A abordagem institucional comparativa Cap. II Evans Autonomia e Parceria Paulo Tigre 1 Evolução das teorias do desenvolvimento Paulo Tigre, UFRJ 2 Utilitarismo O Utilitarismo é um tipo de ética normativa – com origem nas obras dos filósofos e economistas ingleses do século XVIII e XIX. Jeremy Bentham e John Stuart Mill. O Neo-utilitarismo está associado também as idéias de Friedrich Hayek e ao chamado neoliberalismo, doutrina econômica que defende a absoluta liberdade de mercado e uma restrição à intervenção estatal sobre a economia, só devendo esta ocorrer em setores imprescindíveis e ainda assim num grau mínimo. http://gppusp.blogspot.com/2008/06/peter-evans-o-estado-comoproblema-e.html Paulo Tigre 3 John Stuart Mill (1806 — 1873) Em Economia, o utilitarismo pode ser entendido como um princípio ético no qual o que determina se uma decisão ou ação é correta, é o benefício intrínseco exercido à coletividade , ou seja, quanto maior o benefício, tanto melhor a decisão ou ação. Paulo Tigre 4 Síntese Neoclássica Característica essencial: reconciliação das correntes clássica e keynesiana por intermédio de uma “revisão” (filtragem) do modelo de Keynes. Principais expoentes: Hicks (1937) Modigliani (1944) Patinkin (1948, 1956) Abordagem utilitarista do desenvolvimento 1. 2. 3. O bem-estar social é definido como uma função do bem-estar dos indivíduos ou famílias. A renda individual (ou consumo) é considerado uma proxi ou indicador de bem estar individual. Todos os indivíduos são classificados de acordo com sua renda, e atribuído pesos de acordo com sua posição. Por exemplo, a noção “progressiva” atribui um maior ganho em termos de bem estar quando um dólar é transferido para um indivíduo pobre do que a um rico. Em contraste, a “democracia do dólar” adotada nos modelos aplicados de bem-estar atribui o mesmo ganho marginal de bem-estar a um dólar extra de renda independentemente de quem recebe. Isso é o mesmo que dizer que a distribuição de renda em qualquer classe tem efeitos iguais. Paulo Tigre, UFRJ 6 O enfoque da linha de pobreza O enfoque da linha de pobreza dá peso zero a qualquer renda acima do necessário para assegurar as necessidades básicas. Medidas mais complexas atribuem pesos ao aumento de bem estar de acordo com o nível de renda dos indivíduos abaixo da linha de pobreza. A consequencia de definir desenvolvimento usando função de bem estar progressiva (ao invés de renda nacional agregada) é que a maximização do crescimento econômico não vai maximizar automaticamente o bem estar caso a distribuição de renda piore. Paulo Tigre, UFRJ 7 Friedrich Hayek Para Hayek, uma das funções principais do Estado (Mínimo) seria auxiliar na difusão de conhecimentos e informações permitindo uma maior mobilidade econômica, sem haver centralização de decisões, nem planejamento por parte do Estado . A esse Estado (Mínimo), restaria zelar pelo bom funcionamento do mercado: garantindo a ordem, elaborando leis de proteção à propriedade privada, leis de proteção à liberdade de expressão, a manutenção dos cárceres e a defesa das fronteiras Paulo Tigre 8 Estado de bem-estar x Estado mínimo Estado de bem-estar entende que o cidadão tem como direito político, e não como caridade, uma renda básica para sua boa sobrevivência, garantindo sua alimentação, educação, saúde e habitação. Contrariamente a tudo que pregava o Estado de bemestar, Hayek e Friedman, acreditavam que o Estado deveriam ter funções menos autoritária e menos paternalista. Paulo Tigre 9 Estado de bem-estar na Europa: Nórdicos: maiores níveis de proteção, universalização Eur. Continental: pensões, segurança Anglo-saxões: + assistência social – pensões. Mediterrâneos: Mais recente, assistencia + pensões Paulo Tigre 10 A visão neo-utilitarista do Estado Desilusão com o Estado se tornou endêmica no final da década de 70. O modelo neo-utilitarista do Estado considerava ilógico que as autoridades visassem o bem comum. O modelo neoliberal propõe que as relações pessoais dos governantes é a essência da ação do Estado. Suporte político por meio da troca de favores – subsídios, empréstimos, empregos, contratos, privilégios. Para escapar destes deletérios a esfera de atuação do Estado deve ser reduzida ao mínimo e o controle burocrático substituído por mecanismos de mercado. Paulo Tigre 11 Proposições de Milton Friedman ao Chile (1975) Friedman recomendou a Pinochet o seguinte programa econômico que chamou de “tratamento de choque”: • Suspensão imediata da emissão de dinheiro para cobrir o déficit público. • Corte de 20-25% das despesas púbicas, por meio da demissão de funcionários. • Fim do controle de salários e preços • Privatização das empresas estatais • Desregulamentação dos mercados financeiros • Livre comércio total Paulo Tigre 12 A visão neo-utilitarista Corrupção sempre foi uma característica dos Estados do terceiro mundo. De fato alguns Estados consome conspicuamente os recursos que extraem, encorajam o rentismo e falham em prover os bens coletivos. Ao invés de tentar separar o que o Estado seria capaz de fazer do que seria improvável e então fazer mudanças institucionais para melhorar o desempenho, os críticos passaram a demonizar o Estado e não o tipo de políticos e burocratas que o dominavam. A visão neo-utilitarista não está interessada em casos individuais, mas sim em negar a visão do Estado como um árbitro neutro, sustentada pelos autores neoclássicos. Questiona a busca de objetivos comuns (ação coletiva) e o cumprimento de ordens (relações dirigente/agente). Paulo Tigre 13 Ortodoxia neo-utilitarista Fé no mercado, sem qualquer crítica. Mesmo a economia neoclássica reconhecia a importância do Estado – mas mínimo. Estado caixa-preta exógena. Funções internas não eram assunto apropriados ou úteis a analise econômica. O neo-utilitarismo abriu a “caixa-preta” do Estado com instrumentos e ferramentas idealizados para analisar a otimização individual. A visão neo-utilitarista obscureceu, mais do que iluminou, em função de sua ambição exagerada. Paulo Tigre 14 A retração da ortodoxia neo-utilitarista Teoria neo-utilitarista é cínica e utópica. Cínica pq nega a importância pratica do espírito publico e utópica pq presume que a mão invisível oferece uma alternativa fácil. A visão NU torna impossível a própria existência do tipo de Estado limitado q. a própria economia NU exige. – Estado vigia-noturno cujas funções são restritas a proteger os interesses individuais, pessoas e propriedades, e fazer respeitar os contratos privados. O que impede os funcionários isolados de trabalharem juntos como uma coletividade? – NU não oferece evidencias. Porque aqueles que tem o monopólio da violência deveriam se contentar em ser apenas vigias noturnos? O q. os impediria de expandir os benefícios privados indefinidamente? Uma estrita aderência a lógica NU torna a existência do Estado difícil de explicar – uma impossibilidade teórica. Concepção neo-ut. de mercado também são problemáticas. Paulo Tigre 15 Eficiência alocativa a curto prazo não garante transformação estrutural – essência do desenvolvimento. Teoria neoclássica não diz que a maximização marginal garante otimização a LP. Estagnação da capacidade produtiva em um “ponto ótimo” – mantêm o status quo. Negação das normas culturais e de outros tipos de relações culturais para sustentar o processo de troca. Adam Smith: A teoria dos sentimentos morais é um complemento natural de A riqueza das nações. Paulo Tigre 16 Mercado x Relações institucionais O mercado anônimo de modelos neoclássicos é virtualmente inexistente na vida econômica. Relações comerciais de longo prazo requerem confiança – elementos não contratuais do contrato. A troca (mercado) pode reforçar os laços, mas não pode se sustentar sem eles. Paulo Tigre 17 Oliver Williamson A economia moderna é encapsulada dentro de grandes corporações formais, assim como por transações entre maximizadores individuais independentes. Papel das hierarquias formais: permitir a construção de um conjunto de vínculos dentro dos quais uma cultura interna pode crescer. Rede de firmas – relações de troca estão imersas em uma cultura fornecida por outros tipos de estruturas sociais. Onde entra o mercado? Relações de troca (mercado) não precedem outros tipos de relações sociais. Paulo Tigre 18 Contradições para implementar políticas neoliberais Ausência de mercados eficientes Paradoxo ortodoxo – Impor políticas neoliberais implica na imposição de mudanças radicais nas praticas de negócios existentes. Quem poderia implementar tais mudanças se o Estado é corrupto e ineficiente? Se as políticas propostas fossem efetivamente implementadas, a teoria neo-utilitarista do Estado estaria errada. Não há sucessos nas políticas neoliberais, o que minou sua credibilidade em todo o mundo. Mas ainda falta sucessor a NU, o que lhe dá uma certa sobrevida. Paulo Tigre 19 A tradição institucional comparativa Visão neo-utilitarista falhou em oferecer um retrato realista do Estado, por considera-lo uma simples agregação de motivações individuais. Burocratas não são maximizadores independentes pois suas decisões dependem de contextos institucionais complexos com interações historicamente enraizadas e incorporadas em estruturas sociais. Tal realidade é anterior aos interesses individuais, definindo prioridades. Falta de perspectiva comparativa é outro problema. Escolhas individuais não podem ser previstas por meio de simples pressuposições motivacionais universalistas. Paulo Tigre 20 Padrões institucionais históricos definem os interesses individuais e restringem a maneira como esses são perseguidos, um diagnóstico tipo "um modelo serve para tudo" não pode funcionar. Evans: As ações do Estado e suas conseqüências para o desenvolvimento se tornam contingentes do contexto no qual estão imersas e a melhor maneira de realizar uma análise comparativa é começar identificando as diferenças contextuais para então buscar as regularidades fundamentais. Sucedâneo ao modelo neo-utilitarista do Estado: tradição de trabalhos que analisam o Estado em termos históricos comparativos. Metodologicamente, é uma tradição que analisa seriamente as instituições. Teoricamente, está mais associada ao espírito da economia política clássica do que da "teoria econômica da política" dos neo-utilitaristas (Toye 1991b, 324). Paulo Tigre 21 O que são instituições? As instituições consistem em restrições ou regras informais – como as normas culturais e formais – inseridas em estruturas organizacionais particulares. (Deepak Lal) Instituições restringem a “natureza humana” ou o Homo Economicus: modelo assumido por economistas que entendem que o comportamento humano é motivado somente pelo auto-interesse – otimização da utilidade pelos consumidores e do lucro pelos produtores. Instituições visam restringir tal comportamento em benefício do bem comum. Douglas North As instituições são vistas como as regras do jogo e são constituídas por regras formais, como leis, constituições, estatutos, estruturas de direitos de propriedade e contratos individuais; regras informais, como sanções, tabus, costumes, tradições e códigos de conduta; e pela capacidade de fazê-las cumprir (enforcement) pelos próprios agentes ou por órgãos externos. Elas podem ser criadas, como as constituições nacionais, ou surgem no tempo, por meio de leis comuns, por exemplo (NORTH, 1990, 1992, 1994 e 2005). Paulo Tigre 23 Instituições e desenvolvimento A evolução das instituições é provavelmente a principal causa dos diferentes níveis de crescimento econômico, pois as decisões dos agentes são condicionadas pelo passado, por meio de normas culturais e ideológicas e estruturas organizacionais. (Deepak Lal, 1998) Max Weber (1864-1920) Weber postula que o estado é a entidade que possui o monopólio do uso legítimo da ação coercitiva. A política deverá ser entendida como qualquer atividade em que o estado tome parte, de que resulte uma distribuição relativa da força. Paulo Tigre, UFRJ 25 Max Weber e a burocracia Weber elaborou um conceito de burocracia baseado em elementos jurídicos do século 19, concebidos por teóricos do direito. Dentro dessa perspectiva jurídica, o termo era empregado para indicar funções da administração pública, que era guiada por normas, atribuições específicas, esferas de competência bem delimitadas e critérios de seleção de funcionários. A burocracia, então, podia ser definida da seguinte forma: “aparato técnico-administrativo, formado por profissionais especializados, selecionados segundo critérios racionais e que se encarregavam de diversas tarefas importantes dentro do sistema.” Paulo Tigre, UFRJ 26 Teoria da burocracia de Max Weber Parte da premissa de que o traço mais relevante da sociedade ocidental, no século XX era o agrupamento social em organizações. Procurou fazer um mapeamento de como se estabelece o poder nessas entidades. Construiu um modelo ideal, no qual as organizações são caracterizadas por cargos formalmente bem definidos, ordem hierárquica com linhas de autoridade e responsabilidades bem delimitadas. Weber cunhou a expressão burocrática para representar esse tipo ideal de organização, porém ao fazê-lo, não estava pensando se o fenômeno burocrático era bom ou mau. Weber descreve a organização dos sistemas sociais ou burocracia, num sentido que vai além do significado pejorativo que por vezes tem. Paulo Tigre, UFRJ 27 Tipos de sociedade ou poder ou autoridades legítimas segundo Weber Tradicional: irracional, conservador, patriarcal e patrimonialista. Carismática: irracional, conseguido através do carisma Burocrática, legal ou racional: racional, conseguido através de normas impessoais Paulo Tigre, UFRJ 28 Tipos de autoridade, segundo Weber Poder: potencial para exercer influência Autoridade: probabilidade de uma ordem ser obedecida. Ter autoridade é ter poder; mas ter poder não significa ter autoridade, principalmente quando não é legitimada (aceita por todos) Dominação: o governante acredita ter o direito do poder, e os governados a obrigação de obedecer-lhe Paulo Tigre - IE/UFRJ 29 Características da Burocracia Caráter legal das normas e regulamentos: é uma organização ligada por normas e regulamentos Caráter formal das comunicações: são registradas por escrito Divisão racional do trabalho Impessoalidade: relação a nível de cargos, e não de pessoas Hierarquia: cada cargo inferior deve estar sob supervisão do cargo automaticamente superior Rotina: o funcionário deve fazer o que a burocracia manda; não tem autonomia Meritocracia: a escolha das pessoas é baseada no mérito e na competência técnica Especialização da administração: separação entre propriedade e administração Profissionalização Previsibilidade: prever as ações; através das normas Paulo Tigre, UFRJ 30 Disfunções da Burocracia Excesso de formalismo: necessidade de formalizar e documentar todas as comunicações Resistência a mudanças Despersonalização: os funcionários se conhecem pelos cargos que ocupam Categorização como base do processo decisório: o que possui o cargo mais alto, tomará as decisões independentemente do conhecimento que possui sobre o assunto Conformidade às rotinas Exibição de poderes de autoridade Dificuldade com clientes: o funcionário está voltado para o interior da organização A burocracia não leva em conta a organização informal e nem a variabilidade humana. Paulo Tigre - IE/UFRJ 31 Questões críticas para discussão Será que os Estados desenvolvimentistas confirmam a alegação de Weber, de que a burocracia e o capitalismo “pertencem intimamente um ao outro”? Quais são as diferenças nas características de interação entre o Estado e as elites dominantes nos Estados predatórios e nos desenvolvimentistas? As burocracias desenvolvimentistas são mais ou menos insuladas que as predatórias? A possibilidade de fazer projetos conjuntos define os Estados desenvolvimentistas? Caso afirmativo, como a organização interna do Estado interage com as oportunidades surgidas na estrutura da sociedade para tornar os projetos conjuntos possíveis? Paulo Tigre, UFRJ 32 Para Weber, o Estado era útil àqueles que operavam nos mercados precisamente porque as ações de seus funcionários obedeciam a uma lógica bem diferente daquela atribuída a troca utilitarista. A capacidade do Estado em sustentar os mercados e o processo de acumulação capitalista depende da burocracia ser uma entidade corporativamente coerente na qual os indivíduos vêem os objetivos corporativos como a melhor forma de maximizar seus interesses individuais. A coerência corporativa exige que os funcionários responsáveis sejam até certo ponto isolados das exigências da sociedade circundante. O isolamento por sua vez, é acentuado através de um status distinto e recompensador aos burocratas. A concentração de capacitação na burocracia através de recrutamento meritório e a provisão de oportunidades para premiações em carreiras de longo prazo são também fundamentais para a eficiência da burocracia. Paulo Tigre 33 A perspectiva Weberiana As políticas bem sucedidas têm fundamentos estruturais. As estruturas burocráticas criam um conjunto de incentivos para os funcionários do governo, gerando afinidade entre estes incentivos e as políticas exigidas para o crescimento capitalista. Se Weber estiver certo, não daria certo impor políticas diferentes ao aparato estatal sem mudar a estrutura do próprio Estado. Mudanças reais em políticas e no comportamento dos agentes dependem da possibilidade de criar novas estruturas no Estado. A perspectiva Weberiana gera uma hipótese comparativa poderosa: as diferenças na estrutura do aparato estatal deveriam implicar em diferenças na sua eficácia. Deveria, portanto, ser possível ir além da identificação tautológica dos Estados desenvolvimentistas como àqueles que induzem o desenvolvimento, e explicar as diferenças na performance desenvolvimentista com base em contrastes estruturais duradouros. Paulo Tigre 34 Enquanto o Estado sustentar uma estrutura estável de regras permitindo assim que os retornos sobre os investimentos sejam previsíveis, os agentes privados farão o resto. Weber não levanta a questão de como o Estado poderia ir além de apenas reforçar as tendências naturais dos investidores, ou como poderia responder à uma situação na qual as forças empresariais privadas falhassem em emergir. O Estado de Weber é um apoio essencial ao capital privado, mas não constitui um agente transformador em si próprio. Relações Estado-sociedade: conectam o Estado aos grupos empresariais. O trabalho de economistas institucionalistas, como Gerschenkron e Hirschman, oferece uma visão das relações Estado-sociedade que servem como um bom complemento a Weber. Paulo Tigre 35 Karl Polanyi (1944) " O caminho para o livre mercado estava aberto e era mantido aberto graças a um enorme aumento no intervencionismo contínuo, centralmente organizado e controlado.” Desde o início, a vida do mercado foi entrelaçada não apenas com outros tipos de laços sociais, mas com diferentes tipos de políticas governamentais. Um Estado efetivo não era simplesmente um auxiliar do mercado, mas sim um pré-requisito essencial à formação das relações de mercado. A perspectiva de Polanyi abre uma porta para recuperar até mesmo os insights anteriores de Weber. Paulo Tigre 36 Polanyi complementou as idéias pioneiras de Weber... Weber argumentou que as operações das grandes empresas capitalistas dependiam da disponibilidade de um tipo de ordem que somente um Estado burocrático moderno podia oferecer. “O capitalismo e a burocracia se encontraram e se pertencem mutuamente.“ (1911) Imagem espelhada da visão neo-utilitarista: Os burocratas de Weber viam seus interesses atendidos pela execução de suas atribuições e pela contribuição para a realização dos objetivos do aparato como um todo. Usar as prerrogativas do cargo para buscar interesses privados era a característica arquetípica das formas pré-burocráticas. A superioridade do Estado burocrático moderno está em sua habilidade de superar a lógica individualista. Paulo Tigre 37 Gerschenkron (1962) Gerschenkron (1962) constatou a falta de capacitação empresarial, em países de desenvolvimento tardio na Europa focalizando as relações entre o Estado e capital. Competir com Estados já industrializados significava combinar o domínio de novas tecnologias com exigências de capital superiores àquelas que empresariado local era capaz de acumular. Para resolver esta contradição, o Estado teria que ir além de apenas prover um ambiente adequado e promover financiamento a LP. Na falta de capitalistas individuais capazes de assumir riscos na escala exigida pela tecnologia moderna, e instituições privadas que irão permitir que grandes riscos sejam partilhados por uma ampla rede de investidores, o Estado deve servir como banco de investimentos, reunindo os fundos necessários e encorajando sua aplicação em atividades transformadoras. Paulo Tigre 38 Gerschenkron e a Industrialização promovida pelo Estado. Empresários se defrontam com novas tecnologias e desafios competitivos sem ter os recursos suficientes para investir. Precisam do Estado para se financiar com recursos de longo prazo. Aceitação de riscos: empresários não estão dispostos a aceitar grandes riscos sem o apoio de instituicões do Estado. Crise de 2008: mostrou a precariedade das instituições financeiras privadas para lidar com crises. Paulo Tigre 39 F. Fanjzylber: “Industrializacion trunca na AL” (1989): Analisa do papel estratégico que teve a indústria de bens de capital no crescimento industrial das economias desenvolvidas. Na América Latina identifica lacunas, falhas e distorções no proceso de industrialização devido a ausência de um setor de bens de capital suficientemente desenvolvido que têm impedido de alcançar níveis de excelência produtiva. Uma “nova industrialização” se basearia no conceito de eficiência, baseado em “crescimento com criatividade”, isto é, com inovação tecnológica. Seria necessário constituir um “núcleo endógeno de progresso técnico”, tecnologicamente fortalecido e articulado com o conjunto do sistema produtivo, com o fim de dinamizar e alcançar excelência produtiva “que é a condição necessária para penetrar e manter-se no mercado internacional” Paulo Tigre 40 Albert Hirschman Argumenta que o capital não é o principal ingrediente que falta. O que impede o caminho da transformação industrial é uma carência de empresariado no sentido de "percepção de oportunidades de investimento e sua transformação em investimentos reais (Hirschman 1958,35). O Estado pode estimular uma tomada de decisão, que deve ir além de fornecer um ambiente previsível e reunir capital disponível em volumes maiores. Hirschman vê o Estado como uma fonte potencial de incentivos "desestabilizadores" que tornam mais difícil fugir das decisões e portanto induzem o capital privado a se tornar mais empresarial. Paulo Tigre 41 Gerschenkron e Hirschman sugerem que o repertório do Estado deve ir além do que foi vislumbrado por Weber. Eles não negam a importância de uma estrutura burocrática competente, coerente, mas sugerem que o distanciamento indiferente sugerido por Weber pode não ser suficiente. O novo empresariado de que fala Gerschenkron e o processo sutil de transformação da iniciativa privada enfatizado por Hirschman, exigem mais do que regras previsíveis e impessoais. Num processo de transformação "Gerschenkroniano" ou "Hirschmaniano", o formato do projeto de acumulação precisa ser descoberto, quase que inventado, e o Estado deve ser um participante em sua invenção. Não é suficiente diminuir a percepção de riscos. O empresariado deve ser seletivamente estimulado, complementado e reforçado. Isto, por sua vez, exige conexões mais íntimas com agentes econômicos privados, um Estado que seja mais "inserido" na sociedade e não isolado dela. Paulo Tigre 42 Gerschenkron e Hirschman apontam para a necessidade de complementar a hipótese de estrutura interna Weberiana com uma análise das relações Estado-sociedade. Como estão estruturados os elos entre o Estado e os grupos empresariais que ele tenta estimular? Gerschenkron e Hirschman são menos entusiastas que Weber sobre a capacidade do Estado desempenhar os papéis que eles consideram necessários. O legado desta tradição não foi uma imagem espelhada "estatista", da fé utópica neo-utilitarista no mercado. A questão de se um Estado qualquer é capaz ou não de compensar as deficiências dos agentes econômicos privados e impulsionar um processo de transformação permanece em aberto. Hirschman (1958, 65) "O fato do empresariado privado ser incapaz, ou não estar disposto, a fazer certos trabalhos, que gostaríamos que fossem realizados, não garante que o governo possa realizá-los." Paulo Tigre 43 O que a tradição institucional comparativa tem a oferecer? Identificação de alguns papéis que o Estado pode vir a preencher para promover o processo de transformação econômica e sugestões sobre que tipos de características institucionais podem ser necessárias para que o Estado tenha chance de representar esses papéis. Como identificar mais claramente as características organizacionais internas e os padrões de conexões externas associadas com a ação efetiva do Estado? Quais os exemplos históricos concretos que ilustrem suas variações? Paulo Tigre 44 Revisões Institucionalistas do Modelo Neoutilitarista: a nova economia institucional Oliver North (1986): "Em nossas interações diárias com outras pessoas, quer seja com a família, em relações sociais externas, ou em atividades de negócios, a estrutura governante é inteiramente definida por códigos de conduta, normas de comportamento, e convenções". “As estruturas institucionais" são "a chave crítica ao relativo sucesso das economias. Pagamos um alto preço pela aceitação sem crítica da teoria neoclássica" porque "a alocação era considerada como ocorrendo num mundo sem atritos, ou seja, num mundo onde as instituições não existiam ou que não eram importantes" Paulo Tigre 45 Robert Bates Professor of the Science of Government at Harvard University where he has studied and provided consulting assistance in the areas of governmental reform, economic policy reform, and political economy in many countries throughout the world. Since 1968, Bates has worked in Zambia, the Sudan, Uganda, Kenya, Colombia, and Brazil. Bates has focused much of his work on East and West Africa and has published widely on issues of public policy, agricultural policy, and economic policy reform in these regions. Paulo Tigre 46 Robert Bates (1989) "As burocracias e organizações não estão necessariamente em oposição aos mercados. Ao contrário, elas são freqüentemente responsáveis por sustentar e desencadear as forças do mercado." Os Estados e as sociedades são mutuamente constitutivos. Os interesses e as classes não são logicamente mais relevantes que o Estado e suas políticas. Os Estados ajudam a definir os interesses privados e têm um papel crucial no crescimento de classes e grupos de interesse. Paulo Tigre 47