INTEGRAÇÃO LAVOURA-PECUÁRIA PARA A AGRICULTURA FAMILIAR Editores Alceu Luiz Assmann André Brugnara Soares Tangriani Simioni Assmann ROBERTO REQUIÃO Governador do Estado do Paraná VALTER BIANCHINI Secretário de Estado da Agricultura e do Abastecimento INSTITUTO AGRONÔMICO DO PARANÁ - IAPAR JOSÉ AUGUSTO TEIXEIRA DE FREITAS PICHETH Diretor-Presidente ARNALDO COLOZZI FILHO Diretor Técnico-Científico ALTAIR SEBASTIÃO DORIGO Diretor de Administração e Finanças MARIA LÚCIA CROCHEMORE Diretora de Gestão de Pessoas INTEGRAÇÃO LAVOURA-PECUÁRIA PARA A AGRICULTURA FAMILIAR Editores Alceu Luiz Assmann André Brugnara Soares Tangriani Simioni Assmann INSTITUTO AGRONÔMICO DO PARANÁ Londrina 2008 INSTITUTO AGRONÔMICO DO PARANÁ COMITÊ EDITORIAL Séphora Cloé Rezende Cordeiro Sueli Souza Martinez - Editora Executiva Telma Passini EDITOR REVISOR Álisson Néri ASSISTENTE EDITORIAL/ESTAGIÁRIO Guilherme Mastelini da Costa Stephanie Bergamo DIAGRAMAÇÃO/CAPA Devanir de Souza Moraes Álisson Néri Rafael Fernando Cesário/estagiário DISTRIBUIÇÃO Área de Difusão de Tecnologia - ADT [email protected] / (43) 3376-2373 Tiragem: 2.000 exemplares Impresso na Gráfica Midiograf Publicação financiada com recursos do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Todos os direitos reservados É permitida a reprodução parcial, desde que citada a fonte. É proibida a reprodução total desta obra. I61 Integração lavoura-pecuária para a agricultura familiar / Alceu Luiz Assmann, André Brugnara Soares, Tangriani Simioni Assmann, editores. – Londrina: IAPAR, 2008. 49 p. : il. ISBN 978-85-88184-26-8 1. Desenvolvimento sustentável. 2. Agricultura familiar 3. Pastagem. I. Assmann , Alceu Luiz. II. Soares, André Brugnara, III. Assmann, Tangriani Simioni. IV. Instituto Agronômico do Paraná. V.Título. VI. Série. CDD 338.162 Impresso no Brasil / Printed in Brazil 2008 EDITORES Alceu Luiz Assmann Engº. Agrº. Dr. em Fitotecnia Área de atuação: Integração Lavoura-Pecuária Unidade de atuação: IAPAR - Unidade Regional de Pesquisa do Sudoeste do Paraná - Pato Branco - PR Fone: (46) 3213-1140 - [email protected] André Brugnara Soares Engº. Agrº. Dr. em Zootecnia Área de atuação: Forragicultura Unidade de atuação: Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR - Campus Pato Branco - PR Fone: (46) 3220-2536 - [email protected] Tangriani Simioni Assmann Engª. Agrª. Drª. em Fitotecnia Área de atuação: Integração Lavoura-Pecuária Unidade de atuação: Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR - Campus Pato Branco - PR Fone: (46) 3220-2501 - [email protected] Colaboradores Edson Antonio Pin Henrique Luís da Silva Joice Mari Assmann Roque Kirchner Salete Mafioletti Kozelinski Valtecir André Hirchorovitch APRESENTAÇÃO Embora seja praticado há muito tempo nas propriedades familiares produtoras de leite, o Sistema Integração Lavoura-Pecuária ainda apresenta muitos erros de interpretação e de aplicação dos seus conceitos básicos na prática. Muitos são os trabalhos científicos produzidos pela pesquisa, notadamente nos estados do Paraná e Rio Grande do Sul, sobre Integração Lavoura-Pecuária. Contudo, pela própria natureza desses trabalhos, a circulação das informações ocorre apenas entre os próprios pesquisadores, fazendo com que pessoas que aplicam diretamente a tecnologia - produtores rurais e profissionais da área tenham pouco material disponível sobre o assunto. Preocupados com essa situação, um grupo de pesquisadores do Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR) juntamente com professores e estudantes do Programa de Pós-graduação em Agronomia (PPGA) da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) resolveu sintetizar as informações sobre Integração Lavoura-Pecuária para a agricultura familiar, em especial para as condições subtropicais do Sul do Brasil. A sua consecução como publicação foi possível com o apoio do Ministério do Desenvolvimento Agrário, que repassou recursos ao IAPAR através da FAPEAGRO, por meio do contrato MDA/CAIXA/FAPEAGRO 0171326-26/2004. O grupo que elaborou este material foi composto, em grande parte, por agrônomos e médicos veterinários vinculados a empresas públicas e privadas de assistência técnica, com grande experiência e conhecimento prático da realidade das pequenas e médias propriedades produtoras de leite da Região Sudoeste do Paraná. O presente livro apresenta informações práticas para condução do Sistema Integração Lavoura-Pecuária com grande ênfase e preocupação em esclarecer os principais tabus e entraves que dificultam a utilização e impedem a maximização dos efeitos positivos desse sistema. Objetivamos com esta publicação contribuir para o esclarecimento e também suscitar questionamentos a respeito do Sistema Integração LavouraPecuária. Os editores SUMÁRIO 1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E INTEGRAÇÃO LAVOURA-PECUÁRIA ........... 7 1.1 Do Desenvolvimento Sustentável à Agricultura Sustentável .................... 7 1.2 O Sistema Integração Lavoura-Pecuária como Sistema de Agricultura Sustentável ............................................................................. 8 1.3 Incorporação de Conhecimentos e Tecnologia ................................... 10 2 MANEJO DE BIOMASSA ....................................................................... 11 2.1 Rotação de Culturas no Sistema Integração Lavoura-Pecuária ................ 12 2.1.1 Reflexos da adoção da rotação de culturas ............................. 13 3 A INCLUSÃO DOS ANIMAIS NAS ÁREAS DE LAVOURA COMPACTA O SOLO? .......... 14 4 CICLAGEM DE NUTRIENTES E ADUBAÇÃO ................................................. 16 5 PRODUÇÃO DE FORRAGEM NO SISTEMA DE INTEGRAÇÃO LAVOURA-PECUÁRIA .. 24 5.1 Planejamento Forrageiro na Integração Lavoura-Pecuária .................... 24 6 ESPÉCIES FORRAGEIRAS PARA O SISTEMA INTEGRAÇÃO LAVOURA-PECUÁRIA .... 28 6.1 Espécies Forrageiras de Inverno .................................................... 29 6.1.1 Aveia ........................................................................... 29 6.1.2 Azevém ........................................................................ 30 6.1.3 Triticale ........................................................................ 31 6.1.4 Centeio ........................................................................ 32 6.1.5 Trigo duplo propósito ........................................................ 32 6.1.6 Trevo ........................................................................... 33 6.1.7 Cornichão ..................................................................... 34 6.1.8 Ervilhaca ....................................................................... 35 6.2 Espécies de Verão ..................................................................... 36 6.2.1 Sorgo ........................................................................... 36 6.2.2 Milheto ......................................................................... 36 6.3 Consórcios Recomendados ........................................................... 37 7 MANEJO DAS PASTAGENS NO SISTEMA INTEGRAÇÃO LAVOURA-PECUÁRIA ........ 38 7.1 Método de Pastejo Contínuo ........................................................ 43 7.2 Pastejo Rotativo com Parcelas Fixas ............................................... 44 7.3 Pastejo Contínuo em Faixas ......................................................... 45 8 CONSIDERAÇÕES GERAIS ..................................................................... 46 9 REFERÊNCIAS ................................................................................... 47 10 GLOSSÁRIO .................................................................................... 48 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 7 1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E INTEGRAÇÃO LAVOURA-PECUÁRIA Tangriani Simioni Assmann Alceu Luiz Assmann André Brugnara Soares 1.1 Do Desenvolvimento Sustentável à Agricultura Sustentável O desenvolvimento sustentável foi definido pela ONU, em 1987, e na Conferência Rio, em junho de 1992, como “um desenvolvimento que atente às necessidades presentes de uma humanidade solidária, mas que deixe às gerações futuras a possibilidade de sobreviver e prosperar”. Baseadas nessa definição, as nações passaram a tomar consciência da necessidade vital de: • economizar os recursos naturais não renováveis como petróleo e minerais; • proteger a qualidade do meio ambiente: ar, água, solo, paisagens e biodiversidade da fauna e da flora; • promover práticas de manejo de solo, lavoura e pastagens que visem, no mínimo, manter a quantidade de carbono no solo e, se possível, aumentar o estoque de carbono no solo para auxiliar na desaceleração do aquecimento global. Portanto, é importante lembrar que: • foram necessários milhões de anos para formar as reservas de petróleo que terminarão, provavelmente, ao final de um século; • é preciso por vezes mais de mil anos para constituir um solo agrícola • que em poucos anos pode ser degradado, tendo toda a camada fértil removida; as tecnologias agrícolas (adubos, agroquímicos e mecanização) são recentes e, portanto, suas repercussões a longo termo ainda são mal conhecidas. Dessa forma, a agricultura sustentável é um dos aspectos do desenvolvimento sustentável ao lado de outros setores como desenvolvimento industrial, urbano e rural. A agricultura sustentável pode ser definida, então, como uma agricultura 8 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar economicamente viável, ecologicamente sã, socialmente justa e que visa a satisfazer às necessidades humanas sem destruir os recursos naturais. 1.2 O Sistema Integração Lavoura-Pecuária como Sistema de Agricultura Sustentável Integrar deriva do latim integrare e na perspectiva desta publicação significa: a) tornar inteiro, completar, juntar, inteirar, reunir, combinar, renovar, tornar intacto. O sistema integração lavoura-pecuária é aquele que “renova as condições edafológicas”, apoiando-se ao máximo sobre os mecanismos naturais de reciclagem e evitando a todo custo a entrada de insumos no sistema. b) fazer entrar num conjunto, como parte integrante (um significado de origem matemática). Portanto, integrar um sistema significa integrá-lo a um meio que esteja em sintonia com o seu ambiente; é uma agricultura que respeita a regionalidade, que introduz em suas práticas mecanismos naturais tais como a atividade biológica do solo, os efeitos do clima, a contribuição da fauna, e que também utiliza ferramentas como plantio direto, adubos, condicionadores de solo e agroquímicos na medida em que seus efeitos estejam em harmonia com os mecanismos naturais. Pode-se então definir o sistema integração lavoura-pecuária (Fig. 1) como o aproveitamento do solo para a produção agropecuária que busca reduzir a utilização de entradas exteriores ao sistema (energia e produtos químicos) valorizando ao máximo os recursos naturais e aproveitando os processos naturais de regulação. O sistema integração lavoura-pecuária é, simplesmente, um sistema mais autônomo e econômico, que respeita mais o meio ambiente. Na prática, podem ser apresentadas, resumidamente, três características do sistema integração lavoura-pecuária: 1) Valoriza ao máximo os recursos naturais. O sistema tem como base principal a reciclagem de todos os resíduos orgânicos das culturas agrícolas e das criações. Os resíduos e dejetos restituem a superfície do solo, uma parte dos fertilizantes que foram aplicados e os minerais extraídos do subsolo. Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 9 É um sistema diversificado que permite a maximização do uso da terra bem como a conservação do solo e da água. Permite a máxima utilização de um mesmo nutriente, que pode servir tanto para produção animal, quanto, após sua reciclagem via dejetos, ser utilizado para a produção de grãos. Busca a manutenção de resíduos orgânicos e dejetos animais na superfície do solo, via plantio direto, evitando desta forma aceleração dos processos de degradação da matéria orgânica. Adições de adubos calculadas para, no máximo, complementar os aportes naturais. Busca o cultivo de consórcio gramínealeguminosas para suprimir parcialmente as necessidades de adubação nitrogenada. Figura 1. Principais características do sistema integração lavoura-pecuária. 10 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar O sistema recomenda a utilização de explorações mistas: em uma mesma propriedade são associadas produções vegetais anuais e perenes (grãos, pastagens, reflorestamentos) bem como produção animal. Por essa razão, é recomendada a rotação de culturas e desaconselhada a prática de monocultivo, a sucessão de culturas e o confinamento de animais em pequenas áreas. O sistema considera o solo como um recurso a ser conservado e que, portanto, deve ser protegido da erosão. Para isso, são recomendadas técnicas culturais que preservem a matéria orgânica do solo na superfície ao invés de enterrá-la, o que condiz com o mesmo princípio da técnica de plantio direto. 2) Aproveita os processos naturais de regulação. Para aproveitar esses processos, o sistema integração lavoura-pecuária não conta unicamente com produtos agroquímicos, mas busca aproveitar ao máximo: a) a diversidade de cultivos de forragens e culturas agrícolas que promovem a diversificação dos organismos do solo, oferecendo uma dieta variada aos mesmos; b) a matéria orgânica proveniente de resíduos das forrageiras, culturas agrícolas e de dejetos animais que fornecem alimentos para os organismos do solo e promovem a formação de agregados de solo. 3) Busca reduzir a entrada de insumos na propriedade. A utilização das recomendações acima citadas e a implementação da utilização do sistema de plantio direto permite, a longo prazo, reduzir a entrada de insumos (adubos, pesticidas e petróleo) na propriedade, reduzindo os custos de produção: a) via manutenção ou aumento das porcentagens de leguminosas no sistema e evitando superpastejo, minimizando a aplicação de nitrogênio; b) protegendo as comunidades microbiológicas envolvidas nos processos de mineralização da matéria orgânica, minimizando práticas que promovem a compactação do solo, tais como pastejo e manejo mecânico com o solo úmido; c) pela aplicação de fertilizantes e dejetos animais de acordo com planos e estratégias de manejo de nutrientes. 1.3 Incorporação de Conhecimentos e Tecnologia O sistema integração lavoura-pecuária é um processo altamente intensificado, o que significa que todos os fatores de produção (recursos humanos, solo, água, insumos agrícolas e outros) são utilizados na sua máxima potencialidade, sem que isso venha significar prejuízos ambientais. Assim, o principal fator de produção a ser incorporado no sistema Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 11 integração lavoura-pecuária é o conhecimento. Para tanto, recomenda- se que o sistema seja sempre monitorado e acompanhado por assistência técnica especializada. Para agricultores familiares e pequenos produtores, que muitas vezes não têm condições financeiras para contratar assistência técnica, recomendase a formação de grupos para buscar informações e assistência junto às instituições públicas e organizações não governamentais de extensão e pesquisa, universidades, prefeituras, cooperativas, sindicatos e associações de produtores, entre outros. O sucesso do sistema integração lavoura-pecuária não é obtido via aplicação de adubos “mágicos” ou implantação de espécies “miraculosas”. Ele é obtido a partir do conhecimento, monitoramento e entendimento de todos os processos envolvidos nesse sistema. 2 MANEJO DE BIOMASSA Alceu Luiz Assmann Edson Antonio Pin A adoção do plantio direto é obrigatória no sistema integração lavourapecuária. Para que ele tenha sua sustentabilidade assegurada há a necessidade de: a) boa cobertura de solo durante o ano todo; b) aporte contínuo e abundante de biomassa vegetal; c) utilização de um sistema de rotação com plantas capazes de melhorar o balanço de nitrogênio no solo através da fixação biológica e rotação de culturas, incluindo culturas produtoras de grãos e forragem, e o mínimo revolvimento de solo. Devido à necessidade de manutenção de grande quantidade de biomassa para assegurar o bom uso do sistema de plantio direto, a implantação da integração lavoura-pecuária sobre essas áreas pode parecer conflitante, uma vez que grande parte da biomassa da pastagem produzida no inverno, que serviria de cobertura de solo para semeadura das culturas de verão, será ingerida pelos animais. Entretanto, estudos comprovam que, se bem manejado, esse sistema pode favorecer tanto a pecuária quanto a agricultura (ASSMANN et al., 2003; 2004). Os pontos principais para o sucesso do sistema de integração lavourapecuária são: 12 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar a) ajuste da pressão de pastejo ou freqüência e intensidade de utilização da pastagem; b) adubação da pastagem como se fosse uma cultura de grãos. Em propriedades onde o manejo da pastagem não é realizado de forma correta, pode-se reduzir o aporte de palhada a quase zero. Exemplos disso são condições de superpastejo devido ao excesso de carga animal colocada sobre a pastagem. O sistema, entretanto, deve proporcionar condições para que as áreas pastejadas possam se recuperar e acumular fitomassa para atingirem um nível de matéria seca que permita a implantação das culturas de verão sobre uma quantidade adequada de cobertura de solo ou manejar a pastagem para que esta possa ter um bom aporte de massa residual no final do pastejo para o plantio das culturas de verão. Para uma boa manutenção de resíduo do solo e um aporte de massa seca final (residual) mínimo para o bom manejo do plantio direto sem prejudicar o sistema são necessários 2.000 kg/ha de matéria seca, aproximadamente, ou seja, em torno de 15-20 cm de altura para o caso de pastagens de aveia e/ou azevém. 2.1 Rotação de Culturas no Sistema Integração Lavoura-Pecuária A rotação de culturas aumenta o nível de complexidade das tarefas nas propriedades. Exige planejamento de uso do solo e da propriedade, seguindo princípios básicos que consideram a aptidão agrícola da gleba (ASSMANN et al. 2002). As recomendações de rotação de cultura em sistema de integração lavoura-pecuária devem ser planejadas de acordo com o objetivo proposto. No entanto, a escolha do sistema de rotação de culturas deve preconizar a oferta de forragem constante nas diferentes estações do ano. É desejável alternar gramíneas e leguminosas quando se quer aumentar a cobertura do solo com restos culturais ou elevar a disponibilidade de nitrogênio através da escolha de espécies com relação carbono/nitrogênio baixa ou decomposição rápida. Vários trabalhos desenvolvidos nos últimos anos mostram que o sistema de integração lavoura-pecuária com a presença de animais é benéfico a longo prazo. O rendimento de grãos das culturas comerciais tendem a ser superiores em áreas que foram pastejadas. A Tabela 1 apresenta um sistema de rotação de Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 13 Tabela 1. Sistema de rotação de cultura para cinco anos em sistema de integração lavoura-pecuária no Sudoeste do Paraná. Período Ano 1 Ano 2 Ano 3 Ano 4 Ano 5 Inverno Verão Inverno Verão Inverno Verão Inverno Verão Inverno Verão Culturas a serem implantadas Centeio + aveia branca + azevém Soja Aveia branca + azevém + trevo branco + trevo vermelho Milho Aveia branca + azevém + trevo branco + trevo vermelho Soja Aveia branca + azevém + trevo branco Soja Aveia branca + azevém + trevo branco Milho Fonte: ASSMANN et al., 2002 culturas que preconiza o uso de 100% da área no inverno para pastejo direto pelos animais e cultivo de grãos comercias no verão. Qualquer sistema racional de agricultura incluirá a rotação de espécies como princípio básico e prioritário de estabilidade da produção. Além disso, devem-se alternar plantas com sistemas radiculares que permitam maior infiltração de água e a retirada de nutrientes da camada mais profunda do perfil do solo, deixando-os na superfície após a mineralização da palha (GASSEN; GASSEN, 1996). 2.1.1 Reflexos da adoção da rotação de culturas A utilização de diferentes espécies vegetais de forma seqüencial agrega diferentes tipos de resíduos, permitindo a biodiversidade de agentes que atuam diretamente na reciclagem de nutrientes, melhorando a estrutura e aumentando a capacidade produtiva do solo. No sistema integração lavoura-pecuária ocorre melhor aproveitamento dos nutrientes presentes nas pastagens, em virtude de as perdas por exportação serem menores, uma vez que o excremento dos animais fica na área pastejada e ocorre a ciclagem de nutrientes. A falta de cobertura e de conservação do solo proporcionam degradação. Por outro lado, quando o produtor mantém boa cobertura de palha após o pastejo e boa conservação do solo, ele não perde no solo e tem ganho na produção (Fig. 2). 14 a Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar b Figura 2. Erosão superficial, conseqüência da pouca cobertura (a) e solo em boas condições de conservação sob sistema de plantio direto (b). 3 A INCLUSÃO DOS ANIMAIS NAS ÁREAS DE LAVOURA COMPACTA O SOLO? Tangriani Simioni Assmann Joice Mari Assmann Valtecir André Hirchorovitch O solo é um sistema dinâmico, composto por minerais e espaços que são ocupados por água, ar, micro e macroorganismos. Para se alcançar seu máximo potencial de produção, ele deve apresentar espaços para abrigar microorganismos, armazenar água e ar e, desta forma, permitir o adequado desenvolvimento das plantas (Fig. 3). Um dos maiores receios dos produtores é que a entrada de animais em áreas cultivadas exclusivamente com culturas agrícolas compacte o solo, ou seja, provoque uma modificação estrutural, tornando-o mais resistente à penetração das raízes, prejudicando o crescimento das plantas. O que provoca a compactação de um solo não é exclusivamente a entrada de animais ou mesmo de um equipamento agrícola. Na realidade, a forma que se dá a entrada dos animais, ou seja, o manejo animal, bem como o manejo da cobertura vegetal que se encontra sobre este solo é que pode compactá-lo. Muitas vezes, os animais entram nas áreas de integração lavoura-pecuária que apresentam baixa disponibilidade de forragens. No período de outono, principalmente, o produtor tende a antecipar a entrada dos animais nas pastagens anuais de inverno (aveia e azevém) devido à falta de planejamento forrageiro para o vazio alimentar de outono; ou, após a entrada dos animais, o produtor trabalha com carga animal acima da capacidade de suporte da pastagem. Esses procedimentos fazem com que o resíduo deixado para a cultura agrícola posterior seja insuficiente para assegurar um bom manejo para plantio direto. Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 15 Figura 3. Representação do solo estruturado com espaços ocupados por organismos do solo. A falta de cobertura adequada expõe o solo diretamente ao efeito compactador dos cascos dos animais, assim como ao impacto causado pelas gotas de chuva e pela entrada de equipamentos agrícolas, tornando-o suscetível aos processos erosivos e à compactação. Ao chegar ao solo, a água da chuva infiltra-se ou escoa sobre ele. O processo de infiltração é reflexo do equilíbrio da estrutura do solo, sendo dois fatores importantes nesse processo: a porosidade (principalmente os macroporos – canais preferenciais das raízes) e a ausência de selamento superficial (crostas superficiais) e camadas compactadas (Fig. 4). A presença de plantas vegetando constantemente e em adequado estado de desenvolvimento, que não sofreram superpastejo, faz com que suas raízes a b Figura 4. Canais preferenciais no solo (a) e crosta de selamento superficial do solo (b). 16 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar (tanto as das forrageiras como as das culturas agrícolas) tenham um efeito descompactador (Fig. 5). Quando há redução na macroporosidade, a taxa de infiltração no solo é reduzida, pois são os poros que fazem o escoamento rápido do excesso de água. Não havendo a infiltração de água, ocorre o escoamento sobre a superfície do solo em volumes cada vez maiores. A redução da infiltração também acarreta menor armazenamento de água. Deve-se lembrar sempre que as raízes, ao crescerem e posteriormente morrerem, deixam espaços no solo chamados de canais preferenciais. Esses canais facilitam a infiltração de água, reduzindo o processo erosivo e aumentando a capacidade de armazenamento de água do mesmo, fazendo com que as plantas cultivadas fiquem menos suscetíveis a períodos de estiagem. Figura 5. Efeito descompactador das raízes construindo canais preferenciais de até 60 cm de profundidade no solo. 4 CICLAGEM DE NUTRIENTES E ADUBAÇÃO Tangriani Simioni Assmann Alceu Luiz Assmann Joice Mari Assmann A sustentabilidade do sistema integração lavoura-pecuária tem como um dos seus princípios básicos a ciclagem de nutrientes, ou seja, a utilização de um mesmo nutriente, mais de uma vez, para produção vegetal e animal. Dessa forma, o adubo aplicado (uréia, NPK) sobre a pastagem servirá para aumentar a produção vegetal que será consumida pelos animais, resultando em maior produção de leite ou carne. Na seqüência, esses mesmos nutrientes são restituídos à área através dos dejetos animais, podendo ser utilizados Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 17 novamente para produção de pastagem ou permanecer no solo para serem utilizados em futuras produções de grãos, como o milho, por exemplo (Fig. 6). Os ciclos da água, carbono, nitrogênio, fósforo e enxofre são os mais importantes processos de ciclagem de nutrientes no sistema de integração lavoura-pecuária. Cada ciclo tem sua complexidade de interações e transformações bem como interações com os outros ciclos de nutrientes. O ciclo da água é essencial para a fotossíntese e para o transporte de nutrientes das raízes à parte área das plantas. Por outro lado, a água pode facilitar os processos de perda de nutrientes por meio de processos de lixiviação, escorrimento superficial e erosão. O ciclo do carbono é a base para a formação das células e da qualidade do solo. Inicia-se com o processo de fotossíntese e inclui processos de respiração, mineralização, imobilização e formação de húmus. O nitrogênio atmosférico é fixado por bactérias, convertido, no solo, de amônia a nitrato por outros tipos de microrganismos e liberado para a atmosfera por outros grupamentos. Uma grande variedade de organismos do solo está envolvida nos processos de decomposição que liberam ou mineralizam o nitrogênio, fósforo, enxofre e outros nutrientes dos resíduos de plantas e dejetos animais. O manejo das pastagens e das culturas agrícolas influencia as interações e transformações que ocorrem nos processos de ciclagem de nutrientes. A eficiência desses ciclos influencia a produtividade de forragens e grãos, o crescimento e a produção animal. Na Fig. 7, é possível observar que para a produção leiteira menos de 20% dos nutrientes consumidos pelos animais são utilizados para funções estruturais e metabólicas dos animais, de 13% a 20% são exportados junto com o leite que é retirado de área de produção e de 60% a 75%, dependendo do nutriente consumido, retornam a área na forma de dejetos (fezes e urina). a b c Figura 6. Placa de esterco com plantas de trevo crescendo ao redor (a); retorno de nutrientes via urina (b); e placa de esterco com plantas de milho em área de integração lavoura pecuária (c). 18 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar NITROGÊNIO 20% 60% 20% FÓSFORO 13% POTÁSSIO 12% 60% 75% 27% 13% Figura 7. Porcentagens de nitrogênio, fósforo e potássio utilizados para composição orgânica animal, exportados no leite e excretados na forma de dejetos (urina e fezes). Por isso, é de extrema importância que os animais permaneçam a maior parte do tempo na área onde realizaram o consumo da forrageira. Deslocamentos de animais da área de pastejo para áreas de “descanso” são prejudiciais ao processo de ciclagem de nutrientes, uma vez que estas áreas normalmente não apresentam vegetação e os nutrientes contidos nos dejetos ali depositados são perdidos devido aos processos de erosão, lixiviação e perdas gasosas (Fig. 8). Além da ciclagem de nutrientes realizada pelos animais, outro fator preponderante que o sistema integração lavoura-pecuária favorece é a a b Figura 8. Retirada de nutrientes por vacas pastejando em área de integração lavourapecuária (a) e deposição de dejetos animais em áreas sem cobertura vegetal (b). Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 19 exploração das diversas camadas do solo pelas raízes das diferentes plantas utilizadas no sistema. As plantas de aveia têm raízes mais superficiais, o que facilita a exploração quase total da camada de solo que vai de 0 cm a 20 cm de profundidade, favorecendo processos de descompactação que podem ser causados pela presença de animais na área. Por outro lado, plantas como as leguminosas (soja, trevos, cornichão), que possuem sistema radicular pivotante, exploram camadas de solo mais profundas, servindo como verdadeiras “bombas” de nutriente, uma vez que o nutriente absorvido nas camadas mais inferiores do solo será “bombeado” para a parte aérea das plantas, e quando estas entrarem em processo de decomposição o nutriente será depositado sobre o solo. Um dos principais nutrientes responsáveis pela produção forrageira de gramíneas e/ou de grãos é o nitrogênio (N). Esse nutriente pode ser adicionado ao solo via fertilizantes nitrogenados (uréia), via adubação orgânica (resíduos animais) ou via fixação biológica de nitrogênio (Fig. 9). Dentre esses processos, o mais econômico e que respeita os processos naturais é a entrada de nitrogênio via fixação biológica. A inclusão de plantas leguminosas no sistema integração lavoura-pecuária pode reduzir a entrada de adubos nitrogenados. Uma das plantas leguminosas mais conhecidas e amplamente utilizada em propriedades agrícolas é a soja. Os agricultores já dominam o processo de inoculação via rizobium e sabem que a utilização desses organismos elimina a necessidade de adubações nitrogenadas. Desta mesma forma, plantas leguminosas forrageiras podem ser utilizadas em consórcio com gramíneas forrageiras, melhorando a composição protéica da dieta animal e suprindo parcialmente a necessidade de adubação nitrogenada das gramíneas (Fig. 10). a b Figura 9. Raízes de plantas de trevo branco (a) e soja (b) com nódulos provocados por bactérias fixadoras de nitrogênio. 20 a Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar b c Figura 10. Consórcio de plantas forrageiras leguminosas com gramíneas: a) azevém mais ervilhaca; b) aveia mais trevo branco; c) vacas leiteiras pastejando plantas de trevo branco. Existem duas maneiras principais de inclusão de leguminosas forrageiras no sistema integração lavoura-pecuária: 1) semear leguminosas de crescimento hibernal (ervilhaca) ou hibernoprimaveril (trevo vesiculoso), de ciclo anual, que para sua manutenção na área dependam de correto manejo de ressemeadura natural ou nova semeadura; 2) usar leguminosas perenes (trevo branco, cornichão) ou bienais como o trevo vermelho. Nesse tipo de manejo, a complexidade e dificuldade são maiores, pois a cultura é implantada sobre a pastagem e os desafios do produtor são: a) proporcionar a correta semeadura da cultura agrícola; b) evitar a competição das plantas forrageiras com as agrícolas; e, c) permitir que as plantas forrageiras permaneçam vivas sob o dossel das plantas agrícolas para que, logo após a colheita, o gado possa ser colocado sobre a pastagem, com o mínimo intervalo de tempo. Isso reduz o vazio forrageiro que ocorre nos meses de abril/maio e primeira metade de junho. As características das leguminosas permitem que elas permaneçam nas áreas durante todos os períodos de cultivo, inclusive no momento da produção de grãos. Essas plantas contribuem com a nutrição nitrogenada de espécies produtoras de grãos, como o milho (Fig. 11). A utilização de leguminosas perenes no sistema de integração lavourapecuária implica na maior necessidade de conhecimento por parte do produtor e dos técnicos, uma vez que o controle das ervas daninhas de folhas largas não pode eliminar as plantas de trevo e também o manejo de semeadura da cultura de verão deve ser feito de maneira tal que a lavoura fique bem implantada, sem concorrência com as plantas forrageiras, porém estas não podem ser eliminadas. Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar a 21 b Figura 11. Milho cultivado em consórcio com trevo branco (a) e soja cultivada com trevo branco (b) em sistema integração lavoura-pecuária. Contudo, por tratar-se de um sistema de exploração altamente intensivo, as áreas que se encontram sob o sistema integração lavoura-pecuária têm seus processos de produção, exportação e ciclagem de nutrientes acelerados, principalmente na fase inicial de implantação, elevando a demanda por nutrientes, ou seja, fertilizantes. Ao contrário do que se possa pensar, áreas destinadas à exploração pecuária ou a explorações mistas (agricultura e pecuária) não devem ser as áreas marginais da propriedade agrícola. A exploração pecuária ou mista, quando recebe os devidos cuidados técnicos, torna a área utilizada tão ou mais produtiva que as outras, apresenta mais lucratividade e envolve atividades que permitem maior conservação do solo e da água. Antes de tudo, o produtor deve assegurar que o solo na área de integração lavoura-pecuária não apresente elementos tóxicos como o alumínio. Para isso, recomenda-se a aplicação de calcário, sempre baseada na análise de solo e sob a orientação técnica de um engenheiro agrônomo. Além disso, a aplicação de calcário deve ser feita em superfície, sem revolvimento do solo (aração). Os nutrientes para o crescimento das pastagens são os mesmos que as plantas de lavoura necessitam. Porém, em pastagens, as forrageiras estão sujeitas a cortes e ao pastejo, que removem grande quantidade de folhas. Isso é um problema, pois as folhas são fundamentais no crescimento da planta por serem responsáveis pela fotossíntese. Quanto mais rápida for a reposição de folhas (rebrote), mais rapidamente a pastagem poderá ser utilizada. A velocidade de rebrote está intimamente ligada ao fornecimento de nutrientes do solo para a planta. 22 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar A falta de nitrogênio é um dos fatores que mais limita a produtividade, principalmente de gramíneas, tais como milho, milheto, aveia, azevém, entre outros. Contudo, este é um dos poucos elementos que podem ser obtidos da natureza de forma gratuita, via processos de fixação biológica de nitrogênio pelas plantas leguminosas (soja, trevo, cornichão, ervilhaca). A adubação nitrogenada nas gramíneas pode ser uma importante estratégia para aumentar o aporte de biomassa e, conseqüentemente, proporcionar resíduos em quantidade e qualidade suficientes para o sistema de plantio direto e aumentar o conteúdo de matéria orgânica do solo, podendo gerar melhorias nos atributos físico-químicos do sistema. Além disso, em sistema de integração a adubação nitrogenada nas gramíneas aumenta a produção de massa de forragem (Figs. 12 e 13), permitindo que a pastagem suporte um número maior de animais. A produção animal por área, medida que define fortemente a eficiência econômica nos empreendimentos pecuários, é definida pelo número de animais suportado pela pastagem e pela produção individual dos animais. A adubação nitrogenada atua nos dois aspectos: no primeiro, aumentando a produção de forragem, permitindo colocar mais animais sobre a pastagem; no segundo, aumentando o teor de proteína da pastagem com um sutil acréscimo na digestibilidade da forragem, aumentando também a produção individual dos animais, notadamente em pastagens de qualidade não muito alta. Em sistemas de integração lavoura-pecuária, o pastejo realizado por animais (herbívoros) também é um dos componentes das pastagens e seus efeitos no ecossistema podem contribuir para a transformação e a ciclagem de nitrogênio. a b Figura 12. Pastagem de azevém com adubação nitrogenada (a) e sem adubação nitrogenada (b). Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar a 23 b Figura 13. Forrageira sem adubação (a) e com adubação correta com alta oferta de forragem e de excelente qualidade (b). É importante ressaltar que no sistema de integração lavoura-pecuária adotado no Sul do Brasil - onde a produção animal concentra-se no período de inverno através do cultivo de espécies anuais como aveia e azevém, principalmente, misturadas ou não com ervilhacas ou nabo forrageiro - não é usual o uso de adubação nitrogenada. Com isso, o produtor percebe a baixa capacidade de suporte de sua pastagem, mas mesmo assim coloca a carga animal necessária, de acordo com o lote de animais que precisa “invernar”. Disso resulta uma baixa produção animal, pelo excesso de lotação e pela necessidade de retirada antecipada dos animais da pastagem para elevar a massa de forragem, que será a quantidade de palha para o sistema de plantio direto das culturas de verão. O pastejo pode influenciar nos processos de ciclagem de nitrogênio com: • mineralização/imobilização de N, facilitando a rápida decomposição da palhada; • aumento da taxa de reciclagem de N resultante da deposição de urina e fezes; • aumento da disponibilidade de nutrientes por meio da manutenção, na superfície do solo, de uma fração de nutrientes orgânicos facilmente mineralizáveis, os quais são mais acessíveis às plantas e aos microorganismos. A distribuição sazonal de forragem também pode ser manejada com aplicações de nitrogênio. Em gramíneas de inverno (aveia, azevém), que normalmente apresentam alta produção do inverno à primavera, a aplicação de nitrogênio no início do desenvolvimento da pastagem permite o rápido crescimento e rendimentos mais elevados ao longo da estação de crescimento. 24 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar Em pastagem de gramíneas, Assmann (2001; 2002) verificou que a aplicação de adubação nitrogenada no inverno de 200 kg/ha de N foi suficiente para assegurar o ganho animal de 501 kg/ha de peso vivo, em 90 dias de pastejo. Em pastagem de aveia + azevém, a mesma aplicação de N não influenciou a cultura do milho, pois o N aplicado na cultura de inverno foi disponibilizado para a cultura do milho através da ciclagem de nutrientes, gerando produtividade de aproximadamente 9.000 kg/ha. Resultados como esses questionam o grande chavão usado no meio produtivo: “A pastagem não foi adubada porque aproveita o resíduo da adubação da lavoura”. Imaginemos a situação em que ao invés de aplicar 150 kg/ha de N no milho, fosse aplicado na pastagem antecessora ao plantio da lavoura. No inverno seria possível produzir 500 kg de peso vivo/ha, o que representaria uma receita bruta de R$1.000,00/ha apenas durante o período de inverno, a ser somada à receita bruta do milho, de menor custo de produção pela suspensão da adubação nitrogenada de cobertura. Recomenda-se como adubação nitrogenada para gramíneas anuais de inverno, em sistema de integração lavoura-pecuária, a aplicação de 150 kg/ha de N (330 kg/ha de uréia) parceladamente em duas ou três vezes. Para haver reciclagem de nutrientes no sistema solo-planta-animal, é necessário que os animais permaneçam o maior tempo possível sobre a pastagem. Na maioria das propriedades leiteiras do Paraná, as vacas em lactação são mantidas durante a noite ou no intervalo entre a ordenha da manhã e a da tarde (especialmente no verão) em áreas que não são de pastagem, fazendo com que os animais encham o rúmen, muitas vezes em pastejo horário, e posteriormente defequem a fração indigestível, quantidade importante de nutrientes, fora da área pastoril. A esse processo dá-se o nome de exportação de nutrientes. Quando há esse manejo, é necessário maior quantidade de fertilizantes para repor o que foi retirado, aumentando os custos de produção. 5 PRODUÇÃO DE FORRAGEM NO SISTEMA DE INTEGRAÇÃO LAVOURA-PECUÁRIA Alceu Luiz Assmann André Brugnara Soares Edson Antonio Pin 5.1 Planejamento Forrageiro na Integração Lavoura-Pecuária Planejar significa decidir antecipadamente e organizar o que deve ser feito para reduzir/evitar erros e riscos que podem levar o negócio à falência. Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 25 Planejamento forrageiro de um sistema de integração lavoura-pecuária não é tarefa fácil, pois para que uma atividade tire proveito da outra é preciso que se mantenha o solo em boas condições, que permitam adequadas produtividades de grãos e de produção animal (leite e carne). Porque fazer um planejamento forrageiro? Primeiro, para garantir forragens o ano todo, mas também para: • Aumentar a produtividade animal: assegurar comida de qualidade o ano todo garante maior produtividade. Haverá maior produtividade de leite por vaca e mais leite por ano. Se com pouco pasto a vaca produz 7 l/dia, com bom pasto ela produzirá 15 l/dia. A falta de alimentos em certas épocas e a sobra em outras geralmente resulta em prejuízos para os animais, pois estes vivem com problemas fisiológicos, ora estão magros ora estão gordos, caracterizando a vaca “sanfona”, como se pode ver na Fig. 14. • Assegurar maiores margens de lucro: ao garantir maior produtividade, haverá mais dinheiro no bolso. O lucro que o produtor pode obter com uma vaca que produz 15 l/leite/dia pode ser 2,5 vezes maior do que aquele obtido com uma vaca que produz apenas 7 l/leite/dia. • Assegurar sustentabilidade do sistema integração lavoura-pecuária: produzir mais pasto não significa apenas mais produção, mas os animais vivem melhor e são fornecidas maiores quantidades de palhada para o solo. Existem duas maneiras para iniciar a atividade leiteira e planejar a demanda de alimentos para a propriedade no sistema de integração lavourapecuária para a agricultura familiar: a) pressupor o número de animais que o produtor irá adquirir. Nesse caso, deverá se ajustar uma área de pastagem suficiente para atender às exigências dos animais. b) pressupor a área que vai ser disponibilizada para a atividade. Nesse caso, o produtor deverá ajustar o tamanho do rebanho pela área que está sendo disponibilizada para os animais. É muito importante que o produtor faça o ajuste pela área disponibilizada no verão e não pela área de inverno, pois neste período geralmente a área disponível é maior, com pastagens de aveia e azevém. De maneira geral, para cada hectare de pastagem no verão são necessários três hectares no inverno. O produtor deve ter em mente que todo dia é dia para planejar, levar em conta que as vacas, em média, necessitam de uma quantidade muito semelhante de comida todos os dias do ano. 26 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar Fonte: Revista Tortuga, 2006 (adaptado). Figura 14. Vaca “sanfona”. Planejar forragens e pastagens requer conhecer tudo aquilo que envolve o sistema e o processo de produção. Existem coisas que não podemos mudar: sempre existirá o inverno e o verão, por exemplo. Além disso, os pastos de inverno não crescem no verão e os de verão não crescem no inverno. O Sudoeste do Paraná caracteriza-se pela presença de pequenas propriedades. A maioria ainda possui uma composição de rebanho inadequada. Geralmente, possuem menos animais produtores de leite que o restante do rebanho (novilhas, bezerras e bois). Cada categoria tem exigências próprias e depois de feito o planejamento forrageiro, considerando a demanda total de alimento pelo rebanho, são necessários manejos de alimentação que discriminem cada categoria pela sua exigência. Porém, trata-se de manejo de alimentação na atividade pecuária e não especificamente de integração lavoura-pecuária. Na bovinocultura de corte, há época de cobertura, nascimento, desmame e terminação dos animais, ou seja, as exigências alimentares dos animais são extremamente variáveis, dependendo da época do ano. Nesse caso, a definição das necessidades alimentares do rebanho nas épocas do ano é a primeira variável a ser levantada quando se pensa em planejamento forrageiro. No entanto, em bovinocultura leiteira, no Brasil, não existindo época de cobertura, partos e desmame, podemos considerar que em todos os meses teremos vacas secas, parindo, animais sendo desmamados e vacas em prenhês. Assim, pelo menos em termos quantitativos, podemos considerar constantes as exigências alimentares do rebanho em função das épocas do ano. Isso facilita o planejamento forrageiro, pois é necessário fazer apenas a combinação das Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 27 espécies e da área de cada espécie, considerando sua capacidade de suporte em cada mês do ano, buscando a menor variação possível na disponibilidade de forragem entre os meses do ano. Animais que recebem pequenas quantidades de alimento apresentarão elevado intervalo entre partos, terão atrasos do primeiro parto das novilhas e baixa produtividade, o que resultará em baixa remuneração para o produtor (Fig. 15). O produtor deve ter noção clara sobre cada tipo de forrageira utilizada e seu comportamento, principalmente para saber em que época as forrageiras estão à disposição dos animais. Mas como planejar tudo isso se os pastos não são conhecidos? Para responder a esse questionamento, que é o segundo fator a ser analisado no planejamento forrageiro, deve-se criar o hábito, entre os técnicos extensionistas e produtores rurais, de usar uma metodologia e efetivamente avaliar a produção de forragem das espécies existentes em sua propriedade em cada época do ano bem como coletar amostras de forragem e enviar para um laboratório bromatológico, assim como fazem com amostras de solo. Informações consistentes sobre a produção e o valor nutritivo das principais espécies forrageiras, em cada região e em cada época do ano, aliadas às informações de exigência alimentar do rebanho, permitem fazer o planejamento forrageiro e sentir todos os seus benefícios. Existem forrageiras que produzem grande volume de massa, outras produzem menor quantidade, porém de alta qualidade. O milheto, por exemplo, produz 12 toneladas de matéria seca por hectare e tem 16% de proteína bruta. Pouco alimento Elevado intervalo entre parto Atraso do primeiro parto das novilhas Baixa produtividade Baixa remuneração para o produtor Figura 15. Ciclo de baixa remuneração do produtor resultante da reduzida oferta de alimento aos animais. 28 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar O trevo branco produz 5-6 toneladas por hectare, no entanto o teor de proteína bruta é de 20%. Para ter certeza do potencial da pastagem, deve-se realizar um monitoramento ao longo do ano. 6 ESPÉCIES FORRAGEIRAS PARA O SISTEMA INTEGRAÇÃO LAVOURA-PECUÁRIA Alceu Luiz Assmann Henrique Luíz da Silva Roque Kirchner Salete Mafioletti Kozelinski O produtor deve se preocupar com alguns aspectos para a escolha das espécies forrageiras: • Adaptabilidade à realidade local: todas as plantas têm um potencial de produção próprio e adaptam-se a determinadas condições. Alguns fatores são determinantes para que elas expressem todo seu potencial. Devem-se evitar espécies que surgem repentinamente, não pesquisadas e que através de comerciais e propagandas prometem soluções rápidas e “milagrosas”; • Disponibilidade de sementes: assegurar sementes em quantidade e qualidade para o plantio; • Produção de grandes volumes de massa: buscar forrageiras com elevada produtividade de massa; • Qualidade nutricional: cultivar forrageiras com elevada qualidade nutricional e que sejam adubadas para assegurar essa qualidade; • Sistema de manejo utilizado: utilizar forrageiras que suportem melhor o pisoteio animal (azevém). Existe, atualmente, várias cultivares em cada espécie com características produtivas bastante distintas - fato considerado pelos técnicos quando se trata de aveia, sorgo e, talvez, milheto. Porém, muitos produtores ignoram a existência de cultivares diferentes para a maioria das leguminosas forrageiras. Mesmo os produtores e as empresas que revendem sementes de forrageiras não têm segurança para informar qual cultivar estão comercializando. Isso gera um ambiente de desconhecimento técnico e as evidências de campo são desviadas. Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 29 6.1 Espécies Forrageiras de Inverno As espécies forrageiras de inverno estão identificadas na Tabela 2. No Sudoeste do Paraná, vêm sendo utilizadas tradicionalmente duas espécies principais, a aveia preta e o azevém. São gramíneas geralmente consorciadas, de excelente qualidade, adaptabilidade e boas produtoras de massa para as condições climáticas da região (Fig. 16). Tabela 2. Espécies forrageiras anuais de inverno. Espécie Aveia branca Aveia preta Azevém Centeio Ervilhaca Trevo branco Trevo vermelho Trevo vesiculoso Cornichão Triticale Época de semeadura Abr-maio Mar-jun Mar-jun Mar-maio Mar-abr Mar-set Mar-maio Mar-maio Mar-maio Mar-abr Massa seca (ton/ha) 5-8 5-8 3-7 5-7 2-3 3-5 3-4 3-4 3-4 7-10 a Proteína bruta (%) 12-15 12-15 13-17 12-15 20-24 21-25 21-25 17-20 21-25 12-15 Cultura sucessora Soja-milho-feijão Soja-milho-feijão Soja-feijão Soja-milho-feijão Milho Milho Milho Milho Milho Soja-milho-feijão b Figura 16. Pastagem de aveia 40 dias após o plantio (a) e de azevém, 56 dias após o plantio (b). 6.1.1 Aveia Uma das espécies forrageiras mais conhecidas e utilizadas na região é a aveia. As espécies mais comuns são a aveia preta (Avena strigosa), de uso forrageiro, e a aveia branca (Avena sativa), granífera ou forrageira. 30 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar As cultivares aveia preta IAPAR 61 e aveia branca IPR 126 apresentam ciclo vegetativo mais longo que o de outras variedades de aveias - em torno de 140 dias desde a emergência até a plena emissão de panículas. Essas características proporcionam maior número de pastejos se compararmos à aveia comum. Além disso, consegue-se um acúmulo de excelente volume de massa para plantio direto. No entanto, a falta de sementes no mercado e o preço elevado têm sido as principais limitações para sua utilização. Outras cultivares indicadas pela pesquisa são: UPFA 21 - Moreninha e aveia branca FAPA 2 (Fig. 17). A quantidade de sementes recomendada para a implantação da cultura é de 350-400 sementes aptas por m2, sendo utilizados 60-80 kg/ha de sementes. O espaçamento recomendado é de 17-20 cm, sendo as sementes depositadas à profundidade de 2-4 cm. Figura 17. Cultivar de aveia branca forrageira FAPA 2. 6.1.2 Azevém O azevém, excelente alimento, está entre as melhores gramíneas anuais ou perenes de inverno. Pode ser utilizado em associação com aveia, trevo e outras espécies de uso forrageiro. Apresenta ciclo mais longo e desenvolvimento inicial lento, ideal para consorciação com aveias de ciclo curto. A semeadura, quando realizada no sistema de plantio direto, usa de 10-15 kg/ha de sementes, sendo o espaçamento de 17 cm muito utilizado. Utilizam-se 20-40 kg/ha de sementes na semeadura a lanço. O azevém perene é muito utilizado no Sudoeste por apresentar boa ressemeadura após formação do banco de sementes. A adubação para implantação da cultura do azevém segue as mesmas Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 31 recomendações feitas para a aveia. A Fig. 18 ilustra uma pastagem de azevém bem adubada. Figura 18. Pastagem de azevém comum cultivado na região. 6.1.3 Triticale A cultura do triticale (Triticosecale Wittmack) (Fig. 19) apresenta-se como outra opção para a integração lavoura-pecuária. Ele pode ser utilizado como forragem verde, silagem de planta inteira ou grão úmido, grãos secos para fabricação de ração ou duplo propósito com pastejo e posterior colheita de grãos. A densidade de semeadura é de 300-400 sementes aptas por metro quadrado, com 17 cm entre linhas e profundidade de 2-3 cm. A adubação deve ser realizada com interpretação de análise de solo. A aplicação nitrogenada deve ser fracionada: utilizar 15-50 kg/ha de N no momento da semeadura e o restante da dose em cobertura no momento do perfilhamento e alongamento das plantas. Para o Paraná são recomendas as cultivares IAPAR 23-Arapoti, IAPAR 54, OCEPAR 4, BRS 148, BRS 203, BRS Minotauro e EMBRAPA 53. A semeadura pode ocorrer do início de maio até meados de julho. As recomendações oficiais sobre épocas de plantio nem sempre contemplam o objetivo da produção animal, ou seja, do ponto de vista prático, considerando o vazio forrageiro de outono, principalmente quando o triticale não será usado para a produção de grãos, pode-se antecipar a semeadura, mesmo que comprometa a produção total de forragem. 32 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar Figura 19. Triticale forrageiro, opção de produção de forragem e grãos. 6.1.4 Centeio O centeio (Secale cereale L.) foi introduzido no Paraná por imigrantes alemães e poloneses a cerca de dois séculos atrás. Quando utilizado na alimentação animal ou cobertura de solo, a semeadura pode ser realizada logo após a colheita da soja, de março até maio. O centeio é pouco difundido. Apresenta grande resistência ao frio se comparado a outros cereais de inverno, podendo fornecer pastagem de boa qualidade ao gado, principalmente de leite, no período crítico para outras forragens de inverno. Como característica especial, possui a capacidade de produzir excelente volume de forragem verde palatável. A decomposição da palha de centeio é um pouco mais lenta que a dos demais cereais de inverno, sendo uma vantagem para o sistema plantio direto ( IETHOLTER, 2005). A adubação utilizada para a cultura do centeio é a mesma utilizada na cultura da aveia. Todas as espécies de gramíneas anuais de inverno apresentam inúmeras cultivares, porém, de maneira geral, o centeio é a mais precoce das pastagens de inverno, podendo ser indicado para plantio antecipado visando a diminuir a extensão do vazio forrageiro de outono. 6.1.5 Trigo duplo propósito O trigo duplo propósito pode ser utilizado como pastagem, além da produção de grãos. Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 33 No momento da implantação, deve-se utilizar 300-400 sementes aptas por metro quadrado, com espaçamento de 17-20 cm entre linhas. As mesmas recomendações de adubação feitas para aveia, azevém e outras forrageiras são válidas para o trigo duplo propósito. As cultivares utilizadas com duplo propósito são BRS Figueira, BRS Guatambu, BRS Tarumã (Fig. 20) e BRS Umbu. Esses materiais possuem ciclo longo, podendo ser semeados antecipadamente se comparados aos trigos com aptidão apenas para a produção de grãos. Figura 20. Trigo duplo propósito para produção de forragem e grãos. 6.1.6 Trevo O trevo branco (Trifolium repens) é uma leguminosa perene, rasteira, estolonífera e típica de regiões temperadas. Pode ser utilizada diretamente como pastagem e é uma ótima alternativa para a produção de alimento para o gado. Para a implantação, usam-se 3-5 kg de sementes por hectare, quando em associação com gramíneas. Cuidados no manejo devem ser adotados, pois esta espécie causa timpanismo espumoso, o que pode levar os animais à morte. O trevo vermelho (Trifolium pratense) adapta-se bem a climas temperados úmidos, mas não tolera períodos secos. Para a semeadura de um hectare com trevo vermelho, são necessários 10-15 kg/ha. Quando associado a gramíneas, devem ser utilizados 8-10 kg/ha de trevo vermelho mais 10 kg/ha de sementes de azevém e 40 kg/ha de aveia. O trevo vermelho possui grande importância nos sistemas de integração lavoura-pecuária, pois seu estabelecimento se dá em melhor proporção no 34 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar primeiro ano de produção de forragem se comparado ao trevo branco. Contudo, o trevo branco, se semeado em conjunto com o trevo vermelho, tende a dominar as áreas com o passar do tempo, excluindo quase que totalmente o trevo vermelho. Para a implantação, o solo deve estar corrigido. Além da calagem, deve-se proceder à correção dos níveis de fósforo. Na implantação da cultura, a adubação deve seguir rigorosamente as recomendações baseadas em análises de solo. As forrageiras leguminosas são muito exigentes em fósforo e potássio, mas não em adubação nitrogenada. Na integração lavoura-pecuária, Assmann (2003) realizou a implantação de milho sobre a cultura de trevo. Utilizou 1,5 litro de glyphosate por hectare para o manejo das forrageiras, sendo essa dose suficiente para causar apenas um estresse nas plantas de trevo. Esse manejo foi utilizado antes da implantação da cultura do milho no verão e possibilitou posterior rebrota e manutenção do trevo no sistema de integração lavoura-pecuária (Fig. 21). a b Figura 21. Trevo junto à cultura milho no estágio inicial (a) e final da cultura (b). 6.1.7 Cornichão O cornichão é uma leguminosa semiperene (Fig. 22) recomendada para climas temperados, pois se desenvolve de forma lenta após a semeadura e, a exemplo dos trevos, não tolera sombreamento. Para sua implantação são necessários 8-12 kg/ha de sementes colocadas na superfície do solo; quando utilizado em consórcio, 8 kg/ha de sementes são suficientes. As recomendações de adubação são as mesmas utilizadas para os trevos. O cornichão, ao contrário do trevo branco, não é causador de timpanismo, por isso é recomendada sua inclusão nas pastagens de trevo branco. Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 35 Figura 22. Cornichão. 6.1.8 Ervilhaca A ervilhaca (Vicia sativa) é uma leguminosa anual tardia, utilizada largamente como pastagem de inverno, pela sua resistência ao frio. Quando semeada em linha, deve-se utilizar espaçamento 35-40 cm, e 50 kg/ha de semente. A lanço, pode-se utilizar 50-60 kg/ha de semente. A ervilhaca (Fig. 23) tem potencial para produzir forragem de boa qualidade e massa para adubação verde. Pode ser consorciada com aveia, azevém e outras gramíneas. Seu período de intenso desenvolvimento vegetativo vai de agosto a outubro, na Região Sudoeste do Estado do Paraná. Figura 23. Ervilhaca peluda, excelente forrageira destinada à alimentação animal. 36 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 6.2 Espécies de Verão No plano de forrageamento anual, muitas propriedades utilizam espécies anuais de verão, embora a recomendação seja por espécies perenes. Entre as espécies anuais mais utilizadas estão o milheto e o sorgo forrageiro. Essas duas espécies possuem elevado potencial de produção de massa, adaptadas na região, mesmo em sistema integração lavoura-pecuária. 6.2.1 Sorgo O sorgo é uma espécie de origem tropical e, portanto, exigente em clima com temperaturas elevadas, com médias superiores a 20ºC para poder expressar seu potencial. Não tolera baixas temperaturas, porém tolera mais o déficit de água que a maioria dos cereais (MAGALH ES, 2007). O sorgo pode ser pastejado diretamente, como visto na Fig. 24. Para pastejo, recomenda-se o plantio de 15-20 kg/ha de sementes, com espaçamento entre linhas de 30 cm e 20-25 sementes por metro linear. A adubação utilizada no momento da implantação deve ser realizada de forma a suprir as exigências da cultura, por essa razão recomenda-se realizar análise de solo da área onde será realizada a implantação. Figura 24. Animais em pastejo direto em sorgo. 6.2.2 Milheto O milheto (Pennisetum glaucum) é uma gramínea anual, com excelente produção e qualidade de forragem (Fig. 25). Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 37 Compensa baixas densidades de semeadura devido à sua alta capacidade de perfilhamento. Para uso como pastejo, o espaçamento varia de 15 cm a 35 cm entre linhas, porém, quando se quer proteger o solo e evitar o aparecimento de plantas daninhas, o espaçamento deve ser mais estreito. Para a implantação da cultura são utilizados 18-20 kg/ha de sementes, depositadas à profundidade de 2-4 cm no solo. A adubação para a implantação deve ser recomendada mediante análise de solo da área. Figura 25. Pastagem de milheto. 6.3 Consórcios Recomendados Para melhorar a qualidade de forragem e ciclagem de nutrientes no solo, pode-se lançar mão das consorciações, isto é, da mistura de leguminosa e gramínea ou de duas gramíneas. As grandes vantagens de se misturar espécies forrageiras é a melhor distribuição da produção de forragem ao longo do tempo, a manutenção do valor nutritivo adequado por período mais longo e a diminuição dos riscos por adversidades climáticas ou incidência de pragas e doenças. Misturar espécies significa gerar competição. A quantidade de sementes utilizada é diferente do cultivo singular. Uma vez conhecidas as características das forrageiras, pode-se optar por duas ou mais espécies. Diversos tipos de consórcios são conhecidos e bem difundidos no inverno: aveia + azevém, ervilhaca + aveia (Fig. 26) e/ou azevém + trevo, cornichão + azevém, entre outros. No verão, são muito utilizados os consórcios: milheto + papuã, sorgo + papuã, milheto + feijão miúdo, etc. A aveia pode ser consorciada com azevém, centeio, trevo, cornichão e ervilhaca, sendo que para ASSMANN et al. (2004), o consórcio de gramíneas e 38 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar leguminosas de inverno promove aumento do período de pastejo, melhorando o rendimento animal no sistema integração lavoura-pecuária. A ervilhaca pode ser utilizada em consórcio utilizando-se 40 kg/ha de ervilhaca mais 25 kg/ha de azevém por hectare ou 40 kg/ha de ervilhaca mais 40 kg/ha de aveia ou centeio. Outro tipo de consórcio é o de sobressemeadura, em que a espécie anual de inverno é sobressemeada na pastagem perene de verão. Esse manejo procura aumentar o período de utilização da pastagem, manter por mais tempo valor nutritivo adequado, fixar nitrogênio e diminuir o vazio forrageiro de primavera. Os exemplos mais usuais são azevém e ervilhaca sobre Tifton 85 ou Tifton 68 e ervilhaca sobre pioneiro ou cultivares de Panicum. a b Figura 26. Consórcio de duas espécies: trevo + azevém (a) e aveia + ervilhaca (b). 7 MANEJO DAS PASTAGENS NO SISTEMA INTEGRAÇÃO LAVOURA-PECUÁRIA André Brugnara Soares Alceu Luiz Assmann Roque Kirchner Tangriani Simioni Assmann No Sudoeste do Paraná e na Região Sul do Brasil, o sistema de integração lavoura-pecuária caracteriza-se basicamente pela utilização de pastagens anuais no inverno para pastejo de bovinos e produção de grãos no verão. Por isso, o correto manejo das pastagens de inverno é decisivo não somente para a obtenção de bons rendimentos na produção de leite ou carne, mas também para garantir alta produção das culturas de verão. O pastejo é a forma mais eficiente de utilização das pastagens. Do ponto de vista econômico, o corte da pastagem para tratar os animais no cocho Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 39 implica na necessidade de equipamentos, mão-de-obra, combustível, transporte, armazenamento e no transporte dos dejetos dos animais para a lavoura. Tudo isso resulta em aumento do custo de produção. Manejar os animais no sistema de integração lavoura-pecuária compreende levar animais ao pastejo em áreas onde haja forrageiras em condições de alta oferta de alimentos, o solo não seja sacrificado, os animais possam se alimentar sem dificuldade e proporcionar resposta em produção de leite (Fig. 27). Os animais sobre a pastagem proporcionam ciclagem mais veloz dos nutrientes do solo através das fezes e urina devolvidas imediatamente ao solo. Por conseqüência, a maior parte dos nutrientes ingeridos da pastagem pelos animais permanece no sistema. É desejável que os animais permaneçam no pasto o maior tempo possível. Resultados de pesquisa demonstraram que o manejo correto dos pastos no inverno é determinante para a manutenção de um bom sistema de plantio direto. Em termos de manejo de pastejo, o produtor/técnico tem em mãos três ferramentas passíveis de manipulação: tempo de pastejo, tempo de descanso e intensidade de pastejo. As várias combinações possíveis desses três fatores definem o que chamamos de métodos de pastejo. O período de ocupação e de descanso de cada piquete é uma decisão do manejador da pastagem em função da espécie forrageira em questão e é definido primeiramente pelo número de piquetes feitos sobre a pastagem. Os principais métodos de pastejo empregados na Região Sul do país são: a) contínuo; b) rotativo fixo; c) rotativo em faixas; d) horário. Figura 27. Produtor manejando os animais em pastagem de trevo vermelho. 40 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar Em geral, em espécies forrageiras prostradas como os tiftons e coastcross, plantas com boa tolerância ao pastejo, não há diferença significativa entre os animais, tendo acesso a toda área pastoril ou estarem confinados num piquete, num processo de rodízio. No entanto, o grande problema do pastejo rotativo é a necessidade diária (se for período de pastejo de um dia) de manejo dos animais. Em bovinocultura leiteira, como os animais obrigatoriamente serão retirados duas vezes ao dia da área da pastagem para a sala de ordenha, custa muito pouco executar o pastejo rotativo. Aliado a outras vantagens, é o método indicado para as pequenas propriedades de produção de leite. No entanto, o método de pastejo não deve ser confundido com um método capaz de permitir maior intensidade de pastejo, substituir a adubação ou equilibrar a produção de forragem com a demanda do rebanho. A intensidade de pastejo é a relação entre número de animais ou mais precisamente: kg de peso vivo de animais sobre uma área que apresenta uma determinada disponibilidade de forragem. A carga animal colocada sobre a pastagem é função direta da sua disponibilidade de forragem, independente do método de pastejo. O desequilíbrio entre a produção de forragem e as necessidades do rebanho é o maior desafio no manejo de pastagem e não é solucionado com o método de pastejo. A relação entre quantidade de pasto disponível e carga animal presente sobre a pastagem é que se denomina oferta de forragem. Para manter a oferta de forragem, o produtor pode lançar mão de alguns procedimentos como: 1. Uso de animais reguladores: a pastagem para as vacas em lactação pode ser dimensionada para permitir que suporte todas as vacas lactantes, mesmo em períodos de baixo crescimento. Neste procedimento, a maneira de evitar sobras de forragem nos períodos de maior crescimento é o uso de animais reguladores, que podem ser novilhas, vacas secas em menor estado corporal ou qualquer outra categoria ou espécie presente dentro da propriedade. 2. Uso de suplementação: a suplementação fornecida aos animais, seja ela pelo uso de volumoso ou concentrado, deve estar em função do nível de consumo da pastagem, que por sua vez está em função da massa de forragem presente. Ou seja, se estiver faltando forragem no campo, o uso do cocho deve ser intensificado. 3. Uso de diferimento: quando as condições climáticas proporcionam altas taxas de acúmulo da pastagem, acima da capacidade de consumo dos animais, parte da área da pastagem pode ser diferida (excluída Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 41 do pastejo) para posteriormente ser aproveitada. Em bovinos de corte, é muito comum o uso de pastejo direto de pastagens diferidas, o que se chama de feno em pé, associado a uma suplementação protéica. Em bovinos de leite, o mais indicado é a confecção de silagem ou feno dessas áreas diferidas, para fornecimento posterior nos vazios forrageiros. 4. Uso de misturas forrageiras: o uso de sobressemeadura ou mesmo a semeadura de uma mistura de espécies, conscientemente eleitas para o consórcio, pode evitar períodos de menor produção de forragem com vistas à manutenção da capacidade de suporte da pastagem. Independente do método de pastejo adotado, a pastagem deve ser muito bem monitorada, isto é, deve-se conhecer a dinâmica de crescimento e o potencial produtivo. A partir disso, define-se o momento certo da entrada e saída de animais. A entrada não pode ocorrer nem muito cedo nem muito tarde. A parte mais importante da planta é composta pelas folhas, pois quanto mais folhas, melhor a massa e maior a área de captação de radiação solar, o que resulta em melhor desempenho e mais produção. A Fig. 28 ilustra a entrada precoce dos animais para o pastejo, uma prática errada presente em muitas propriedades. Por outro lado, a mesma figura demonstra também a altura de entrada correta para o azevém. É fundamental adequar a lotação e a carga animal por área. A definição de carga animal e lotação é estabelecida pela oferta de forragem disponível, ou seja, deve-se permitir apenas o acesso a um número de animais que o pasto suporta. Quanto maior a intensidade de pastejo, ou quanto mais rapada estiver a a b Figura 28. Altura de entrada de animais muito baixa em pastagem de azevém (a) e altura de entrada correta de 25-30 cm para pastejo de azevém (b), para qualquer sistema de pastejo. 42 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar Captura energia solar pastagem, menor será a captura de energia solar e a eficiência de conversão da forragem consumida em produto animal, logo a eficiência de colheita aumenta. Observa-se na Fig. 29 que a eficiência de colheita é a quantidade desaparecida pelos animais através do consumo e perdas por pisoteio sobre o total que foi produzido. Essa eficiência tem obtido uma ênfase demasiadamente grande pela sua importância. Os produtores preferem, muitas vezes, aumentar a intensidade de pastejo para não “perder a pastagem” ou para “não deixar envelhecer” e obtêm um nível de produtividade animal tanto por hectare ou individual bem abaixo do desejável, pois o manejo que busca aumentar a eficiência de colheita é o mesmo que promove baixa produção animal. Os três fatores à esquerda da Fig. 29 definem as relações produtivas entre intensidade de pastejo e produções por animal e por área (gráfico a direita da Fig. 29). O aumento do número de animais por hectare faz com que um dos fatores que define a produção animal por hectare seja aumentado - o que é bom porém a produção individual dos animais é reduzida. A relação entre taxa de lotação e produção individual é desproporcional, ou seja, numa faixa de manejo o aumento do número de animais por hectare é maior que a diminuição da produção individual, aumentando assim a produção por hectare, objetivo de todo produtor de leite. Esse aumento ocorre até um determinado ponto de intensidade de pastejo. A partir desse ponto, a produção de leite por hectare começa a diminuir com o aumento da lotação, pois o + Eficiência conversão Intensidade de pastejo + Intensidade de pastejo Produção/área = Produção/animal Produção/an ma Eficiência de clolheita Intensidade de pastejo Intensidade de pastejo Pastagem alta Baixa lotação Pastagem rapada Alta lotação Fonte: Briske e Heitschmidt, 1991. Figura 29. Produção animal no ecossistema pastoril. Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 43 aumento do número de animais começa a ser menor que a diminuição da produção individual de leite. Essa relação deve ser compreendida pelos técnicos e produtores para que as pastagens fiquem em condição de manejo de intensidade de pastejo capaz de proporcionar a maior produção por hectare possível, sem comprometer a persistência da pastagem e a qualidade físico-química do solo. 7.1 Método de Pastejo Contínuo Preconiza-se o pastejo contínuo, porém com lotação variável, ou seja, deve-se reduzir ou aumentar o número de animais sobre a área quando ocorre redução ou aumento da oferta de massa de forragem e nos períodos de maiores precipitações pluviométricas (chuvas) que podem prejudicar o solo e as plantas, através de pisoteio intenso. Os maiores problemas observados nesse sistema, na região, é o excesso de lotação de animais por área e a entrada destes quando a pastagem ainda não tem condições de oferta de forragem suficiente para se manter produtiva ao longo do período de pastoreio. Ocorre também de a carga animal sobre a pastagem estar, muitas vezes, além da capacidade de suporte, promovendo menor produção animal e comprometendo a qualidade física do solo. Ainda como conseqüência desses problemas, há a diminuição da quantidade de palha para cobertura, para plantio direto. Ocorre também, a exposição do solo à erosão, diminui a infiltração e umidade e reduzem-se os teores de matéria orgânica e o estoque de nutrientes. O método de pastejo contínuo com lotação variável pode ser monitorado pela altura da pastagem, o que varia de acordo com a espécie. As alturas devem atender à necessidade dos animais, permitindo ganho de peso e produção de leite. Por outro lado, a planta deve ter uma garantia de área foliar suficiente para interceptar a radiação solar, continuar a rebrota e perfilhar. No final, com a dessecação, fornecerá cobertura vegetal satisfatória do solo para a semeadura das culturas de verão. A faixa recomendada de manejo para definir o momento de entrada e de saída dos animais na maioria das forrageiras anuais de inverno (aveia, azevém, triticale, centeio, trigo duplo propósito, trevo branco, cornichão) é de 25-30 cm e 10 cm, respectivamente. A altura indicada para o pastejo contínuo é aquela que fica na média das alturas de entrada e saída recomendadas para o pastejo rotativo. Como em qualquer outro método de pastejo, o tempo de utilização da pastagem no inverno está diretamente relacionado a todos os argumentos 44 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar citados anteriormente. Portanto, é imprescindível o cuidado com a planta, com o solo e com os animais para assegurar a sustentabilidade do sistema de integração lavoura-pecuária. 7.2 Pastejo Rotativo com Parcelas Fixas Este método de pastejo é bastante difundido e caracteriza-se pela divisão da área de pastagem em parcelas menores ou “piquetes” fixos (Fig. 30). Nesses piquetes, os animais entram quando o volume de forragem é suficiente e são retirados quando a quantidade de forragem atinge um limite inferior, geralmente estabelecido pela altura para cada espécie. Na seqüência, os animais são transferidos para o piquete seguinte, ainda não pastejado. Dessa maneira, os animais passam de piquete em piquete até retornarem ao primeiro, quando este apresentar novamente condições de pastejo. Tal sistema de pastoreio permite melhor aproveitamento da pastagem, porém diminui a seletividade dos animais em pastejo, fazendo com que a produção individual dos animais seja diminuída. Entretanto, a produção animal por hectare aumenta 12%, em média. O pastejo rotacionado utiliza alta carga e lotação animal instantânea sobre o piquete durante algumas horas, um dia ou no máximo três dias. Isso pode prejudicar a condição física do solo em períodos de chuva. Portanto, são necessários cuidados para evitar a compactação do solo e, por conseqüência, prejuízos na produção das culturas de verão como milho, feijão e soja. O método de pastejo rotacionado é mais recomendado para pastagens Figura 30. Animais em pastejo rotativo em piquetes com consórcio de trevo branco, trevo vermelho, cornichão e azevém. Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 45 perenes de verão, especialmente as forrageiras de hábito cespitoso de crescimento (capim elefante, Tanzânia, etc.). Permite visualizar melhor o crescimento e preservar as plantas pela maior uniformidade de pastejo. Esse método de pastejo exige estruturas fixas com cercas elétricas e a colocação de bebedouros dentro dos piquetes, nos corredores ou distribuídos em locais próximos e de fácil acesso para os animais. Isso tudo aumenta os custos na implantação do sistema. O manejo citado acima pode ser definido como “Voisin”, no qual os animais permanecem um dia em cada piquete, computando, por exemplo, trinta áreas fixas de pastejo rotativo, observando-se sempre as recomendações de carga animal e a capacidade de suporte das pastagens. Porém, como já dito anteriormente, pode-se utilizar um número inferior de piquetes, como por exemplo, doze. Nesse caso, ocorre maior flexibilidade de permanência dos animais, seguindo as mesmas recomendações de estudos visuais da pastagem e dos animais. 7.3 Pastejo Contínuo em Faixas É um sistema de manejo que utiliza cercas móveis. Estas são deslocadas de acordo com o tempo que se quer disponibilizar o pasto aos animais. Esse tempo pode variar desde algumas horas até um, dois ou três dias. Assim como no rotativo fixo, o pastejo contínuo em faixas permite controlar o momento da entrada e da saída, baseado na oferta de massa (Fig. 31). O consumo da forragem nas faixas é mais controlado pelo produtor e pode apresentar alta carga instantânea. No entanto, esse método não permite seletividade aos animais e pode compactar o solo pelos motivos já expostos anteriormente. Os animais deslocam-se para áreas onde está o bebedouro, ali permanecendo. No caso de pastejos de algumas horas por dia, a ciclagem de nutrientes não é adequada, pois as fezes e urina terminam por ser depositadas fora da área de pastagem. Recomenda-se disponibilizar cocho de água para os animais durante o período de pastejo, aproveitando mais a forrageira disponível e manejando as cercas elétricas móveis de acordo com as faixas de consumo de forragem. Neste método de pastejo, o ideal é que o produtor avalie a massa de forragem atual da pastagem. Com esse valor, diminuindo-se o valor de massa de forragem de saída dos animais, previamente escolhido, e dependente da espécie forrageira, obtém-se a quantidade de massa a ser removida por unidade de área. Estimando o consumo dos animais e o número de animais do lote, calcula-se a área necessária para alimentar aquele lote de animais por um 46 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar Faixa em pastejo Faixa já pastejada Figura 31. Sistema de pastejo contínuo em faixas. período definido. A área varia em função da massa de forragem presente em cada momento e é manejada pelo recuo da cerca elétrica. 8 CONSIDERAÇÕES GERAIS A integração lavoura-pecuária na agricultura familiar possui grande importância no setor produtivo, principalmente pelo favorecimento do uso intensivo do solo. Nas regiões-alvo predominam pequenas propriedades, nas quais a produção de leite é uma alternativa interessante para a inclusão social, sustentabilidade do setor e para assegurar a sobrevivência do homem no campo. No Sudoeste do Paraná, mais de 80% das pequenas propriedades fazem integração lavoura-pecuária na produção de leite. A utilização dessa integração exige um bom planejamento de utilização da área e amplo conhecimento em sistema de produção agrícola integrada. O produtor precisa quebrar tabus e compreender que a entrada de animais em áreas de lavouras, quando realizada de maneira adequada, não afeta o desempenho das culturas sucessoras destinadas à produção de grãos. Esse sistema envolve muitas variáveis e demanda ainda estudos complementares, cujos resultados ao serem aplicados pelos agricultores podem tornar a integração lavoura-pecuária uma prática de alto benefício econômico e ambiental. O sucesso desse sistema de integração está diretamente associado à produção de biomassa para plantio direto e alimentação animal. Por essa razão, os produtores e profissionais da área de ciência agrárias precisam conhecer, cada vez mais, seu uso correto. Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 47 9 REFERÊNCIAS ASSMMAN, A. L. Adubação nitrogenada de forrageiras de estação fria em presença e ausência de trevo branco, na produção animal em área de integração lavoura-pecuária. Curitiba, 2002. 122 p. Tese (Doutorado em Agronomia – Produção Vegetal) - Universidade Federal do Paraná, 2002. ASSMANN, A. L. ; PELISSARI, A. ; MORAES, A. de et al. Produção de gado de corte e acúmulo de matéria seca em sistema de integração lavoura-pecuária em presença e ausência de trevo branco e nitrogênio. Revista Brasileira Zootecnia v. 33, n. 1, p. 37-44, 2004. ASSMANN, T. S.; CASSOL, L. C.; ASSMANN, A. L. Manejo da fertilidade do solo (ciclagem de nutrientes) em sistemas de integração lavoura-pecuária. In: Nilvânia Aparecida de Mello; Tangriani Simioni Assmann. (Org.). Anais... do I Encontro de Integração Lavoura-Pecuária no Sul do Brasil. 1 ed. Pato Branco: Imprepel, 2002, v. I, p. 61-84. ASSMANN, T. S. Rendimento de milho em áreas de integração lavourapecuária sob o sistema de plantio direto, em presença e ausência de trevo branco, pastejo e nitrogênio. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2001. 80 p. Tese (Doutorado em Agronomia – Produção Vegetal) Universidade Federal do Paraná, 2001. ASSMANN, T. S.; RONZELLI JR., P.; MORAES, A.; ASSMANN, A. L.; KOEHLER, H. S.; SANDINI, I. Rendimento de milho em área de integração lavoura-pecuária sob o sistema de plantio direto, em presença e ausência de trevo branco, pastejo e nitrogênio. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 27, n. 4, p. 675-683, 2003. GASSEN, D. N.; GASSEN, F. R. Plantio direto: o caminho do futuro. Passo Fundo: Aldeia Sul, 1996. 207 p. MAGALH ES, P. C. 2007 Cultivo do Sorgo: Clima. Disponível em: http:// .cnpms.embrapa.br/publicacoes/sorgo/clima.htmr Acesso em: 09 maio 2008. IETH LTER, S. Cultivo de centeio. Passo Fundo: Embrapa Trigo, 2005. (Embrapa Trigo. Sistema de Produção, 1). Disponível em: http:// sistemasdeproducao.cnptia.embrapa.br/FontesHTML/Centeio/ CultivodoCenteio/index.htm . Acesso em: 09 maio 2008. 48 Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 10 GLOSSÁRIO Acúmulo de matéria seca/ha: aumento na massa de forragem de uma área de pastagem durante um determinado período de tempo. Alqueire: medida agrária que corresponde, no Paraná, a 24.200 m2, variando nos demais estados brasileiros. Altura de pastejo: altura em que os animas devem pastejar em uma determinada pastagem. Biomassa: todo tipo de matéria orgânica, tanto de origem vegetal como animal, que se forma graças à fotossíntese, diretamente (como os vegetais) ou indiretamente (pela digestão dos vegetais). C. A.: carga animal. Cespitosa: planta que forma um cespede, isto é, um conjunto mais ou menos denso, um tufo ou uma touceira. Espécie anual: planta que germina, floresce, produz semente e morre no intervalo de um ano. Espécie perene: planta de ciclo vegetativo superior a dois anos. Estolonífera: planta que possui a capacidade de originar estruturas de propagação denominadas estolões, que consistem em prolongamentos vegetativos que originam novas plantas. Forragem: parte comestível das plantas, exceto os grãos, que pode servir na alimentação dos animais em pastejo, ou colhida e fornecida. Ganho de peso por hectare: ganho de peso animal obtido em um hectare num determinado período em uma determinada pastagem. Ganho de peso diário: taxa de ganho de peso médio por dia obtida como medida de controle de crescimento e engorda. O ganho varia com a alimentação fornecida e o potencial genético do animal. Pode ocorrer também um ganho de peso negativo (com perda real de massa corporal). Isso acontece quando o animal se alimenta em pastagens que não fornecem nutrientes suficientes para suas necessidades de manutenção. Hectare (ha): unidade de medida agrária, equivalente a uma área de 10.000 m2 ou um hectômetro quadrado. I. A. F.: índice de área foliar. Integração Lavoura-Pecuária para a Agricultura Familiar 49 I. L. P.: integração lavoura-pecuária. Integração lavoura-pecuária: atividade agrícola que tem por finalidade a produção de grãos e a criação de animais numa determinada área. Lotação: número de animais por hectare usado para colher forragem, mas não tem relação alguma com produção de forragem. M. S.: matéria seca. M. V: matéria verde. Massa de forragem: quantidade - massa ou peso seco - total de forragem presente por unidade de área acima do nível do solo (preferencialmente, não obrigatoriamente). Medida de caráter pontual, normalmente expressa em Kg MS/ha. Matéria seca: parte da forragem sem água, na qual se encontram os nutrientes. Matéria verde: forragem com água, da qual os animais se alimentam. Pastejo contínuo: presença contínua e irrestrita de animais em uma área específica durante o ano ou estação de pastejo. Pastejo rotativo: método de pastejo que utiliza subdivisão de uma área de pastagem em dois ou mais piquetes, que são submetidos a períodos controlados de pastejo (ocupação) e descanso. Senescência: processo natural de amadurecimento, quando as folhas amarelecem e caem das plantas. Subpastejo: Pastejo com uma quantidade de animais menor que a capacidade de lotação da pastagem. Superpastejo: pastejo intensivo e freqüente das pastagens, acarretando danos à vegetação, com possíveis perdas do valor forrageiro das pastagens. U. A.: unidade animal. Unidade animal: medida usada para padronizar o peso dos animais de um rebanho (1 unidade animal corresponde a um animal de 450 kg). Resíduo: forragem remanescente após o pastejo, expressa como altura ou massa por unidade de área.