VIOLÊNCIA: O QUE PODEMOS FAZER? Profa. Dra. Francisca Maria Coelho Cavalcanti(1) Profa. Msc. Kátia Neves Lenz César de Oliveira(2) Profa. Dra. Cláudia Regina Brandão Sampaio(3) Profa. Dra. Rosimeire Carvalho Martins(4) Departamento de Psicologia RESUMO: A questão da violência no mundo e no Brasil, especificamente, as que atingem diretamente a vida, a civilidade, a integridade física dos indivíduos, a cidadania, como direito à vida saudável, tem sido, amplamente, divulgadas na sociedade, mas muito pouco se tem feito para o estanque ou mesmo a minimização da mesma. Este fenômeno assim como atinge a esfera macro da sociedade, permeia e se infiltra na esfera micro, como e o caso da violência na escola, a violência sexual no âmbito familiar, a violência de gênero, a violência na juventude, entre outras. O trabalho analisa a questão da violência e pontua intenções que levem a minimizar essa questão social que aniquila vidas e as deixa sem possibilidades de reconstrução social e humana. VIOLÊNCIA ESCOLAR O fenômeno chamado violência se alastra na sociedade e se infiltra em todos os âmbitos sociais imagináveis (família, igreja, escola etc) e suas manifestações assumem proporções que parecem naturalizar o que podemos chamar de “cultura da violência”, em que nossos jovens, ao mesmo tempo que são as vitimas, também são levados a ser os algozes. Diante dessa configuração social, a escola é uma instituição educativa que abarca esses jovens e, por conseguinte, a violência é disseminada e perpetrada na sociedade. Pergunta-se: o que fazer com a violência que adentra a escola e que está contemplada em seu âmbito como se fora um conteúdo que deva ser difundido? A exemplo: O Instituto de prevenção de violência na escola dos EUA entrevistou alunos e pais e constatou que 2/3 dos alunos participam de grupos que intimidam colegas. Na Alemanha, pesquisa entre jovens das 7ª e 8ª séries apontava que 60% já tinham batido em colegas nos últimos seis meses, 5% os intimidavam, regularmente, e 8% os ameaçaram com facas e pistolas. Na França, 23,9% dos alunos já foram agredidos, 72,4% sofreram insultos e 45,1% foram roubados. No Brasil, pesquisa realizada em três municípios (Iguatu- CE, Juiz de Fora- MG e Campinas- SP), constatou que as violências sofridas e praticadas nas escolas se apresentavam sob diversas formas. Aspectos como: estrato social, natureza da instituição (pública ou privada), cultural e de gênero mediavam esse fenômeno. Os dados revelaram que para todas as escolas, a humilhação foi à forma de agressão mais sofrida pelos alunos, seguida de furtos, ameaças e destruição de seus objetos. Na referida pesquisa, as escolas públicas enfatizaram experiências de agressões físicas e depredações, nas escolas situadas em áreas de intensos conflitos entre traficantes e a policia, a existência de arma de fogo foi mais citada tanto pelos alunos quanto pelos professores. Assim, vemos perplexo o avanço desse fenômeno e, notamos, também, que é intolerável adiar providências para uma educação que dissemine todo o contrário. Vemos como essencial o papel da escola na desconstrução da violência e na reconstrução de conteúdos de valor como: respeito mútuo, solidariedade, tolerância, empatia, assertividade, conteúdos que não devem ser ensinados isoladamente, mas através de um conjunto de ações deliberadas e intencionais envolvendo escola, família, comunidade e estado. VIOLÊNCIA CONJUGAL E DE GÊNERO: PODER E AMOR ROMÂNTICO X SERENIDADE A violência conjugal tem sido combatida a partir de diferentes orientações teóricas e políticas. Um bloco baseia-se nas importantes contribuições feministas, convergindo em prol da explicação de que a violência conjugal contra a mulher é um ato relacionado, diretamente, à dominação masculina, desenvolvida ao longo da história da humanidade. Usam em especial a categoria “gênero” ser homem e ser mulher é condição realizada na cultura. Outro grupo apóia-se numa perspectiva mais relacional/sistêmica, discutindo, em especial, o papel da mulher como produtora, juntamente com o parceiro, da relação violenta. Tende, então, a posicionar-se contra o discurso da “vitimização”, colocando a mulher como cúmplice. Mas, atualmente, ainda se desenvolve uma terceira via, que legitima as contribuições do feminismo clássico, ao criar o termo “vitimização afirmativa”, que designa um discurso performático de auto-análise da mulher e não de passividade, e/ou propondo um olhar voltado ao modelo de conjugalidade ocidental moderno baseado na idéia de amor. Por fim, diante da eficácia de todas estas correntes em diferentes contextos, proponho construirmos intervenções polissêmicas e múltiplas, que aliem crítica social (com postura auto-reflexiva sobre seus próprios valores e conseqüências destes) e acolhimento ao diferente (serenidade). VIOLÊNCIA E ADOLESCÊNCIA A violência vem, ao longo das últimas décadas, impondo-se como fenômeno emergencial no contexto das ciências que buscam modelos teóricos e intervenções técnicas eficazes para o enfrentamento, diminuição e prevenção dos impactos negativos dela resultantes. A ampliação deste tema para múltiplos campos do saber, outrora difícil e até mesmo negada, possibilitou reflexões mais comprometidas com a sua real dimensão. Tais reflexões têm proporcionado avanços senão na efetivação de ações que incidam, diretamente, em sua diminuição, na sensibilidade de muitos, visando compreender para intervir. Estudos científicos, políticas públicas, ações sociais e comunitárias, medidas de proteção individual são pensadas e postas em prática, visando à contenção da violência e redução de seus impactos sobre a vida das populações. Entendido como fenômeno não-positivista pela complexidade com a qual se reveste, a violência é, sem dúvida, um tema incômodo, de difícil conceituação e enfrentamento. De caráter onipresente e multifacetado, revela também, a dificuldade em abordá-lo sob um único aporte. Sua complexidade toma forma nos múltiplos sentidos que pode adquirir, nos mais diversos contextos em que se manifesta. A despeito de sua ‘onipresença’, a violência é um fenômeno comumente associado à pobreza e/ou subdesenvolvimento. Seus índices e a (des)informação produzida em torno do tema revelam participação significativa de vítimas e autores – indivíduos pobres, em geral, do sexo masculino e, cada vez mais, jovens – protagonizando históricos de violência, ocultando as condições que predispõem a ocorrência de tais fatos de modo mais ostensivo junto a determinados grupos e populações. É a vulnerabilidade destes grupos que os coloca não apenas como principais atores no cenário da violência, mas também como vítimas da naturalização e banalização que surgem face à vinculação simplista e automática entre pobreza e violência, juventude e criminalidade. É neste contexto de naturalização da violência e sua associação com a pobreza e juventude que vem gerando o inquietante quadro nas duas últimas décadas, sugerindo que a sociedade deve precaver-se contra crianças e adolescentes pobres, uma vez que estes representariam ‘ameaça potencial’ à segurança individual e coletiva. Nossa fala pretende problematizar a participação de crianças e jovens nos quadros de violência, considerando análises no âmbito de diversos campos do saber, evidenciando estarmos vivendo em um mundo incapacitado a atender as especificidades da infância e juventude, visando o desenvolvimento sob perspectivas menos aprisionantes. As alternativas de enfrentamento apontadas sugerem, para além da postura prevencionista, a adoção do paradigma de promoção da saúde e do desenvolvimento humano, enfocando diretamente as políticas públicas para infância e juventude. PESQUISA SOBRE O IMPACTO DA VIOLÊNCIA NA SAÚDE DE MULHERES VÍTIMADAS EM MANAUS A preocupação com a violência se coloca hoje como uma questão central para muitas sociedades e inúmeros são os fatores apontados como responsáveis pelo seu aumento. Um aspecto assustador desse fenômeno é a sua naturalização, restando às vítimas aprender a conviver com ela. A violência, segundo Araújo (1996), não pode se caracterizar apenas pela agressão física, tendo em vista que o conceito envolve também a violência sexual e psicológica, incluindo agressões verbais e humilhações que afetam a auto-estima e a capacidade de reação e decisão da pessoa agredida. O tipo mais cruel de violência, certamente, é aquele praticado contra crianças e adolescentes, porque compromete a manifestação mais humana que a civilização construiu – o direito à liberdade. Praticar violência contra crianças e adolescentes significa violar os seus direitos essenciais e negar valores humanos fundamentais legitimados há muito tempo, como aqueles relacionados aos direitos à vida, à liberdade e à segurança. Um dos tipos de violência que gera grande preocupação em nossa sociedade é a violência sexual, conseqüência da falta de garantia dos direitos relacionados à saúde de milhões de crianças e de jovens, principalmente, quando se trata das condições básicas que abonam a sobrevivência física e um desenvolvimento psicológico saudável. Esta ausência de responsabilidade social e precariedade de políticas sociais de assistência refletem- se na falta de atenção psicológica especializada às milhares de pessoas que sofrem violência sexual e vivem relegadas à própria sorte. Apesar da sua importância, que pode ser avaliada pelas inúmeras conseqüências, que podem acompanhar as vítimas por muito tempo, há muitas dificuldades para aquilatar a sua dimensão. Diversos autores chamam a atenção para isso, alertando para a pouca confiabilidade dos registros disponíveis (Pfeiffer e Salvagni, 2005; Faúndes, Rosas, Bedone e Orozco, 2006). Com base em estudos internacionais, estima-se que entre 7-36% das meninas e 3-29% dos meninos são sexualmente vitimados. Os registros representam uma subnotificação, pois nem todas as crianças revelam o abuso; em outros casos, revelam, mas não são acreditadas. Conforme informam Pfeiffer e Salvagni (2005) “Trabalha-se com um fenômeno que é encoberto por segredo, um muro de silêncio do qual fazem parte os familiares, vizinhos e, algumas vezes, os próprios profissionais que atendem as crianças vítimas de violência.” (p.197). Damergian (1986) destaca que é a permissividade social que sustenta tal situação, pois a “nossa sociedade é tolerante com a violência, incorpora-a a seu cotidiano, de forma tal que não nos espantamos mais com as notícias de brutalidades cometidas indiscriminadamente contra crianças e contra adolescentes, inundando jornais e noticiários” (p. 3), donde poderíamos concluir que somos permissivos, complacentes e acomodados com a violência. No Brasil, os estudos sobre a temática da violência doméstica são recentes, tendo despertado maior preocupação no campo científico, institucional e político a partir da década de 1980, como evidenciam as pesquisas de Guerra (1985), Marques (1986), Santos (1987) e Azevedo & Guerra (1989). A principal preocupação dos estudos iniciais era a denúncia e a demonstração da incidência desse tipo de violência. Atualmente, o quadro referente às pesquisas se ampliou significativamente e as investigações sobre abuso sexual, realizadas na área de estudos sobre violência doméstica contra as mulheres, têm contribuído para evidenciar o impacto da violência sexual na saúde das vítimas. Pesquisas recentes como as de Furniss (2002), Gabel (1997), Hirigoyen (2002), Teicher (2003), Amazarray e Koller (1998), Santos (1997), Sobreira (1997), Charam (1997), Mees (2001) e Rangel (1998), revelam preocupação com possíveis impactos na saúde ao se referirem ao aparecimento de problemas psicológicos como depressão, ansiedade e dificuldade nas relações afetivas e sexuais e evidenciam que a violência sexual representa um sério problema de saúde pública, que pode comprometer o desenvolvimento daqueles que a ela são expostos. O que tem predominado na literatura contemporânea sobre a violência sexual é a ênfase nos aspectos negativos dela decorrentes. Verifica-se que a principal preocupação dos estudos tem sido a de demonstrar como as pessoas vitimadas ficam presas na teia de sofrimento decorrente do abuso, não conseguindo dela se libertar, enquanto outros sucumbem de forma drástica através de atentados à própria vida (AZEVEDO, 2000; ROUYER, 1992; AZEVEDO, GUERRA & VAICUNAS, 2000; MEES, 2001; BRAUN, 2002; HABIGZANG & CAMINHA, 2004). É importante ressaltar que embora haja o reconhecimento dos efeitos deletérios do abuso sexual na saúde das pessoas vitimadas, algumas mulheres contam com o apoio social e a compreensão de familiares e amigos, o que contribui para que haja superação das dificuldades originadas pelo abuso. Assim, pareceu-nos necessária uma investigação que procurasse identificar além dos efeitos deletérios do abuso, as estratégias utilizadas pelas vítimas para superá-los. Esta pesquisa pretendeu conhecer o impacto do abuso sexual sobre a saúde de mulheres jovens na cidade de Manaus, a partir da caracterização do contexto em que o abuso ocorreu, tendo como principais objetivos identificar: a) a prevalência dos tipos de abuso (intra ou extra-familiar); os locais em que ocorrem; as características dos agressores e as estratégias que utilizam; b) a ocorrência de recorrências; c) os sentimentos provocados pelo abuso das vítimas; d) as conseqüências para a saúde e para as relações familiares, sociais e sexuais; e, e) as estratégias utilizadas pelas vítimas no intuito de superar o ocorrido. E-mail: [email protected] ________________________________________ (1) Expositora 01: Tema - Violência Escolar (2) Expositora 02: Tema - Violência conjugal e de gênero: poder e amor romântico X serenidade (3) Expositora 04: Tema - Violência e adolescência (4) Coordenadora / Expositora 03: Tema - Pesquisa Sobre o Impacto da Violência na Saúde de Mulheres Vitimadas em Manaus