Suanno, M. V. (2010). Universidade e práticas pedagógicas inovadoras. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell, N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. UNIVERSIDADE E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS INOVADORAS Marilza Vanessa Rosa Suanno* – UFG (Brasil) RESUMO Destaca-se nessa publicação algumas inovações teóricas e metodológicas apresentadas e desenvolvidas por professores universitários que têm intencionalmente trabalhado com a discussão e o enfrentamento da transição paradigmática, em específico os pesquisadores que se fundamentam na complexidade e na transdisciplinaridade. Destaco como inovações pedagógicas no contexto universitário: a) compreender a autonomia, criticidade e criatividade como atitudes interdependentes, b) favorecer a metacognição, c) perceber a relações entre pensamento e emoção, d) utilizar estratégias para sentipensar em contextos educativos, e) desenvolver a escuta sensível, f) promover a escuta musical em cenários de aprendizagem, g) utilizar em sala de aula de perguntas mediadoras e favorecer a elaboração se sínteses provisórias e h) educar por projetos de trabalho, por projetos de investigação. Devido à limitação de páginas para essa publicação apresentarei em outra publicação nesse mesmo evento as demais inovações pedagógicas identificadas no contexto universitário, sendo elas: a) pesquisar a profissionalidade docente emergente, b) investir na formação pedagógica do professor universitário, c) desenvolver pesquisa (auto)biográfica, histórias de vida, biografia educativa na formação de professores como processo que pode auxiliar no resgate da subjetividade, d) considerar os conhecimentos prévios dos acadêmicos no processo de ensino e de aprendizagem, e) promover aprendizagem cooperativa. INTRODUÇÃO No presente artigo apresento algumas inovações pedagógicas identificadas no contexto universitário, desenvolvidas por professores universitários que tem intencionalmente trabalhado com a discussão e o enfrentamento da transição paradigmática, em específico os pesquisadores que se fundamentam na complexidade e na transdisciplinaridade. Busca-se compreender os caminhos que estão sendo construídos em uma situação de supercomplexidade (BARNETT, 2005), em contexto de crise de hegemonia, crise de legitimidade e crise institucional da universidade, (SOUSA SANTOS, 1998). Entretanto contexto de crise são também oportunidade significativas para revisitar nossas concepções, desafiá-las e construir novas possibilidades de vida em sociedade, de organização institucional, de práticas formativas e práticas pedagógicas. 1- COMPREENDER A AUTONOMIA, CRITICIDADE E CRIATIVIDADE COMO ATITUDES INTERDEPENDENTES É UMA INOVAÇÃO 1 Suanno, M. V. (2010). Universidade e práticas pedagógicas inovadoras. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell, N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. Souza (2008) argumenta acerca da relação dialética existente entre autonomia, criticidade e criatividade. Destaco, aqui, a concepção de criatividade assumida pela autora, contextualizada e historicamente constituída pela ação de sujeitos em seu contexto cultural e histórico. Práticas pedagógicas inovadoras e emancipadoras orientam os alunos para desenvolverem autonomia e, desse modo, a aprendizagem cooperativa poderá promover a autonomia. Vale destacar que, para Maturana e Varela (1999), o processo de conhecer se confunde com a própria dinâmica da vida (orgânicopsico-ambiental) e ocorre numa organização autopoiética, na qual o indivíduo se auto-organiza. Souza (2008) evidencia que falta autonomia aos discentes, seja de graduação ou pós-graduação e cabe ao professor desenvolver ações planejadas e dirigidas para que os alunos tomem consciência de suas responsabilidades, dos seus objetivos, de gestão do tempo, bem como de suas descobertas e dificuldades. Buscando complementar essa análise, observo que alguns estudos têm evidenciado a falta de autonomia dos discentes, porém verifico também que muitos professores da graduação, bem como da pós-graduação, quando planejam as suas disciplinas, fecham a programação com um controle e (de)limitação dos conteúdos, dos temas, dos autores e das bibliografias. Assim procedendo, não permitem que o aluno, a partir do que for estudando, possa propor temáticas que venham a emergir das/nas aulas e das discussões ou que pareçam interessantes para investigação dos discentes. Essas temáticas poderiam fazer interfaces ou proporcionar aprofundamentos que a disciplina objetivaria alcançar. Pensando nessa mesma perspectiva, Santos (2004) afirma que “o processo ensino-aprendizagem é irredutível a uma metodologia racionalizante construída a priori.” Os processos de construções do conhecimento, na atualidade, abarcam os conceitos de multirreferencialidade e autorreferencialidade do processo ensino-aprendizagem e estes evidenciam a necessidade de se redimensionar o conceito de aprendizagem considerando o conceito de autopoiese. Santos (2004) considera que a diversidade de valores, crenças, ideais e situações escamoteiam o controle a priori pensado em base a postulados científicos e unidimensionais. Segundo essa autora, se não se superar a abordagem disciplinar nunca se alcançará um saber significativo. Precisa-se, então, de uma abordagem multirreferencial por meio da transdisciplinaridade, considerando-se a multidimensionalidade dos conhecimentos, ou seja, mudanças de níveis de conhecimento. 2- FAVORECER A METACOGNIÇÃO É UMA INOVAÇÃO Considerada uma prática pedagógica inovadora por buscar promover a tomada de consciência dos modos próprios de pensar e de resolver problemas por 2 Suanno, M. V. (2010). Universidade e práticas pedagógicas inovadoras. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell, N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. parte dos discentes, a metacognição busca identificar e compreender os modos de pensar. Assim ocorrendo, poderá potencializar o pensar, bem como compreender que essa é uma atitude e um processo cognitivo que exigem intencionalidade, de acordo com Brunner (1996). Apresenta-se como uma inovação pedagógica a preocupação em instaurar uma cultura do pensar no espaço da sala de aula universitária e, desse modo, explicitar, compartilhar e aperfeiçoar modalidades de pensamento. Souza (2008) propõe dois recursos importantes para o desenvolvimento de uma atitude intencional metacognitiva: a) incentivar o diálogo e a arte de formular perguntas fundamentais aos alunos, promover a reflexão coletiva sobre o que aprenderam e como aprenderam e b) valorizar o registro escrito da atividade mental desenvolvida no estudo, explicar o que se está compreendendo e como esse processo se dá. Como exemplo do registro escrito mencionado, alguns autores utilizam de portfólios e memoriais com o intuito de propiciar aos acadêmicos o registro e compreensão da atividade mental, dos processos, da elaboração de conceitos, das opções assumidas nos estudos desenvolvidos. Souza (2008) destaca que a discussão em torno da motivação escolar tem estado equivocadamente relacionada a estímulos externos que os professores utilizam ou disponibilizam aos alunos. Estudos têm evidenciado que a motivação é, sobretudo, um processo intrínseco ao sujeito que aprende, o qual envolve seus desejos, suas necessidades, sua atuação. A aprendizagem se estabelece no viver, consiste em mudar o mundo a partir das interações entre o sujeito e o mundo, mas não ocorre ao captar o mundo externo. Desta forma, o que se aprende seria uma expressão relacional do acoplamento estrutural do sistema vivente, como mencionado. Fundamentalmente educar e aprender são fenômenos biológicos que envolvem todas as dimensões do ser humano, em total integração do corpo, do espírito e do ser com o fazer. Troché-Fabre (1999) apud Souza (2008) coloca que, se os professores quiserem assumir a responsabilidade de atuar para motivar seus alunos, seria importante partir dos conhecimentos que esses já possuem, de seus interesses, seus ritmos, seus estilos de aprendizagem. Souza (2008) complementa pontuando que grande parte dos cursos e dos professores propõe mais a educar a razão que o sentimento e a vontade, ignorando assim a educação dos motivos. Para educar e aprender é fundamental que se tenha um motivo, um projeto, uma inquietação, um desejo, uma ideologia, tanto social como pessoal. Souza (2008), por sua vez, estabelece uma relação integradora entre motivação, perseverança no esforço mental e autonomia para concretizar ações de aprendizagem, bem como para superar dificuldades no processo de construção do conhecimento. 3 Suanno, M. V. (2010). Universidade e práticas pedagógicas inovadoras. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell, N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. Nesse sentido, uma prática pedagógica inovadora tem sido motivar os acadêmicos a refletirem sobre os conceitos que têm e como os têm elaborado. Na medida em que forem aprofundando os estudos, poderão reconstruir seus conceitos e concepções sobre as temáticas discutidas e suas redes de relações. 3- RELAÇÕES ENTRE PENSAMENTO E EMOÇÃO Souza (2008) apresenta que, de modo geral, professores universitários desvalorizam a afetividade, amorosidade com seus alunos. Em contrapartida, a autora propõe que, nas atividades docentes, se considerem a afetividade e a inteligência como sendo interdependentes em seu desenvolvimento, levandose em conta a perspectiva proposta por Wallon. Souza (2008) complementa que aprendemos o que tem significado, o que ativa nossa emoção, visto que as redes de significado que se constroem nas interrelações constituem os fundamentos do ato cognitivo. A autora apresenta que é importante para dirigir o processo de ensinagem assumir que a produção de significados é ligada a processos emocionais e que estes são processos complexo, tecidos conjuntamente. Goleman (1996) e Damásio (1996) demonstram em seus estudos as limitações da inteligência, se esta não é guiada pela emoção. Nesse sentido, considero relevante a citação de Moraes (2008, p. 79), como se segue: Educar na biologia do amor e da solidariedade implica integração entre o sentir, o pensar e o agir, integração entre razão e emoção. Pressupõe o resgate de sentimentos como expressão de nossa verdade interior. É educar visando à restauração da inteireza humana e conspirar a favor da multidimensionalidade do ser humano. Educar na biologia do amor é uma atitude de cuidar ao mesmo tempo do desenvolvimento do pensamento, da razão, mas também da pessoa, da emoção, respeitando-se as intuições e as emergências. Para educar nessa perspectiva é preciso construir ambientes de aprendizagem que sejam acolhedores, desafiantes, amorosos e não competitivos; ambientes nos quais se avalie o fazer em contínuo diálogo com o ser. 4- UTILIZAR ESTRATÉGIAS PARA SENTIPENSAR É UMA INOVAÇÃO Estratégias para sentipensar apresentam-se como uma prática pedagógica inovadora. Sentipensar é um processo que busca resgatar a dimensão emocional, o sujeito como elemento didático significativo do seu próprio processo de aprendizagem, de autoaprendizagem, de ecoaprendizagem. Moraes e Torre (2004, p.63) definem sentipensar como 4 Suanno, M. V. (2010). Universidade e práticas pedagógicas inovadoras. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell, N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. [...] processo mediante o qual se colocam para trabalhar conjuntamente o sentimento e o pensamento, a emoção e a razão, evidenciando, assim, o quanto nossas estruturas cognitivas são irrigadas pelos nossos componentes emocionais, pelos nossos sentimentos e crenças. Evidencia-se que sentipensar é um processo, uma dinâmica experiencial que visa estabelecer relações, interações entre o mundo interior subjetivo dos sujeitos e o mundo exterior, historicamente constituído e no qual os sujeitos vivem, legitimando ou não o que está posto. Moraes, (2008, p.164) propõe que a incorporação das estratégias de sentipensar nas práticas pedagógicas, de modo sistematizado, é fundamental se quisermos “formar indivíduos não apenas profissionalmente competentes, mas, sobretudo, cidadãos eticamente bem formados, pessoas sadias, emocionalmente equilibradas e felizes.” Estudos de Maturana e Varela (1995, 1997) apresentam que sentimento, emoção e ação são processos integrados em nossa corporeidade e desempenham papeis importantes de auto-organização de cada indivíduo. As estratégias didáticas de sentipensar propõem que os indivíduos (professores, alunos) possam entrar em contato com as suas emoções, seus sentimentos, seus valores, e assim perceberem o quanto a nossa capacidade de ação e de reflexão é nutrida pelas correntes de energia que circulam pelo nosso corpo, ativadas pelas emoções. Maturana e Block (1996) apud Moraes (2008, p.165) apresentam que as emoções e os sentimentos expandem ou restringem a capacidade operacional dos indivíduos, tanto no que se refere às possibilidade de reflexão quanto de atuação. O que se apresenta como inovador nas estratégias de sentipensar é a preocupação em se criar na sala de aula, seja universitária ou não, um espaço agradável, acolhedor, criativo, dialógico, afetivo; que as pessoas se sintam motivadas, valorizadas e respeitadas. A sala de aula, nessa proposta, apresenta-se como espaços emocionalmente sadios que valorizam o pensar e o fazer em contínuo diálogo com o ser. Moraes (2008) argumenta que a promoção do sentipensar pode e deve ser facilitada mediante o uso de diálogos multissensoriais, utilizando-se diferentes linguagens e estímulos, sejam eles visuais, musicais, verbais, táteis, cinéticos, intuitivos, meditacionais, dentre outros. Esses estímulos colaboram para os processos de sensibilização do acadêmico e para criação de condições emocionais mais adequadas e harmoniosas que facilitem os seus processos de aprendizagem integrada, como o proposto por Torre (2005). A aprendizagem integrada é uma concepção e proposta pedagógica em comunhão com o Pensamento Complexo proposto por Morin (2008) e pelo Pensamento Ecossistêmico de Moraes (2004). Aprendizagem integrada implica um processo educativo mais dinâmico pensado e construído de forma que seja colaborativo, recursivo, dialógico e hologramático em sua relação com o mundo, a vida, os conhecimentos, visto que somos seres simultaneamente enriquecidos pelas dimensões física, biológica, psíquica, social, cultural e espiritual. 5 Suanno, M. V. (2010). Universidade e práticas pedagógicas inovadoras. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell, N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. 5- DESENVOLVER A ESCUTA SENSÍVEL É UMA INOVAÇÃO Moraes (2008) propõe que o sentipensar seja uma estratégia transdisciplinar para promover a escuta sensível na perspectiva apresentada por Barbier (2002): uma escuta empática que possibilite ao indivíduo entrar em sintonia com o outro. A escuta sensível é uma postura de respeito, atenção e uma busca de compreensão do sujeito que fala. Barbier (2002, p.1) assim define a escuta sensível: Trata-se de um escutar-ver que recebe em seu significado a influência da abordagem rogeriana em ciências humanas, inclinando-se para a tendência interpretativa da meditação no sentido oriental do termo (Krishnamurti, 1994). A escuta sensível se apoia na empatia. O pesquisador deve saber sentir o universo afetivo, imaginário e cognitivo do outro para poder compreender de dentro suas atitudes, comportamentos e sistema de ideias, de valores de símbolos e de mitos. Para desenvolver a capacidade de ter uma escuta sensível, o professor precisa perceber o universo afetivo e cognitivo do outro para melhor compreender suas atitudes, seus comportamentos e seus sistemas de ideias. Se a escuta ativa, sensível, é tão significativa nas relações humanas, interpessoais, investigativas e pedagógicas, a escuta musical (PAREJO, 2007) afina e sensibiliza as pessoas para viverem e aprenderem em cenários de aprendizagem. 6- PROMOVER A ESCUTA MUSICAL EM CENÁRIOS DE APRENDIZAGEM É UMA INOVAÇÃO A escuta musical em cenários de aprendizagem possibilita a harmonização do ambiente e das pessoas, bem como a sensibilização para sentipensar. Envoltas nesse campo energético e vibracional, desenvolvem aprendizagens complexas e transdisciplinares. Os estudos de Parejo (2007) propõem a escuta musical como uma estratégia transdisciplinar privilegiada para o sentipensar e evidenciam que a escuta musical alimenta o saber interior ao propiciar o desenvolvimento de um conjunto de atitudes, como relaxamento, concentração, atenção, entrega, fruição de emoções. Segundo Parejo (2007), a escuta musical produz uma vivência interior rica que integra corpo e mente, numa coordenação perfeita para o sentipensar. Argumenta também que a escuta musical une as pessoas de forma sensível e a destaca como uma estratégia transdisciplinar privilegiada para o sentipensar. Ainda nesse contexto, a neurociência, dentre outros estudos neurológicos, tem revelado que existem estímulos (como a escuta musical) que criam no cérebro e no sistema nervoso campos energéticos. 6 Suanno, M. V. (2010). Universidade e práticas pedagógicas inovadoras. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell, N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. [...] correntes de energia e de substâncias químicas criam estados emocionais que, dependendo da emoção ou do sentimento ativado, inibem ou estimulam certos tipos de pensamentos, reflexões e ações que entram em ressonância com os ambientes e provocam alterações nos ambientes (SERVAN-SCHREIBER, 2004 apud MORAES, 2008, p.142). Nogueira (2008), por sua vez, apresenta a importância da formação cultural dos professores, da experiência estética, da fruição, como oportunidade de aproximação de distintas interpretações da realidade. A “formação cultural é um processo pelo qual o indivíduo se conecta ao mundo da cultura, mundo esse entendido como espaço de diferentes leituras e interpretações da realidade, promovidas pela Arte, nas suas diferentes modalidades e pela Literatura” (NOGUEIRA, 2008, p.1). A arte como forma de conhecimento humano e um meio pelo qual a humanidade tem tentado compreender a realidade. A Arte é, portanto, uma forma de interpretação do real, nem superior, nem inferior às demais: é apenas mais uma. É também múltipla, pois varia de acordo com suas diferentes modalidades ou linguagens: música, artes visuais, teatro, dança, cinema, fotografia, entre outras. A experiência estética seria justamente aquilo que acontece com o espectador no momento em que a Arte acontece, no espaço e no tempo em que está sendo fruída (NOGUEIRA, 2008, p.2). 7- UTILIZAR EM SALA DE AULA DE PERGUNTAS MEDIADORAS E ELABORAÇÃO SE SÍNTESES PROVISÓRIAS É UMA INOVAÇÃO Outra prática pedagógica de caráter inovador torna-se possível por meio de perguntas mediadoras, perguntas significativas que podem surgir ou ser construídas no diálogo entre teoria e prática, entre a observação dos fenômenos e as teorias que lhe dão suporte. Bonill e Calafell (2007) apud Moraes (2008) propõem que uma das formas de se ajudar o aluno a pensar de maneira complexa é propiciar a construção de perguntas que, partindo de uma visão complexa do fenômeno, favoreçam a construção de boas respostas. A utilização de perguntas mediadoras pode colaborar para o estabelecimento de relações úteis entre as elaborações do acadêmico e o pensamento científico. Os referidos autores pontuam que, para o desenvolvimento da ciência é fundamental possibilitar a construção de respostas às novas perguntas que vão sendo geradas a partir das teorias, práticas, processos, fatos, fenômenos. Alguns pesquisadores como Cunha (2000) e outros têm trabalhado com a proposta de ensino como pesquisa que se caracteriza como um exercício formativo de pesquisador e profissional capaz de investigar a sua realidade e 7 Suanno, M. V. (2010). Universidade e práticas pedagógicas inovadoras. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell, N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. suas práticas profissionais. Parece-me oportuno pontuar que o ensino como pesquisa pode valer-se das contribuições da exposição de Bonill e Calafell (2007) ao defenderem que perguntas mediadoras favorecem o desenvolvimento de uma visão dinâmica, relacional, interativa da realidade, dos fenômenos e das teorias. Os autores propõem que, no processo de ensino e aprendizagem, haja maior dinamismo e, para tanto, que a aula dialógica possa possibilitar reflexões e um diálogo criativo em torno da construção de “certezas provisórias” e “dúvidas temporárias”. Essa proposta coloca o aluno em contato com o seu processo individual e coletivo de construção de conhecimento e o ajuda a perceber a evolução do seu pensamento, bem como o processo que vai construindo para buscar cientificamente pesquisar o seu problema. A presente proposição possibilita ao discente autonomia intelectual, a autopoiese. Trabalhar com perguntas mediadoras promove um processo de ensinoaprendizagem desafiante; ao iniciar um estudo com uma pergunta significativa, pode-se favorecer a emergência de outras perguntas mediadoras ao longo do estudo. Para Cunha (2000), as respostas não importam tanto quanto as perguntas e ambas são sempre múltiplas. Moraes (2008), ao concordar com Bonill e Calafell (2007), destaca que essa proposta permite ou deva permitir: a) trabalhar na perspectiva da complexidade, b) elaborar perguntas que levem à abertura do processo de aprendizagem e não ao seu fechamento ou à sua paralisação, c) evitar perguntas que levem à simplificação e ao estabelecimento de certezas e verdades inquestionáveis, d) colocar, lado a lado, a razão, a emoção, a imaginação e a intuição, aliadas também ao imaginário, à sensibilidade e à criatividade, como condição necessária para a evolução do pensamento, da consciência, da sensibilidade e do espírito humano. 8- EDUCAR POR PROJETOS DE INVESTIGAÇÃO É UMA INOVAÇÃO TRABALHO, PROJETOS DE Hernandéz (1998a) propõe que se reorganize o currículo por projetos de trabalho em vez de um currículo organizado por disciplinas. Educar por projetos de trabalho significa trabalhar com projetos centrados em problemas, com perguntas mediadoras. Essa é uma organização curricular considerada ousada e inovadora, como afirma Hernández (1998a) é uma proposta transgressora. O autor defende a superação do ensino centrado em disciplinas por um currículo organizado por projetos de trabalho. Intitula sua proposição teórica como sendo uma transgressão, um convite a soltar a imaginação, a paixão e o risco por explorar novos caminhos que permitam às escolas deixarem de ser formadas por compartimentos fechados, faixas horárias fragmentadas, arquipélagos de docentes. Organizadas em projetos, maiores serão as chances de as escolas transformarem-se em uma comunidade de aprendizagem, onde a paixão pelo conhecimento seja a divisa, e a educação de melhores cidadãos o horizonte ao qual se dirigir. 8 Suanno, M. V. (2010). Universidade e práticas pedagógicas inovadoras. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell, N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. *Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás – UFG (Brasil). E-mail: [email protected] REFERÊNCIAS BARBIER, René. Escuta sensível na formação de profissionais de Saúde. Conferência na Escola Superior de Ciências da Saúde - FEPECS - SES-GDF. Brasília, D.F, 2002. Disponível em: http://www.barbierrd.nom.fr/ESCUTASENSIVEL.PDF. Acesso em: 16/11/2008. BARNETT, Ronald. A Universidade em uma era de supercomplexidade. Traduação Aurea Dal Bó. São Paulo: Anhembi Morumbi, 2005. BRUNNER, Jerome. Cultura da educação. Lisboa: Edições 70, 1998. HERNÁNDEZ, Fernando. Transgressão e mudança na Educação. Os projetos de trabalho. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998a. MATURANA, H. e VARELA, F. A árvore do conhecimento. Campinas: Psy, 1995. MOARES, Maria Cândida. Ecologia dos saberes: complexidade, transdisciplinaridade e educação – novos fundamentos para iluminar novas práticas educacionais. São Paulo: Antakarana/WHH – Willis Harman House, 2008. MORAES, M. 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