
do CC), sem dúvida que a sociedade empresária não pode terceirizar a sua própria ratio essendi, sob pena de haver o esvaziamento
do seu objeto social e o desvirtuamento de sua função social.
Nessa linha, tenho por inviável cogitar da existência de
pessoa jurídica sem mão de obra apta à promoção de sua finalidade social, mormente quando se considera que a empresa
envolve a organização dos fatores de produção, quais sejam,
força de trabalho, matéria-prima, capital e tecnologia.
Em acréscimo, registro que outra dificuldade para a terceirização de atividade-fim repousa no moderno conceito de subordinação objetiva, estrutural ou integrativa, que não se vincula à visão
clássica de submissão ao poder diretivo do empregador – fiscalização e controle –, mas, sim, à inserção do empregado no padrão
corporativo, com a ‘standardização’ do serviço prestado, dentro da
regular e permanente dinâmica que caracteriza a atividade da
tomadora.
(...)
Assim, adotado o conceito de subordinação objetiva, estrutural ou integrativa, tenho como absolutamente inviável a terceirização de atividade-fim, sem formação de vínculo direto com o
tomador dos serviços, pois, sob tal perspectiva, em tais situações
sempre haverá a presença dos requisitos do art. 3º da CLT a
conectar o suposto empregado da prestadora de serviços à tomadora.
(...)"
Por todo o exposto, conheço, porque foi contrariada a
Súmula nº 331, I, do TST.
2. MÉRITO
EMPRESA DE TELEFONIA CELULAR – TERCEIRIZAÇÃO – VÍNCULO DE EMPREGO COM A TOMADORA DE SERVIÇOS
Em razão do conhecimento do recurso de revista, porque
contrariada a Súmula nº 331, I, do TST, dou-lhe provimento para
declarar ilícita a terceirização ocorrida, com o consequente reconhecimento do vínculo empregatício entre a reclamante e a segunda reclamada, Claro S.A., e para determinar o retorno dos
autos à Vara de Trabalho, para que sejam analisados os pedidos
decorrentes do reconhecimento da relação de emprego.
Prejudicado o exame do tema remanescente.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista
por contrariedade à Súmula nº 331, I, do TST e, no mérito, dar-lhe
provimento, para declarar ilícita a terceirização ocorrida, com
consequente reconhecimento do vínculo empregatício entre a
reclamante e a segunda reclamada, Claro S.A., e para determinar
o retorno dos autos à Vara de Trabalho para que sejam analisados os pedidos decorrentes do reconhecimento da relação de
emprego. Prejudicado o exame do tema remanescente.
Brasília, 26 de Junho de 2013. (Kátia Magalhães Arruda –
Ministra Relatora)
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