Revista RecreArte 12 www.revistarecrearte.net Revista RecreArte 12 > I - Creatividad Básica: Investigación y Fundamentación David de Prado Díez 2010 Santos, A.; Barros Sánchez,S. (2010) Métodos interativos na perspectiva da transdisciplinaridade. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. MÉTODOS INTERATIVOS NA PERSPECTIVA DA TRANSDISCIPLINARIDADE Akiko Santos (Ph.D) – PPGEA/UFRRJ/Brasil Sandra Barros Sanchez (Ph.D) - PPGEA/UFRRJ/Brasil Introdução Quando se pensa num processo educativo na perspectiva da Complexidade e Transdisciplinaridade, voltar à história da educação é de grande valia, pois fornece elementos para saber como os educadores que nos antecederam agiram na ministração do conhecimento na perspectiva renovadora e indicam modalidades metodológicas possiveis de resgatar e recontextualizar segundo as necessidades do nosso momento histórico. Neste texto não iremos retroceder aos primórdios da educação na sociedade humana. Pretendemos revisitar Métodos Interativos que fazem parte da história mais recente da educação e verificar sua compatibilidade com os conceitos da teoria da Complexidade e Transdisciplinaridade e reconceitualizálos. Métodos Interativos e a Transdisciplinaridade Existem muitos métodos que poderíamos chamar de interativos, como por exemplo, Método Paulo Freire, Método dos Complexos de Blonsky, Pinkevich e Krupskaia. No entanto, neste texto nos restringiremos ao Método Decroly, de Ovide Decroly (1871-1932) com seus “Centros de Interesse”, Método Freinet de Célestin Freinet (1896-1966), Método de Projetos de William Kilpatrick (1871-1965) e Temas Transversais (BRASIL, 1998). Chamamos de Métodos Interativos aqueles que permitem: 1. Interlocução entre os conhecimentos que estão compartimentados em disciplinas devido à orientação modernista. 2. Interlocução aplicando a democracia cognitiva (sem hierarquias, não superestimando determinados conhecimentos em detrimento de outros); 3. Interlocução entre todos os participantes do processo com possibilidade de integração dos agentes comunitários; 4. Aprendizagem considerando razão e emoção, integrando teoria e prática; 5. Uma organização do conhecimento de tal forma que o diálogo entre os diversos saberes, acadêmicos ou não-acadêmicos, permita a emergência de um saber global e significativo para o aluno; 6. Respeito à diversidade de estilos e ritmos de aprendizagem. 7. Respeito às diferenças individuais, raciais e culturais, considerando uma auto-formação, hetero-formação e eco-formação, estimulando a flexibilidade e tolerância perante as diferenças. Tais métodos se diferenciam do método tradicional de transmissão de conteúdos justamente pelos conceitos que os sustentam. Se focalizar tais diferenciações ao longo da história da educação, veremos que seus conceitos têm raízes no Iluminismo do século XVIII, época de grandes transformações Santos, A.; Barros Sánchez,S. (2010) Métodos interativos na perspectiva da transdisciplinaridade. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. político-econômico-sociais, início da Revolução Industrial e ascensão da burguesia liberal (ARANHA, 1996). Naquela época, segundo Aranha (1996) três eram as grandes linhas pedagógicas: o Enciclopedismo; o Naturalismo de Rousseau e a Pedagogia idealista de Kant (p.120). Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), não obstante ter sido um dos colaboradores da obra organizada por Denis Diderot (1713-1784) Encyclopédie, diferencia-se do grupo. Enquanto os outros enciclopedistas priorizavam a objetividade, transmissão de verdades e valores já constituídos pela humanidade, formando as bases da pedagogia europeia (Pedagogia Tradicional), Rousseau pensava a educação a partir das potencialidades de cada criança, como uma expressão própria em contato com a natureza (Pedagogia Renovada) . Rousseau centraliza os interesses pedagógicos no aluno, não mais no professor. Mais que isso, ressalva a especificidade da criança, que não deve ser encarada como um adulto em miniatura (ARANHA, 1996: p. 121). Sua noção de “democracia direta” também diferia da “democracia representativa”. Defendia que toda lei deveria ser ratificada pelo povo. O soberano era o povo que não delega poderes para os representantes: O cidadão, homem ativo e soberano, capaz de autonomia e liberdade, é ao mesmo tempo um súdito, porque submisso à lei que ele próprio ajudou a erigir. Liberdade e obediência são polos que devem se completar na vida do homem em sociedade (ARANHA: 1996: 122). As ideias de Rousseau vêm repercutindo ao longo dos séculos e influenciando as tendências pedagógicas alternativas, entre elas a Escola Nova, um ramo da Pedagogia Renovada, que se consolidou no Brasil pelas atuações de Anísio Teixeira (1900-1971), inspirado no ideário liberal de John Dewey (1859-1952): O movimento de renovação da educação, inspirado nas ideias de Rousseau, recebeu diversas denominações, como educação nova, escola nova, pedagogia ativa, escola do trabalho (LIBÂNEO, 1991: 62). As características dessa tendência pedagógica, sintetizando as colocações feitas por Libâneo (1991: p. 62-65), são: 1. Se opõe à concepção da Pedagogia Tradicional, verbalista, de memorização dos conhecimentos acumulados pela humanidade. 2. Advoga a educação pela ação. O centro é o aluno ativo e investigador. Interação entre o organismo e o meio através da experiência, estimulando a criança para que alcance seu objetivo de crescimento e desenvolvimento. Colocar o aluno em condições propícias para que, partindo das suas necessidades e estimulando os seus interesses, possa buscar por si mesmo conhecimentos e experiências. Trata-se de colocar o aluno em situações em que seja mobilizada a sua atividade global e que se manifesta em atividades Santos, A.; Barros Sánchez,S. (2010) Métodos interativos na perspectiva da transdisciplinaridade. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. 3. 4. 5. 6. intelectual, atividade de criação, de expressão verbal, escrita, plástica ou outro tipo. A atividade escolar deve centrar-se em situações de experiência onde são ativadas as potencialidades, capacidades, necessidades e interesses naturais da criança. Escola não é uma preparação para a vida, é a própria vida. O currículo não se baseia nas matérias de estudo convencionais que expressam a lógica do adulto, mas nas atividades e ocupações da vida presente, de modo que a escola se transforme num lugar de vivência daquelas tarefas requeridas para a vida em sociedade. O aluno e o grupo passam a ser o centro de convergência do trabalho escolar. O melhor método é aquele que atende as exigências psicológicas do aprender. Para que tais características fossem consideradas num processo ensinoaprendizagem, os educadores adeptos dessa tendência dedicaram-se à construção de metodologias de ensino, que aqui chamamos de Métodos Interativos, mas que também são conhecidos como Métodos Globalizados. Assim, temos: A metodologia chamada de “centros de interesse” proposta pelo belga, médico e educador Ovide Decroly (1871-1932) foi precursora da educação transdisciplinar, um ensino globalizado, centrado no aluno, contrapondo-se ao ensino fragmentado, centrado no professor. Decroly parte do princípio de que a criança percebe os fatos como uma totalidade, e que suas representações são globais (ARANHA, 1996, p. 173). De uma atividade como comer, estudava-se a origem dos alimentos, seus preços e distribuição, noções de geografia, história, ciências, matemática e linguagem oral e escrita. Ele classificou os interesses das crianças em seis grupos: A criança e a família; A criança e a escola; A criança e o mundo animal; A criança e o mundo vegetal; A criança e o mundo geográfico e A criança e o universo. Método Freinet, de Celéstin Freinet (1896-1966), francês, constrói sua teoria com base na ação, não separando o conhecimento escolar da vida, dos fatos sociais e políticos. Assim como Decroly, Freinet insurgiase contra o ensino tradicional enciclopédico, fragmentado, e era defensor da unidade do conhecimento através de um ensino global. Trabalhava os conhecimentos integrados e interdisciplinarmente. Na sua visão, o natural da criança, sendo ele seguidor do Partido Comunista Francês, não seria propriamente o jogo, mas sim o trabalho, como incentivo inicial do interesse na aprendizagem. Freinet utilizava técnicas tais como: Aula-passeio; Estudos de campo; Confecção de jornais de classe; Texto livre; Documentação; Livro da vida; Correspondência entre escolas, ler, compreender e responder. Método de Projetos, de William Kilpatrick ((1871-1965), norte-americano, difundiu-se no Brasil pela atuação de Anísio Teixeira e Lourenço Filho. O conhecimento seria trabalhado através de Projetos que requeriam Santos, A.; Barros Sánchez,S. (2010) Métodos interativos na perspectiva da transdisciplinaridade. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. diversidade de olhares, favorecendo a capacidade de análise, interpretação e crítica. Seu método consistia em uma tarefa como, por exemplo, construir uma casinha. Ao desenvolver o Projeto, ia-se aprendendo a geometria, desenho, cálculo, história natural. Kilpatrick formulou sua metodologia a partir de problemas reais, do dia-a-dia do aluno. Uma metodologia que transgride fronteiras disciplinares, visando a um ensino globalizado. Não havia disciplinas isoladas, elas se interrelacionavam. Kilpatrick concebia quatro grupos de projetos: de Produção; de Consumo; Resolução de problemas e Aperfeiçoamento de uma técnica. Dentro dos Métodos Interativos, podemos ainda incluir os Temas Transversais, instituídos nas escolas brasileiras no final do século passado, com assessoria de César Coll. Por sua amplitude metodológica, os Temas Transversais são os que melhor expressam a aplicação dos conceitos da Transdisciplinaridade, considerando a lógica do terceiro termo incluído, elaborado por Basarab Nicolescu (1999). Os Temas Transversais possibilitam o envolvimento de toda a comunidade escolar, desde professores, alunos e funcionários, como também a comunidade na qual estão inseridos. Ao se tomar a ÉTICA como tema transversal, discute-se o conceito de justiça, tomadas de decisões justas, solidariedade planetária, injustiças sociais, valores e moralidades que estruturam a atual sociedade. Ao se tomar o MEIO AMBIENTE, trazem-se à tona as relações homemnatureza, homem-animal (seres vivos em geral), conceitos e estruturas da economia predominante, da política e da cultura. Ao se tomar a SAÚDE, debate-se a miséria da humanidade planetária como consequência de uma orientação política, econômica, social, cultural e sanitária. Não só disseminar (como se pratica hoje em dia) hábitos de cuidados tanto da saúde como do meio ambiente. Os hábitos e valores estão em relação direta com o grau de consciência políticohistórico-cultural. Ao se tomar a PLURALIDADE CULTURAL como tema transversal, emerge a diversidade da formação humana, diferenças de raça, crença, origem social, cultura, formação profissional. Na ORIENTAÇÃO SEXUAL, para que não se transforme em simples receituário comportamental, torna-se necessária a contextualização na história da humanidade dos papéis assumidos em cada cultura, articulação com a ÉTICA referindo-se à integridade e dignidade, valores, tabus, preconceitos, respeito aos diferentes e igualdade de gêneros. Os métodos de ensino acima relatados, na prática, eles sofreram o fenômeno observado por Edgar Morin (2002) da “ecologia da ação”. O pesamento complexo nos diz que há uma ecologia da ação. A partir do momento em que lançamos uma ação no mundo, essa vai deixar de obedecer às nossas intenções, vai entrar num jogo de ações e interações do meio social no qual acontece, e seguir direções muitas vezes contrárias daquela que era nossa intenção. Santos, A.; Barros Sánchez,S. (2010) Métodos interativos na perspectiva da transdisciplinaridade. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. Logo, nunca estamos certos se nossas boas intenções vão gerar boas ações (MORIN, 2002: 19). Como já destacado por Libâneo (1991), Esse entendimento da Didática (ativa) tem muitos aspectos positivos, principalmente quando baseia a atividadade escolar na atividade mental dos alunos, no estudo e na pesquisa, visando a formação de um pensamento autônomo. Entretanto, é raro encontrar professores que apliquem inteiramente o que propõe a Didática ativa. Por falta de conhecimento aprofundado das bases teóricas da pedagogia ativa, falta de condições materiais, pelas exigências de cumprimento do programa oficial e outras razões, o que fica são alguns métodos e técnicas (p; 66). Métodos de ensino são sistematizações construídas a partir dos ideários de cada momento da sociedade, dando sustentação e fundamentação conceitual à educação no que se refere ao ser humano, à sociedade, à aprendizagem e ao próprio conhecimento. As teorias e seus conceitos orientam as práticas pedagógicas. No entanto é necessário atentar para o fato de que entre teoria e prática há o mundo da vida, da condição humana e sua sobrevivência no sistema constituído. Essas dimensões da vida fazem com que uma prática como a educativa nem sempre corresponda, integralmente, à teoria que a constituiu. Devido à força que a lógica clássica ainda exerce de separar, simplificar e reduzir quando um fenômeno é complexo, persiste a dicotomia entre teoria e método, sendo frequente aplicar-se o método com o senso comum, como se fosse algo independente, um saber simplesmente técnico. A dicotomia teoria e método leva a esse comportamento. Se a mudança metodológica não se faz acompanhar de mudança epistemológica, reproduz-se o sistema vigente da mesma maneira, ou seja, com novos métodos talvez mais eficientes. Os Métodos Interativos não seguem conceitos da Pedagogia Tradicional que organiza o sistema educacional em base a fragmentação do conhecimento, valorizando a objetividade e racionalidade, seguindo a lógica clássica de identidade e não-contradição e acreditando que aprender é memorizar, apropriar-se dos conhecimentos disponíveis fora do sujeito (dicotomia sujeito/objeto). Ao fazer a articulação dos conhecimentos, os Métodos Interativos transgridem a organização estabelecida. A lógica clássica não admite interação entre as disciplinas compartimentadas, de modo que, décadas atrás, quando se começou a falar de interdisciplinaridade, esta já extrapolava tal lógica. Os citados Métodos Globalizados (Escola Nova) também transgrediam a organização estabelecida. Na sua elaboração, os conceitos eram diferentes, hoje, aprofundados e delimitados pela teoria da Complexidade e Transdisciplinaridade. Ao articular os conhecimentos escolares, não os separando da vida, dos fatos sociais e políticos, trabalhando os diversos conhecimentos disciplinares integradamente, tais métodos seguiam outra lógica, a Lógica do Terceiro Termo Incluído que comanda a Metodologia Santos, A.; Barros Sánchez,S. (2010) Métodos interativos na perspectiva da transdisciplinaridade. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. Transdisciplinar (NICOLESCU, 1999) e sistematiza as articulações, visando uma compreensão mais global e significativa dos conhecimentos para a vida. Ao praticar a articulação dos conhecimentos transgride-se leis, lógica e conceitos que estruturam o nível disciplinar de fragmentação e compartimentação de saberes. Passa-se a trabalhar no outro nível, o nível da articulação dos saberes, da unidade do conhecimento. Cada Nível de Realidade (disciplinaridade e transdisciplinaridade) possui leis, lógica e conceitos próprios. Na articulação, dependendo das leis, lógicas e conceitos utilizados, observa-se, na prática, a emergência de vários graus de transdisciplinaridade. Conforme a satisfação em relação às leis, lógicas e conceitos aplicados, a articulação se aproxima mais do nivel da disciplinaridade ou do nível da transdisciplinaridade. Sommerman (2006) refere-se a tais oscilações entre Multi, Pluri, Inter e Transdisciplinaridade1 como a “valsa dos prefixos”. Na prática, há momentos em que estamos simplesmente justapondo (multidisciplinaridade) e há momentos em que integramos conteúdos de diferentes disciplinas (interdisciplinaridade) e quando se realiza, simultaneamente, diálogo entre distintos saberes (transdisciplinaridade) a compreensão supera o nível da fragmentação e passa-se a desenvolver no outro Nível de Realidade, uma compreensão global dos objetos de estudo. Quando os Métodos Interativos, sustentados na crença de que a criança percebe os fatos como uma totalidade, e que suas representações são globais, centram o ensino na aprendizagem do aluno com base na ação e na experimentação, seja no estilo de “Centros de Interesse”, de Decroly; ou seja propondo um trabalho no estilo Freinet; ou um projeto, no estilo de Kilpatrick; ou, ainda, desenvolvendo Temas Transversais, o conceito de aprendizagem já não é mais o de acumulação de conhecimentos, o de memorização e repetição mecânica da Pedagogia Tradicional Os conceitos de aprendizagem e de ser humano seguem outra fundamentação. Ainda que nos anos da elaboração dos métodos globalizados não se tinha uma sistematização científica, os conceitos que os sustentam, hoje, correspondem aos conceitos que os pesquisadores Maturana e Varela (2001) chamaram de autopoiese, isto é, que a aprendizagem é algo que o sujeito constrói por si mesmo em interação com as informações que o meio disponibiliza, um ato autopoiético e o ser humano seria um sistema autopoiético. A autopoiese sugere que a aprendizagem é um processo de duas vias: de fora para dentro e de dentro para fora. Ou seja, o sujeito, frente às informações, negocia, as adapta segundo suas características. Ele interage com o meio físico e social, como dizia Piaget (1976). No entendimento da Pedagogia Tradicional, a aprendizagem teria uma só via: de fora para dentro. Por isso, a forma tradicional de ensino se sustenta na exposição e memorização do conhecimento. A aprendizagem como sinônimo de memória se enreda com o conceito de conhecimento, como sendo 1 1 Nicolescu (1999) tanto alerta para o fato de que a transdisciplinaridade é radicalmente distinta das duas visões que a antecedem (pluri e Inter) como chama atenção para que não se diferencie em forma absoluta, pois a transdisciplinaridade corre o risco de esvaziamento. Santos, A.; Barros Sánchez,S. (2010) Métodos interativos na perspectiva da transdisciplinaridade. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. já dado, verdadeiro e universal, por isso, era necessário sua apropriação da parte dos alunos por meio de exercícios de repetições. Com tais conceitos, o ensino-aprendizagem só poderia ser o de transmissão de conteúdos, com um só movimento: o de transmissor para receptor. O conhecimento não é objetivo (fora do sujeito) e neutro. O sujeito constrói seu próprio conhecimento, dialogando com os que lhe são apresentados e para tal necessita o envolvimento emocional e racional, portanto, o conhecimento seria objetivo e subjetivo ao mesmo tempo e nãoneutro. Tudo o que existe no ambiente influencia o ser que o capta e integra no processo mental de interação e construção. Desse modo, o conhecimento é dinâmico, provisório e não-neutro. Os Métodos Interativos já trabalhavam com os novos conceitos de conhecimento, aprendizagem e ser humano. Considerar o ser humano como um sistema autopoiético é bem diferente da definição modernista de um ser racional. A modernidade, como continuidade da forma de pensar dos gregos se apoia no princípio da identidade e não-contradição da lógica Aristotélica, hoje, conhecida como lógica clássica. Descartes (1560-1650), pai da ciência e filosofia moderna, ao separar o sujeito do objeto, separa também o ser do conhecimento, a emoção da razão, o particular do coletivo, a unidade da diversidade (DESCARTES, 1973). Assim, trabalha com um sistema fragmentado, parcializado, unilateral. Daí, a definição do Homem como um ser racional, determinando e subsidiando o modo de ensinar, privilegiando somente a sua dimensão racional. A Pedagogia Tradicional se fundamenta no sistema cartesiano de interpretar os fenômenos e organiza toda a estrutura burocrática e conforma a mente das pessoas, aprisionando-as. As pessoas que nasceram e tiveram o cérebro estruturado dentro desse sistema não têm consciência do seu aprisionamento. Outro modo de pensar o ser humano consiste em tomá-lo por inteiro como faz Edgar Morin (2000): um ser complexo. Falar do ser humano é um problema realmente complexo. Complexo, no sentido de fenômenos “tecidos em conjunto”, um entrelaçamento de múltiplos fatores. E, para complicar, existe uma multiplicidade de facetas ainda não devidamente esclarecidas e outras que surgem no enfretamento da vida. Assim, o que quer que seja dito sobre o ser humano, deve-se tomar como conclusões transitórias e sujeitas a mudanças. Mas, mesmo nessas condições, é imprescindível que os educadores possuam uma noção do que seja o ser humano, pois é seu objeto de trabalho. Dependendo da definição que se tenha do ser humano, variará o seu modo de ensinar. Como Rousseau já percebia a condição paradoxal do cidadão dizendo que a liberdade e obediência (opostos) são polos que devem se completar na vida do homem em sociedade, hoje, a teoria da Complexidade e Transdisciplinaridade, fala do binário autonomia e dependência e traz o Princípio da Complementaridade dos Opostos: A noção de sujeito (como uma estrutura organizadora) compelenos a associar noções antagônica... o que exige um Santos, A.; Barros Sánchez,S. (2010) Métodos interativos na perspectiva da transdisciplinaridade. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. pensamento complexo... um pensamento capaz de unir conceitos que se rechaçam entre si e que são suprimidos e catalogados em compartimentos fechados... esse é o trabalho que precisa ser feito para que emerja a noção de sujeito. Do contrário, só continuaremos dissolvendo-o e transcendentalizando-o, e não chegaremos a compreendê-lo jamais (MORIN, 1996: 55). A construção da subjetividade humana é uma articulação de contrários (autonomia e dependência). A unidade se constrói em diálogo com a multiplicidade (autorreferencialidade e multirreferencialidade), consolidando uma unidade indissolúvel (opostos complementares unidade e multiplicidade). Desse modo, o ser humano tece a si mesmo articulando os antagônicos: razão/emoção, unidade/diversidade, subjetividade/objetividade, ser/saber, egocentrismo/altruismo. Oscila de um polo a outro conforme as circunstâncias internas e externas. É a dança dos binários. Os novos conceitos aqui delineados muito brevemente, estão implícitos nos Métodos Interativos. Ainda que nas suas aplicações manifesta-se o fenômeno do reducionismo. Na prática, as teorias são interpretadas por sujeitos que trazem suas próprias convicções e estão imersos no mundo da vida, da sobrevivência, adequando-se ao sistema. A falta de preparo adequado dos professores, faz com que se aplique a lógica clássica de oposição e não-articulação (que comanda inconscientemente o raciocínio. Fenômeno esse conhecido como princípio oculto), dicotomizando os pares binários, isto é, ao dicotomizar teoria e prática (ou teoria e método) desfigura a teoria que fundamenta a prática, anulando as transformações preconizadas pelas teorias e a educação continua igual, integrando somente algumas inovações pontuais, sem que se atinja o sistema como todo. Conclusões Assim como todo conhecimento é reconstrução do conhecimento, o resgate dos Métodos Interativos da história da educação nos oferece elementos para a construção metodológica de como se educar segundo os conceitos da teoria da Complexidade e Transdisciplinaridade. O importante nesse afazer é estar atento quanto ao nosso próprio instrumental de raciocínio, pois as sinapses neuronais estão automatizadas na lógica clássica de identidade e não-contradição. Lidar com a educação transdisciplinar significa construir novas sinapses neuronais. É distinguir a formação disciplinar, vida já determinada, certeza de todos os dias, comodidade dos horários fixos de aulas e mergulhar no incerto, na utopia, na possibilidade, ampliando o horizonte em busca da totalidade perdida. E então, um novo panorama se descortinará aos que ousam. Referências Bibliográficas ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. (1996). História da Educação. 2ª. ed. São Paulo: Moderna. BRASIL. (1998). Secretaria de Educação Fundamental. PCNs. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos: apresentação dos temas transversais. 3ª. ed. Brasília: MEC/SEF Santos, A.; Barros Sánchez,S. (2010) Métodos interativos na perspectiva da transdisciplinaridade. En Torre, S., Pujol, M.A., Rajadell N., Borja, M. (Coords) Innovación y Creatividad (CD-ROM). Barcelona: Giad. DESCARTES, René. (1973). Discurso do Método. In: Coleção Os Pensadores. Trad. J. Guinsburg e Bento Prado Junior. 1ª. ed. São Paulo: Abril-Cultural. LIBÂNEO, José Carlos. (1991). Didática. 2ª. ed. São Paulo: Cortez. MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco. (2001). A árvore do conhecimento. Trad. Humberto Mariotti e Lia Diskin. 2ª. ed. São Paulo: Palas Athena. MORIN, Edgar. (1996). A noção de sujeito. In: SCHNITMAN, Dora (org). Novos paradigmas, cultura e subjetividade. 1ª. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, p. 4558. _____________ (2000). A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. 1ª. ed. Trad. 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