METODOLOGIA ENSINO DE CIENCIAS – TEXTO 3 – RELAÇÃO EXISTENTE
ENTRE SENSO COMUM E CONHECIMENTO CIENTÍFICO.
Objetivos específicos :
Relacionar critérios do senso comum e do conhecimento científico, isto
é, características básicas que orientem sobre o que, a pricipio, pode ou
não ser classificado como um e outro;
Analisar uma determinada situação ou problema do dia-a-dia, indo além
do saber imediato a respeito dela.
Já vimos a importância de contextualizar o saber para apresentá-lo aos
seus alunos, também de forma contextualizada, tendo em vista que o
conhecimento é um processo sempre em construção.
O homem é um ser que faz questionamentos existências e que tem de
interpretar a si e ao mundo em que vive, atribuindo-lhes significados, criando
representações significativas da realidade e intervindo sobre ela, podendo
lançar princípios explicativos que sirvam de base para a organização e
classificação dos elementos do seu mundo: esse processo caracteriza o
conhecimento.
Existem diferentes formas de conhecimento que partilham do papel de
explicar a realidade, Vamos abordar duas delas, que nos interessam
particularmente, quando tratamos de Ciência: o senso comum e o
conhecimento cientifico.
Conhecimento do senso comum
Essa é a forma de conhecimento mais usual que o homem utiliza para
interpretar a si mesmo, a seu mundo e ao universo como um todo, produzindo
interpretações significativas. Podemos dizer que o senso comum é o modo
comum, corrente e expontaneo de conhecer, adquirido no trato direto com as
coisas e com os seres humanos; de outro modo, é o saber que prevalece em
nossas vidas diárias, aquele que é sem comprovação ou estudo, sem a
aplicação de um estudo (método) mais cuidadoso e sem reflexão sobre algo
que é afirmado como verdade.
O senso comum surgiu como conseqüência da necessidade de resolver
problemas imediatos que aparecem na vida prática do homem, decorrentes do
contato direto com os fatos e com os fenômenos que aconteciam no seu dia-adia. Para que você entenda melhor, o senso comum tem sua origem a partir da
observação da regularidade da ocorrência de certos fenômenos na natureza
que acabam gerando um hábito de acreditar que, quando determinadas
condições estão presentes, imediatamente, segue-se um evento a elas
relacionado, geralmente aceito de modo acrítico, como se fosse uma lei natural
das coisas. Dessa forma, o conhecimento em jogo limita-se ao fato isolado,
sem a preocupação de o correlacionar com outros, ou de o explicar. Isso nos
mostra por que os astros influenciavam a vida das pessoas etc., registrando
uma postura dogmática diante da compreensão dos fenômenos
Existem, ainda, muitas outras situações em que presenciamos o senso
comum na vida diária, como por exemplo, nas informações assimiladas por
tradição, nas explicações “ingênuas” que são dadas sem aplicação de método
e sem a devida reflexão sobre algo. É importante você saber que essa
incapacidade do senso comum de submeter-se a uma crítica sistemática,
gerando interpretações sustentadas apenas nas crenças pessoais, torna-o um
conhecimento subjetivo e inseguro, além do fato de que sua linguagem vaga,
seu baixo poder de crítica e o desconhecimento dos limites de validade das
suas crenças contribuem para a restrição desse tipo de conhecimento.
O conhecimento científico
O conhecimento científico surge da necessidade de o homem deixar de
ocupar uma posição passiva em face dos fenômenos que rodeiam,
dinamizando sua racionalidade para, de uma forma sistemática, metódica e
crítica, de desvelar o mundo a fim de compreendê-lo, explicá-lo e dominá-lo.
A Ciência, muitas vezes, rompe com determinadas idéias do senso
comum. Podemos dizer que esse saber representa a parte dinâmica do
fenômeno que faz o conhecimento evoluir, ou seja, representa a fase
construtora do conhecimento. O senso comum, por sua vez , representa a fase
conservadora do conhecimento e, por isso, tem a característica de imobilidade,
tendendo a se repetir em um ciclo fechado eternamente se não for fecundado
pelo dinamismo evolutivo da ciência.
Feita essa comparação, torna-se mais evidente que o impulso do
homem em direção à Ciencia deve-se à necessidade de compreender a “rede
de relações” que existe sob a aparência sensível dos objetos, fatos ou
fenômenos. Essa rede, no entanto, não mostra facilmente, o que pode deixar
uma “porta” aberta para a retomada do conhecimento do senso comum. É
preciso, assim, ir além da forma de ver a realidade imediatamente percebida,
que necessita de princípios explicativos para servirem de base ao
conhecimento da organização, da classificação e da ordenação da natureza,
superando as contradições da atividade guiada pelo senso comum.
A preocupação é que, no que diz respeito aos conteúdos de Ciencias
ensinados na escola, existe a idéia de uma significativa resistência por parte
dos alunos em superarem o senso comum (que tem origem na sua própria
vivencia) e aplicarem, a seu dia-a-dia, explicações cientificas frente à
resolução de problemas propostos. O senso comum que estudamos impõe-se
aos alunos como verdade à medida que não há suficiente reflexa sobre o que
eles constroem na sua experiência cotidiana: essa realidade mostra muitos
dos graves problemas de aprendizagem e da concepção dos alunos de todos
os níveis – não só da Educação Infantil e das Séries Iniciais – como também
aponta a necessidade de superar essa situação. Essa superação só será
possível quando professores e alunos romperem com a aceitação passiva e
acrítica de tudo aquilo que lêem, vêem e ouvem, e passarem a “ler” o mundo
de forma ativa e crítica.
Embora a atividade cognoscitiva na ciência e a experiência cotidiana se
relacionem, não se pode analisar como iguais e a do ponto de chegada
(conhecimento cientifico). A observação inicial, por exemplo, que um menino
faz de uma árvore sobre o fato de suas folhas caírem no inverno, a partir de
seu conhecimento cotidiano, não será mais a mesma desde que ele passe a
formular hipóteses, leis e teorias a respeito desse fenômeno. Segundo Hohn
Macarthy (apud, MARQUES, 1999), as situações em que novos conhecimentos
são gerados, levam-nos a refletir sobre a questão de onde caba o “senso
comum” e onde começa o “conhecimento cientifico”. Para pensarmos sobre o
“lugar” que um e outro ocupa – senso comum e conhecimento científico – é
importante lembrarmos que não é simples organização ou classificação dos
fenômenos que caracteriza um conhecimento cientifico, mas sua organização e
classificação sustentadas em princípios próprios da Ciencia como forma
especial de conhecimento.
O conhecimento cientifico é expresso sob a forma de enunciados que
demonstram, experimentam e comprovam as condições que determinam a
ocorrência dos fatos e dos fenômenos relacionados a um problema, tornando
claras as relações e os sistemas de dependência que existem entre suas
propriedades. Quando um meteorologista acompanha o movimento das
massas de ar, com o uso de modernos computadores, fazendo registros como
os de mudanças na temperatura e movimento das massas de ar, é possível
prever para onde elas vão, quando chegarão e, principalmente, quais serão as
conseqüências de seu deslocamento. Tal acompanhamento é feito com o
auxilio de teorias de instrumentos como o barômetro, o anemômetro, o cata
vento, a biruta, o pluviômetro e os satélites meteorológicos. As informações
recebidas são processadas e discutidas, para, então, ser fornecido um boletim
meteorológico. Como você vê, o conhecimento cientifico orienta-se,
conscientemente, através da discussão objetiva e intersubjetiva sobre seus
resultados, suas explicações, seus enunciados e suas teorias, por isso todas
as teorias cientificas têm um caráter provisorias e podem modificar-se quando
se encontram outras que explicam, de forma mais completa o fenômeno ou os
fenômenos. Assim também acontece quando o senso comum, ou outro tipo de
conhecimento, por mais que tenha avançado, deixa de ser o fundamento para
a explicação de um determinado fenômeno, principalmente, quando a geração
de novos conhecimentos marca o seu limite. É, portanto, fundamental que você
conheça a existência, desses tipos de conhecimento, que podem conviver lado
a lado, podem estar presentes em todo o processo educativo.
Nossas crianças, desde a Educação Infantil, estabelecem um contato
ainda muito elementar, nos termos da atividade cognoscitiva, com as coisas de
seu mundo. Existe, ainda uma indiferenciação significativa entre a vida psíquica
e física, ou seja, entre o que elas são e fazem e o mundo que as cerca. Afinal,
trata-se de um contexto de relações iniciais, naturais, com o mundo que as
crianças vivenciam. Exemplo disso é o fato de que nossos pequeninos, quando
querem explicar um fenômeno, como a origem das plantas, não vão procurar
respostas no “como” esse processo se dá, ou seja, na sua realização física,
mas na “intenção”, no “por que é assim”, que subjaz à sua atividade inicial de
conhecer, em face de suas primeiras impressões acerca da natureza,
impressões orientadas por um pensamento muito mais sensório-motor que
conceitual, assim como em decorrência da falta de critérios de distinção das
coisas, o que mostra os limites precisos ente o “eu” e o “mundo”. A criança
simplesmente poderá dizer que “quem fez as plantinhas foi o Papai-do-céu!” E
terá dito tudo que sabe a respeito! Podemos dizer que o pensamento delas,
nesse momento de suas vidas, evolui a partir de formas animistas na
interpretação da realidade, procurando, no seu modo de ser ou na natureza,
explicações para o que a cerca, animando os objetos inanimados para poder
compreendê-los.
Assim é compreensível que as crianças considerem como vivo e
consciente um grande número de coisas que a rodeiam, por se basearem nos
caracteres imediatos de sua própria atividade, não conseguindo, ainda,
formular “nenhuma” teoria no sentido de uma explicação verbal, consciente,
sistemática sobre os fatos e os fenômenos. Daí as crianças serem muito
imaginativas! É natural, nesse caso, a indiferenciação entre coisas vivas e nãovivas – um conteúdo que precisa ser muito bem trabalhado desde a Educação
Infantil e as Séries Iniciais, pois, do contrário, serão profundas as marcas que
essa lacuna vai deixar.
Muitos adolescentes e adultos apresentam, tanto na sua vida em geral
quanto no cotidiano escolar, resquícios dessa ausência de aprendizagem,
manifestando a indiferenciação do vivo e do não-vivo na sua iniciação
científica, o que se revela em suas visões de mundo, julgamentos irreflexivos e
nas explicações ingênuas que dão para determinados acontecimentos e
fenômenos, entre outros comportamentos.
Certamente, na medida em que a criança vai crescendo, aprendendo e
conhecendo novas coisas, ela gradativamente vai estabelecendo relações que
antes não conseguia e vai mais longe, levantando questões mais ricas e
apresentando soluções mais adequadas a essas mesmas coisas. Por essa
razão o educador precisa conhecer melhor e precisa respeitar os processos de
desenvolvimento infantil, buscando criar, nas suas aulas, todas as condições
possíveis para enriquecer as interações entre as crianças e os objetos que a
cercam, introduzindo sempre elementos novos e fazendo referencia ao que ela
já domina, buscando superar características ilusórias na explicação dos
fenômenos da natureza, noções confusas sobre os conteúdos de Ciencias e
demonstrações mágicas sobre os fenômenos naturais.
É possível deixar um grande legado à criança depois que concluir as
Séries Iniciais e progredir em seus estudos, se, com ela, tiverem sido
trabalhadas noções elementares de Ciencias Naturais, noções que vão servir
de alicerce para a aprendizagem de conceitos científicos futuros. As situações
vivenciadas no dia-a-dia, como brincar no escorregador, arrastar (gastar) a sola
do calçado, esfregar as mãos uma na outra, deslizar o pé na calçada molhada,
pegar em diferentes objetos e observar sua textura, cor, tamanho, forma,
espessura etc., plantar flores ou verduras, falar de alguns animais e de seus
hábitos, explicar o que é a chuva, por exemplo, podem contribuir para essa
construção. Lembramos, nesse sentido, a grande contribuição de Paulo Freire,
quando nos ensina a relevância de considerar a realidade do aluno, realidade
essa em que ele está presente com toda sua historia, da qual devemos partir, e
a qual deve-se valorizar, assegurando a aquisição de novos conhecimentos e
a transformação da realidade infantil.
Daí o papel da escola na promoção de condições para que o aluno
avalie, critique e avance na construção do conhecimento cientifico, a partir da
reestruturação das suas próprias representações, para que possa intervir
conscientemente na sociedade.
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