A RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA NOS CRIMES AMBIENTAIS *Antonio Aécio Bandeira da Silva - NOVAFAPI, CEUT. **Graciane Pimentel de Sousa – NOVAFAPI. INTRODUÇÃO Meio ambiente, conceituado legalmente (art. 3°, I da Lei n. 6.938/81), consiste no “conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abrange e rege a vida em todas as suas formas”. A preocupação do homem com a preservação dos valores ambientais levou à criação do Direito Ambiental, ramo do direito com a função de prevenir e coibir as atividades lesivas ao meio ambiente, por meio de regras coercitivas e a aplicação de penalidades, de forma a garantir a promoção de sociedades eficientes do ponto de vista econômico e viáveis ambientalmente. É assegurado constitucionalmente que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo incumbência do Estado e da coletividade defendê-lo e preservá-lo. Assim, o legislador constituinte de 1988, sensível à constatação de que as grandes degradações ambientais não ocorriam por conta de atividades singulares, realizadas por pessoas físicas, mas apresentavam-se de forma coletiva, abriu a possibilidade de responsabilização penal da pessoa jurídica. Nesse contexto, o legislador infraconstitucional, atento aos acontecimentos sociais, ou melhor, à própria dinâmica que rege atualmente as atividades econômicas, ao elaborar a Lei n. 9.605/98 (Lei dos Crimes Ambientais), previu de forma clara e objetiva a responsabilidade penal da pessoa jurídica, inovando consideravelmente o ordenamento jurídico penal. Tal previsão trata-se de uma política criminal com o fim de tornar mais severa a tutela ao meio ambiente. No entanto, deve ser ressaltado que a responsabilidade penal da pessoa jurídica não é aceita de forma pacífica pela doutrina pátria. Para parte da doutrina, adepta ao paradigma da responsabilidade individual, a idéia da punição da pessoa jurídica é manifestamente incompatível com a teoria do delito tradicional. Contrapondo tal entendimento, há doutrinadores que defendem a responsabilização com fundamento na assertiva de que a pessoa jurídica é um ente dotado de vontade para assumir obrigações e deter direitos. A partir de então, diante da divergência doutrinária acerca do tema, foram trazidas à baila várias questões, como, a título ilustrativo, a capacidade penal da pessoa jurídica, a aplicação da responsabilização penal à pessoa jurídica de direito público, a efetividade da responsabilização penal da pessoa jurídica, questões processuais e as penas aplicadas. Para se chegar à capacidade penal da pessoa jurídica, para fins de responsabilização, necessário se faz a realização de uma análise acerca da sua natureza jurídica, que é definida por meio de algumas teorias. Primeiramente, há a teoria da ficção, para a qual as pessoas jurídicas são entidades fictícias criadas pelo direito, e não seres reais. Assim, não há que se falar em responsabilização, face a impossibilidade de se reconhecer responsabilidade para um ente fictício, inexistente e incapaz de querer e, portanto, impossível de lhe ser imputável um fato danoso. Já a teoria da realidade objetiva, oposta à anterior, concebe a pessoa jurídica como uma pessoa real, com vontade própria e vida distinta em relação aos seus dirigentes. Dessa forma, considerando-se a pessoa jurídica como sujeito de direitos, resta clara a possibilidade da sua responsabilização no âmbito penal. Por fim, há a teoria da realidade jurídica, notadamente a que melhor explica a existência da pessoa jurídica e o cabimento da responsabilização penal. Pois, considera a pessoa jurídica como ente de existência real, mas totalmente distinta da realidade das pessoas físicas, ou seja, enquanto a pessoa física existe naturalmente, a pessoa jurídica é concebida pela ordem jurídica. Dessa forma, tal responsabilização resta justificada pelo fato de que, sendo a pessoa jurídica criada pelo Direito, este por sua vez pode e deve regular os efeitos jurídicos de suas intervenções no meio ambiente social. Quanto às pessoas jurídicas de Direito Público, cumpre anotar que as mesmas não podem ser responsabilizadas pela prática de ilícitos penais. Isso porque, se o Estado detém o monopólio do direito de punir, não é adequada a possibilidade de o Estado punir a si mesmo. Por outro lado, cumpre anotar que a responsabilização penal é plenamente aplicável às empresas públicas, às sociedades de economia mista e às fundações instituídas pelo Poder Público. Posto que não se confundem com o Estado, mas coexistem paralelamente ao mesmo. A efetividade da responsabilidade penal da pessoa jurídica está diretamente relacionada com as questões processuais, necessitando para tanto analisar, por exemplo, o procedimento aplicável, a aplicação das penas e o cumprimento ou execução destas. As penas aplicadas às pessoas jurídicas são as seguintes: pena de multa, onde deve ser observada a situação econômica do infrator; penas restritivas de direitos que abrangem a suspensão total ou parcial de atividades, a interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade e a proibição de contratar com o poder público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações; pena de prestação de serviço à comunidade e, por fim, a liquidação forçada da pessoa jurídica nos casos em que for constituída ou utilizada, preponderantemente, com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime previsto na já citada Lei dos Crimes Ambientais. OBJETIVOS Objetivo Geral: Analisar a responsabilização penal da pessoa jurídica nos crimes ambientais. Objetivos Específicos: Constatar os principais motivos ensejadores do surgimento da responsabilidade penal da pessoa jurídica; Sistematizar a legislação constitucional e infraconstitucional que prevê a responsabilidade penal da pessoa jurídica nos crimes ambientais; Analisar a capacidade penal da pessoa jurídica para fins de responsabilização, bem como, o procedimento para a apuração dos crimes ambientais praticados por pessoa jurídica e a aplicação da pena correspondente. METODOLOGIA A metodologia aplicada ao presente trabalho é basicamente, quanto à abordagem, dedutiva. Sendo realizada com o uso da técnica de pesquisa bibliográfica, entendida assim, como a pesquisa “[...] desenvolvida com base em material já elaborado, constituída principalmente de livros e artigos” (GIL, 2002, p. 44), e, eventualmente, a pesquisa de campo. RESULTADOS A execução do presente trabalho enseja atingir os seguintes resultados: ampliar o referencial teórico acerca do tema da responsabilidade penal da pessoa jurídica, notadamente, no tocante aos crimes ambientais e contribuir com o processo de discussão do tema no âmbito do Poder Público, destacando a importância da adoção de políticas públicas para a promoção do desenvolvimento econômico coma devida responsabilidade sócio-ambiental. CONSIDERAÇÕES FINAIS A inserção da responsabilidade penal da pessoa jurídica no ordenamento jurídico pátrio ainda desafiará os estudiosos do Direito por algum tempo, de forma que estamos vivenciando uma fase de construção doutrinária acerca do tema. No entanto, não há como negar a participação das empresas no crescente processo de degradação ambiental, não sendo justo que as mesmas não sejam responsabilizadas sob o argumento de que não são dotadas de vontade. Pois, é sabido que a ação da pessoa jurídica é resultado da vontade de determinado grupo de pessoas físicas, sendo correto que a punição recaia sobre a pessoa jurídica, que emitiu a vontade. Nesse sentido, para Fedeli, “crimes graves merecem punições à altura, e a pessoa jurídica, que tem, pela sua complexidade e pelo poder que detém, condições de causar os maiores males, não pode restar ilesa da punição” (2004, p.59). Dessa forma, a consagração da responsabilização penal da pessoa jurídica, caracterizase como um mecanismo para tornar mais eficiente a tutela ao meio ambiente. E, sendo este considerado como um direito fundamental de terceira geração, ou seja, inserido constitucionalmente no âmbito dos direitos coletivos e difusos, entendemos que estudos dessa natureza nos possibilitará levar adiante a idéia de que, diante da crescente escassez dos bens ambientais, a preocupação com a preservação ambiental não deve ser monopólio de uma minoria esclarecida, mas de toda a sociedade, de forma a adquirimos consciência social e nos preocuparmos com as gerações presentes e futuras. PALAVRAS-CHAVE Responsabilidade penas das pessoas jurídicas; crimes ambientais; direito penal. REFERÊNCIAS BURGALHO, Nelson R. Tutela penal das florestas e demais formas de vegetação consideradas de preservação permanente. Revista de Direito Ambiental. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 7, n. 25, p. 152-173, jan./mar. 2002. CAZETTA, Ubiratan. A competência federal e os crimes contra o meio ambiente: uma crítica à jurisprudência dos tribunais superiores. Revista de Direito Ambiental. 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