Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 866.359 - ES (2006/0068933-2) RELATORA RECORRENTE ADVOGADO ADVOGADA RECORRENTE ADVOGADOS RECORRIDO ADVOGADO : : : : : MINISTRA NANCY ANDRIGHI VISA DO BRASIL EMPREENDIMENTOS LTDA TÚLIO FREITAS DO EGITO COELHO E OUTRO(S) CARLA RODRIGUES DA CUNHA LOBO BANESCARD BANESTES ADMINISTRADORA DE CARTÕES DE CRÉDITO E SERVIÇOS LTDA : GUILHERME PIMENTA DA VEIGA NEVES EDUARDO ARRUDA ALVIM WAGNER ROBERTO FERREIRA POZZER E OUTRO(S) : CINTIA SHIMABUCO : RODRIGO REIS MAZZEI E OUTRO(S) EMENTA DIREITO DO CONSUMIDOR. CANCELAMENTO INDEVIDO DE CARTÃO DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. DANOS MORAIS. EXISTÊNCIA. VALOR FIXADO EM PATAMAR RAZOÁVEL. - Não há ofensa ao art. 535 do CPC se o acórdão impugnado examinou motivadamente todas as questões pertinentes ao deslinde da controvérsia. - A simples menção ao artigo de lei sem a demonstração das razões de inconformidade não abrem o caminho do recurso especial. Aplicação da Súmula 284/STF. - A hipótese dos autos revela que, desde o ajuizamento da ação, estava claro para a autora que o defeito existiu na prestação do serviço contratado e oferecido pela administradora de cartões de crédito, não sendo atribuída à outra co-ré qualquer conduta relevante para a caracterização do defeito do serviço e nem se indicam motivos para lhe imputar a responsabilidade. Deve-se reconhecer, por isso, a ilegitimidade passiva da co-ré. - Só há propriamente cerceamento do direito de prova quando o julgador indefere a demonstração de fatos controvertidos, cujo esclarecimento é necessário e relevante para a prestação jurisdicional. - A modificação do valor fixado a título de compensação por danos morais só deve ser feita em recurso especial quando aquele seja irrisório ou exagerado. Recurso especial de Banescard improvido. Recurso especial de Visa do Brasil provido em parte. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 1 de 15 Superior Tribunal de Justiça constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial da Visa do Brasil Empreendimentos Ltda e, nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora e, também, à unanimidade, negar provimento ao recurso da Banescard Banestes Administradora de Cartões de Crédito e Serviços Ltda, nos termos da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Sidnei Beneti, Vasco Della Giustina e Paulo Furtado votaram com a Sra. Ministra Relatora. Impedido o Sr. Ministro Massami Uyeda. Brasília (DF), 05 de maio de 2009(Data do Julgamento) MINISTRA NANCY ANDRIGHI Relatora Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 2 de 15 Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 866.359 - ES (2006/0068933-2) RECORRENTE ADVOGADO ADVOGADA RECORRENTE ADVOGADOS RECORRIDO ADVOGADO : : : : VISA DO BRASIL EMPREENDIMENTOS LTDA TÚLIO FREITAS DO EGITO COELHO E OUTRO(S) CARLA RODRIGUES DA CUNHA LOBO BANESCARD BANESTES ADMINISTRADORA DE CARTÕES DE CRÉDITO E SERVIÇOS LTDA : GUILHERME PIMENTA DA VEIGA NEVES EDUARDO ARRUDA ALVIM WAGNER ROBERTO FERREIRA POZZER E OUTRO(S) : CINTIA SHIMABUCO : RODRIGO REIS MAZZEI E OUTRO(S) RELATÓRIO A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator): Cuida-se de recursos especiais interpostos por Banescard - Banestes Administradora de Cartões de Crédito e Serviços Ltda. e Visa do Brasil Empreendimentos Ltda., ambos com fundamento no art. 105, III, “a” e “c” da CF, contra acórdão proferido pelo TJ/ES. Ação: Cintia Shimabuco ajuizou ação indenizatória em face das recorrentes, Banescard - Banestes Administradora de Cartões de Crédito e Serviços Ltda. e de Visa do Brasil Empreendimentos Ltda., alegando que pretendeu realizar compras em estabelecimento comercial valendo-se de seu cartão de crédito. A autorização para a compra foi negada e o comerciante ainda foi orientado a reter o seu cartão. A situação lhe causou embaraço e constrangimento. Afirma que tentou resolver o problema junto à central de atendimento do cartão, mas a situação voltou a se repetir por seguidas vezes. Veio a descobrir que a razão para esses infortúnios foi a indevida inclusão de seu nome em cadastro denominado “boletim de cancelamento de cartões de crédito”. Requereu a reparação dos danos morais sofridos. Sentença: Afastou as preliminares de inépcia da inicial e de Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 3 de 15 Superior Tribunal de Justiça ilegitimidade passiva levantada por Visa do Brasil, para, no mérito, julgar procedentes os pedidos e condenar cada uma das recorrentes no pagamento de R$25.000,00 a título de danos morais, num total de R$50.000,00. Acórdão: O TJ/ES deu parcial provimento às apelações interpostas pelas recorrentes, para determinar que os juros e correção monetária sejam contados da data em que os danos morais foram fixados e, além disso, para reduzir os honorários advocatícios, fixando-os em 10% sobre a condenação. A sentença foi mantida nos seus demais termos. Confira-se: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. 1) PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA, REJEITADA. 2) PRELIMINAR DE INÉPCIA DA INICIAL, REJEITADA. 3) PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA, REJEITADA. 4) BLOQUEIO INDEVIDO DE CARTÃO DE CRÉDITO. USUÁRIO EXPOSTO A SITUAÇÕES VEXATÓRIAS. DANOS MORAIS INDENIZÁVEIS. 5) ESTIMAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO FEITA COM MODERAÇÃO. 6) INCIDÊNCIA DE JUROS E DE CORREÇÃO MONETÁRIA A PARTIR DA DATA DA FIXAÇÃO DO VALOR DOS DANOS MORAIS. 7) HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS ARBITRADOS EM EXCESSO. RECURSO PROVIDO EM PARTE. 1. Não consubstancia cerceamento de defesa a conduta do magistrado de piso que, malgrado tenha deferido a especificação de provas pelas partes, proferiu sentença, antes mesmo que elas fossem intimadas daquela decisão, convencendo-se de que a prova documental produzida era suficiente para dirimir a lide. 2. A falta de atribuição de valor certo ao pedido indenizatório por danos morais não implica em inépcia da inicial. 3. A VISA Brasil Empreendimentos Ltda. e a operadora de cartões de crédito, que mantém parceria comercial com a primeira, utilizando-se de sua da marca para a captação de clientes, respondem solidariamente perante o consumidor pelos danos originados da má prestação dos serviços. 4. O indevido bloqueio do cartão de crédito da recorrida foi a causa de diversas situações vexatórias vivenciadas por ela perante o comércio local. Os danos morais que lhe foram infligidos devem ser suportados pelos recorrentes, responsáveis pelo fato. 5. Fixados os danos morais com razoabilidade e proporcionalidade, Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 4 de 15 Superior Tribunal de Justiça atendendo aos parâmetros consagrados pela jurisprudência, não há que se reparar a sentença de piso. 6. Cuidando-se de dano moral, somente a partir da data em que seu valor foi fixado é que devem incidir juros e correção monetária. 7. A verba advocatícia foi fixada em patamar excessivo, haja vista o julgamento antecipado da lide, não tendo sido necessário realizar qualquer dilação probatória”. Embargos de declaração: Interpostos por ambas recorrentes e pela recorrida, mas rejeitados pelo TJ/ES. Primeiro Recurso Especial: Interposto por Banescard, sustentando violação aos seguintes dispositivos da legislação federal: (i) art. 535, II, do CPC, pois o acórdão impugnado deixou de suprir as omissões apontadas em embargos de declaração; (ii) arts. 330, I, e 333, I, do CPC, havendo cerceamento de defesa; (iii) arts. 159 do CC/1916 e 282, IV, 286, 295, do CPC. Indicou a existência de dissídio jurisprudencial no que diz respeito ao montante dos danos morais. Segundo Recurso Especial: Visa do Brasil apontou violação aos seguintes dispositivos de lei: (i) art. 535 do CPC, pois o TJ/ES não supriu as omissões indicadas nos embargos de declaração; (ii) arts. 130 e 330 do CPC; (iii) arts. 14 e 25, §1o, do CDC, bem com arts. 3º e 267, VI, do CPC, ante a sua ilegitimidade passiva; (iv) art. 927 e 944 do CC/02, pois o dano moral causa enriquecimento ilícito da recorrida. Apontou a existência de dissídio jurisprudencial. Recurso Extraordinário: Interposto por Banescard a fls. 500/513. Juízo Prévio de Admissibilidade: Apresentadas contra-razões (fls. 572/589; 615/620), o TJ/ES admitiu os recursos especiais, mas negou seguimento ao recurso extraordinário, e, em consequência, determinou a remessa dos autos ao STJ. É o relatório. Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 5 de 15 Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 866.359 - ES (2006/0068933-2) RELATORA RECORRENTE ADVOGADO ADVOGADA RECORRENTE ADVOGADOS RECORRIDO ADVOGADO : : : : : MINISTRA NANCY ANDRIGHI VISA DO BRASIL EMPREENDIMENTOS LTDA TÚLIO FREITAS DO EGITO COELHO E OUTRO(S) CARLA RODRIGUES DA CUNHA LOBO BANESCARD BANESTES ADMINISTRADORA DE CARTÕES DE CRÉDITO E SERVIÇOS LTDA : GUILHERME PIMENTA DA VEIGA NEVES EDUARDO ARRUDA ALVIM WAGNER ROBERTO FERREIRA POZZER E OUTRO(S) : CINTIA SHIMABUCO : RODRIGO REIS MAZZEI E OUTRO(S) VOTO A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator): Cinge-se a controvérsia a três pontos principais: (i) definir a legitimidade passiva da empresa que cede sua marca para exploração da atividade de cartão de créditos; (ii) constatar o cerceamento de defesa; (iii) avaliar a correção do valor dos danos morais. I. Violação ao art. 535 do CPC. Visa do Brasil apontou a violação ao art. 535 do CPC por considerar que o TJ/ES não disse “expressamente tal ou qual prova seria suficiente para o julgamento antecipado da lide” (fls. 529). Não assiste razão à Visa do Brasil, pois o acórdão impugnado indicou expressamente quais provas considerava essenciais para o julgamento antecipado do processo. A sentença, tal como mantida pelo TJ/ES, já havia destacado que a inclusão do cartão da recorrida em “boletim de cancelamento” é fato “em momento algum negado pelas requeridas, especialmente pela segunda ré, integrante do Sistema Visa, que por sua vez é responsável pela emissão do referido boletim, como bem se observa do contrato de fls. 27” (fls. 243). Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 6 de 15 Superior Tribunal de Justiça Por sua vez, Banescard lançou mão de uma suposta violação ao art. 535 do CPC como argumento subsidiário, a ser aplicado caso não se reconheça o prequestionamento para os demais temas que foram objeto do recurso especial. Não houve, entretanto, omissão, contradição ou obscuridade que justificasse o emprego dos embargos de declaração, sendo de rigor a rejeição daquele recurso. Ao contrário, o TJ/ES deu resposta a todos os temas aventados em apelação, não havendo que se falar em violação ao art. 535 do CPC. II. Violação aos arts. 159 do CC/1916 e 282, IV, 286, 295, do CPC. Embora mencione uma possível violação ao art. 159 do CC/1916 e arts. 282, IV, 286, 295, do CPC, Banescard não desenvolve argumentos para demonstrar no que consiste essa negativa de vigência à lei federal. Ocorre que a simples menção ao artigo de lei sem a demonstração das razões de inconformidade não abrem o caminho do recurso especial (AgRg no Ag 663.548/MS, 3a Turma, DJ 10.04.2006). Incide, nesse ponto, a Súmula 284/STF. III. Legitimidade passiva de Visa do Brasil (arts. 14 e 25, §1o, do CDC, 3º e 267, VI, do CPC). A ilegitimidade passiva da Visa do Brasil é preliminar que foi levantada juntamente com a contestação e vem sendo, desde então, objeto de discussão entre as partes. Tanto a sentença quanto o acórdão afastaram-na. O acórdão analisou detidamente a questão, fazendo expressa menção ao art. 25, §1o, do CDC. Estavam implícitas, no entanto, a análise dos arts. 14 do CDC, 3º e 267, VI, do CPC, sem o que jamais se poderia concluir pela legitimidade passiva. Por isso, o tema encontra-se devidamente prequestionado. O tema não exige, por outro lado, reexame de provas ou fatos, Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 7 de 15 Superior Tribunal de Justiça resumindo-se a aplicação do direito à hipótese vertente. O recurso especial da Visa do Brasil preenche, nesse ponto, os requisitos de admissibilidade. Embora se possa discutir a existência de um fornecedor aparente para as hipóteses em que sociedade empresária empresta sua marca a um serviço, que passa a ser por ela conhecido pela coletividade de consumidores, a hipótese desses autos afasta-se dessa controvérsia. Com efeito, a petição inicial narrou um defeito no fornecimento de serviços consubstanciado no indevido cancelamento de cartão de crédito. A irregular inclusão do número de cartão em um “boletim de cancelamento”, no entendimento da recorrida, deve ser atribuída a “operação realizada pelo funcionário do Banestes de nome Jatobá que havia atendido a autora pela primeira vez que procurou substituir seu cartão com problema, uma vez que o mesmo não sabendo operar o sistema, cancelou o referido cartão e solicitou uma 2a via do cartão que havia acabado de cancelar” (fls. 5/6). Mesmo a inércia para a correção do equívoco e exclusão do cartão da recorrida do “boletim de cancelamento” não é atribuída à Visa do Brasil, mas sim à administradora do cartão. Essas observações revelam que, desde o ajuizamento da ação, estava claro para a recorrida que o defeito existiu na prestação do serviço contratado e oferecido pela administradora de cartões, Banescard. A inicial não atribuiu à Visa do Brasil qualquer conduta relevante para a caracterização do defeito do serviço e nem indicou motivos para lhe imputar a responsabilidade pela conduta de funcionário alheio a seus quadros de pessoal. Nessas circunstâncias deve prevalecer o entendimento já manifestado por esta 3a Turma em situações análogas. Confira-se: Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 8 de 15 Superior Tribunal de Justiça “Cartão de crédito. Utilização da marca de empresa comercial. Legitimidade passiva da empresa comercial. 1. Descaracterizada na instância ordinária a existência de conglomerado econômico, não tem a empresa comercial que cede seu nome para ser usado em cartão de crédito legitimidade passiva para responder em ação de revisão de cláusulas contratuais diante da cobrança de encargos excessivos. 2. Recurso especial conhecido e provido” (REsp 652.069/RS, Rel. Ministro Carlos Alberto a Menezes Direito, 3 Turma, DJ 16/04/2007) Com essas ponderações, considero haver violação aos arts. 14 e 25, §1o, do CDC, 3º e 267, VI, do CPC, devendo o acórdão impugnado ser reformado, para que se reconheça a ilegitimidade passiva da Visa do Brasil. Com isso, ficam prejudicados os demais argumentos ventilados no recurso especial por ela interposto. IV. Cerceamento de defesa (arts. 330, I, e 333, I, do CPC). O juízo em 1º grau de jurisdição determinou que as partes indicassem as provas que desejavam produzir. Previamente à publicação deste despacho, aquele juízo retratou-se e deu solução de mérito ao processo, não realizando a dilação probatória. Nesse contexto é que Banescard argumenta haver cerceamento de defesa. A recorrente, segundo afirma em seu recurso especial, não teve a oportunidade de comprovar os fatos que fundamentam sua defesa (art. 333, I, do CPC), estando claro, ademais, que o processo não comporta julgamento antecipado (art. 330, I, do CPC). A produção judicial de provas submete-se a três pressupostos: (i) existência de questões fáticas controvertidas, isto é, a fatos afirmados por uma parte e negados por outra; (ii) necessidade e relevância da prova para a solução da controvérsia e; (iii) adequação do meio de prova indicado pela parte. A contestação de Banescard, no que diz respeito ao campo fático Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 9 de 15 Superior Tribunal de Justiça probatório, indicou que a recorrida fez utilização regular do cartão de crédito mesmo após os infortúnios narrados na inicial. Assim, a par das transações que a recorrida considerou serem problemáticas, haveria um grande número de outras compras concluídas com sucesso. Nesse ponto, a falta de dilação probatória poderia, no máximo, ter frustrado a oportunidade de demonstrar as circunstâncias narradas na defesa, mas essa prova em nada descaracterizaria o essencial para o sucesso da pretensão da recorrida, a saber, a indevida inclusão do cartão desta em “boletim de cancelamento”. A prova que poderia ser produzida pela defesa demonstraria, no máximo, que os transtornos narrados foram esporádicos, e não contínuos. Entretanto, o caráter isolado de algumas lesões não afasta, por si só, o dever de repará-las. Por outro lado, a defesa de Banescard indica que “se algum eventual problema foi ocasionado à autora, em especial na transação de 8 de agosto de 1997, na compra feita na 'Tecelagem Aparecida Ltda.', esta não se deu por culpa ou qualquer ato da ré, Banescard” (fls. 103). O argumento é irrelevante para fins probatórios, pois, como é cediço, a responsabilidade do fornecedor, sob a égide do CDC, prescinde da análise de culpa, fundamentando-se no risco. Assim, poder-se-ia exigir de Banescard a prova dos fatos que alegou em defesa (art. 333, II, do CPC), mas esses se revelaram irrelevantes para o julgamento da lide. Cabe ao juiz, de ofício, indeferir “as diligências inúteis ou meramente protelatórias” , segundo o art. 130 do CPC. Se, por um lado, as provas requeridas pela defesa revelavam-se inúteis, a prova documental apresentada até então já demonstrava suficientemente os fatos alegados pela autora, indicando que, de fato, seu número de cartão foi incluído sem qualquer justificação em “boletim de cancelamento”. Como ressalta o TJ/ES, esse fato foi demonstrado “(...) a fls. 32/34” e, em nenhum momento, foi “negado pelas requeridas (...)” (fls. 243). Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 1 0 de 15 Superior Tribunal de Justiça Mais que isso, o TJ/ES concluiu que os documentos juntados com a inicial demonstram que a recorrida experimentou transtornos na realização de compras localizadas. Assim, o juiz, ao se convencer de tal fato, cumpriu o dever de indeferir as provas desnecessárias, para entregar a prestação jurisdicional dentro de prazo razoável (anotando-se que os fatos ocorreram em 1996). Não houve, por isso, infringência aos arts. 330, I, e 333, I, do CPC. V. Valor dos danos morais. Dissídio jurisprudencial. Banescard volta-se contra o valor dos danos morais, considerando-os exorbitantes. Nesse sentido, traz à colação acórdão paradigma, proferido pela 4a Turma deste STJ, de relatoria do Min. Aldir Passarinho Junior, quando do julgamento do REsp 488.159/ES. No entanto, o cotejo analítico não revela a proximidade das hipóteses a ponto de se tomar aquele julgamento como paradigma para este. No julgamento do REsp 488.159/ES, estava-se diante do cancelamento de cartão de crédito e impossibilidade de realização de compra “perante um estabelecimento comercial de cidade onde [o consumidor] não residia” . Aqui, os constrangimentos não se resumiram a um estabelecimento comercial, perduraram no tempo, se deram na cidade em que a recorrida reside e perante pessoas de seu trato social. Ademais, o STJ tem afastado o óbice de sua Súmula 7 somente naquelas hipóteses em que o valor fixado como compensação dos danos morais revela-se irrisório ou exagerado, de forma a não atender os critérios que balizam o seu arbitramento, a saber, assegurar ao lesado a justa reparação pelos danos sofridos, sem, no entanto, incorrer em seu enriquecimento sem causa. Conforme afirmado pelo i. Min. Ruy Rosado de Aguiar em Voto-vogal no Resp nº 269.407/RJ, "(...) a intervenção do Superior Tribunal de Justiça há de se dar quando há o abuso, o absurdo: indenizações de um milhão, de dois milhões, de cinco milhões, como temos visto; não é o caso. Aqui, Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 1 1 de 15 Superior Tribunal de Justiça ficaríamos entre quinhentos, trezentos e cinqüenta, duzentos, duzentos e cinqüenta, cem reais a mais, cem salários a menos. Não é, portanto, um caso de abuso na fixação, é uma discrepância na avaliação. Temos que ponderar até que ponto o Superior Tribunal de Justiça deve interferir na fixação de um valor de dano moral, que é matéria de fato, para fazer uma composição mais ou menos adequada. Não sendo abusiva ou iníqua a opção do tribunal local, não se justificaria a intervenção deste Tribunal" . Assim, se o arbitramento do valor da compensação por danos morais foi realizado com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível sócio-econômico do recorrente e, ainda, ao porte econômico do recorrido, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, fazendo uso de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, o STJ tem por coerente a prestação jurisdicional fornecida (RESP 259.816/RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 27/11/2000). Esta é justamente a hipótese dos presentes autos. A recorrida sujeitou-se a constrangimentos indevidos em mais de uma oportunidade, requereu solução para o problema, no que não foi atendida. Some-se a isso, a necessidade de que o valor dos danos morais venha a refletir a capacidade econômica do causador do dano e sirva como fator de desestímulo. Portanto, não se vislumbra qualquer exagero na fixação do valor dos danos morais e, neste ponto, o recurso especial não deve ser conhecido. Mantém-se a condenação imposta a Banescard no valor de R$25.000,00 a título de danos morais. Em que pese o dano moral ter sido fixado em um montante global de R$50.000,00, sendo suportado em partes iguais por cada uma das recorrentes, a sentença não reconheceu solidariedade entre elas. Assim, impor, nesta sede, ônus maior à Banescard significaria admitir a Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 1 2 de 15 Superior Tribunal de Justiça “reformatio in pejus” . Forte em tais razões, CONHEÇO EM PARTE do recurso especial interposto por Visa do Brasil Empreendimentos Ltda. e, nessa parte, LHE DOU PROVIMENTO, para reconhecer a ilegitimidade passiva da recorrente. Por outro lado, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial interposto por Banescard Banestes Administradora de Cartões de Crédito e Serviços Ltda. Em razão da sucumbência da recorrida perante Visa do Brasil, fixo os honorários em favor desta, com base no art. 20, §4o, do CPC, em R$1.000,00 (mil reais). No que diz respeito à sucumbência de Banescard em face da recorrida, ficam mantidos os honorários advocatícios fixados pelo TJ/ES. Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 1 3 de 15 Superior Tribunal de Justiça CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA Número Registro: 2006/0068933-2 REsp 866359 / ES Número Origem: 35010116354 PAUTA: 05/05/2009 JULGADO: 05/05/2009 Relatora Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI Ministro Impedido Exmo. Sr. Ministro : MASSAMI UYEDA Presidente da Sessão Exmo. Sr. Ministro SIDNEI BENETI Subprocurador-Geral da República Exmo. Sr. Dr. MAURÍCIO DE PAULA CARDOSO Secretária Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA AUTUAÇÃO RECORRENTE ADVOGADO ADVOGADA RECORRENTE ADVOGADOS RECORRIDO ADVOGADO : : : : VISA DO BRASIL EMPREENDIMENTOS LTDA TÚLIO FREITAS DO EGITO COELHO E OUTRO(S) CARLA RODRIGUES DA CUNHA LOBO BANESCARD BANESTES ADMINISTRADORA DE CARTÕES DE CRÉDITO E SERVIÇOS LTDA : GUILHERME PIMENTA DA VEIGA NEVES EDUARDO ARRUDA ALVIM WAGNER ROBERTO FERREIRA POZZER E OUTRO(S) : CINTIA SHIMABUCO : RODRIGO REIS MAZZEI E OUTRO(S) ASSUNTO: Civil - Responsabilidade Civil - Indenização CERTIDÃO Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso especial da Visa do Brasil Empreendimentos Ltda e, nessa parte, deu-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora e, também, à unanimidade, negou provimento ao recurso da Banescard Banestes Administradora de Cartões de Crédito e Serviços Ltda, nos termos da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Sidnei Beneti, Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS) e Paulo Furtado (Desembargador convocado do TJ/BA) votaram com a Sra. Ministra Relatora. Impedido o Sr. Ministro Massami Uyeda. Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 1 4 de 15 Superior Tribunal de Justiça Brasília, 05 de maio de 2009 MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA Secretária Documento: 879416 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 15/05/2009 Página 1 5 de 15