“PRINCÍPIOS DA SEGURIDADE SOCIAL”
Sérgio Henrique Salvador
Advogado em Minas Gerais. Pós-Graduando em Direito Previdenciário pela Escola Paulista de Direito
(EPD/SP) sob a coordenação do Professor Wagner Balera. Presidente da Comissão de Assuntos
Previdenciários da OAB/MG (23ª Subseção). Sócio do Escritório “ADVOCACIA ESPECIALIZADA
TRABALHISTA & PREVIDENCIARIA”.
O detido e sempre esperado estudo dos Institutos Jurídicos passa por
rotineira análise de seus princípios regedores. Neste aspecto, precipitada a
análise de um objeto jurídico específico, sem antes, esmiuçar todos os seus
princípios norteadores.
No ordenamento pátrio, por exemplo, a própria legislação hodierna elenca
os princípios como parte integrante e necessária a ser observado quando da
aplicação de qualquer comando legal lacunoso, em determinado caso concreto.
A esse aspecto, o artigo 4º da Lei de Introdução ao Código Civil é por
demais explícito, de acordo com a literalidade de seu enunciado: “Quando a lei
for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os
princípios gerais do Direito”.
Conceitualmente, os princípios são utilitários para o entendimento ou a
interpretação de todo um Sistema Jurídico, na acepção ampla e genérica do
termo, onde os institutos jurídicos específicos, em seu sentido restrito, são
melhores compreendidos mediante a análise principiológica. Em outras palavras,
princípios são diretrizes de interpretação, verdadeiros meios da exegese.
Com a maestria de sempre e em singular lição, o Professor Wagner
Balera1, acerca da definição jurídica de princípios, citando Josef Esser, ensina
que:
“Foi, sem dúvida, Esser o primeiro dos autores a fixar a distinção entre
princípio e norma. Em trabalho, que deu à estampa em 1956, Esser
considera os princípios como pontos de partida do raciocínio
jurisprudencial. Permitem ao julgador identificar a comunicação
permanente entre a moral e o direito. E, munido desse canal de
comunicação, o julgador pode interpretar o caso, valendo-se de
elementos que encontrará tanto no direito natural como no direito
positivo”.
De igual forma, o estudo dos princípios ainda reflete destacada
importância na hermenêutica jurídica, seja pelo aspecto temporal que revela a
origem do objeto a ser estudo, seja pela importância que os mesmos refletem
dentro de um sistema jurídico complexo, como o hodierno, no tocante aos seus
efeitos.
Neste ínterim, sobre o valor dos princípios na ciência jurídica, valemo-nos
de precioso ensinamento ministrado pelo conceituado mestre e destacado jurista,
Professor Celso Antônio Bandeira de Melo2:
“Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma
qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um
específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É
a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o
escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo
o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia
1
2
BALERA, Wagner. Sistema de Seguridade Social. 5ª Ed. São Paulo: LTr. 2009. p.19
MELO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 12ª Ed. São Paulo: Malheiros. p.748
irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.
Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustêm e alui-se
toda a estrutura nelas esforçadas”.
Transpassada essa preambular análise conceitual, de toda necessária a
compreensão do presente e modesto estudo, interessa perquirir então sobre os
princípios basilares do Sistema de Seguridade Social.
Deste modo, imperiosa a compreensão jurídica do Sistema Nacional de
Seguridade Social para então, entendê-lo, substancialmente, através de seus
princípios afirmadores.
O Professor Fábio Lopes Vilela Berbel 3 conceitua aludido instituto
jurídico da seguinte forma:
“Desta forma, pode-se dizer, em princípio, que Sistema de Seguridade
Social é o conjunto de regras e princípios estruturalmente alocados, com
escopo de realizar a Seguridade Social que, a partir de uma visão
meramente política, seria a proteção plena do indivíduo frente aos
infortúnios da vida capazes de levá-lo à indigência, ou seja, a proteção
social da infelicidade individual”.
De fato, o ideário da justiça social e a promoção do bem de todos os
integrantes de uma coletividade politicamente organizada, encontrou no Sistema
de Seguridade Social um verdadeiro instrumento para esta magna concretude.
É que a Lei Suprema alocou o citado Sistema dentro do arcabouço
constitucional, exprimindo, pois, total imprescindibilidade e válida importância
dentro do cenário jurídico, pois, o comando do artigo 194 da Lei das Leis em
3
BERBEL, Fabio Lopes Vilela. Teoria Geral da Previdência Social. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
seu caput definiu a extensão do Sistema de Seguridade Social, bem como, vale
destacar, alocou-o constitucionalmente no Título da “Ordem Social”,
confirmando sua indispensabilidade como meio para o alcance dos objetivos
axiológicos do bem-estar de todos e da justiça social.
Novamente, o Mestre Wagner Balera4, aborda a extensão deste Sistema:
“Queremos dizer, quando afirmamos que o objetivo do Sistema Nacional
de Seguridade Social se confunde com o objetivo da Ordem Social (e,
diga-se, igualmente, com o objetivo da Ordem Econômica, na voz do
caput do art.170), que esse valor – a justiça social – uma vez
concretizado, representa o modelo ideal de comunidade para a qual tende
toda a concretização constitucional do sistema”.
Portanto, o Sistema de Seguridade Social se revela como um necessário
mecanismo de fixação constitucional para a concretização dos propósitos da
República, dentre eles da Justiça Social e do Bem-Estar de toda a coletividade.
Aludido Sistema, se ramifica em três vertentes a justificar sua existência,
onde busca incessantemente através desses meios a plena viabilização dos
propósitos afirmadores, como já aqui explanado, resumindo-se, da Proteção
Social Hipotética para a Proteção Social Fenomênica.
Com efeito, o arcabouço desse Constitucional Sistema abrange: a Saúde; a
Previdência Social e a Assistência Social, como, aliás, o Constituinte Originário
estampou no comando do artigo 194 em seu caput.
Além da definição e extensão do Sistema de Seguridade Social, a Lei das
Leis ainda trouxe no mesmo capítulo vários princípios norteadores e regedores
4
BALERA, Wagner. Sistema de Seguridade Social. 5ª Ed. São Paulo: LTr. 2009. p.15.
deste instrumental de efetivação da proteção social, como se afere do artigo 194,
parágrafo único e seus sete incisos do Texto Político.
Assim, o Sistema Protetivo ora em comento possui um total de sete
Princípios constitucionalmente regulados, que hodiernamente amoldam todo o
ordenamento jurídico da Seguridade Social com seus propósitos esclarecedores.
Aludidos princípios, ainda são divididos conceitualmente como: de
direitos, abrangendo os incisos I ao IV do artigo em estudo; de deveres, onde
estão inclusos os incisos V e VI, e, por fim, princípios de gestão, sedimentado
no inciso VII do comando constitucional.
Verdadeira válvula-motriz de todo o sistema em análise, o inciso primeiro
do comando constitucional estudado representa um grande norte no plano
protetivo. De fato, assim está enunciado: universalidade da cobertura e do
atendimento.
Trata-se, pois, de verdadeiro campo de atuação do ideal protetivo, onde o
Constituinte assegura que todos os infortúnios da vida são cobertos, ou seja, as
contingências advindas estão incluídas no ambiente de proteção, bem como o
atendimento é extensivo e assegurado à todas as pessoas inclusas no Sistema e
destinatárias das prestações, evitando-se a exclusão de quem quer que seja.
De igual forma, o princípio insculpido no inciso II do mesmo dispositivo
constitucional, quer seja, da uniformidade e equivalência dos benefícios e
serviços às populações urbanas e rurais, conduz ao ideário da isonomia também
retratada na Carta Política em seu artigo 5º, já que prevê igual tratamento aos
sujeitos da proteção social, seja dos centos urbanos, seja dos campesinos, não
descurando de discriminar quem quer que seja da tutela social.
Cabe destacar que aludido princípio, visou a corrigir a plena distorção que
havia na ordem constitucional com os trabalhadores rurícolas, que até então
tinham tímida proteção social.
O terceiro princípio, assim disposto: seletividade e distributividade na
prestação dos serviços e benefícios, não se divorciando do ideal social
preconizado pelo Sistema de Proteção, assegura a especificidade do direito
regulado, sobretudo das hipóteses em que os benefícios e serviços serão
acessíveis ao titular de direitos, cabendo ao legislador ordinário tal mister.
De igual forma, esse princípio vem assegurar com firmeza de intenção, as
modalidades da Ordem Social que merecem proteção, ou seja, especifica onde
deve ser seu campo de atuação.
A irredutibilidade do valor dos benefícios, princípio de direito insculpido
no inciso IV, representa uma verdadeira garantia do sujeitos de direitos, de
maneira a preservar seu direito, de fundo social, com o fim precípuo de proteção
contra intempéries econômicas, sobretudo de um Mundo Globalizado. Neste
aspecto, a proteção contra a redução demonstra a preocupação da Ordem
Constitucional com a Segurança Jurídica, já que direitos sociais não podem ser
efêmeros, oscilantes e hipotéticos, mas sim, e sempre, duradouros, habituais e
reais.
Os Princípios da Seguridade Social, do tipo “de deveres”, arquitetados nos
incisos V e VI do cenário constitucional, a saber: equidade na forma de
participação do custeio e diversidade da base de financiamento, como
literalmente classificados, apresentam critérios obrigacionais de toda a
coletividade como integrantes do pacote protetivo. De fato, revelam que as
proposições elencadas como necessárias à Ordem Social, só hão de existir na
dimensão fática se houver participação coletiva efetiva, de forma equânime e
diversa quanto as contribuições.
Percebe-se que tais princípios confirmam a Solidariedade descrita no
artigo 3º, inciso I da Carta Magna, onde, colocada como um dos corolários da
República, encontra nestas proposições do Sistema Protetivo sua especificidade,
já que, para haver um plano de proteção social, imperiosa se faz a participação
ativa de todos os sujeitos envolvidos, proporcionalmente a participação
individualizada, bem como, diversificando, objetivamente (fatos gerados da
contribuição) e subjetivamente (sujeitos obrigados da contribuição), os núcleos
geradores do financiamento.
Referidos Princípios também revelam a bilateralidade da relação jurídica
de proteção previdenciária trazida pela Teoria Unitária ou da Relação Bilateral,
em total contra ponto à Teoria Escisionista do direito espanhol.
Derradeiramente, o inciso VII do texto constitucional sob enfoque, assim
extratificado: caráter democrático e descentralizado da administração,
mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos
empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados, revela
uma exigência democrática fundamental, já que o formato democrático do
Estado não pode se desnaturar por mera deliberação administrativa de agentes
políticos, já que a preservação, expansão e o futuro do plano de proteção social
há de contar com efetiva participação gerencial dos atores sociais, seus
destinatários, eis que, em sentido contrário, haveria um pleno retrocesso do ideal
democrático, pois, os sujeitos da proteção ficariam relegados tão somente a
solidariedade contributiva. Ora, a Solidariedade é completa e total, encontrando
neste Princípio verdadeiro instrumental do ideal democrático.
Assim tratado, os Princípios da Seguridade Social como aqui explanados,
justificam toda uma pretensão do Poder Constituinte Originário em elencar a
Seguridade Social, dentro do plano protetivo, como instrumento necessário de
evolução organizada da Sociedade, de forma a alcançar e garantir a justiça social
e o bem-estar de todos, como destacados alvos da Ordem Social.
Desta forma, em uma análise hermenêutica, pode-se afirmar, com clareza,
que não há objetivos e fundamentos da República a serem observados, sem total
atenção ao Sistema Protetivo alocado no artigo 194 do Texto Magno, bem como,
de seus princípios basilares e afirmadores de toda a sistemática da proteção
social, sem o qual, os ideais axiológicos de um povo não encontram vida.
[email protected]
www.trabalhistaeprevidenciaria.com.br
(em construção)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1 - BALERA, Wagner. Sistema de Seguridade Social. 5ª Ed. São Paulo: LTr.
2009.
2 - MELO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 12ª Ed.
São Paulo: Malheiros. 2005.
3 - BERBEL, Fabio Lopes Vilela. Teoria Geral da Previdência Social. São
Paulo: Quartier Latin, 2005.
Download

“PRINCÍPIOS DA SEGURIDADE SOCIAL” O detido e sempre