"... quem quiser ser grande entre vós, será esse o que vos sirva; e quem quiser
ser o primeiro entre vós será servo de todos. Pois o próprio Filho do homem não
veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos."
(Marcos 10.43-45)
O cristão deve estar habilitado para servir e liderar.
Quando se afirma que uma determinada pessoa é líder, isso não significa
necessariamente um acréscimo de qualidade positiva àquela pessoa. Denominam-se de
líderes, por exemplo, desde os governantes aos chefes de gangues; dos gestores de
empresa aos sacerdotes de uma religião. Enfim, seja para o bem ou para o mal, os
líderes existem. Se estiver correto o conceito de que liderança é basicamente influenciar
pessoas, a história registra líderes que assassinaram milhões de pessoas, como o
soviético Joseph Stálin, e líderes que conduziram suas nações ao progresso social, como
o pastor americano Martin Luther King Jr. Portanto, não basta ser um líder. Importa que
o líder seja um ser humano dotado da capacidade de inspirar, apoiar e mobilizar pessoas
a cumprir uma missão.
O mérito da liderança não é exercê-la como um fim em si mesmo, mas a capacidade
de usá-la para servir. Há outros fundamentos básicos da liderança, como caráter e
integridade – e essas são características que podem ser desenvolvidas por qualquer
pessoa. O servo que lidera é marcado pela singularidade do bom caráter, que nada mais
é que a manifestação pública do seu estado de ser. Conheço mais servos que são líderes
do que líderes que são servos. E há muito mais gente escrevendo para os líderes do que
para os servos. Depois que li "O monge e o executivo", de James Hunter, que anima os
líderes a serem servidores, fiquei pensando em escrever um livro intitulado “O coroinha
e o office-boy”. Não seria uma réplica – apenas uma forma de falar de serviço a partir
do público que serve e tem um potencial extraordinário para liderar.
O detalhe é que nem sempre o pastor titular é o grande líder de uma igreja. Nem
sempre o artilheiro é o líder do time de futebol, assim como há gerentes que exercem
muito mais liderança numa empresa do que o presidente da corporação. Muitas vezes,
os líderes não têm qualquer posição oficial no grupo a que pertencem, mas se destacam
por sua integridade, carisma, caráter, capacidade de influenciar as pessoas para o bem
comum. A essência mais básica da liderança é o cuidado especial para servir as pessoas.
O líder, neste contexto, se realiza em cumprir o seu papel peculiar de tornar os seres
humanos mais humanos. O ser humano é a matéria-prima do servo que lidera. E, se a
matéria-prima dos líderes é o ser humano, o produto final que realiza esses líderes é o
desenvolvimento máximo das pessoas que lideram. Em geral, os servos que lideram
agem assim e nunca souberam conscientemente o bem realizado.
Ora, se liderança é influenciar pessoas pelo exemplo e pelo caráter, qual outro líder
na história da humanidade conseguiu influenciar pessoas tão positivamente e por tantos
séculos senão Jesus de Nazaré? Seu propósito não era liderar, era servir. Todos nós
temos sérias suspeitas sobre o cristianismo e sobre a incoerência das instituições cristãs;
mas, nem mesmo os opositores da religião cristã têm qualquer suspeita sobre a
capacidade extraordinária do serviço de Jesus Cristo prestado à humanidade. Nessa
tentativa de propor uma liderança marcada pela integridade, bom caráter, compromisso
com a plenitude de vida para todas as pessoas, e, naturalmente relacionados ao exemplo
de Jesus Cristo, o perfil proposto nesta reflexão estará sempre denunciando
inadequações, equívocos e atitudes que podem ser melhoradas na liderança. O propósito
não é provocar uma sensação de culpa, muito menos sugerir que alguém pode ser
melhor do que outras pessoas. A intenção é fortalecer uma necessidade básica para toda
e qualquer liderança – a necessidade fundamental de servir, em aprendizado e
crescimento contínuos. Aprender sempre, mas nunca para ser melhor do que os outros;
basta ser e fazer, a fim de se tornar o dia de hoje melhor do que o de ontem.
A partir deste raciocínio, fica evidente que a primeira tarefa do líder é cuidar de si
mesmo. Há um consenso muito evidente entre todos os estudiosos sobre liderança: o de
que ninguém consegue liderar outras pessoas se não gastar tempo, muito trabalho e
sabedoria em liderar a si mesmo. Se a tarefa primária da liderança é amar, servir e
influenciar os outros, o próprio líder é a primeira pessoa a desfrutar dessa tarefa. O líder
precisa ser inspirado por seus valores, fortalecido pelo prazer de servir e motivado pela
capacidade de se sacrificar. Se os monges e executivos precisam ser lembrados sobre
suas potencialidades em servir, os servos – tanto os coroinhas como os office-boys da
vida – precisam ser desafiados a exercer suas capacidades para que possam liderar. Não
há como pensar de forma diferente: a tarefa de liderar requer de quem a exerce muita
disciplina pessoal, investimento em conhecimentos diversos e, acima de tudo,
conhecimento e domínio sobre si mesmo.
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