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Pró-Reitoria de Graduação
Curso de Direito
Trabalho de Conclusão de Curso
OBJETIVAÇÃO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Autor: Igor Viana Reis
Orientadora: Raquel Lucas Bueno
Brasília-DF
2012
IGOR VIANA REIS
OBJETIVAÇÃO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO:
EM QUE PESE OS BENEFÍCIOS DA OBJETIVAÇÃO DO RECURSO
EXTRAORDINÁRIO, TAL REALIDADE NÃO FERE AS REGRAS LEGAIS DO
CONTROLE CONCENTRADO? EXISTE ALGUM PRINCÍPIO QUE JUSTIFIQUE
TAL FENÔMENO?
Monografia apresentada ao curso
de graduação em Direito da Universidade
Católica de Brasília, como requisito parcial
à obtenção do título de bacharel em
Direito.
Orientadora:
Lucas Bueno.
Brasília
2012
Especialista
Raquel
Monografia de autoria de Igor Viana Reis, intitulada “Objetivação do
Recurso Extraordinário”, apresentada como requisito parcial para obtenção do Grau
de Bacharel em Direito da Universidade Católica de Brasília, em novembro de 2012,
defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:
__________________________________________________
Profa. Esp. Raquel Lucas Bueno.
Orientadora/ Curso de Direito da UCB
__________________________________________________
Prof. (a)
Membro da Banca/ Curso de Direito da UCB
__________________________________________________
Prof. (a)
Membro da Banca/ Curso de Direito da UCB
Brasília
2012
Dedico esta monografia a Edilson Serafim
e Vera Lúcia, pais maravilhosos, que me
auxiliam sempre.
AGRADECIMENTO
Agradeço, primeiramente, a Deus, que sempre me deu força e perseverança
para enfrentar as dificuldades ao longo da graduação. Agradeço, também, à
professora Raquel Lucas Bueno, pela orientação na elaboração deste trabalho.
Agradeço, ainda, a todos os meus amigos, em especial Debora Garcia e Miguel
Ângelo, que me apoiaram e acreditaram em mim, com fé e esperança. Por fim,
agradeço às minhas duas irmãs Rayanne e Geovana, cujo apoio foi essencial.
"Realmente não teria me metido nestas
coisas por minha própria vontade, e a
necessidade de melhorar esta Justiça
nunca
teria me perturbado
o
sono.
Entretanto, como parece ser, estou detido
– a verdade é que estou detido -, vejo-me
obrigado a intervir, e concretamente, por
mim.”
Franz Kafka, O processo.
RESUMO
Referência: REIS, Igor Viana. Título. Objetivação do Recurso Extraordinário. 2012.
74 Páginas. Monografia do Curso de Direito da Universidade Católica de Brasília,
Brasília. 2012.
No primeiro capítulo será feita uma abordagem acerca do Recurso Extraordinário. É
por meio dele que o Supremo Tribunal Federal exerce o Controle Difuso de
Constitucionalidade, sua evolução histórica nas Constituições brasileiras, as suas
hipóteses de cabimento. No que se refere aos seus requisitos de admissibilidade,
terá foco primordial na Repercussão Geral acrescida pela emenda constitucional
45/2004, que reforça o caráter objetivo que se tenta aplicar ao Controle Difuso de
Constitucionalidade, fazendo com que as decisões proferidas no instituto tenham
eficácia vinculante e erga omnes, efeito atribuído somente em decisões proferidas
em sede de Controle Concentrado de Constitucionalidade, ultrapassando assim os
limites iter partes, uma tendência jurisprudencial por parte da Suprema Corte.
Prossegue trazendo ponderações acerca do controle de constitucionalidade, as
modalidades que são aplicadas no país, e até onde pode alcançar os efeitos das
decisões proferidas por cada um dos controles. Tentar demonstrar que o fenômeno
da objetivação está em total harmonia com os preceitos legais, não havendo óbice
em sua aplicação.
RÉSUMÉ
Dans ce premier chapitre sera faite une approche à propos de Recours
extraordinaire. C’est comme ça que La Haute Cour Fédérale de Justice- STF- fait le
contrôle diffus de constitutionnalité. On parlera de son évolution historique par les
Constitutions brésiliennes et les hypothèses de compréhension. Au sujet de la
condition de possibilité, il y aura, premièrement, la répercussion générale, avant
l'entrée en vigueur de la EC nº 45/2004, ce qui va solidifier le caractère objectif qui
appartient au contrôle diffus de constitutionnalité. Ainsi, pour que les decisions
affirmées par l’institut aient l’efficacité de la justice et erga omnes. Cet effet est
attribué seulement aux decisions proférées en siège de contrôle de constitutionnalité
concentré, ce qui dépasse, ainsi, les limites iter partes, une tendance
jurisprudentielle pour partie de La Haute Cour Fédérale de Justice. On parlera, aussi,
à propos de contrôle de constitutionnalité, les modalités qui sont appliquées au Brésil
et par conséquent les effets des decisions proférées par chaque contrôle. On
essayera de démontrer que les phénomènes de l’objectivation sont en harmonie
avec les normes juridiques, de cette manière, il n’y aura pas de problème pour être
mise en place.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 11
1 RECURSO EXTRAORDINÁRIO .................................................................................................. 14
1.1 NATUREZA JURÍDICA ........................................................................................................... 16
1.2 COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO............................................................................... 17
1.3 PREVISÃO LEGAL .................................................................................................................. 18
1.4 REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE ................................................................................. 21
1.5 HIPÓTESES DE CABIMENTO .............................................................................................. 24
1.6 HISTÓRICO .............................................................................................................................. 27
1.7 REPERCUSSÃO GERAL ....................................................................................................... 29
2 PONDERAÇÕES ACERCA DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ..................... 35
2.1 NATUREZA JURÍDICA ........................................................................................................... 36
2.2 HISTÓRICO .................................................................................................................................. 39
O caso Marbury v.Madison: A doutrina Marshall....................................................................... 39
3 CONTROLE DIFUSO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS ............................................... 41
3.1 CONSTITUIÇÃO IMPERIAL .................................................................................................. 41
3.2 CONSTITUIÇÃO DE 1891 ..................................................................................................... 42
3.3 CONSTITUIÇÃO DE 1934 ..................................................................................................... 42
3.4 CONSTITUIÇÃO DE 1937 ..................................................................................................... 43
3.5 CONSTITUIÇÃO DE 1946 ..................................................................................................... 43
3.6 CONSTITUIÇÃO DE 1988 ..................................................................................................... 44
4 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE E A JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ......... 46
4.1 CONTROLE DIFUSO .................................................................................................................. 47
4.2 LEGITIMADOS ......................................................................................................................... 51
4.3 PROCEDIMENTO DA DECLARAÇÃO DE INCIDENTE ................................................... 52
4.4 CONTROLE DIFUSO PERANTE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ........................ 53
4.5 CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE POR VIA DE AÇÃO
DIRETA ................................................................................................................................................ 55
4.6 LEGITIMADOS ......................................................................................................................... 56
4.7 OBJETO .................................................................................................................................... 60
4.8 PROCESSO E JULGAMENTO DA AÇÃO POR VIA DIRETA ......................................... 61
5 EFEITOS DAS DECISÕES DE INCONSTITUCIONALIDADE E DE
CONSTITUCIONALIDADE ............................................................................................................... 65
5.1 A OBJETIVAÇÃO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO ....................................................... 68
5.1.1 Definição da objetivação do RE, características e exemplos práticos de sua
aplicação no ordenamento jurídico brasileiro...................................................................... 68
5.2 POSIÇÕES DIVERGENTES E SEUS FUNDAMENTOS .................................................. 71
5.3 PRINCÍPIOS JUSTIFICADORES DO FENÔMENO .......................................................... 74
CONCLUSÃO ..................................................................................................................................... 81
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................................ 83
11
INTRODUÇÃO
Poucos são os problemas que podem balançar tanto a sociedade brasileira
quanto a questão judiciária, principalmente, no que se refere ao acesso à justiça, e
mesmo que já se tenha proposta à ação, a demora quanto a uma resposta
adequada por parte do jurisdicionado brasileiro se torna um problema nos dias de
hoje.
No que se refere às instâncias excepcionais, o Recurso Extraordinário tem
sido coadjuvante há muito tempo pelo congestionamento no funcionamento do
Supremo Tribunal Federal. É por meio desse recurso que a referida Corte
Constitucional exerce o controle difuso de constitucionalidade.
Nesse sentido é com intuito de dar ainda mais força à atribuição proclamada
pelo texto constitucional, a Suprema Corte vem atribuindo eficácia erga omnes no
controle difuso de constitucionalidade, mais especificamente nas decisões proferidas
em sede de Recurso Extraordinário.
Diante da enorme quantidade de Recursos Extraordinários que chegam a
Suprema Corte, na maior parte das vezes tratando de questões idênticas, resolve-se
então fazer uso do fenômeno da objetivação ou abstrativização.
Há de se ressaltar que a própria constituição trouxe uma diferença quanto à
vinculação das decisões proferidas em sede de Controle Difuso, necessitando para
tanto aval do poder legislativo. A eficácia erga omnes está prevista nas decisões
proferidas em sede de controle Concentrado de Constitucionalidade.
O presente trabalho busca analisar a vinculação das decisões proferidas em
sede de Controle Difuso de Constitucionalidade, via Recurso Extraordinário, através
da descrição de sua estrutura na Constituição Brasileira, examinando as principais
características do Recurso Excepcional. Inicialmente o Controle Difuso será
caracterizado e estudado de forma pormenorizada. Em seguida, será feita uma
12
abordagem ampla acerca do tema Controle de Constitucionalidade que será
delineada e apresentada desde sua implementação até o atual modelo.
O método geral utilizado será o hipotético-dedutivo. Quando da identificação
da questão a ser relatada, assim, sendo o Controle de Constitucionalidade, através
da observação do contexto geral, chegar-se-á ao caso particular. As observações
serão combinadas cuidadosamente para elaboração de postulados que expliquem o
fenômeno da objetivação ou abstrativização . Será feita com base em materiais já
publicados sobre o assunto, como livros, artigos e jurisprudências dos Tribunais
Superiores.
Será utilizado o método histórico, que submeterá a comparação do objeto
deste trabalho, o Controle Difuso de Constitucionalidade via Recurso Extraordinário,
na atualidade, como era nas suas origens, bem como submeterá também suas
características atuais (Constituição de 1988), com as formações anteriores (outras
constituições), sendo consideradas como precursoras do estágio atual.
Quanto à organização, o trabalho apresenta-se dividido em três capítulos. O
primeiro capítulo tem em vista elucidar objetivamente as características do Recurso
Extraordinário. Trazendo seu aspecto histórico e as hipóteses de cabimento do
referido recurso excepcional. Quanto aos requisitos de admissibilidade, em especial
a Repercussão Geral acrescentada pela emenda constitucional 45/2004, oportunizase a tentativa de evidenciar que o referido instituto tem condição ímpar no
ordenamento jurídico brasileiro, apesar de haver na história outras tentativas de se
filtrar a entrada de Recursos Extraordinários perante o Supremo Tribunal, como por
exemplo, a arguição de relevância. Será traçado um paralelo entre os dois institutos,
que apesar de surgirem com mesma função, na sua essência eles nada tem a ver.
No segundo capítulo pretende-se realizar um estudo do Controle de
Constitucionalidade, desde sua implementação até os dias atuais, destacando os
tipos de controles existentes no ordenamento jurídico brasileiro, as suas hipóteses
de cabimento perante o Supremo Tribunal Federal, os efeitos que são produzidos a
partir da prolação de decisão de inconstitucionalidade.
13
A análise do fenômeno da objetivação ou abstrativização será objeto do
terceiro capítulo, suas características, e como se aplica no ordenamento jurídico
brasileiro, posições favoráveis e divergentes quanto à aplicação do referido instituto.
14
1 RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Antes de buscar respostas acerca do conceito de Recurso Extraordinário,
torna-se de grande relevância uma primeira abordagem sobre as nomenclaturas
“Extraordinário”, “Ordinário” no direito Brasileiro, com vistas a facilitar ainda mais o
estudo do tema.
O termo “Ordinários” remete a algo comum, refere-se a todos os recursos que
podem ser interpostos em desfavor de sentenças judiciais. De outra forma, nomeouse de “Extraordinários”, aqueles recursos que surgem de uma excepcionalidade
assegurada
pela
carta
constitucional,
“a
ser
interposto,
para
as
Cortes
Constitucionais, de decisões judiciais definitivas proferidas por juízes e tribunais
federais e pela justiça dos Estados1”.
Há quem diga que o conceito de Recurso Extraordinário no direito nacional
não se relaciona com referências da legislação estrangeira, pois os critérios
abordados pela doutrina alienígena não se coadunam “quanto a essa questão, aos
aceitos pelo direito brasileiro2”.
Conceito atribuído ao que seria realmente definido como Extraordinário, é o
recurso cuja interposição se valia somente de sentença já transitada em julgado, o
que não ocorre no Brasil. Ovídio A. Baptista Santos cita em sua obra “por exemplo,
no direito português, com recurso de revisão (art.771) e a oposição de terceiros
(art.778); ou com a denominada opozione di terzo do direito italiano3”.
Nesse sentido, o doutrinador supra faz a seguinte ponderação:
É o caso do Direito Português -, são ordinários todos os recursos
que correspondam a meios de impugnação formulados na mesma relação
processual, capazes de prolongar a pendência da causa evitando a
formação da coisa julgada; enquanto consideram-se extraordinários os
4
recursos interpostos contra uma sentença já transitada em julgado .
1
CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Recurso Extraordinário e Recurso Especial: São Paulo: Saraiva,
2010. p. 12.
2
SILVA, Ovídio A. Batista da. Curso de Processo Civil: Processo de Conhecimento. 7ª. Ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2005. p. 390.
3
Idem, ibidem.
4
CUNHA, 2010, p. 12.
15
Por conseguinte, não restaria outra opção senão afirmar a existência somente
de recursos ordinários. Seguindo essa orientação, Ovídio A. Baptista Santos conclui
que:
No sentido em que definem os sistemas jurídicos europeus, uma
vez que não consideramos como recursos todos os meios autônomos de
impugnação, como ação rescisória e os embargos de terceiro, que
poderiam ser assimilados a essas formas de ataque às sentenças já
5
existentes naqueles sistemas processuais .
Sob outra perspectiva, pode ser encarada a classificação dos recursos, em
que sua abordagem fática leva em conta “não a circunstância de ter ou não ocorrido
a coisa julgada, e sim a natureza ou os pressupostos que se exijam para sua
fundamentação6”.
José Frederico Marques, classifica como Recurso Comum e Recurso
Especial, assim para o primeiro, a condição “si ne qua non” se dá com a
sucumbência,
claro,
desde
que
preenchidos
pressupostos
ditos
como
procedimentais.
Quanto aos Recursos tidos como Especiais, deveria haver mais uma
condição subjetiva para recorrer da decisão, esta por sua vez enumerada pela
Constituição, corroborando com mesmo entendimento, Sebastião de Oliveira Castro
Filho se manifesta no seguinte sentido:
Por serem excepcionais, são diferenciados, de sorte que, embora
não dispensem, para sua interposição, os mesmos pressupostos genéricos
reclamados pelos meios singelos de impugnação de decisões judiciais,
exigem a presença de outros requisitos, especificados na própria
Constituição. Ausente qualquer um deles, seja genérico ou específico, de
7
natureza objetiva ou subjetiva, o recurso não é apreciado .
Há de se observar que na origem dos recursos judiciais em geral, na sua
verdadeira essência, o que menos se observava era a busca pela justiça; a criação
das casas revisoras de decisões volta-se, na verdade, para um conteúdo meramente
5
CUNHA, 2010, p. 12.
Idem, ibidem.
7
CASTRO Filho, Sebastião de Oliveira. Dos recursos excepcionais na constituição brasileira. In:
As vertentes do direito constitucional contemporâneo. MARTINS, Ives Gandra da Silva. (Coord.). Rio
de
Janeiro:
América
Jurídica,
2002.
p.
175-196.
Disponível
em:
<http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/16074>. Acesso em 31 ago. 2012.
6
16
político, e que, somente a partir da República a revisão das decisões passou a se
ocupar com questões de justiça. No mesmo sentido se manifesta Sérgio Sérvulo da
Cunha:
O motivo de sua instituição foi político, na medida em que o
monarca – tendo delegado aos prepostos o poder de impor penas e decidir
litígios – quis manter a palavra final em determinados assuntos, no mínimo
como sinal de soberania. Em sua origem, portanto, não há neles
preocupação com a justiça ou cidadania, o que só viria a ocorrer na
República; nesta eles protegem a parte contra o arbítrio do julgador, daí
poder-se falar não apenas em “duplo grau de jurisdição”, mas em “principio
8
da recorribilidade .
Com intuito de esclarecer ainda mais acerca do tema, vale enaltecer o
comentário do ilustre Professor Deocleciano Batista:
A expressão ‘recurso extraordinário’ é conhecida entre nós desde as
Ordenações Filipinas. Designava então uma espécie de súplica que os
súditos podiam endereçar ao rei português para obter a cassação ou a
revisão até mesmo de decisões passadas em julgado. Nessa época o
9
Estado ainda sob o domínio da vontade única do monarca .
Os tribunais que possuíam o poder de revisão tinham em sua maioria a
designação política de seus magistrados, com a função única de atingir a vontade do
monarca. Nesse diapasão, Mario de Albuquerque ensina que:
O mais antigo sistema procede da monarquia absoluta do ancien
régime, que, considerando a justiça não como função do Estado, mas como
privilégio da Coroa, outorgava o Rei à faculdade de designar livremente as
pessoas que em seu nome haviam de administrar a justiça, quando ele não
10
podia fazê-lo por si mesmo .
Acertados os pontos mais relevantes, observa-se que o conceito de Recurso
Extraordinário surge por ele possuir singularidades, obviamente diversas daquelas
aplicadas aos recursos tidos como ordinários, não bastando para sua interposição
os requisitos genéricos de admissibilidade, tal como a sucumbência.
1.1 NATUREZA JURÍDICA
8
CUNHA, 2010, p. 11.
BATISTA, Deocleciano. Recurso Extraordinário Contra Acórdão Proferido por Turma do STF.
Rev. Fund. Esc. Super. Minist. Público Dist. Fed. Territ., Brasília, Ano 10, Volume 19, p. 57–92,
jan./jun. 2002. Disponível em: http://www.escolamp.org.br/arquivos/19_04.pdf. Acesso em 16 out.
2012.
10
ALBUQUERQUE, Mário Pimentel. Órgão jurisdicional e sua função: estudos sobre a ideologia,
aspectos críticos e o controle do poder judiciário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p.129.
9
17
A natureza jurídica do Recurso Extraordinário é de Recurso Processual, à
mercê de quem se tornou sucumbente na controvérsia, onde o Supremo Tribunal
Federal irá dirimir a questão constitucional acendida e ainda julgar de forma
definitiva a pretensão resistida.
1.2 COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO
A Constituição Federal de 1988 aduz em seu texto mais precisamente no seu
art. 102, “que compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente a guarda da
Constituição.”, assim, conforme preleciona Sebastião de Oliveira Castro Filho,
citando Mendonça Lima:
O STF foi erigido ao plano de Corte Constitucional quase que nos
moldes europeus. E “(...) o recurso extraordinário - diz ele – deixou de ser,
de agora em diante, a panacéia para qualquer pretensão das partes (...) A
orientação presente colocou o remédio extremo em suas devidas
proporções, cerceando os ímpetos em seu uso desmedido e
11
inconsequente .
A competência de guarda do texto constitucional por meio do poder
constituinte originário foi apontada ao Supremo Tribunal Federal, sendo, portanto, o
responsável para julgamento do Recurso extraordinário.
Nesse sentido, e com intuito de mais esclarecimentos acerca do tema, vale
ressaltar o seguinte comentário:
Seguindo o notável modelo americano, o constituinte republicano de
1891 estabeleceu que esse papel de defesa da unidade e autoridade da
Constituição e das Leis Federais deveria caber ao Supremo Tribunal
Federal, que assim foi erigido numa espécie de Tribunal de Superposição
da Federação, ao qual estão subordinados tantos os órgãos judiciário
federais de menor hierarquia, quer da justiça ordinária, quer da justiça
especializada (trabalhista, eleitoral e militar), como órgãos das justiças
12
estaduais .
11
2000, apud CASTRO Filho. 2002. p. 175-196.
Villela, José Guilherme. Recurso Extraordinário. Revista de informação legislativa, v.23, nº 89, p.
235-252, jan./mar. de 1986. Revista de processo, v.11, nº 41, p. 137-150, jan./mar. de 1986. Revista
de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro, nº 37, p. 47-65 de 1985. Disponível em:
http://www2.senado.gov.br/bdsf/item/id/181678. Acesso em 31 ago. 2012.
12
18
Nesse diapasão, com o posto que lhe foi atribuído, ao Supremo Tribunal
Federal incumbe resguardar e interpretar as normas constitucionais. “Nessa função
de preservar e interpretar as normas da Constituição Federal, deve se considerar
inserida função de uniformizar a jurisprudência nacional quanto à interpretação das
normas constitucionais13”.
Fredie Didier Jr. afirma que o encargo a ser desempenhado ao STF, se
encontra em total consonância com o Recurso Extraordinário, conforme pode-se
extrair abaixo:
No espectro dessa função desempenhada pelo STF, insere – se o
recurso extraordinário, mêrce do qual a Corte Suprema rejulga decisões
proferidas, em última ou única instância, que tenham violado o dispositivo
da Constituição Federal. No particular, além de corrigir a ofensa a
dispositivos da Constituição, o STF cuida de uniformizar a jurisprudência
14
nacional quanto a interpretação das normas constitucionais .
Dessa forma, atribuída a competência da análise do Recurso Extraordinário
ao Supremo Tribunal Federal, fica a cargo então da suprema corte a incumbência de
uniformizar o entendimento das instâncias ordinárias quanto à interpretação de texto
constitucional.
1.3 PREVISÃO LEGAL
O Recurso Extraordinário é previsto na Constituição Federal, mais
especificamente no artigo 102, inciso III, abaixo reproduzido:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a
guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I (...);
II (...);
III julgar mediante recurso extraordinário, as causas decididas em
única ou última instância, quando a decisão recorrida:
a) contrariar dispositivo desta Constituição;
b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;
c) julgar válida lei ou o ato do governo local contestado em face
desta Constituição;
d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal. §(...);
13
DIDIER JÚNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual
Civil: Meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. 5. Ed. Salvador: Jus
Podivm, 2008. p.306.
14
Idem, ibidem.
19
Como pode se perceber, o inciso III, trouxe as alíneas a, b, c e d, em que se
encontram elencadas as hipóteses de interposição do Recurso Extraordinário, que
será objeto de debate logo mais a frente.
Vale ressaltar que com o advento da Constituição de 1988, instituída a
criação do Superior Tribunal de Justiça – STJ por meio do poder constituinte
originário desincumbiu ao Supremo Tribunal Federal, via recurso extraordinário,
analisar contrariedade à lei federal, ficando a cargo apenas das questões
constitucionais.
Dessa forma, vale transcrever o comentário de Ricardo de Barros Leonel:
Que se inseria na competência recursal do Supremo Tribunal
Federal o julgamento do Recurso Extraordinário, envolvendo tanto matérias
que ainda hoje são discutidas no âmbito desse recurso, as denominadas
“questões federais de natureza constitucional”, como outras, de direito
federal comum, as chamadas “questões federais de natureza
15
infraconstitucional .
Fredie Didier Jr. faz alguns apontamentos acerca das alterações ora tratadas,
tomando como fundamento o Recurso Especial dirigido aquele novo Tribunal, no
seguinte sentido:
O recurso especial, na verdade é fruto da divisão das hipóteses de
cabimento do recurso extraordinário para o STF (antes d CF/88), que servia
como meio de impugnação da decisão judicial por violação à Constituição e
à Legislação federal. Com a criação do STJ, pela CF/88, as hipóteses de
cabimento do antigo recurso extraordinário foram repartidas entre o STF e o
STJ. O recurso especial nada mais é do que um recurso extraordinário para
16
o STJ .
Em linhas genéricas, o surgimento do Superior Tribunal de Justiça trouxe
como característica de ser o “guardião do direito federal17”, restando assim ao
Supremo Tribunal Federal ser encarregado como “guardião da Constituição
Federal18”.
15
LEONEL, Ricardo de Barros. Emenda Constitucional n° 45/04: a competência do STF e do STJ.
Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, Porto Alegre, v. 2, n. 10, p 53-80, jan./fev. 2006.
Disponível em:< http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/27663>. Acesso em 28 ago. 2012.
16
DIDIER, 2008. p. 249.
17
LEONEL, jan./fev. 2006, p 53-80. Disponível em:<http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/27663>.
Acesso em 28 ago. 2012.
18
Idem, ibidem.
20
Há de se observar que o art. 102 da CF/88 nada fala acerca do seu
procedimento, ficando a cargo da legislação infralegal preceituar qual caminho a ser
perseguido. O recurso extraordinário é regulamentado pelo Código de Processo
Civil, consoante se depreende dos Arts. 541, 542 e 543, in verbis:
Art. 541. O recurso extraordinário e o recurso especial, nos casos
previstos na Constituição Federal, serão interpostos perante o presidente ou
o vice-presidente do tribunal recorrido, em petições distintas, que conterão:
(Revigorado, com nova redação, pela Lei nº 8.950, de 1994)
I - a exposição do fato e do direito; (Incluído pela Lei nº 8.950, de
1994)
II - a demonstração do cabimento do recurso interposto; (Incluído
pela Lei nº 8.950, de 1994)
III - as razões do pedido de reforma da decisão recorrida.(Incluído
pela Lei nº 8.950, de 1994)
Parágrafo único. Quando o recurso fundar-se em dissídio
jurisprudencial, o recorrente fará a prova da divergência mediante certidão,
cópia autenticada ou pela citação do repositório de jurisprudência, oficial ou
credenciado, inclusive em mídia eletrônica, em que tiver sido publicada a
decisão divergente, ou ainda pela reprodução de julgado disponível na
Internet, com indicação da respectiva fonte, mencionando, em qualquer
caso, as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos
confrontados. (Redação dada pela Lei nº 11.341, de 2006).
Art. 542. Recebida a petição pela secretaria do tribunal, será
intimado o recorrido, abrindo-se-lhe vista, para apresentar contra-razões.
(Redação dada pela Lei nº 10.352, de 2001)
§ 1 Findo esse prazo, serão os autos conclusos para admissão ou
não do recurso, no prazo de 15 (quinze) dias, em decisão
fundamentada.(Incluído pela Lei nº 8.950, de 1994)
o
§ 2 Os recursos extraordinário e especial serão recebidos no efeito
devolutivo. (Incluído pela Lei nº 8.950, de 1994)
o
§ 3 O recurso extraordinário, ou o recurso especial, quando
interpostos contra decisão interlocutória em processo de conhecimento,
cautelar, ou embargos à execução ficará retido nos autos e somente será
processado se o reiterar a parte, no prazo para a interposição do recurso
contra a decisão final, ou para as contra-razões. (Incluído pela Lei nº 9.756,
de 1998).
Art. 543. Admitidos ambos os recursos, os autos serão remetidos ao
Superior Tribunal de Justiça. (Revigorado e com redação dada pela Lei nº
8.950, de 13.12.1994).
o
§ 1 Concluído o julgamento do recurso especial, serão os autos
remetidos ao Supremo Tribunal Federal, para apreciação do recurso
extraordinário, se este não estiver prejudicado. (Revigorado e alterado pela
Lei nº 8.950, de 13.12.1994).
o
§ 2 Na hipótese de o relator do recurso especial considerar que o
recurso extraordinário é prejudicial àquele, em decisão irrecorrível
sobrestará o seu julgamento e remeterá os autos ao Supremo Tribunal
Federal, para o julgamento do recurso extraordinário. (Revigorado e
alterado pela Lei nº 8.950, de 13.12.1994).
o
§ 3 No caso do parágrafo anterior, se o relator do recurso
extraordinário, em decisão irrecorrível, não o considerar prejudicial,
devolverá os autos ao Superior Tribunal de Justiça, para o julgamento do
21
recurso especial.
19
13.12.1994) .
Pode-se
notar
que
o
(Revigorado
Recurso
e
alterado
Extraordinário
pela
e
Lei
nº
Especial
8.950,
de
possuem
características peculiares que os diferenciam dos outros recursos previstos na
legislação pátria, principalmente, no tocante a sua previsão legal que pode ser
encontrada na constituição federal enaltecendo a sua característica de recurso
excepcional.
1.4 REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE
Antes de adentrar no tema, se torna necessário algumas ponderações no que
se refere ao juízo de admissibilidade e juízo de mérito, a respeito do qual se passa a
expor. O juízo de admissibilidade se instaura na concepção de validação dos atos
jurídicos. “Mais precisamente do ato jurídico complexo procedimento20”.
Dessa forma, tem–se conhecimento de que todo procedimento se
desencadeia por um ato postulatório, quando se verifica então com prévia análise
acerca da possibilidade ou não do que se postula. “O exame postulatório é, a fortiori,
o exame de validade do próprio procedimento, de que se faz parte21.” Eis que aí
surge o juízo de admissibilidade.
Fredie Didier Júnior enuncia sobre a questão e fecha o seu raciocínio com a
seguinte conclusão:
Toda postulação se sujeita a um duplo exame do magistrado:
primeiro, verifica – se se será possível o exame do conteúdo da postulação;
após, e em caso de um juízo positivo no primeiro momento, examina– se a
procedência ou não daquilo que se postula. O primeiro exame “tem
prioridade lógica, pois tal atividade [análise do conteúdo da postulação] só
se há de desenvolver plenamente se concorrerem os requisitos
indispensáveis para tornar legítimo o seu exercício”. No juízo de
admissibilidade, verifica-se a existência dos requisitos de admissibilidade.
Distingue – se do juízo de mérito, que é aquele “em que se apura a
existência ou inexistência de fundamento para o que se postula, tirando– se
daí as consequências cabíveis, isto é, acolhendo-se ou rejeitando -se a
19
o
BRASIL. Lei n. 5.869, de 11 de Janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Diário Oficial
da
União.
Brasília,
11
de
janeiro
de
1973.
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869.htm>. Acesso em: 27 out. 2012.
20
DIDIER, 2008. p.41.
21
Idem, ibidem. p. 43
22
postulação. No primeiro julga–se esta admissível ou inadmissível; no
segundo, procedente ou improcedente. Por isso que se fala em
22
admissibilidade do recurso, da petição, da denunciação da lide etc .
Nesse sentido, o juízo de admissibilidade sempre antecederá o juízo de
mérito. A deliberação do primeiro, que irá determinar se a matéria de fundo será ou
não analisada. Tereza Arruda Alvim Wambier também faz algumas ponderações
sobre o tema, e afirma que:
O juízo de inadmissibilidade é um juízo definitivo, de certeza quanto
à inviabilidade do provimento do recurso, muitas vezes por razões de
mérito; já o juízo de admissibilidade é um juízo de viabilidade possibilidade, não em tese, mas diante do caso – de que àquele recurso se
23
dê provimento .
No que concerne ao Recurso Extraordinário, este possui peculiaridade de ser
um recurso de fundamentação vinculada, referente à probabilidade “de que haja
certa dose de sobreposição entre juízo de admissibilidade e o mérito24”. É o que
afirma Tereza Arruda Alvim Wambier quando trata acerca do juízo de
admissibilidade conferida no art. 102, III, da CF, conforme se demostra abaixo:
É que as letras do art. 102, III, (...), da Constituição Federal alistam–
se como únicos possíveis fundamentos desses recursos a ofensa à
Constituição Federal (desde que esta ofensa apresente repercussão geral)
(...).São objeto de exame pelo judiciário, portanto necessariamente, quando
25
do juízo de admissibilidade .
A partir dessa premissa, poderia se constatar que quando admitidos os
recursos de fundamentação vinculada, a estes também caberia o reconhecimento de
dar provimento, pois já se teria por legítimo haver ofensa no caso do recurso
extraordinário à constituição federal, quando da sua admissão.
Nelson Nery, citado por Rodolfo de Camargo Mancuso, tece algumas
ponderações, para facilitar a busca da diferença entre juízo de admissibilidade e
juízo de mérito, conforme se depreende do texto abaixo reproduzido:
22
DIDIER, 2008, p. 44
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recurso Especial, Recurso Extraordinário e Ação Recisória.
2. Ed. São Paulo: Revista Dos Tribunais, 2008. p. 249.
24
Idem, ibidem, p.248.
25
Idem, ibidem, p.249.
23
23
Existem algumas condições de admissibilidade que necessitam
estar presentes para que o juízo ad quem possa proferir o julgamento do
mérito do recurso. Chamamos o exame destes requisitos de juízo de
admissibilidade. O exame do recurso pelo seu fundamento, isto é, saber se
o recorrente tem ou não razão quanto ao objeto do recurso, denomina – se
26
juízo de mérito .
Os pressupostos genéricos do juízo de admissibilidade trazidos pela doutrina
podem ser classificados de duas formas: extrínsecos, que são dirimidos em
tempestividade, preparo, regularidade formal, inexistência de fato impeditivo ou
extintivo do direito de recorrer; quanto aos intrínsecos, são eles, o cabimento,
legitimação para recorrer e interesse em recorrer.
No que concerne à excepcionalidade do Recurso Extraordinário, por não se
tratar somente de recurso de revisão, haverá a necessidade de demonstração pela
parte de algo mais que não seja a sucumbência. Ponderação acertada de Rodolfo
de Camargo Mancuso, quanto aos recursos excepcionais:
Em se tratando dos Recursos Excepcionais, o só fato da
sucumbência, isoladamente considerado, não confere interesse para
recorrer, já que nessas impugnações o aspecto primordial é o controle do
ius in thesi, não bastando ao recorrente a singela alegação de prejuízo ou
27
injustiça do julgado recorrido, como se dá nos recursos de tipo comum .
Assim, o recurso extraordinário ou excepcional, enquanto espécie do gênero
recurso possui pressupostos universais, conforme já mencionado, além dos
pressupostos específicos escoados pela Constituição Federal, art. 102, III, e suas
respectivas alíneas. Nesse ponto, oportuna a ponderação de Rodolfo de Camargo
Mancuso, in verbis:
Em resumo, o iter para o conhecimento dos recursos extraordinário
e especial é o seguinte: A) preenchimento, como todos os recursos, dos
pressupostos genéricos, objetivos e subjetivos; B) atendimento, no âmbito
do “interesse de recorrer”, da exigência de cuidar-se de “causa de única ou
última instância”;C) implemento das especificações de base constitucional
(art.102, III,......), matéria que poderia aglutinar sob a égide do cabimento
28
propriamente dito .
26
2004 apud MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso Extraordinário e Recurso Especial. 10.
Ed. São Paulo: Revista Dos Tribunais, 2010. p. 237.
27
Idem, ibidem.
28
MANCUSO, 2010, p. 239.
24
Desta forma, consta-se que os pressupostos ou requisitos para o juízo de
admissibilidade dos recursos estão determinados mediante lei, ficando a cargo de a
parte formulá-lo em estrito cumprimento à legislação. Pois, quando deficiente
impede o seu conhecimento.
1.5 HIPÓTESES DE CABIMENTO
O inciso III, do art. 102 da Constituição Federal de 1988 ao falar de causa de
última ou única instância refere-se tão somente ao esgotamento da via ordinária. Se
ainda sendo cabíveis recursos pela via ordinária tem-se, então, um obstáculo quanto
à interposição do recurso excepcional.
Corroborando com o mesmo entendimento Tereza Arruda Alvim Wambier
trata do tema, conforme se depreende:
Os recursos extraordinário e especial têm como pressuposto de
cabimento o esgotamento das vias ordinárias. Isto significa que, no direito
brasileiro, não se adotou a possibilidade de recurso pers saltum. Sendo
cabíveis ainda, recursos ordinários eles é que deverão ser interpostos
29
primeiramente, e não diretamente os excepcionais .
Nesse sentido é que se tem o enunciado 281 da súmula do STF, constando
ser inadmissível o Recurso Extraordinário, quando couber, na justiça de origem,
recurso ordinário da decisão impugnada.
Há de se ressaltar quanto à possibilidade de desmembramento da decisão
proferida no tribunal a quo, com previsão no art. 498, do CPC, Tereza Arruda Alvim
Wambier, se manifesta acerca do tema, in verbis:
Tendo sido parcialmente proferida por unanimidade e parcialmente
por maioria, o prazo dos recursos excepcionais não começará a correr
senão quando forem interpostos e julgados os embargos infringentes da
parte do acórdão em que não houve unanimidade, se preenchidos os
30
demais pressupostos ”.
29
30
WAMBIER, 2008, p. 270.
WAMBIER, 2008, p.274.
25
Nesse contexto, se não foi interposto o referido recurso dentro do prazo legal,
estará acobertada pela coisa julgada material “quanto a essa parcela da decisão 31”,
pois ainda havia possibilidade de se rediscutir na instância ordinária, não fosse
assim, é como se existisse recurso per saltum, no direito brasileiro, o que não é
possível.
Vale ressaltar quanto a sua excepcionalidade como recurso, pois a esse, cujo
endereçamento se dá a Corte Constitucional, não cabe à análise de fatos. “Esses
meios de impugnação têm natureza excepcional, pois objetivam a primazia do
interesse público em detrimento do interesse direto das partes32”.
Com intuito de mais esclarecimentos Luiz Orione Neto, cita Rodolfo Camargo,
que persegue a mesma afirmativa:
Os recursos excepcionais não sejam vocacionados à mera revisão
da matéria de fato é que a indigitada injustiça daí defluente teria por causa
uma má subsunção do fato a norma, erronia corrigível pelos recursos
comuns; ao passo que o móvel dos recursos extraordinário e especial se
restringe a adequação do julgado recorrido aos parâmetros constitucionais
ou do direito federal, respectivamente, portanto remanescendo no plano do
33
direito estrito .
Dessa forma, o recurso Extraordinário não pode ser interposto como mero
interesse de revisão da matéria de fato já analisada na instância ordinária, pois aí se
desconhece qualquer questão constitucional a ser analisada.
As hipóteses de cabimento do Recurso Extraordinário iniciam-se pela alínea
“a”, do Art. 102 da Constituição Federal, com os seguintes dizeres, “contrariar
dispositivo desta constituição”. A adversidade deve ser então de forma “direta e
frontal, não cabendo recurso extraordinário, por ofensa indireta ou reflexa34”.
Muitas vezes a verificação de violação direta e frontal dependerá de exame
prévio da legislação infralegal, pois a “violação reflexa e oblíqua da Constituição
31
WAMBIER, 2008, p.274.
2007, apud ORIONE NETO, Luiz. Recursos Cíveis: Teoria geral, Princípios fundamentais, Dos
Recursos em Espécie, Tutela de Urgência no âmbito recursal, Da Ordem nos Processos nos
Tribunais. 3. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.439.
33
Idem, ibidem , p.448.
34
DIDIER, 2008, p. 308.
32
26
Federal decorrente da necessidade de análise de malferimento de dispositivo
infraconstitucional torna inadmissível o recurso extraordinário35”. Nesse sentido: RE
596.682, Rel.Min. Carlos Britto, Dje de 21/10/10, e AI 808.361, Rel. Min. Marco
Aurélio, Dje de 08/09/10.
A ponderação levantada por Fredie Didier Jr. é de muita relevância, pois se
há confronto quanto à interpretação de norma infralegal, o caminho a ser perseguido
certamente não será interposição do Recurso extraordinário, mas sim, Recurso
Especial para o Superior Tribunal de Justiça. É o que diz o enunciado 636 da súmula
do Supremo Tribunal Federal, com o seguinte teor:
Não cabe recurso extraordinário por contrariedade ao princípio
constitucional da legalidade, quando a sua verificação pressupunha rever
interpretação dada pelas normas infraconstitucionais pela decisão recorrida.
Quanto a sua segunda hipótese de cabimento elencada na alínea “b”, do
inciso III, do art.102 da CF, fala-se em declaração de inconstitucionalidade, “de
tratado ou lei federal à luz da constituição”, nesse contexto, decretada a
inconstitucionalidade de tratado ou lei federal, cabe recurso extraordinário ao STF.
À Corte constitucional cabe a guarda da constituição tendo ela função de
rever se a norma declarada inconstitucional possui realmente tal vício. Essa
segunda hipótese é ausente de prequestionamento; necessita-se, porém, da
proclamação do tribunal recorrido decretando a inconstitucionalidade de uma lei ou
de um tratado.
Com fulcro na alínea “c” do inciso III, do art. 102 da CF, caberá recurso
extraordinário, quando a decisão altercada “julgar válida lei ou ato de governo local
contestado em face da Constituição36”.
35
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO
772.813 GOIÁS, Primeira Turma, Brasília, DF, 9 de outubro de 2012. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2905191>.Acesso em: 27 out.
2012.
36
BRASIL Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União. Brasília, 5
de outubro de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 27 out. 2012.
27
No caso em comento a decisão atacada sobrepõe legislação ou ato local em
face da Constituição Federal. É comum em situações como esta, em que a parte
tenha alegado inconstitucionalidade da referida norma e o tribunal não tenha
acolhido, apreciando favoravelmente a aplicação da referida norma.
O cabimento com base na alínea “d” do inciso III, do art. 102 da CF, assim
lecionou: “julgar válida lei local contestada em face de lei federal”. Como não há
hierarquia entre lei local e lei estadual, a controvérsia que poderá surgir estará
relacionada tão somente quanto à competência legislativa atribuída aos entes
federados por meio da própria Carta Constitucional.
1.6 HISTÓRICO
O recurso extraordinário tem suas raízes ligadas ao direito norte-americano,
no “judiciary Act 24.09.1789, que organizou a justiça da União e estabeleceu, na
competência recursal da Suprema Corte, poder de revisão das sentenças finais da
justiça estadual (com exceção de recursos contra decisões de autoridades
judiciárias inferiores.)37”.
Gilmar Ferreira Mendes menciona alguns aspectos marcantes no que se
refere ao recurso extraordinário, conforme se pode conferir:
Esse recurso instruído incialmente, por meio do Decreto n. 848, de
1890, e introduzido na ordem constitucional republicana, por inspiração no
writ of error do direito norte-americano, cujo pedido consistia em revisão
38
ampla das decisões de tribunais inferiores pela Suprema Corte americana.
Todavia, apesar de encontrar o seu histórico ligado ao direito norteamericano, o referido recurso quando inserido no direito pátrio sofreu algumas
modificações, “teria ficado, a princípio mais parecido com agravo ordinário ou
37
CASTRO Filho, 2007. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/16074>.Acesso
em 31 ago. 2012.
38
MENDES, Gilmar Ferreira. Controle de Constitucionalidade. In: MENDES, Gilmar Ferreira;
BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
Cap. 10, p. 1185.
28
suplicação a que se referem às Ordenações Filipinas (Capítulo 3, Título 84), ou com
a velha revista da tradição lusa39”.
A constituição de 1824 encontra resquícios do atual Recurso Extraordinário,
que à época era conhecido como Recurso Inominado, alterou também a
nomenclatura atribuída a Suprema Corte na época, que logo após passou-se a
Supremo Tribunal Federal.
Em seguida, a CF de 1891, trouxe em seu corpo, no tocante a parte dedicada
ao Poder Judiciário art. 59, § 1, in verbis:
Art 59 - Ao Supremo Tribunal Federal compete:
(..)
§ 1º - Das sentenças das Justiças dos Estados, em última instância,
40
haverá recurso para o Supremo Tribunal Federal:
A denominação de Recurso Extraordinário surge mesmo com o advento do
primeiro regimento interno do Supremo Tribunal Federal, de 26 de janeiro de 1891,
tendo sido consagrada, também na constituição de 1934.
A principal função do Supremo Tribunal Federal se constituía na
uniformização do direito federal, e que se conhecia por meio da interposição do
Recurso Extraordinário, essa competência conferida
à suprema corte foi
estabelecida por meio do art. 59, § 1º alínea “a” e “b”, in verbis:
Art. 59 (...)
§ 1º (..)
a) quando se questionar sobre a validade, ou a aplicação de
tratados e leis federais, e a decisão do Tribunal do Estado for contra ela;
b) quando se contestar a validade de leis ou de atos dos Governos
dos Estados em face da Constituição, ou das leis federais, e a decisão do
Tribunal do Estado considerar válidos esses atos, ou essas leis
41
impugnadas .
39
CASTRO Filho, 2007. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/16074>. Acesso
em 31 ago. 2012.
40
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União. Brasília, 5
de
outubro
de
1988.
Disponível
em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 18 out. 2012.
41
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União. Brasília, 5
de
outubro
de
1988.
Disponível
em:<
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 18 out. 2012.
29
O constituinte de 1988 criou o Superior Tribunal de Justiça, este por sua vez
com função única para uniformizar normas de direito federal infraconstitucional, “que
teria uma função eminente como instância federal sobre matéria que não tivesse
como especificidade, natureza constitucional42”.
Essa alteração trouxe mudanças drásticas no que concerne a finalidade do
Recurso Extraordinário, ficando este para tratar de questões sob o fundamento
exclusivamente constitucional.
As modificações ocorridas então possuíam íntima ligação com a nova
característica atribuída ao Supremo Tribunal Federal, ou seja, guardião da
constituição. Gilmar Ferreira Mendes corrobora como o mesmo entendimento:
Um dos objetivos da Constituição ao criar o Superior Tribunal de
Justiça foi o de conferir feição de Corte Constitucional, semelhante às cortes
europeias, ao Supremo Tribunal Federal. Quando era cabível o apelo
extremo tanto por violação à Constituição como por desrespeito a leis
federais, além de o Supremo ocupar a função de corte revisional, o volume
de processos era tão grande que comprometia a eficiência da prestação
43
jurisdicional .
Não há como negar que o Recurso Extraordinário possui suas raízes no writ
of error, do direito norte-americano, mas com adaptações que tornaram necessárias
ao contexto da legislação pátria na época. Há que se ressaltar também, que as
alterações contidas na constituição de 1988, asseguram ainda mais a feição
constitucional do referido recurso, devendo ser interposto somente em casos de
violação de preceito constitucional.
1.7 REPERCUSSÃO GERAL
A Emenda Constitucional n. 45/2004 trouxe várias alterações na estrutura do
poder judiciário, no tocante ao Recurso Extraordinário, foi acrescentado do § 3º ao
art. 102, que cuida das suas formas de cabimento. A parte então deverá demonstrar
Repercussão Geral da questão debatida para o conhecimento do referido recurso.
42
43
MANCUSO, 2007, p.107.
MENDES, 2012, p. 1185.
30
Com fito de esclarecer ainda mais, vale transcrever o referido parágrafo, in
verbis:
§ 3º No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a
repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos
termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso,
somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus
membros.
Há de se observar que o parágrafo primeiro acrescentado trata-se de norma
constitucional de eficácia contida dependente assim de regulamentação para sua
aplicação, que ocorreu logo em seguida por meio da lei 11.428/ 2006, incluindo os
art.543 A e 543 B ao Código de Processo Civil, conforme se comprova abaixo:
Art. 543-A. O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível,
não conhecerá do recurso extraordinário, quando a questão constitucional
nele versada não oferecer repercussão geral, nos termos deste
artigo. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006).
o
§ 1 Para efeito da repercussão geral, será considerada a
existência, ou não, de questões relevantes do ponto de vista econômico,
político, social ou jurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos da
causa. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006).
o
§ 2 O recorrente deverá demonstrar, em preliminar do recurso,
para apreciação exclusiva do Supremo Tribunal Federal, a existência da
repercussão geral. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006).
o
§ 3 Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar
decisão contrária a súmula ou jurisprudência dominante do
Tribunal. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006).
o
§ 4 Se a Turma decidir pela existência da repercussão geral por,
no mínimo, 4 (quatro) votos, ficará dispensada a remessa do recurso ao
Plenário. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006).
o
§ 5 Negada a existência da repercussão geral, a decisão valerá
para todos os recursos sobre matéria idêntica, que serão indeferidos
liminarmente, salvo revisão da tese, tudo nos termos do Regimento Interno
do Supremo Tribunal Federal. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006).
o
§ 6 O Relator poderá admitir, na análise da repercussão geral, a
manifestação de terceiros, subscrita por procurador habilitado, nos termos
do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. (Incluído pela Lei nº
11.418, de 2006).
o
§ 7 A Súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de
ata, que será publicada no Diário Oficial e valerá como acórdão. (Incluído
pela Lei nº 11.418, de 2006).
Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com
fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será
processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal,
observado o disposto neste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006).
o
§ 1 Caberá ao Tribunal de origem selecionar um ou mais recursos
representativos da controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal
Federal, sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo da
Corte. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006).
o
§ 2 Negada a existência de repercussão geral, os recursos
sobrestados considerar-se-ão automaticamente não admitidos. (Incluído
pela Lei nº 11.418, de 2006).
31
o
§ 3 Julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos
sobrestados serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou
Turmas Recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratarse. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006).
o
§ 4 Mantida a decisão e admitido o recurso, poderá o Supremo
Tribunal Federal, nos termos do Regimento Interno, cassar ou reformar,
liminarmente, o acórdão contrário à orientação firmada. (Incluído pela Lei nº
11.418, de 2006).
o
§ 5 O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal disporá
sobre as atribuições dos Ministros, das Turmas e de outros órgãos, na
análise da repercussão geral. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006).
O § 1º do art. 543 - A estabelece que para a demonstração da “repercussão
geral será considerada a existência, ou não, de questões relevantes do ponto de
vista econômico, político, social ou jurídico”, como se pode notar, não houve uma
individualização quanto às hipóteses de se encontrar repercussão geral, atribui-se
terminologias amplas, devendo seu sentido ser esculpido pelo Supremo Tribunal
Federal.
No § 2º do art. 543 A, a parte deverá demonstrar repercussão geral da
questão debatida, ou seja, apresentará transcendência da causa ao caso concreto,
deve restar provado que a causa ultrapassa o interesses subjetivos inter partes,
adentrando, portanto no interesse geral.
A repercussão geral, conforme § 4º do art. 543 A, deverá ser demonstrada
pelo recorrente quanto às questões constitucionais discutidas, para que assim o
tribunal examine a admissão do recurso, podendo ser recusada com manifestação
de dois terços de seus membros.
A ausência então da demonstração de Repercussão Geral, gera a sua
inadmissão, isto é o que diz o art. 327 do Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal, in verbis:
A Presidência do Tribunal recusará recursos que não apresentem
preliminar formal e fundamentada de repercussão geral, bem como aqueles
cuja matéria carecer de repercussão geral, segundo o precedente do
tribunal, salvo se a tese tiver sido revista ou estiver em procedimento de
revisão.
No que tange ao efeito do acórdão que não conhece da repercussão a
decisão e irrecorrível com fulcro no § 5º do art. 543 A será ele erga omnes, em
32
consequência disso, todos os recursos que versarem sobre a mesma matéria
questionada em sede de Recurso Extraordinário serão atingidos pela referida
decisão.
No que se refere à multiplicidade de recursos com idêntica controvérsia em
sede de Recurso Extraordinário apresentada pelo caput do 543 B, do CPC, torna-se
necessário fazer algumas ponderações.
Quando ocorrer, então, situações idênticas às apresentadas acima, os
Recursos Extraordinários serão julgados nos termos do regimento interno do
Supremo Tribunal Federal, e mais, ficarão os “presidentes ou vice – presidentes44”
tribunais de origem incumbidos de eleger um ou mais recursos, encaminhando - os
ao Supremo Tribunal Federal sobrestando os demais.
Dessa forma, depois de julgado o paradigma, os recursos sobrestados serão
julgados seguindo então a orientação dada pela suprema corte. Caso ocorra
negativa de repercussão geral, serão liminarmente indeferidos os recursos
sobrestados que versem sobre matéria idêntica.
Quanto ao julgamento daqueles que se encontram sobrestados, se fundar na
negativa de repercussão, caberá agravo, com fulcro no art. 544, do Código de
Processo Civil, como forma de eliminar aplicação incompatível com o caso concreto,
e também ocorrer a correta aplicação da lei.
No tocante à finalidade da repercussão geral foi apresentada da seguinte
forma:
Delimitar a competência do STF, no julgamento de recursos
extraordinários, às questões constitucionais com relevância social, política,
econômica ou jurídica, que transcendem os interesses subjetivos da causa.
Uniformizar a interpretação constitucional, sem exigir que o STF decida
45
múltiplos casos idênticos sobre a mesma matéria ”.
44
SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos Recursos Cíveis e à Ação Rescisória. 7ª Ed. São
Paulo: Saraiva, 2010. p.707.
45
UNIVERSIDADE CORPORATIVA DA JUSTIÇA FEDERAL DA 1ª REGIÃO. Disponível em <
http://www.ba.trf1.gov.br/Nucre/Seder/cursos/repercussaogeral.pdf> Acesso em: 18 de out.2012.
33
Um marco na questão constitucional, o recurso extraordinário deixa de ter um
enfoque totalmente subjetivista, deixando não mais como protagonistas as partes
alcançando dessa forma uma temática altamente objetivista, para assegurar o direito
constitucional.
Como bem lembra Bernardo Pimentel de Souza em sua obra, “Com efeito,
não há razão para a Corte Suprema tomar conhecimento de Recurso Extraordinário
fundado apenas em interesse pessoal do recorrente, sem relevância para a
Federação ou para os respectivos jurisdicionados em geral46”.
Nesse contexto, por tratar somente de questões subjetivas é que o Recurso
Extraordinário não pode ficar a cabo para a “correção de eventuais desvios na
análise dos fatos, há muito tempo encontra-se arraigado na jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal47”.
Nesse sentido, é o que podemos extrair da súmula 279, da referida Corte,
que, “Para o simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário”.
Há de se observar que a repercussão geral não se trata de uma inovação
constitucional, é só umas das tantas formas já apresentadas para filtragem de
Recursos Extraordinários dirigidos ao Supremo Tribunal Federal, nos tempos de
outrora já se desenvolveram outros mecanismos como arguição de relevância, esse
instituto por sua vez é o que mais se aproxima da Repercussão Geral.
Com a mesma finalidade de filtrar a quantidade de recursos interpostos para o
Supremo Tribunal Federal, para que a referida corte se preocupe tão somente com
questões de relevância constitucional, se torna necessário traçar um paralelo entre
os dois institutos, que na sua essência não são iguais.
Em linhas gerais, a arguição de relevância “apresenta-se como instrumento
de controle pelo STF da interposição, conhecimento e julgamento do recurso
46
47
SOUZA, 2010, p. 699.
ORIONE NETO, 2009, p.448.
34
extraordinário instituído no cenário nacional para fazer frente ao excesso de trabalho
que sobreveio ao STF48”.
A arguição de relevância esteve prevista na Emenda Constitucional n. 1/69, à
constituição de 1967, que por sua vez, trouxe como alterações as normas referentes
à competência do Supremo Tribunal Federal.
Nesse caminho, a apreciação quanto à arguição de relevância ocorria em
sessão secreta, onde a devida procedência era alcançada com o voto de no mínimo
quatro ministros do respectivo tribunal, o voto dispensava qualquer fundamentação.
Bernardo
Pimentel
Souza
assevera
que
a
realização
do
Recurso
Extraordinário se constituía de um juízo positivo, conforme se comprova abaixo:
A realização do julgamento do recurso extraordinário na vigência da
antiga arguição de relevância dependia da existência de um juízo positivo
específico isto é, de reconhecimento da existência de relevância, mediante
prolação de pelo menos quatro votos em prol da relevância da questão
49
veiculada no recurso extraordinário .
Eduardo de Avelar Lamamy, citado por Rodolfo de Camargo Mancuso, após
estudos da argüição de relevância e a repercussão geral, chega a seguinte
conclusão:
A argüição de relevância tinha objetivo de justificar o conhecimento
do recurso extraordinário que não seria admitido segundo as taxativas
hipóteses de cabimento. Por sua vez, a repercussão geral é um instituto que
possui o objetivo de possibilitar o não-conhecimento do mesmo recurso,
caso possa não haver reflexo da referida decisão junto à sociedade. Logo, o
antigo instituto buscava a inclusão, enquanto o atual justifica a exclusão, de
50
feição bastante pragmática: uma alternativa ao congestionamento do STF .
Nesse contexto, pode-se notar que os institutos com a mesma função, qual
seja filtrar a quantidade de recursos interpostos a Suprema Corte, mas com natureza
de seleção totalmente distinta uma da outra, pois a repercussão geral atua de
maneira excludente enquanto a arguição de relevância atua de maneira inclusiva.
48
ANDRIGHI, Fátima Nancy. Argüição de relevância. Brasília, DF, 2000. Disponível em:
<http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/633>.Acesso em: 28 Ago. 2012.
49
SOUZA, 2010. p. 699.
50
MANCUSO, 2010. p. 88.
35
2 PONDERAÇÕES ACERCA DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
Conforme aponta Jorge Miranda, citado por Gilmar Ferreira Mendes,
constitucionalidade e inconstitucionalidade assinalam apreciações de afinidade, ou
seja, “a relação que se estabelece entre uma coisa ---- a Constituição ---- e outra
coisa ---- um comportamento que lhe está ou não conforme, que com ela é
compatível, que cabe ou não no seu sentido51”. Prossegue aduzindo que não se
trata de “uma relação lógica ou intelectiva52”, e sim de “relação de caráter normativo
e valorativo53”.
Nesse contexto, essa afinidade de caráter normativo será responsável para
rotular se uma norma é inconstitucional, e dessa forma, considerar a vinculação de
norma constitucional e por consequência a impotência de ato normativo contraposto.
Acerca dessa temática, afirma o Ministro Gilmar Ferreira Mendes:
Em, verdade, é essa relação de índole normativa que qualifica a
inconstitucionalidade, pois somente assim
logra-se afirmar a
obrigatoriedade do texto constitucional e a ineficácia de todo e qualquer ato
54
normativo contraveniente .
O mesmo autor cita Jorge Mirada que exemplifica o caso em questão:
Não estão em causa --- diz Jorge Miranda ---- simplesmente a
adequação de uma realidade a outra realidade, de um quid a outro quid, ou
a descorrespondência entre este e aquele ato, mas o cumprimento ou não
55
de certa norma jurídica .
Pondera o referido autor que não se pode olvidar o conceito de
inconstitucionalidade e constitucionalidade, a inteligência de acerto ou desacerto
com a Constituição. Neste ponto, importante é a contribuição de Bittar, citado pelo
Ministro já identificado:
Dir-se-á que constitucional será o ato que não incorrer em sanção,
por ter sido criado por autoridade constitucionalmente competente e sob a
forma que a Constituição prescreve para sua perfeita integração;
51
MENDES, 2012, p. 1093.
Idem, ibidem.
53
MENDES, 2012, p.1094.
54
Idem, ibidem.
55
1983 apud MENDES, 2012.p.1094.
52
36
inconstitucional será o ato que incorrer em sanção ---- de nulidade ou de
56
anulabilidade --- por desconformidade com ordenamento constitucional .
Nessa
linha
de
raciocínio,
esclareça-se
que
os
conceitos
de
constitucionalidade ou inconstitucionalidade devem ser compreendidos com uma
abordagem mais ampla, e, portanto, não abarcando somente estar conforme ou
desconforme com o texto constitucional, nas palavras de Gilmar Mendes:
Finalmente, cumpre advertir que os conceitos de constitucionalidade
ou inconstitucionalidade não abrangem tradicionalmente, toda conformidade
ou desconformidade com a Constituição, referindo-se, propriamente, a atos
57
ou omissões dos poderes públicos
Nesse contexto, é de se notar que o controle de constitucionalidade pode ser
visto sob vários aspectos, mas todos se desaguam em um só leito, qual seja, de que
as normas quando questionadas acerca de sua inconstitucionalidade, devem estar
em sintonia com texto constitucional.
2.1 NATUREZA JURÍDICA
“A função social do direito é a disciplina da vida social58”. Nesse contexto,
surge a necessidade de se submeter alguns fatos a normatização, “determinados
fatos humanos e naturais transformando-os em fatos jurídicos59”.
Os fatos jurídicos por sua vez se desenvolvem por meio de “uma
manifestação de vontade60”, são chamados de ato jurídico. É nesse contexto que
estão inseridas as normas jurídicas, atos cujo nascimento decorre de entes que
possuem autorização constitucional, com a incumbência de “criar ou modificar as
situações nela contempladas61”.
56
MENDES, 2012.p.1094.
Idem, ibidem.
58
BARROSO, Luís Roberto. Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. 6ª ed. São
Paulo: Saraiva, 2012. p.34.
59
Idem, ibidem.
60
Idem, ibidem.
61
Idem, ibidem.
57
37
Os atos jurídicos decorrem de uma análise que deve ser auferida em três
planos distintos e que estão intrinsecamente ligados ao tema inconstitucionalidade,
“o de sua existência, o de sua validade e o de sua eficácia62”.
Como já se sabe somente uma parcela dos fatos da vida se tornam
importantes para o Direito. “Apenas alguns deles, pelo fenômeno da juridicização,
passam do mundo dos fatos para o mundo jurídico 63”.
Nesse diapasão, Luís Roberto Barroso enuncia acerca do tema, e assevera
que:
A ausência, deficiência ou insuficiência dos elementos que
constituem pressupostos materiais de incidência da norma impedem
ingresso do ato no mundo jurídico. Será por via de consequência, um ato
inexistente, do qual o Direito só se ocupara para repeli-lo adequadamente,
se necessário. Seria inexistente, por exemplo, uma ‘lei’ que não houvesse
resultado de aprovação da casa legislativa, por ausente a manifestação de
64
vontade apta a fazê-la ingressar no mundo jurídico .
No que concerne ao plano de validade, ocorrendo a existência do ato, será
ele submetido a um segundo momento de apreciação, agora referente à sua
validade, Luís Roberto Barroso enuncia que na próxima etapa de análise do ato,
certifica-se “se os elementos do ato preenchem os atributos, os requisitos que a lei
lhes acostou para que sejam recebidos como atos dotados de perfeição65”. O insigne
autor prossegue aduzindo que:
Se estiverem presentes os elementos: agente, forma e objeto,
suficientes á incidência da lei, o ato será existente. Se, além disso,
estiverem presentes os requisitos competência, forma adequada e licitude –
possibilidade, o ato, que já existe será também válido. A ausência de algum
dos requisitos conduz à invalidade do ato, à qual o ordenamento jurídico,
considerando a maior ou menor gravidade da violação, comina sanções de
66
nulidade e anulabilidade .
A eficácia, por sua vez, “consiste em sua aptidão para a produção de efeitos,
para irradiação das consequências que lhe são próprias. Eficaz é ato idôneo para
atingir a finalidade para a qual foi gerado67”.
62
BARROSO, 2012, p.34.
Idem, ibidem.
64
BARROSO, 2012. p.35.
65
Idem, ibidem.
66
Idem, ibidem.
67
BARROSO, 2012, p.36.
63
38
Nesse diapasão, pode-se notar que a inconstitucionalidade é verificada no
plano de validade da norma. A partir do momento em que se tenha reconhecido a
inconstitucionalidade do ato normativo este é lançado ao plano seguinte que é o da
eficácia, pois conforme assevera Luís Roberto Barroso, “ norma inconstitucional não
deve ser aplicada68”.
Nesse contexto, verificada a inconstitucionalidade da norma há de se verificar
também quais os efeitos que esta decisão poderá causar. Isso depende de qual
modalidade de controle de constitucionalidade é aplicada, se somente terá eficácia
inter partes (controle difuso) ou valerá para todos (controle concentrado).
Dessa forma, as normas infralegais devem estar em total consonância com a
Constituição Federal; em caso negativo, aquelas não poderão ser consideradas
válidas. “E a falta de validade traz como consequência a nulidade ou a
anulabilidade69”.
Consequentemente, quando constatada a inconstitucionalidade de uma
norma, esse ato será considerado nulo de pleno direito. Luís Roberto Barroso
enuncia acerca do tema e afirma que:
A lógica do raciocínio é irrefutável. Se a Constituição é a lei
suprema, admitir a ampliação de uma lei com ela incompatível é violar a sua
supremacia. Se uma lei inconstitucional puder reger dada situação e
produzir efeitos regulares e válidos, isso representaria a negativa de
vigência da Constituição naquele mesmo período, em relação àquela
matéria. Daí por que a inconstitucionalidade deve ser tida como uma forma
de nulidade, conceito que denuncia o vício de origem e a possibilidade de
70
convalidação do ato .
Ad finiendium, a supremacia constitucional revela, portanto, subordinação das
normas infralegais a uma lei maior, o referido autor afirma que “É ela o fundamento
de validade de todas as demais normas71”, pode-se constatar, então, uma
diferenciação hierárquica das normas.
68
BARROSO, 2012, p.36.
Idem, ibidem, p. 37.
70
Idem, ibidem.
71
BARROSO, 2012, p.23.
69
39
2.2 HISTÓRICO
O caso Marbury v.Madison: A doutrina Marshall
A Suprema Corte surge como órgão do judiciário de última instância, porém,
não se concentrava exclusivamente em questões constitucionais, sua delimitação
quanto à matéria nasce a partir de uma evolução secular.
O primeiro degrau para instituição de um modelo constitucional de justiça
nasce a partir de 1803, onde a Suprema Corte Americana, até então presidida pelo
Juiz Jhon Marshall, decidiu o leading case Marbury v.Madison, em que se deflagrou
o primeiro caso de uma lei em confronto com a Constituição Americana.
A partir daí, avaliado o caso concreto pelo magistrado, concluindo-se que a
solução do litígio se daria após invalidação de norma infralegal por estar em total
desacerto com a Constituição, possuía ele o poder para tanto. Nasce então, a
doutrina Marshall, conforme leciona Luiz Guilherme Marinoni:
Foi desenvolvido o raciocínio que deu origem à tese – que passou
ser conhecida como doutrina Marshall – de que todo juiz tem o poder e
dever de negar validade à lei que, mostrando-se indispensável para solução
72
do litígio, afrontar a constituição .
O mesmo autor prossegue com seu raciocínio e afirma que a doutrina
Marshall aponta duas alternativas:
Ou a Constituição é a lei suprema, incapaz de ser modificada
mediante meios ordinários, e desta forma a lei que lhe é contraria não é
uma lei, ou a Constituição está no mesmo nível das leis ordinárias, e, como
73
estas, pode ser modificada quando desejar o legislador .
72
MARINONI, Luiz Guilherme; SARLET, Ingo Wolfgang; MITIDIERO, Daniel. Sistema Constitucional
Brasileiro: Controle de Constitucionalidade. In: SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme;
MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Revista Dos Tribunais, 2012. Cap.
6, p.726.
73
MARINONI, 2012, p.728.
40
Nesse diapasão, enaltece a supremacia da Constituição perante o
ordenamento infralegal, pois assenta Barroso, “todos aqueles que elaboram
constituições escritas encaram-na como a lei fundamental da nação74”.
Corroborando com esse entendimento, Luiz Guilherme Marinoni, afirma que:
O precedente firmado em Marbury v. Madison afirmou a
superioridade da constituição, outorgando – lhe caráter de lei que subordina
todas as outras. A partir daí, demostrou que o judiciário, ao se deparar com
a lei contraria a Constituição, deve deixar de aplicá – la, simplesmente pelas
circunstância (sic) de lhe incumbir interpretar as leis e eliminar os conflitos
75
entre elas .
Não longe disso, apregoava-se também ao poder judiciário como último
interprete da Constituição, indubitavelmente essa era a sua competência, “dizer o
direito, e o sentido de todas as leis76”.
Constata-se que, a partir do leading case, ficara confirmada, então, a força
normativa da Constituição perante a legislação infralegal, quanto ao judiciário foi
atribuída não só a competência de aplicar a lei, mas também a incumbência de
fiscalizá-la e interpretá-la.
74
BARROSO, 2012. p.30.
MARINONI, 2012. p.728.
76
BARROSO, op. cit. p. 30.
75
41
3 CONTROLE DIFUSO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
3.1 CONSTITUIÇÃO IMPERIAL
A Constituição Imperial não trouxe nenhum modelo de controle de
constitucionalidade semelhante ao que se tem nos dias de hoje. Com forte influência
francesa, atribuía ao Legislativo o poder de interpretar, revogar, e também velar pela
guarda da constituição.
O que se tinha na época era uma proteção ao legislador, e quaisquer dúvidas
quanto à aplicação da lei conduzia a uma obrigatoriedade de se recorrer à Comissão
Legislativa.
Ao magistrado competia aplicação da lei, sem a possibilidade de se
manifestar quanto à legalidade da norma; não havia espaço para interpretação,
conforme leciona Luiz Guilherme Marinoni, in verbis:
Basicamente, negava-se poder ao juiz para, aplicando a Lei,
pronunciar mais do que as palavras do seu texto. Nestas condições, não
havia, como é óbvio, qualquer espaço para o controle judicial da
constitucionalidade das leis. Se o juiz não podia interpretar a lei certamente
não tinha como controlar a sua legitimidade. Os princípios que marcaram a
Constituição 1824, como princípio da supremacia da lei ou da nítida e
radical separação dos poderes, ainda não abriram margem ao controle
77
difuso, nem, muito menos, para o controle concentrado .
No mesmo sentindo, leciona Pimenta Bueno, ao afirmar que “o conteúdo da
lei somente poderia ser definido pelo órgão legiferante 78”.
Só o poder que faz a lei é o único competente para declarar por via
de autoridade ou por disposição geral obrigatória o pensamento, o preceito
dela. Só ele e exclusivamente ele é quem tem o direito de interpretar o seu
próprio ato, suas próprias vistas, sua vontade e seus fins. Nenhum outro
poder tem o direito de interpretar de igual modo, já porque nenhuma lei lhe
79
deu essa faculdade, já porque seria absurda a que lhe desse .
77
MARINONI, 2012, p.740.
1978 apud MENDES, 2012, p.1131.
79
MENDES, op. cit. p.1132.
78
42
O ilustre publicista somente reitera o que já foi mencionado acerca do
imperativismo do legislativo. Não se pode olvidar, portanto que na constituição
imperial, não havia qualquer sinal de controle judicial de constitucionalidade.
3.2 CONSTITUIÇÃO DE 1891
Com o advento da Constituição de 1891 não havia mais espaço para o Poder
Moderador, nasce, então, a Federação e República, destacando-se o executivo que
apresentava-se nos moldes do presidencialismo; o legislativo dividido em duas
casas, o Senado e Câmara dos Deputados; e o Judiciário apresentou-se com força,
e com poderes de controlar a constitucionalidade de forma incidental ou difusa.
Conforme adverte Rui Barbosa citado por Luiz Guilherme Marinoni, sobre a
Constituição de 1891, “essa fortemente carregada com as tintas do direito
estadunidense. Assim, não foi por acaso que o controle de constitucionalidade foi
com ela sedimentado, já que a sua semente foi lançada na Constituição Provisória
da República80”.
Sob a influência do direito norte americano, arraigado até então, pelo controle
incidental de constitucionalidade das leis implantado pela famosa doutrina já
debatida Marbury v. Madison, por meio do Decreto n. 848, de 11-10-1890, fora
estabelecido o referido controle, que somente por provocação das partes poderia ser
analisado.
3.3 CONSTITUIÇÃO DE 1934
A primeira notícia que sem tem a respeito do Controle Concentrado de
Constitucionalidade no Brasil nasce na Constituição de 1934, sendo um controle
exercido pelo Supremo Tribunal Federal para sua análise, oportunidade na qual
surge então à representação interventiva.
80
MARINONI, 2012, p.741.
43
Luís Roberto Barroso, com brilhantismo, refere-se ao tema, nos seguintes
termos:
A lei que decretasse a intervenção federal por violação de um dos
princípios constitucionais de observância obrigatória pelos Estadosmembros (os denominados princípios constitucionais sensíveis, constante
no art. 7º da Carta) precisava ser previamente submetida à mais alta corte,
mediante provocação do Procurador Geral da República para que fosse
81
declarada sua constitucionalidade .
Sem dúvida, a constituição de 1934 trouxe valiosas mudanças no que tange
ao controle de constitucionalidade das leis, afirmando Gilmar Ferreira Mendes, que
“talvez a mais fecunda e inovadora alteração introduzida pelo Texto Magno de 1934
se refira à declaração de inconstitucionalidade para evitar a intervenção federal82”.
3.4 CONSTITUIÇÃO DE 1937
A Constituição de 1937, por sua vez, não trouxe alterações de grande
relevância, algumas delas fazem referência à representação para fins de
intervenção, como bem assevera Gilmar Ferreira Mendes:
Confiada ao Procurador Geral da República foi ampliada, como
objetivo de assegurar não só observância dos chamados princípios
sensíveis (art. 10, VII), mas também prover a execução de lei federal
(art.10, VI, 1º parte). A competência para suspender o ato estadual foi
83
transferida para o Presidente da República (art.11,§2º) .
Dessa forma, atribuída mais uma forma de fiscalização para o Procurador
Geral da República, e transferida uma de suas competências ao Presidente da
República, quanto à suspensão de ato estadual, as referidas modificações restaram
assim equilibradas.
3.5 CONSTITUIÇÃO DE 1946
O controle de constitucionalidade a partir da emenda constitucional n.16 de
novembro de 1965 trouxe inovações de grande monta, vigente à época a
Constituição de 1946, e conforme leciona Luís Roberto Barroso, “Passava o
81
BARROSO, 2012, p.86.
MENDES, 2012, p.1135.
83
Idem, ibidem.
82
44
Supremo Tribunal Federal a ter competência para declarar a inconstitucionalidade
de lei ou ato federal84”.
Como bem assevera o insigne autor, “introduzia-se, assim, no direito
brasileiro, mecanismos análogos ao das Cortes Constitucionais europeias85”. Quanto
à forma, ele afirma que seria “um controle por via principal, mediante ação direta, em
fiscalização abstrata e concentrada no Supremo Tribunal Federal86”.
O controle difuso e incidental por sua vez não sofreu qualquer alteração,
convivendo em total harmonia com o controle concentrado.
3.6 CONSTITUIÇÃO DE 1988
No que se refere ao controle de constitucionalidade das leis, a CF de 1988
conservou o sistema misto, ou seja, “combinando o controle por via incidental e
difuso (sistema americano), que vinha desde o início da República com o controle
por via principal e concentrado, implantado com a EC n. 16/65 (sistema continental
europeu) 87”.
Alguns pontos possuem um marco de grande relevância, como a ampliação
do rol de legitimados para propositura da ação por via direta de constitucionalidade,
acrescentado pelo art. 103, § 2º, da CF.
Luís Roberto Barros pontua as alterações de maior relevância, onde se pode
destacar:
Introdução de mecanismos de controle concentrado da
inconstitucionalidade por omissão, como a ação direta com esse objeto
(art.103, § 2º) e o mandado de injunção (art. 5º, LXXI); A recriação da ação
direta de inconstitucionalidade em âmbito estadual, referida como
representação de inconstitucionalidade (art.125, § 2º);
A previsão de um mecanismo de arguição do descumprimento de
preceito fundamental (Art.102, §1º); A limitação do recurso extraordinário às
88
questões constitucionais (art. 102, III) .
84
BARROSO, 2012, p.86.
Idem, ibidem.
86
Idem, ibidem.
87
BARROSO, op. cit. p.87.
88
BARROSO, op. cit. p. 89.
85
45
O ponto de grande importância então trazido pelo constituinte de 1988 referese à extinção do monopólio dado ao Procurador Geral da República para propositura
da ação direta de inconstitucionalidade.
Outro marco de grande importância está relacionado com o advento da Lei n.
9.868 10 de novembro de 1999, criada exclusivamente com ferramentas processuais
destinadas ao controle de constitucionalidade por via direta. A referida legislação
fornece todo o procedimento para propositura da referida ação.
46
4 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE E A JURISDIÇÃO
CONSTITUCIONAL
No que se refere às terminologias jurisdição constitucional e controle de
constitucionalidade estas devem ser observadas com muito cuidado, pois não
possuem o mesmo significado, “trata-se na verdade, de uma relação de gênero e
espécie89”.
Nas palavras de Luís Roberto Barroso, jurisdição Constitucional “designa a
interpretação e aplicação da Constituição por órgãos judiciais90”, função que no
Brasil é desempenhada pelos magistrados e tribunais, atuando o Supremo Tribunal
Federal na condição de protagonista.
Nesse diapasão, a jurisdição constitucional pode se dar em duas situações, a
primeira se refere ao emprego direto da constituição, por meio de circunstâncias
encontradas dentro do seu próprio corpo jurídico. A segunda por sua vez, se refere
a uma aplicação que não se dá de forma frontal, aqui o “intérprete a utiliza como
parâmetro para aferir a validade de uma norma infraconstitucional, (controle de
constitucionalidade) ou para atribuir a ela o melhor sentido em meio de diferentes
possibilidades (Interpretação conforme a constituição)
91
”. Ao final o referido autor
conclui que:
A jurisdição constitucional compreende o poder exercido por juízes
e tribunais na aplicação direta da Constituição, no desempenho do controle
de constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público em geral e na
92
interpretação do ordenamento infraconstitucional conforme a constituição .
Nesse ponto, forçoso concluir que
quando ocorrer o controle de
constitucionalidade de forma indireta estar-se-á diante de “uma das formas de
exercício da jurisdição constitucional93”.
89
BARROSO, 2012, p.25.
BARROSO, op.cit. p.365.
91
Idem, ibidem.
92
Idem, ibidem.
93
BARROSO, op.cit. p.25.
90
47
4.1 CONTROLE DIFUSO
Toda e qualquer ação quando proposta tem como fundamento lei ou ato
normativo, e para que ocorra sua apreciação nada mais coerente do que estar
esses requisitos e outros que lhe caibam, em total harmonia com o texto
constitucional.
Todavia, surgem casos nos quais, a própria norma invocada como
fundamento para a demanda possui vício, exigindo-se do magistrado o
reconhecimento da sua inconstitucionalidade, falando-se, neste caso, em controle
difuso de constitucionalidade.
Assim, proposta a ação, verificando-se no curso do processo que a aplicação
da norma aventada como fundamento está em desconformidade com a constituição,
suscitar-se-á inconstitucionalidade da referida lei.
Vale ressaltar quanto à sua característica maior, trata-se de incidente
processual, que é analisado de forma indireta, uma vez que o que se tem em voga é
a busca da resolução de violação de direito subjetivo.
Dessa forma, a verificação de compatibilização do ato normativo com a
Constituição não está relacionada à matéria de mérito, sendo tratado como questão
prejudicial, motivo pelo qual deve ser julgada antes de se proferir o resultado final
da lide.
O que se tem como raciocínio é que a questão constitucional ventilada no
processo de forma incidental será analisada como questão prejudicial para
resolução da lide.
Luís Roberto Barroso enuncia acerca do tema com muita clareza:
O reconhecimento da inconstitucionalidade da lei não é objeto da
causa, não é a providência postulada. O que a parte pede no processo é o
reconhecimento do seu direito, que, todavia, é afetado pela norma cuja
48
validade se questiona. Para decidir acerca do direito em discussão, o órgão
judicial precisará formar um juízo acerca da constitucionalidade ou não da
norma. Por isso é que se diz que a questão constitucional é uma questão
prejudicial: porque ela precisa ser decidida previamente, como pressuposto
94
lógico e necessário da solução do problema principal .
Com o mesmo entendimento, Luiz Guilherme Marinoni afirma que:
Para chegar a uma conclusão, resolvendo a lide, o juiz pode ter a
necessidade de aplicar determinada norma. Porém, o juiz também pode
depender da constitucionalidade de uma norma para proferir decisão de
natureza processual. Assim, por exemplo, ao se deparar com a norma
processual que trata do julgamento liminar da demanda repetitiva, o juiz
pode considerar a norma inconstitucional, e, assim, negar a possibilidade do
95
julgamento imediato .
O
regramento
básico
para
que
ocorra
o
controle
difuso
de
constitucionalidade, é que exista um conflito de interesses, ou seja, um processo em
andamento, não se podendo falar em questões objetivas, mas sim em subjetivismo,
“O objetivo do pedido não é o ataque à lei, mas a proteção de um direito nela
afastado96”.
Como já se sabe, compete aos órgãos judiciais a realização do controle
difuso de constitucionalidade, incluído nesse rol os juízes de primeiro grau que
também exercem o referido controle. Corroborando com o mesmo entendimento,
Luís Roberto Barroso enuncia que:
Por tratar-se de atribuição inerente ao desempenho normal da
função jurisdicional, qualquer juiz ou tribunal, no ato da realização do Direito
nas situações concretas que lhes são submetidas, tem o poder-dever de
97
deixar de aplicar o ato legislativo conflitante com a Constituição .
Nesse mesmo sentido, o Ministro Sepúlveda Pertence, já se manifestou no
RE 117.805 PR, “no sistema de controle incidente, o juiz de qualquer instância deve
declarar de ofício a inconstitucionalidade de lei aplicável ao caso98”.
94
BARROSO, 2012, p.117.
MARINONI, 2012, p.812.
96
BARROSO, op. cit. p.115.
97
BARROSO, op. cit. p.118.
98
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 117.805-1. Paraná. Relator: Sepúlveda
Pertence. Primeira Turma, Brasília, DF, 27 de agosto de 1993. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=206918>. Acesso em 28 out.
2012.
95
49
Em relação aos tribunais, para que se tome a mesma providência quanto à
declaração de inconstitucionalidade incidenter tantum é necessário que tenha
cumprimento do regramento básico do art. 97 da CF/88, “Somente pelo voto da
maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial
poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do
Poder Público”.
Conforme observa o Ilustre Ministro do Supremo Tribunal Federal Moreira
Alves, no julgado RE 179 179, “ora em se tratando de inconstitucionalidade de
norma jurídica a ser declarada em controle difuso por tribunal, só pode, declara – lá,
em face do disposto do art. 97 a Constituição, o Plenário dele ou seu Órgão
Especial, onde este houver, pelo voto da maioria absoluta dos membros de um ou
de outro, no caso não se observou o dispositivo constitucional99”.
Dessa forma, quando ocorrer o afastamento de uma norma no plano de
aplicação, exercido por órgãos fracionários de Tribunais ordinários, mesmo que tal
manifestação seja implícita, não guarnece de validade ou eficácia.
Não longe disso, quando já analisada a causa pelo tribunal ou órgão
especial, o tribunal fracionário poderá declarar a questão prejudicial de aplicação ou
não de lei em confronto com a constituição; nesse sentido se manifestou o Ilustre
Ministro do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, no AI 413118 AGR / RS,
conforme trecho abaixo reproduzido:
Os órgãos fracionários dos Tribunais podem declarar a
inconstitucionalidade de normas se a matéria já tiver sido apreciada pelo
Supremo Tribunal Federal, ainda que incidentalmente. Inaplicável, no caso,
100
o art. 97 da Constituição. Agravo regimental ao qual se nega provimento .
99
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 179.170 - 5. Ceará. Relator: Moreira
Alves. Primeira Turma, Brasília, DF, 30 de novembro de 1998. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=224299>. Acesso em: 27 out.
2012.
100
______. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento 413.118. Rio
Grande do Sul. Relator: Joaquim Barbosa Segunda Turma, Brasília, DF, 7 de maio de 2010.
Disponível
em:<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=610624>.
Acesso em: 27 out. 2012.
50
De mais a mais, o Supremo Tribunal Federal, com intuito de orientar a
aplicação do art. 97, I, da CF, editou a Súmula Vinculante n. 10, no seguinte
sentido:
Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art. 97), a decisão de
órgão fracionário de Tribunal que, embora não declare expressamente a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua
incidência, no todo ou em parte
101
.
Assim, se já houver manifestação de tribunal ou órgão especial tem-se por
afastada a Súmula vinculante n. 10; de outro lado, se não ocorreu discussão acerca
do tema, haverá necessidade de se observar a regra contida no art. 97, caput, da
CF/88, e também da referida súmula.
De outro norte, vale transcrever o que diz Luiz Guilherme Marinoni a respeito
da declaração de aplicabilidade ou não de lei pelo magistrado por estar em
desconformidade com texto constitucional, de forma que esta se sobreporia ao
poder de decidir, conforme se constata abaixo:
Qualquer caso judicial pode obrigar o juiz de primeiro grau de
jurisdição ou o tribunal, a partir de decisão da maioria absoluta dos
membros do seu Plenário ou Órgão Especial, a deixar de aplicar
determinada norma por considera – la inconstitucional. Deixar de aplicar lei
inconstitucional é inerente ao poder de decidir, ou seja, ao poder
102
jurisdicional .
Assim, nota-se que o Controle exercido de forma incidenter tantum possui a
característica de ser analisado por qualquer órgão judicial, no que se refere aos
Tribunais devem ser respeitados o requisito do art. 97, da CF/88, quanto ao quórum
qualificado, poderá também ser exercido pelo juiz de primeira instância,
entendimento já pacificado pela doutrina e jurisprudência.
101
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula vinculante nº 10. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=10.NUME.%20E%20S.FLSV.&
base=baseSumulasVinculantes>. Acesso em: 27 out. 2012.
102
MARINONI, 2012, p.811.
51
4.2 LEGITIMADOS
Quanto à legitimação para suscitar arguição de inconstitucionalidade, nos
tempos de outrora, só poderia ser alvitrada pelo réu, ao argumento de que estava
desincumbido de cumprir determinação auferida com base em norma com total
desacerto com texto constitucional.
Luís Roberto Barroso se manifesta acerca da questão e pondera que esse
entendimento não permanece mais:
A parte no lugar de atacar o ato diretamente aguardava que
autoridade postulasse judicialmente sua aplicação, pedindo então ao juiz
que não aplicasse a lei reputada inconstitucional. Tal limitação de arguição
de inconstitucionalidade a uma tese de defesa já não subsiste, mas o réu
por certo, continua a poder utilizar o argumento em sua resposta a uma
demanda
A
parte
autora
103
.
também
pode
aventar
a
questão
prejudicial
de
constitucionalidade, ou no momento em que se propôs a ação ou logo após, por
meio da declaração incidental de inconstitucionalidade da norma, para que não se
submeta aos seus efeitos, entendimento consolidado na doutrina de Luís Roberto
Barroso, consoante trecho abaixo reproduzido:
Com a multiplicação das ações constitucionais e dos mecanismos
de tutela preventiva (provimento liminar, medidas cautelares, tutela
antecipada), esta ter – se – á tornado hipótese mais corriqueira. Fazem
parte da rotina forense, por exemplo, mandados de segurança nos quais o
contribuinte procura preventivamente eximir – se do recolhimento do tributo
104
instituído por lei cuja constitucionalidade é questionável .
Ademais, há de se ressaltar que o Parquet também poderá suscitar incidente
de constitucionalidade, exercendo função de custos legis ou parte, “bem como
terceiros
que
tenham
opoente)105”.
103
BARROSO, 2012, p.115.
BARROSO, op. cit. p.114.
105
Idem, ibidem.
104
intervindo
legitimamente
(assistente,
litisconsorte,
52
4.3 PROCEDIMENTO DA DECLARAÇÃO DE INCIDENTE
O procedimento da declaração de inconstitucionalidade incidental tem sua
previsão legal situada nos arts. 480 e 482 do Código de Processo Civil. De acordo
com o raciocínio desenvolvido pelos referidos artigos à arguição está dividida em
duas partes: “a primeira perante o órgão fracionário106”, assim, questionada a
constitucionalidade da lei por qualquer das partes, ministério público ou até mesmo
pelo magistrado, deverá ser submetido a órgão do tribunal competente para o
julgamento do caso. Rejeitada a arguição de inconstitucionalidade, prosseguirá o
processo com seu andamento.
No que se refere à segunda parte, está por sua vez ocorre “perante o pleno
ou órgãos especial107, assim, acolhida a inconstitucionalidade pelo órgão
fracionário, “será lavrado acórdão, a fim, de ser submetida à questão ao tribunal
pleno ou a órgão especial108”, restando tão somente a suspensão do processo até
que seja resolvida a questão prejudicial.
Com o fito de esclarecer, ainda mais, vale transcrever o pensamento de Luís
Roberto Barroso:
Se, todavia, o órgão fracionário acolher a arguição de
inconstitucionalidade ----- isto é, se considerar que a norma indigitada é
inconstitucional ----, lavrará o acórdão nesse sentido e encaminhará a
questão para ser submetida ao tribunal pleno ou órgão fracionário. O
tribunal então deliberará a respeito, observado o quórum de maioria
absoluta para a declaração de inconstitucionalidade (CF, art. 97). Declarada
ou não a inconstitucionalidade, o julgamento será retomado no órgão
fracionário, tendo como premissa lógica a decisão proferida pelo tribunal: se
a norma tiver sido declarada inconstitucional, não será aplicada. Na
109
hipótese contrária, incidirá regularmente sobre o caso concreto .
De outra ponta, se já houver manifestação por parte do Plenário do Supremo
Tribunal Federal acerca da questão arguida, e rejeitada a arguição de
inconstitucionalidade, não poderão os órgãos fracionários dos tribunais submeter
questão já decidida para julgamento em plenário, ou ao órgão especial, até mesmo
quando se tratar de pronunciamento destes últimos.
106
BARROSO, 2012, p.123.
Idem, ibidem.
108
BARROSO, op. cit. p.123.
109
BARROSO, op. cit. p.124.
107
53
4.4 CONTROLE DIFUSO PERANTE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Cabe ao Supremo Tribunal Federal a guarda precípua da Constituição, dessa
forma, é por meio do controle concentrado ou ação direta de constitucionalidade
que o STF como regra exerce “a fiscalização em via principal da constitucionalidade
de lei ou atos normativos federais ou estaduais”110. Não longe disso, e tendo como
premissa maior o que fora manifestado acima, o STF, “a, exemplo, de todos os
demais órgãos judiciais, também realiza o controle incidental e difuso de
constitucionalidade. Poderá fazê-lo em processos de sua competência originária
(art. 102, I, CF), ou no julgamento do Recurso Ordinário (art. 102, II, CF)111”.
A disciplina do incidente de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal
Federal está previsto no regimento interno do respectivo tribunal. A doutrina se
posiciona no sentido de não haver mais a necessidade da análise para solução da
questão
subjetiva,
considera-se
relevante
a
simples
arguição
de
inconstitucionalidade. Gilmar Mendes, afirma que “não mais se enfatiza a
imprescindibilidade do julgamento da questão para a decisão do caso concreto,
afigurando-se suficiente a arguição de inconstitucionalidade112”.
Conforme leciona o art. 176, § 1º do Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal, os processos pelos quais sejam de competência da turma serão julgados
pelo plenário em caso de arguição de inconstitucionalidade, isso também ocorre de
forma a ser manter resguardado o princípio da reserva de plenário, encontrado no
art. 97, caput da Constituição Federal, e insculpido implicitamente no art. 6º, II,
alínea “a” do RISTF.
A apreciação da disciplina exige quórum de no mínimo oito ministros,
“somente podendo ser proclamada a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade
110
BARROSO, 2012.p.126.
Idem, ibidem.
112
MENDES, 2012, p.1182
111
54
do preceito do ato impugnado se, num ou noutro sentido, se tiverem manifestado
seis ministros (RISTF, art. 173, caput, c/c art. 143) 113”.
Se declarado a inconstitucionalidade perante o plenário da Suprema Corte,
“serão comunicados os órgãos interessados, remetendo-se cópia autêntica da
decisão ao Presidente do Senado Federal, para os fins do disposto no art. 52, X, da
Constituição Federal114”. A decisão proferida deverá ser aplicada a todos os casos
que versarem sobre a mesma matéria, submetidos a turma ou ao plenário do
Supremo Tribunal Federal, conforme aponta art. 103 c/c o art. 11, incisos I e II, do
Regimento Interno do respectivo tribunal.
Conforme leciona Gilmar Ferreira Mendes, ficará resguardado o direito de
qualquer ministro em novas demandas a possibilidade de revisão do entendimento
já assentado. Todavia, vale lembrar que após a comunicação da casa legislativa
conforme o art. 52, X, da CF/88, “não mais deverá ocorrer 115”, ainda que aconteça
não terá nenhuma repercussão a referida revisão “após a publicação da resolução
suspensiva pelo Senado Federal116”.
Há de se ressaltar que o Recurso Extraordinário é um dos meios pelo qual o
STF desempenha o controle difuso de constitucionalidade, qual seja, “a fiscalização
concreta de constitucionalidade de leis e atos normativos117”. O referido recurso é
hoje a principal fonte de acesso a Suprema Corte.
O Recurso Extraordinário, conforme aponta Gilmar Ferreira Mendes, é
“instrumento de singular importância no âmbito da jurisdição constitucional
brasileira, tem como finalidade assegurar: a inteireza positiva; a validade; autoridade
a uniformidade da interpretação da constituição118”.
Nesse contexto, é possível a realização de controle incidental de
constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, o procedimento está
113
MENDES, 2012, p.1182
MENDES, op. cit. p.1183.
115
Idem, ibidem.
116
Idem, ibidem.
117
BARROSO, 2012, p.126.
118
MENDES, op. cit. p.1185.
114
55
regulamentado por meio do seu regimento interno e também no Código de
Processo Civil, quanto à chegada do incidente pode se dar por meio de processos
de sua competência originária, todavia, o Recurso Extraordinário possui certa
singularidade para o caso, sendo esse, portanto o meio mais adequado para se
discutir o controle incidenter tantum.
4.5 CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE POR VIA
DE AÇÃO DIRETA
O antecedente histórico da via de ação direta se deságua na Constituição de
1934, com a representação interventiva, “Figurava ela como pressuposto para
decretação de intervenção federal nos Estados – membros, em caso de
inobservância de algum dos denominados princípios constitucionais sensíveis 119”.
O controle concentrado de constitucionalidade tem suas raízes ligadas ao
modelo austríaco, consistindo na atribuição de um único órgão a guarda precípua
da constituição, diferente do que ocorre com o modelo difuso, em que se atribui a
todos os órgãos jurisdicionais a possibilidade de se arguir a inconstitucionalidade de
uma norma.
A singularidade no controle concentrado se dá justamente na questão de não
existir um conflito de interesses (questão subjetiva), mas sim uma manifestação do
tribunal sobre a própria lei.
Corroborando com esse entendimento, vale enaltecer o comentário aduzido
por Luís Roberto Barroso:
Trata – se de um processo objetivo, sem partes, que não se presta
à tutela dos direito subjetivos, de situações jurídicas individuais. No caso
específico da inconstitucionalidade por omissão, a declaração é igualmente
em tese, em pronunciamento no qual se reconhece a inércia ilegítima do
120
órgão encarregado de editar a norma exigida pelo ordenamento .
119
120
BARROSO, 2012, p.179.
BARROSO, op. cit. p.181.
56
O autor em questão também enuncia acerca das possibilidades do controle
concentrado e por quem ele é exercido:
a)
No plano federal, e tendo como paradigma a Constituição da
República, pelo Supremo Tribunal Federal, na ação direta de
constitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, na ação
direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal (art. 102, I, a)
e na ação de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, § 2º);
b)
No plano estadual, e tendo como paradigma a Constituição
do Estado, pelo Tribunal de Justiça, na representação de
inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais
121
(art.125,§ 2º) .
O controle concentrado de constitucionalidade foi introduzido nas normas do
direito brasileiro por meio da emenda constitucional n. 16, de 26 de novembro de
1965; todavia, já se encontravam seus primeiros esboços na constituição de 1946,
“a qual ela se referia como representação122”.
Conforme salienta Luís Roberto Barroso, “Trata – se, no entanto, de
verdadeira ação, no sentido de que os legitimados ativos provocam, direta e
efetivamente, o exercício da jurisdição, constitucional123”.
Temos, portanto, algumas características que são próprias do Controle
Concentrado de Constitucionalidade, mesmo se tratando de questão jurisdicional, o
seu exercício se dá por meio de uma função atípica do referido instituto, pois não há
um conflito de interesse entre as partes a ser reconhecida perante aplicação da lei,
a sua natureza é se manifestar acerca da própria lei.
4.6 LEGITIMADOS
O legitimado passivo da Ação por via direta não se torna difícil deduzir quem
seja, pois conforme afirma Luís Roberto Barroso:
A legitimação passiva, na ação direta de inconstitucionalidade, não
apresenta maior dificuldade: recai sobre os órgãos ou autoridades
121
BARROSO, 2012, p.182.
Idem, ibidem.
123
BARROSO, op. cit. p.183.
122
57
responsáveis pela lei ou ato normativo objeto da ação, aos quais caberá
124
prestar informações ao relator do processo .
No que se refere aos legitimados ativos, ou seja, a quem é atribuído o direito
propor a referida ação, esse sim é assunto de debate, ainda mais porque a
jurisprudência ao fazer interpretação trouxe algumas diferenças entre eles.
Nesse contexto, os legitimados para propor as ações do controle concentrado
encontram-se estancados no art. 103 da Constituição Federal, abaixo transcrito:
Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a
ação declaratória de constitucionalidade: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004)
I - o Presidente da República;
II - a Mesa do Senado Federal;
III - a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do
Distrito Federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
V o Governador de Estado ou do Distrito Federal; (Redação dada
pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
VI - o Procurador-Geral da República;
VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;
IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito
125
nacional.
Conforme já afirmado, a jurisprudência do STF subdividiu em legitimados
Universais, “que são aqueles cujo papel institucional autoriza a defesa da
Constituição em qualquer hipótese126”, e Especiais “que são órgãos e entidades
cuja atuação é restrita a questões que repercutem diretamente sobre a sua esfera
jurídica ou de seus filiados e em relação às quais possam atuar com
representatividade adequada127”.
Nesse contexto, os legitimados ativos para propositura da Ação Por Via Direta
classificados por meio de jurisprudência já cristalizada perante o Supremo Tribunal
Federal, em legitimados universais, quais sejam; o Presidente da República, as
Mesas do Senado e da Câmara, o Procurador Geral da República, Conselho Federal
da Ordem dos Advogados do Brasil e partido político com representação no
124
BARROSO, 2012, p.186.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União. Brasília,
5
de
outubro
de
1988.
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 28-09-2012.
126
BARROSO, op. cit. p.188.
127
Idem, ibidem.
125
58
Congresso Nacional, e legitimados especiais, formados então pelos Governadores
de Estados, a Mesa da Assembléia Legislativa, Confederação Sindical ou Entidade
de Classe de âmbito nacional.
O Presidente da República, conforme art. 66, §§ 4º e 7º da Constituição
Federal, pode se opor às normas que tenham sido promulgadas por meio da
derrocada do seu veto. Não distante disso, há possibilidade de acionar a
inconstitucionalidade de lei, através da ação por via direta, “mesmo quando haja
participado diretamente do processo de elaboração de lei, mediante inciativa ou
sanção128”.
A Mesa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal está, também,
abarcada pela legitimação universal, “podendo questionar os atos normativos
passíveis de controle por via principal, inclusive os seus próprios ou mesmo aqueles
que o Congresso Nacional pudesse sustar por deliberação exclusiva 129”.
Quanto à atuação dos legitimados especiais, sempre terá de se observar
como requisito para propositura da ação por via direta, a pertinência temática entre
a norma que se pretende impugnar e o referido órgão.
Culminado em uma posição severa e restrita por parte do STF, no que se
refere às entidades de classe, varias discussões já foram travadas, o Supremo
Tribunal Federal por sua vez, manteve uma “posição severa e restrita 130”. Conforme
salienta Luís Roberto Barroso, os principais entendimentos do aludido estão
caminhando no seguinte sentido:
Entidade
de
âmbito
nacional:
exigi-se,
para
reconhecimento de seu caráter nacional, que a entidade
possua filiados em pelo menos nove Estados da Federação,
em analogia com a Lei Orgânica dos Partidos Políticos.
128
BARROSO, 2012, p.188.
Idem, ibidem.
130
BARROSO, op. cit. p.191.
129
59
Classe: exigi-se que os filiados da entidade estejam ligados entre si
pelo exercício da mesma atividade econômica ou profissional. Não
preenchem tal exigência os grupos sociais unidos por vínculo de natureza
diversa, como entidades estudantis, ou de promoção dos direitos humanos.
Tampouco associações que reúnam membros pertencentes a categorias
profissionais ou econômicas diversas por ausência de homogeneidade de
interesses. Por outro lado, o STF tem entendido que a entidade postulante
deve apresentar a integralidade da categoria econômica em questão, e não
apenas uma “parcela setorizada” dessa. A exigência deve ser interpretada
com cautela, sob pena de produzir efeito inverso ao que se pretendia obter
privilegiando
entidades
caracterizadas
por
vínculo
associativo
excessivamente genérico e, por isso mesmo, menos aptas a representar de
maneira efetiva os interesses de seus membros.
Composição de entidade: a jurisprudência antes dominante no STF
exigia que a entidade tivesse como membros os próprios integrantes da
classe, sem intermediação de qualquer outro ente que os representasse.
Assim, pelo entendimento anterior do Supremo, não preenchiam tal
exigência as entidades que, congregando pessoas jurídicas, se
apresentassem como “associações de associações”, pelo hibridismo de sua
131
composição social.
Não longe disso, há de falar também do posicionamento da Suprema Corte
quanto à legitimidade ad causam das associações de associações quanto “a
instauração do processo objetivo de fiscalização abstrata de constitucionalidade132".
A questão foi aventada no Agravo Regimental n. 3.153-8, Distrito Federal,
interposto em desfavor de decisão proferida pelo Ministro Celso de Mello, que
denegou seguimento a Ação Direta de Constitucionalidade, proposta pela
Federação Nacional das Associações dos Produtores de Cachaça – FENACA, por
ausência de legitimidade ad causam, ao fundamento de a autora se tratava tão
somente de uma associação de associação.
O Ministro Celso de Mello em seu voto manifestou-se pelo desprovimento do
Agravo interposto, manteve os mesmos fundamentos proferidos na Ação Direta de
Constitucionalidade, de forma diversa se manifestou o Ministro Sepúlveda Pertence,
o qual ponderou:
A entidade é de classe, da classe reunida nas associações. O seu
objetivo é a defesa da mesma categoria social. É o fato de uma
determinada categoria se reunir, por mimetismo, com a organização
federativa do País em associações correspondentes a cada Estado, e essas
131
BARROSO, 2012. p.194.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental na Ação Direta de Inconstitucionalidade
3.153-8. Distrito Federal. Relator: Celso de Mello. Tribunal Pleno, Brasília, DF, 12 de agosto de 2004.
Disponível
em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=363459>.
Acesso em 28 out. 2012.
132
60
associações se reuniram para, por meio de uma entidade nacional,
perseguir o mesmo objetivo institucional de defesa de classe, a meu ver,
133
não descaracteriza a entidade de grau superior como o que ela é .”
Restou, por fim, configurado a legitimidade ativa das “associações de
associações”, para propositura da Ação por Via Direta, por maioria nos termos do
voto divergente supramencionado, acompanhado pelo Ministro Gilmar Mendes,
Joaquim Barbosa e Cezar Peluso.
Não sendo diferente, e como legitimados especiais devem também haver
pertinência temática, “é preciso que haja uma relação lógica entre a questão
versada na lei ou ato normativo a ser impugnado e os objetivos sociais da entidade
requerente134”.
4.7 OBJETO
O que se impugna por meio da ação direta de inconstitucionalidade “são a lei
e o ato normativo federal ou estadual (art. 102, I, a, CF)135”. O entendimento
consolidado na Suprema Corte, possuía um caráter celetista, tomando como
requisito que a norma ora altercada em ação por via direta, “fosse dotada dos
atributos de generalidade abstração136”. Conforme aponta Luís Roberto Barroso:
Isso para excluir a apreciação de atos que, a despeito da roupagem
formal de lei, veiculariam medidas materialmente administrativas, com
objeto determinado e destinatários certos. Era enquadrado nessa categoria,
dispositivo de lei orçamentária que fixa determinada dotação ou ato
legislativo que veicule a doação de um bem público é uma entidade
137
privada .
Todavia, no ano de 2008, a jurisprudência que já se encontrava pacificada
passou por discussões enfrentadas por quase todos os ministros que pertenciam a
133
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental na Ação Direta de Inconstitucionalidade
3.153-8. Distrito Federal. Relator: Celso de Mello. Tribunal Pleno, Brasília, DF, 12 de agosto de 2004.
Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=363459>.
Acesso em: 28 out. 2012.
134
BARROSO, 2012.p.194.
135
BARROSO, op. cit. p.198.
136
Idem, ibidem.
137
Idem, ibidem.
61
Suprema Corte à época, nesse diapasão, Barroso discorre acerca de um
precedente que trouxe o embate:
A hipótese envolvia o controle de medidas provisórias que teriam
aberto créditos extraordinários sem atender aos requisitos de urgência e
imprevisibilidade, instituídos pelo art. 167, § 3º, da Constituição. Por maioria
o tribunal entendeu possível auferir a presença dos referidos requisitos,
destacando que o caráter abstrato da fiscalização realizada em ação direta
diz respeito à existência de uma questão constitucional posta em tese ---desvinculada, portanto, de qualquer caso concreto ----, e não ao conteúdo
138
do ato específico sobre o qual o controle irá recair .
Na esteira desse raciocínio, Luiz Guilherme Marinoni, afirma que:
São passíveis de controle de constitucionalidade lei federais de
qualquer forma ou conteúdo. As leis complementares, as lei ordinárias, as
leis delegadas, as medidas provisórias, os decretos legislativos, as
resoluções das Casas Legislativas, os decretos presidenciais, os
regimentos internos dos Tribunais Superiores, os atos normativos expedidos
por pessoas jurídicas de direito público federal, entre outros, podem ser
139
objeto de ação direta de inconstitucionalidade .
Um ponto de grande relevância no que concerne ao Controle Concentrado de
Constitucionalidade, é que ele só será realizado por atos normativos posteriores a
promulgação da Constituição Federal, dessa forma, não cabe controle abstrato de
constitucionalidade a leis anteriores a constituição vigente.
4.8 PROCESSO E JULGAMENTO DA AÇÃO POR VIA DIRETA
No que se refere ao processo e julgamento da ação por via direta, estes se
encontram na Lei n. 9.868, de 10 de novembro de 2009, antes disso, o
procedimento se encontrava regulamentado pelo Regimento Interno do Supremo
Tribunal Federal e também por meio da Lei n. 4.337, de 1º de junho de 1964,
restando indubitável que houve uma parcela de contribuição da jurisprudência, no
que tange ao processamento da ação em comento.
Conforme dispõe a própria norma, a petição da ação direta de
constitucionalidade deverá ser apresentada em duas vias, e quando houver patrono
138
139
BARROSO, 2012, p.199.
MARINONI, 2012, p.924.
62
nos autos, deverá estar acompanhada por procuração nos autos, “devendo conter
cópias da lei ou do ato normativo impugnado e dos documentos necessários para
comprovar impugnação140”.
Há de se ressaltar que a referida ação não admite desistência. Para evitar o
não
conhecimento
da
referida
ação, é
necessário, descrever de forma
pormenorizada a norma tida como inconstitucional e menção ao preceito
constitucional violado.
O não atendimento a esse requisito de admissibilidade da ação por via direta
poderá acarretar ao não conhecimento da demanda proposta; nesse sentido, já se
manifestou a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, em decisão monocrática
proferida pelo Ministro Eros Grau, na ADIN. 2.561, cujos trechos pertinentes
seguem abaixo reproduzidos:
(....) Da leitura e análise da petição inicial, observa-se que o
requerente não demonstra quais preceitos dos textos normativos estariam
em confronto com a Constituição do Brasil nem os analisa de forma
correlacionada aos artigos constitucionais supostamente violados.9.
Necessário lembrar que a Lei n. 9.868, de 10 de novembro de 1999,
preconiza que a peça inaugural das ações diretas indicará o dispositivo da
lei ou do ato normativo atacado e os fundamentos jurídicos do pedido em
relação a cada uma das impugnações (art.3º).10. Por não observar essa
determinação legal, o requerente deixa de obedecer à técnica
imprescindível ao conhecimento da ação. A inicial não se reveste das
formalidades a ela inerentes. Enseja a declaração da inépcia da peça por
141
faltar-lhe requisitos essenciais (...) .
Há
que
se
ressaltar
também
a
aplicação
do
fenômeno
da
inconstitucionalidade por arrastamento, pelo qual, o Supremo Tribunal Federal
quando julga norma inconstitucional, que possui a característica de fundamentação
de outro dispositivo legal, sem dúvida a esse também será alcançado pelo efeito da
inconstitucionalidade. Corroborando com o mesmo entendimento Luiz Guilherme
Marinoni, afirma que:
O STF utiliza a expressão “arrastamento” para indicar o modo como
dispositivos não expressamente impugnados na petição inicial são
140
MARINONI, 2012, p.1197.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 2561. São Paulo.
Relator: Eros Grau. Segunda Turma, Brasília, DF, 9 de fevereiro de 2012. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1982682>. Acesso em
28 out. 2012.
141
63
declarados inconstitucionais. A inconstitucionalidade por arrastamento
ocorre quando determinada norma, não descrita na inicial, possui conteúdo
análogo a da que foi expressamente impugnada, ou quando a
142
inconstitucionalidade daquela atacada na petição inicial
.
Nesse sentido, vale a pena transcrever trecho do voto proferido pelo ilustre
relator Ricardo Lewandowski, AG.REG. no RE 631.698 Paraná, nos termos
seguintes:
Ressalte-se, ademais, que, segundo a jurisprudência dessa Corte,
na hipótese de determinada norma constituir fundamento de validade para
outro preceito normativo, a inconstitucionalidade daquela implica a
143
invalidade, por arrastamento, desse .
A jurisprudência também se manifesta no sentido de que, se já houve
pronunciamento da norma impugnada, não caberá propositura de ação por via
direta, mesmo que a decisão tenha sido proferida em sede de Recurso
Extraordinário, posição não unânime na Suprema Corte, vencidos no caso em
comento, os Ministros Marco Aurélio, Carlos Britto e Eros Grau, sob o fundamento
de se proporcionar uma discussão mais aprofundada da tese levantada.
Contrário a esse entendimento acompanhando o voto vencedor, o Ministro
Menezes de Direito, afirma ser:
(...)
manifestamente
improcedente
a
ação
direta
de
inconstitucionalidade que verse sobre norma (art. 56 da Lei n. 9430/96) cuja
constitucionalidade foi expressamente declarada pelo Plenário do Supremo
144
Tribunal Federal, mesmo que em Recurso Extraordinário (...) .
Outrossim, vale ressaltar que a ação direta de inconstitucionalidade não
admite desistência conforme art. 5º, da Lei n. 5. 868/99, “arguição de suspeição ou
impedimento --- ressalvando possibilidade de os próprios Ministros afastarem-se do
142
MARINONI, 2012, p.935.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal Agravo Regimental no Recurso Extraordinário. 631.698
Paraná. Relator: Sepúlveda Pertence. Segunda Turma, Brasília, DF, 22 de maio de 2012. Disponível
em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2138254>. Acesso em 28
out. 2012.
144
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.071. Brasília. Relator:
Menezes Direito. Plenário, Brasília, DF, 22 de abril de 2009. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2611967>. Acesso em
28 out. 2012.
143
64
julgamento por questões de foro íntimo ---- nem tampouco intervenção de
terceiros145”.
Entretanto, a própria lei oportuniza a participação no processo, através da
representação de petição ou memorial, de quem não seja parte, mas tenha legítimo
interesse no resultado da ação. Fala-se então, na figura do amicus curiae, também
admitida no controle difuso de constitucionalidade.
Dessa forma, conforme preconiza o art. 7º, § 2º, o relator verificado o grau de
importância da questão debatida, pode, por meio de despacho irrecorrível
possibilitar manifestação de outros órgãos e entidades. Barroso afirma que:
A jurisprudência do STF firmou entendimento de que o pedido de
ingresso poderá ser feito até a remessa dos autos à Mesa para julgamento.
Cuida-se aqui da introdução formal, no ordenamento brasileiro, da figura ao
146
amicus curiae, originária do direito norte-americano .
De todo exposto, é notável as alterações introduzidas no Controle
Concentrado desde sua entrada em vigor no país, relacionadas tanto quanto ao
procedimento, agora regulamentado pela lei n. 9.868/99, implementação do amicus
curiae, fortalecendo ainda o seu procedimento, dando mais legitimidade ao
processamento por meio de representação da social.
145
146
BARROSO, 2012, p.215.
Idem, ibidem.
65
5 EFEITOS DAS DECISÕES DE INCONSTITUCIONALIDADE E DE
CONSTITUCIONALIDADE
Como
já
mencionado,
o
controle
de
constitucionalidade
e
inconstitucionalidade passa pelo crivo judicial, nesse contexto tem-se que as
decisões possuem natureza jurisdicional.
Por estar abarcado pela jurisdição, ocorrerá a produção da coisa julgada, ou
seja, decisão proferida é impossível de ser recorrida, é o que se afirma no art. 467,
do Código de Processo Civil.
Luís Roberto Barroso pondera não estar totalmente correta essa afirmação,
não se observa a coisa julgada como efeito da decisão, “ela é, sim uma especial
qualidade que imuniza os efeitos da decisão, assegurando sua estabilidade147”.
Outro ponto que se torna relevante destacar acerca da coisa julgada, está
relacionada em como elas podem se apresentar. Uma de suas formas será eficácia
preclusiva, esta quando coberta pela coisa julgada material não cabe mais
discussão ou possibilidade de revisão do que já foi decidido.
A segunda se apresenta com eficácia vinculativa, haverá preponderância da
coisa julgada material de qualquer outra questão debatida e que possua uma
ligação subjetiva com a lide solucionada. Um exemplo prático e costumeiro que se
tem, citado por Luís Roberto Barroso, é quando se tem reconhecida paternidade do
indivíduo por meio de uma ação de investigação, e logo após, proposta ação de
alimentos, não pode o magistrado negar-lhe ao fundamento de que existe ausência
de comprovação paterna.
O mesmo autor traz algumas informações acerca da produção dos efeitos
das decisões do controle de constitucionalidade, ele pondera que após a
promulgação da Lei n. 9.868/99, esses, “como sendo em regra, retroativos (ex tunc),
gerais (erga omnes), repristinatórios e vinculados148”.
147
148
BARROSO, 2012, p. 223.
Idem, ibidem.
66
Quanto aos efeitos retroativos, e tendo como parâmetro que o modelo
abstrato de constitucionalidade, que por sua vez possui como espelho o modelo
austríaco criado por Kelsen, quando declarada inconstitucionalidade da norma esta
terá efeitos ex tunc, se o ato é nulo de pleno direito, nunca obteve eficácia no
âmbito jurídico, não se constituiu de validade qualquer ato praticado com base em
seu fundamento.
Assim, como via de regra, lei declarada inconstitucional tem aplicação da
decisão com efeitos retroativos. Vale lembrar que o art. 27 da lei n. 9.869/99, com
resquícios do direito alemão e português como bem afirma Pedro Lenza, “introduziu
a técnica da declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia de nulidade149”.
Não obstante, tendo como primor a estabilidade dos efeitos das decisões
proferidas pelo STF, já se manifestou o Ministro Luis Fux, que “não pode a Corte
fechar os olhos para os efeitos nocivos que a pronúncia de nulidade com efeitos
retroativos pode acarretar para a sociedade150”.
A aplicação literal dos efeitos retroativos leva uma reflexão quanto a suas
consequências, muita vezes poderá causar mais intempéries do que aquelas já
existentes, conclui o
Ilustre Ministro já mencionado que, “É inimaginável a
quantidade de relações jurídicas que foram e ainda são reguladas por esses
diplomas, e que seriam abaladas caso o Judiciário aplique, friamente, a regra da
nulidade retroativa151”.
Atento de que a modulação dos efeitos da ação por via direta possui amparo
legal e também não constitui violação literal a texto da Constituição, Luis Fux, afirma
em seu voto:
149
LENZA, Pedro. Direito Constitucional: Esquematizado. 15. Ed. São Paulo: Saraiva, 2011,p.312.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.029. Brasília. Relator:
Luis Fux. Plenário, Distrito Federal, DF, 8 de março de 2012. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2227089>. Acesso em 28 out.
2012.
151
______. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.029. Brasília. Relator:
Luis Fux. Plenário, Distrito Federal, DF, 8 de março de 2012. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2227089>. Acesso em 28 out.
2012.
150
67
A modulação dos efeitos temporais da declaração de
inconstitucionalidade, primeiramente idealizada no direito norte americano,
com a admissão do prospective overruling nos casos Linkletter v. Walker
(381 U.S. 618) e Stovall v. Denno (388 U. S. 293), não significa uma
afronta à Carta Magna, mas uma defesa da segurança jurídica,
também norma constitucional (art. 5º, caput), sob o prisma do princípio da
152
proporcionalidade .
Dessa forma, o Supremo ao declarar inconstitucionalidade de uma lei ou ato
normativo, levando em consideração o princípio da segurança jurídica ou
excepcional interesse social, poderá por meio de dois terços de seus membros,
restringir os efeitos da decisão ou até mesmo decidir que ela só tenha eficácia a
partir do seu trânsito em julgado.
Conforme leciona o parágrafo único do art. 28 da lei n. 9.868/99, terá eficácia
contra toda a declaração de constitucionalidade ou inconstitucionalidade. A natureza
objetiva do processo instaura essa consequência, “Tais processos ‘sem partes
formais’ somente têm significado se as decisões mais relevantes nelas proferidas
forem dotadas de eficácia contra todos153”.
Luís Roberto Barroso pondera que sua eficácia é contra todos, explica que
causa de tal fenômeno tem por força “da substituição processual154”, conforme se
depreende:
As pessoas e órgãos constantes no art. 103 da constituição
atuam com legitimação extraordinária, agindo em nome próprio, mas
na defesa do interesse da coletividade Por essa razão é que os
efeitos da decisão têm caráter geral, e não apenas entre as partes do
155
processo, como é a regra ”.
A modulação dos efeitos das decisões proferidas em sede de controle
concentrado de constitucionalidade pode ser analisada como um marco para o
direito constitucional brasileiro, apesar de sua aplicabilidade estar ocupando função
152
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.029. Brasília. Relator:
Luis Fux. Plenário, Distrito Federal, DF, 8 de março de 2012. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2227089>. Acesso em 28 out.
2012.
153
______. Supremo Tribunal Federal. Reclamação 935-0. Distrito Federal. Relator: Gilmar Mendes.
Tribunal Pleno,
Distrito
Federal,
DF,
28
de
abril de
2003.
Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=87011>. Acesso em 28 out.
2012.
154
. BARROSO, 2012, p. 231.
155
. Idem, ibidem.
68
excepcional, mesmo porque a teoria adotada no direito pátrio é no sentido de que a
norma quando declarada inconstitucional é nula de pleno direito, afigura-se como
uma forma de se manter a segurança jurídica em determinados atos praticados
quando ainda vigente ato normativo declarado inconstitucional.
5.1 A OBJETIVAÇÃO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
5.1.1 Definição da objetivação do RE, características e exemplos
práticos de sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro.
Conforme já discutido, o chamado controle difuso está relacionado à
possibilidade de qualquer órgão jurisdicional
realizar referido controle de
constitucionalidade das normas.
Nesse contexto, os efeitos atribuídos ao referido controle somente podem
atingir as partes, por tratar-se de questão subjetiva. Como já mencionado, a
verificação da arguição de constitucionalidade surge como questão prejudicial não
fazendo parte de dispositivo da sentença, e por sua vez não faz coisa julgada
material.
Todavia, poderá ocorrer ampliação dos efeitos no controle difuso de
constitucionalidade, como a própria constituição federal assegura com base no
inciso X, do art. 52, segundo o qual, “poderá o Senado Federal suspender a
execução de lei (municipal, estadual o federal), declarada inconstitucional por
decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal156”. Tem-se, portanto, a possibilidade
de se ver ampliada a decisão proferida em sede de controle difuso ultrapassando os
interesses subjetivos da causa.
Entretanto, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal se transforma no
sentido de dar alcance erga omnes aos efeitos das decisões proferidas em sede de
156
VASCONCELOS, Amanda Barreto. Nova amplitude do artigo 52, X, da CF e abstrativização
dos efeitos da declaração incidental de inconstitucionalidade: “Teoria dos motivos
determinantes”. Revista da Esmese, Aracaju, n. 16, p. 251-285, 2012. Disponível em:
<http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/46716>. Acesso em: 9 ma. 2012.
69
recurso extraordinário, no controle difuso, sendo referido instituto conhecido como
objetivação ou abstrativização, nomenclatura atribuída em virtude do fenômeno
possuir características típicas do controle abstrato de constitucionalidade.
Na linha desse raciocínio, Ulisses Schwarz Viana, corrobora com o mesmo
entendimento, aduzindo que essa nova vestimenta do referido recurso surge com a
demonstração de repercussão geral como requisito de admissibilidade do referido
instituto, conforme se depreende:
(....) a repercussão geral implica um passo adiante, no sentido da
objetivação do controle incidental ou difuso de normas no sistema
constitucional brasileiro(....)Essa mudança de paradigma conduz à
superação da ênfase subjetivista, do recurso extraordinário como meio de
157
solução de conflitos intersubjetivos (....) .
Atendendo o mesmo raciocínio, Gilmar Ferreira Mendes, afirma:
Registre-se que a sistemática da repercussão geral faz com que as
decisões proferidas nos processos-paradigmas espraiem seus efeitos para
uma série de demandas sobre igual tema, antes mesmo da conversão do
entendimento em súmula vinculante. É mais uma fase do fenômeno de
158
“objetivação” do recurso extraordinário .
O que se tem, portanto, é a possibilidade de se ver alargados os efeitos de
uma decisão prolatada em declaração de inconstitucionalidade por meio do Recurso
Extraordinário, controle difuso, para outro julgado.
Sobre isso, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou no RE 388.830-7RJ. Nesse interim e conforme assenta Gilmar Ferreira Mendes, o recurso
extraordinário deixa sua marca subjetiva para ampliação da eficácia de suas
decisões, abarcando sua competência de proteção da constituição com caráter
inteiramente objetivo.
De mais a mais, os fundamentos do voto restaram assim consignados, in
verbis:
157
VIANA, Ulisses Schwarz. Repercussão Geral: sob a ótica da teoria dos sistemas de Niklas
Luhmann. 2ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 45.
158
MENDES, 2012, p.1093.
70
A proposta aqui desenvolvida parece consultar a tendência de nãoestrita subjetivação ou de maior objetivação do recurso extraordinário, que
deixa de ter caráter marcadamente subjetivo ou de defesa de interesse das
partes, para assumir, de forma decisiva, a função de defesa da ordem
159
constitucional objetiva .
Não diferente disso, vale transcrever um trecho do voto proferido pelo Ministro
Eros Grau, citando como fundamento, manifestação prolatada na SE n. 5.206-Agr,
conforme se segue:
E a experiência demostra a cada dia, que a tendência dominante
especialmente na pratica deste tribunal é no sentido da crescente
contaminação da pureza dos dogmas do controle difuso pelos princípios
160
reitores do método concentrado .
Nesse diapasão, o parágrafo terceiro do art. 102 da CF/88, acrescentado pela
emenda constitucional 45/2004, distancia a análise individual da matéria, dando
relevância às matérias constitucionais, afirmando ainda mais uma concepção
objetivista do instituto.
O desenrolar do objetivismo no Recurso Extraordinário poderá surgir em dois
momentos onde produzirá efeito vinculante; o primeiro poderá ocorrer na admissão
ou inadmissão do reconhecimento da repercussão geral, logo em fase de
admissibilidade, realidade contemplada pelo § 5º do art. 543 – A do CPC, abaixo
reproduzido:
§ 5º Negada a existência da repercussão geral, a decisão valerá
para todos os recursos sobre a matéria idêntica, que serão indeferidos
liminarmente, salvo revisão da tese, tudo nos termos do Regimento Interno
do Supremo Tribunal Federal.
Ulisses Schwarz Viana assevera que não admitido o referido recurso pela
ausência de repercussão geral da questão debatida, esta decisão valerá para todos
os recursos interpostos acerca da mesma questão, afastando assim o exame da
159
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 388-830-7. Brasília. Relator: Gilmar
Mendes. Segunda Turma, Distrito Federal, DF, 14 de fevereiro de 2006. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=261682>. Acesso em 28 out.
2012.
160
______. Supremo Tribunal Federal. Reclamação 4335. Maranhão. Relator: Gilmar Mendes.
Tribunal
Pleno,
Brasília,
DF,
10
de
novembro
de
2011.
Disponível
em:
<http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoDeslocamento.asp?incidente=2381551>.
Acesso
em 16 out. 2012.
71
Suprema Corte de recurso interposto acerca de matéria idêntica; é o que se pode
extrair em sua manifestação:
Nessa fase, o Supremo Tribunal Federal ao não admitir a existência
de repercussão geral proferirá decisão com efeito vinculante, pois resultará
na inadmissão geral de todos os recursos extraordinários interpostos em
torno da mesma questão agora afastada da apreciação da corte
161
constitucional (...) .
Na segunda hipótese, ultrapassado o juízo de admissibilidade, surge a análise
do mérito recursal, este, por sua vez, regulamentados pelos §§ 3º e 4º do art. 543-B
do CPC, ora reproduzidos:
§ 3ºJulgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos
sobrestados serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou
Turmas Recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se.
§ 4º Mantida a decisão e admitido o recurso, poderá o Supremo
Tribunal Federal, nos termos do Regimento Interno, cassar ou reformar,
liminarmente o acórdão contrário à orientação firmada.
Vale ressaltar que a análise do mérito recursal, valerá para todos os recursos
que se encontram sobrestados, na forma do § 1º, do art. 543-B do Código de
Processo Civil.
Há de se observar que existe uma tendência a vinculação das decisões
proferidas pelo Supremo Tribunal Federal em sede de Recurso Extraordinário,
mesmo que de forma horizontal, isso se deve também não só a jurisprudência deste
Tribunal Constitucional, uma parcela disso ao legislador, quando produz as normas
com essa característica. A objetivação se torna uma tendência perante o direito
brasileiro.
5.2 POSIÇÕES DIVERGENTES E SEUS FUNDAMENTOS
O que se tem entendido, até mesmo pela doutrina, em especial a de Gilmar
Ferreira Mendes, no que se refere à aplicação do referido art. 52, X, da CF/88 está
estritamente relacionado com a declaração de inconstitucionalidade da lei ou ato
normativo.
161
VIANA, 2011, p.48.
72
Mendes pondera que deve ser feita uma “releitura do papel do Senado no
processo do controle de constitucionalidade162”, da concepção do referido instituto,
em 1934, qual seja, aplicação do art. 52, X, da CF, permeava a concepção da
separação dos poderes que já restou vencida. O insigne autor prossegue aduzindo
que:
A amplitude conferida ao controle abstrato de normas e a
possibilidade de que se suspenda, liminarmente, a eficácia das leis ou atos
normativos, com eficácia geral, contribuíram, certamente, para que se
mitigasse a crença na própria justificativa desse instituto, que se inspirava
163
diretamente numa concepção de separação dos poderes .
Afirma o referido autor, que essas mudanças ocorreram, principalmente, a
partir de uma nova releitura acerca do controle abstrato das normas com
promulgação da constituição de 1988, e pondera que:
A constituição de 1988 reduziu o significado do controle de
constitucionalidade incidental ou difuso, ao ampliar, de forma marcante, a
legitimação para propositura da ação direta de inconstitucionalidade
(art.103), permitindo que, praticamente, todas as controvérsias
constitucionais relevantes sejam submetidas ao Supremo Tribunal Federal
164
mediante processo de controle abstrato das normas .
Com mais profundidade, vale a pena transcrever um trecho do voto proferido
pelo ilustre Ministro Eros Grau, na Reclamação 4335, sob a relatoria do Ministro
Gilmar Mendes, conforme se segue:
Passamos na verdade de um texto [pelo qual] compete
privativamente ao Senado Federal suspender a execução, no todo ou em
parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo
Tribunal Federal, a outro texto: Compete privativamente ao Senado Federal
dar publicidade à suspensão da execução, operada pelo Supremo Tribunal
Federal de lei declarada inconstitucional, no todo ou em parte, por decisão
165
definitiva do Supremo .
162
MENDES, 2012, p.1201.
MENDES, op. cit. p.1198.
164
MENDES, op. cit. p.1201.
165
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação 4335. Maranhão. Relator: Gilmar Mendes.
Tribunal
Pleno,
Brasília,
DF,
10
de
novembro
de
2011.
Disponível
em:
<http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoDeslocamento.asp?incidente=2381551>.
Acesso
em 16 out. 2012.
163
73
Fala-se em mutação constitucional, que “tem por objetivo adequar as normas
constitucionais às mudanças sociais significativas, redimensionando a realidade
normativa e conferindo conteúdos ainda não realçados pela interpretação166”.
Com esse novo paradigma, atribui-se ao Senado não a suspensão, mas tão
somente a publicidade de norma declarada inconstitucional pela corte suprema, no
que se refere ao controle difuso de constitucionalidade, ao fundamento de que a
referida decisão já possuirá eficácia erga omnes.
Lenio Luiz Streck, fala acerca do tema e menciona que:
O caminho para a decisão do controle difuso ao do controle
concentrado, que só pode ser feito a partir do que (...) foi denominado de
“mutação constitucional”, que consistiu, na verdade, não a atribuição de
uma (nova) norma a um texto (..), mas, sim a substituição de um texto por
167
outro texto (construído pelo Supremo Tribunal Federal) .
O mesmo autor afirma que seria um fechamento quanto à competência
atribuída ao Senado, ou até mesmo atribuir outra função à casa legislativa,
consoante trecho abaixo reproduzido:
Excluir a competência do Senado Federal – ou conferir-lhe apenas
um caráter de tornar público o entendimento do Supremo Tribunal Federal –
significa reduzir as atribuições do Senado Federal à de secretaria de
divulgação intra-legislativa das decisões do Supremo Tribunal Federal;
significa, por fim, retirar do processo de controle difuso qualquer
possibilidade de chancela dos representantes do povo deste referido
processo, o que não parece ser sequer sugerido pela Constituição da
168
República de 1988 .
Prossegue o insigne autor afirmando que não somente diminui a competência
do Senado Federal, mas também poderá causar grave lesão aos direitos e garantias
fundamentais, no que se refere ao devido processo legal, da ampla defesa e
166
SOUSA, José Péricles Pereira de; DEOCLECIANO, Pedro Rafael Malveira. Mutação
Constitucional por Interpretação: Promoção ou Ameaça aos Direitos Fundamentais? In: MATIAS,
João Luis Nogueira. Neoconstitucionalismo e Direito Fundamentais. São Paulo: Atlas, 2009. Cap.
16, p.259.
167
STRECK, Lenio Luiz; OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de et al. A nova perspectiva do
Supremo Tribunal Federal sobre o controle difuso: mutação constitucional e limites da legitimidade da
jurisdição constitucional. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1498, 8 ago. 2007 . Disponível
em:<http://jus.com.br/revista/texto/10253>. Acesso em: 17 out. 2012.
168
Idem, ibidem.
74
contraditório, ao fundamento de que não houve participação no processo por
aqueles pelos quais as decisões ficaram sobrepostas.
O mesmo autor afirma ainda que a própria Constituição trouxe a diferença
entre os institutos, controle difuso e concentrado; não fosse assim, por óbvio não
forneceria distinção alguma entre eles, nesse sentido ele pontua que:
Se a Constituição – seja na sua versão original, seja naquela que
decorreu das reformas realizadas pelo poder constituinte derivado – elabora
tão preciosa diferenciação entre o controle concentrado e difuso, não há
como se imaginar que os efeitos do controle concentrado sejam extensivos
169
ao controle difuso .
O rol de legitimados evidencia o caráter democrático e também não
demonstra a constrição de direitos fundamentais do devido processo legal, no que
tange ao contraditório e ampla defesa. Lenio aborda a temática aduzindo que:
Se o controle concentrado é exercido pelo Supremo Tribunal, por
outro lado poderá existir, neste controle, a participação da sociedade civil. A
decisão do Supremo Tribunal estará, então, legitimada não somente porque
emanou da corte que possui última instância a complexa responsabilidade
da guarda da Constituição. Principalmente a decisão estatal estará
legitimada por ser o resultado de um processo jurisdicional em que a
170
sociedade poderá vir a ter participação .
Nesse contexto o art. 103 da CF/88 assegura o envolvimento da Sociedade
Civil na guarda da constituição, tanto por meio de representantes como também pela
própria sociedade. Diferentemente do que se propõe no controle difuso, que se inicia
por interesse das partes, como incidente processual.
5.3 PRINCÍPIOS JUSTIFICADORES DO FENÔMENO
Vários são os princípios que podem justificar a vinculação das decisões
proferidas em sede de controle difuso no que se refere ao Recurso Extraordinário
com eficácia erga omnes, entre os quais se destacam a “economia e a celeridade
169
170
STRECK, 2007. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/10253>. Acesso em: 17 out. 2012.
Idem, ibidem.
75
processuais, ou seja, alcançar-se o máximo de eficácia da lei com o mínimo de
atividade judicante, sobrepondo-se à forma a realidade171”.
Como
se
pode perceber quanto
às alterações feitas no Recurso
Extraordinário até os dias de hoje, estas estão intrinsecamente ligadas ao novo
propósito para um judiciário mais célere e republicano, no que se refere à Suprema
Corte enaltecer ainda mais a sua função de guardiã da Constituição, e por
consequência julgar menos causas para tratar de matérias que tenham um grau de
relevância para toda a sociedade.
Com o caminhar em uma visão neoconstitucionalista, o direito brasileiro
afirma a efetivação da duração razoável do processo, assegurando esse direito na
própria Carta Magna. Corroborando o ilustre Ministro Luiz Fux, em seu voto, enuncia
acerca da temática:
A Constituição de 1988 foi o estopim de um marco científico,
consistente na difusão da doutrina neoconstitucionalista no Brasil, cuja
metodologia assume a existência de uma conexão necessária entre direito e
moral. No plano teórico, afasta-se o estatalismo (sic), o legicentrismo e o
formalismo interpretativo na análise do sistema jurídico, e desenvolvem se
mecanismos para a efetividade dos princípios constitucionais que abarcam
172
os valores mais caros à nossa sociedade .
Nesse sentido, a objetivação não se torna vício de inconstitucionalidade, mas
sim uma forma de prestação jurisdicional adequada. Pois “impossível, portanto,
interpretar as normas processuais de modo desfavorável à consecução do acesso à
justiça (art. 5º, XXXV, da Constituição) e desconectada da necessidade de conferir
aplicabilidade às normas de direito material173”.
Quanto à violação de preceito legal do controle concentrado, ligado
principalmente ao rol de legitimados, encontrados em numerus clausus, no art. 103,
171
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 586.693. São Paulo. Relator: Marco
Aurélio.
Plenário,
Brasília,
DF,
25
de
maio.
Disponível
em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=624412>. Acesso em 16 out.
2012.
172
______. Supremo Tribunal Federal. Embargos de Declaração no Habeas Corpus 101-132.
Maranhão. Relator: Luiz Fux. Primeira Turma, Brasília, DF, 24 de abril de 2012. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2025390>. Acesso em 16 out.
2012.
173
Idem, ibidem.
76
da CF/88, não há nenhuma prejudicialidade ao controle objetivo, pois, “a
interpretação constitucional é um direito fundamental que está nas bases da
legitimação democrática: o direito de cidadania174”. Quanto mais efetiva se torna a
participação da sociedade no processo democrático aqui representando pelo
Controle Difuso de Constitucionalidade das leis, mais legítimo se torna esse
processo.
Sob uma perspectiva constitucional, ao analisar o fenômeno da objetivação
não deparam princípios constitucionais conflitantes. Pois, de um mesmo lado se
encontram a manifestação do devido processo legal, qual seja o compromisso com a
prestação judicial correta, e também a segurança jurídica das decisões proferidas.
Este último merece guarita, pois se vários processos que tratam da mesma
matéria chegarem até a instância excepcional, via controle difuso, e houver
contrariedade dos julgados, causaria um colapso e verdadeira insegurança jurídica
no que tange à função única do STF, que é então dar interpretação singular à
Constituição Federal. Logo, a partir da objetivação, constrói a Suprema Corte uma
válvula de segurança.
Outro não é o posicionamento adotado pelo Supremo Tribunal Federal,
consoante se depreende do trecho que se segue extraído do voto do Relator Ary
Franco, que à época pertencente à Suprema Corte, em Recurso Extraordinário n.
32.812 :
Ora, se ao Supremo Tribunal Federal compete, precipuamente, a
guarda da constituição federal, é certo que a sua interpretação do texto
constitucional deve ser acompanhada pelos demais tribunais, em
175
decorrência do efeito definitivo e absoluto da outorga à sua decisão .
No mesmo voto, o ilustre Ministro em questão, pondera quanto à fragilidade
da decisão quando não se encontra em consonância com a Suprema Corte:
174
BARBOSA, Patrícia Januária de Sales Marques; CASTRO, Dayse Starling Lima (Org.). Direito
Público: A Verticalização do Controle Jurisdicional Brasileiro de Constitucionalidade das Leis no
Estado Democrático de Direito. Belo Horizonte: Instituto de Educação Continuada, 2010. p.29.
175
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 32.812. Espirito Santo. Relator: Ary
Franco. Primeira Turma, Brasília, DF, 13 de agosto de 1958. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=133384>. Acesso em 16 out.
2012.
77
Contrariamente, a manutenção de soluções divergentes, em
instâncias inferiores, sobre o mesmo tema, provocaria, além da
desconsideração do próprio conteúdo da decisão desta corte, última
interprete do texto constitucional, uma fragilização da força normativa da
176
CF .
Em sentido aparentemente oposto ou crítico, o Ministro Sepúlveda Pertence,
em voto proferido no Agravo Regimental na Sentença estrangeira 5.206-7, na
Sessão do dia 8 de maio do ano de 1997, afirma:
E a experiência demonstra, a cada dia, que a tendência dominante
– especialmente na prática desse tribunal – é no sentido da crescente
contaminação da pureza dos dogmas do controle difuso pelos princípios
reitores do modo concentrado. Detentor do monopólio do controle direto e,
também, como órgão de cúpula do judiciário, titular da palavra definitiva
sobre a validade das normas no controle incidente, em ambos os papéis, o
Supremo Tribunal há de ter em vista o melhor cumprimento da missão
precípua de “guarda da Constituição” que a lei fundamental explicitamente
177
lhe confiou .
Noutro giro, Pedro Lenza enumera os argumentos que justificam o novo
instituto:
Força normativa da Constituição (...) Princípio da Supremacia da
Constituição e a sua ampliação uniforme a todos os destinatários(...) O STF,
enquanto guardião da constituição e seu interprete máximo (...)dimensão
178
política das decisões do STF .
Entretanto, o referido autor manifesta-se divergente à abstrativização, e traz
como fundamento a escolha de outra via que lhe parece mais adequada, qual seja, a
da súmula vinculante, “(...) o que, em nosso entender, seria muito mais legítimo e
eficaz, além de respeitar a segurança jurídica179”.
Ademais, para ocorrência da edição do referido instituto terão de ser
observados os requisitos constantes do art. 103-A da CF, “como exigência de
reiteradas decisões sobre a matéria constitucional controvertida180”.
176
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 32.812. Espirito Santo. Relator: Ary Franco.
Primeira
Turma,
Brasília,
DF,
13
de
agosto
de
1958.
Disponível
em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=133384>. Acesso em: 16 out. 2012.
177
______. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental na Sentença Estrangeira n. 5.206-7. Reino da
Espanha. Relator: Sepúlveda Pertence. Tribunal Pleno, Brasília, DF, 8 de maio de 1997. Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=345889>. Acesso em: 16 out. 2012.
178
LENZA, 2011, p.259.
Idem, ibidem.
180
Idem, ibidem.
179
78
Prossegue aduzindo que, necessitando de um quorum qualificado de dois
terços a súmula vinculante se torna um instituto mais seguro para a concretização
da “abstrativização”, do que “o quorum normal do controle difuso que é da maioria
absoluta181”.
Pois bem, na verdade não há incoerência alguma quanto à realização do
Controle Difuso de forma abstrata. A própria legislação caminha nesse sentido. Temse como exemplo o art. 481, do Código de Processo Civil, que possibilitou órgãos
jurisdicionais, a dispensa de sujeitar-se a declaração de inconstitucionalidade pelo
Plenário ou ao Órgão Especial quando já existente o pronunciamento do Supremo
Tribunal Federal acerca da matéria. Ratificando tal entendimento, Ulisses Schwarz
Viana, aduz que:
Esse novo instrumento será apto a gerar segurança jurídica pela
uniformização da tese jurídica objetiva em determinado sentido, o que
evitará decisões conflitantes e oscilantes sobre o mesmo tema jurídico que
comportem decisão homogênea, seja relativo ao direito federal (recurso
182
especial) ou à ordem constitucional (recurso extraordinário) .
Não se pode olvidar que o acesso à justiça possui fortes ligações com o
referido instituto, pois, em um país onde sua extensão demográfica se demonstra
tão longínqua, se torna evidente o surgimento de vários conflitos com mesmo
fundamento, e, já firmado o entendimento do “caráter normativo da constituição 183”,
em que se busca a aplicação desta de forma única, não poderá supor que decisões
advindas de um mesmo paradigma tenham soluções diversas.
Por conseguinte, o que se busca com a objetivação do Recurso Extraordinário
é uma maior efetividade das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal.
Com o referido fenômeno, a Suprema Corte intensifica a unificação das suas
decisões, e por consequência apregoa ainda mais a força normativa da Constituição.
Amanda Barreto Vasconcelos trata do tema e assevera que:
181
LENZA, 2011, p.259.
VIANA, Ulisses Schwarz. Inovações no processo civil brasileiro: objetivação, racionalização e
redução dos custos de acesso à jurisdição civil 2011. Revista de informação legislativa, v. 48, n.
190 t.2, p. 293-305, abr./jun. 2011. Disponível em: <http://www2.senado.gov.br/bdsf/item/id/242960>.
Acesso em: 23 out. 2012.
183
VASCONCELOS,
2012,
p.
251-285.
Disponível
em:<
http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/46716>. Acesso em: 9 maio 2012.
182
79
Essa é a razão para a defesa do efeito geral e obrigatório de
submissão
ao
preceito
abstrato
proferido
em
controle
de
constitucionalidade, quer se trate de jurisdição exercida de forma concreta,
quer abstrata. E, em se referindo a efeito geral ou abstrato, há que se referir
a uma necessária uniformidade, ainda que impositiva, de entendimentos,
donde relevante se mostra a análise da vinculação da jurisdição
184
constitucional .
É o que se pode extrair do trecho do voto proferido no Superior Tribunal de
Justiça pelo Ministro Massami Uyeda, ao mencionar acerca da finalidade da
vinculação das decisões proferidas em sede de Recursos Excepcionais:
Conferir racionalidade e celeridade à prestação jurisdicional,
otimizando o julgamento dos múltiplos recursos com fundamento em
idêntica questão de direito, além de amenizar o problema representado pelo
185
excesso de demanda nos Tribunais Superiores .
Destarte, é possível afirmar que legislação brasileira caminha nesse sentido,
como se pode perceber com a emenda constitucional n. 45/2004, acrescentando a
Repercussão Geral como requisito de admissibilidade ao Recurso Extraordinário,
enaltecendo ainda mais o caráter de guardião da Constituição à Suprema Corte.
Sob outro enfoque limita-se também o acesso àqueles que buscam na
utilização do processo, uma forma de “obter a procrastinação no cumprimento de
suas obrigações, gerando custos tanto para outra parte quanto para o próprio
Estado Brasileiro no custeio da máquina administrativa judiciária186”.
Outrossim, busca-se também a desvinculação dos Tribunais Excepcionais,
“como mera duplicação da segunda instância. Os Tribunais Superiores devem se
ocupar de questões realmente relevantes187”. É o mesmo que colocar em evidência
as diretrizes traçadas pela reforma da justiça, atendendo assim ao ditame da
184
VASCONCELOS,
2012,
p.
251-285,
Disponível
em:
<http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/46716>. Acesso em: 9 mai 2012.
185
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186
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187
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80
razoável duração do processo, assim como a celeridade de sua tramitação (art. 5º,
inciso LXXVIII, da CF/88).
Todavia, Não há que se falar em limitação do acesso à justiça, pois o instituto
da objetivação está ligado tão somente a questões de idêntica controvérsia; o seu
objetivo é dar maior efetividade à prestação da tutela jurisdicional e sua aplicação é
respaldada pelos princípios da celeridade e da economia processual. Não existe a
necessidade por parte da Suprema Corte analisar um caso que já passou em suas
mãos com os mesmos argumentos.
Logo, a objetivação do Recurso Extraordinário possui inspiração no princípio
da celeridade da prestação jurisdicional, excluindo alguns casos de submissão à
Corte Constitucional, pois não cabe a essa protagonizar no simples papel de duplo
grau, restando indubitável que os casos levados ao Supremo devem ultrapassar os
limites subjetivos da causa, fenômeno denominado transcendência.
81
CONCLUSÃO
O papel do Supremo Tribunal Federal é hoje sem dúvidas de guardião da
Constituição Federal. É nesse contexto em que se baseiam as teses de que
possuindo esse caráter singular, deve a Corte Constitucional cuidar de questões que
sejam mesmo relevantes para toda sociedade.
O controle difuso de constitucionalidade desenvolveu um papel singular nesse
aspecto. A declaração de inconstitucionalidade no Recurso Extraordinário via
controle difuso, exercido pelo Supremo Tribunal Federal, produzia efeito somente às
partes que interpuseram o referido recurso excepcional.
Dessa forma, nota-se que milhares de Recursos Extraordinários subjetivados,
tratando da mesma temática constitucional corroboraram para o abarrotamento do
Supremo Tribunal Federal, com questões que já foram levadas a julgamento ou que
estão por serem julgadas, direcionando o plenário da Suprema Corte reunir-se para
tratar de questões repetitivas.
O Recurso Extraordinário, na Constituição de 1934, necessitava do Senado
Federal para expedir a suspensão da execução nas decisões proferidas no caso
concreto para que produzissem eficácia erga omnes. Possuía então uma noção de
separação dos poderes. Havia no caso em questão certo receio por parte do
legislativo de sofrer violação de sua competência pelo judiciário.
Nota-se então que a partir da inclusão do controle concentrado ao
ordenamento jurídico brasileiro, o controle difuso perde um pouco de sua posição de
protagonista, ainda mais evidente com a promulgação da Constituição vigente, que
trouxe um rol de legitimação bem maior para o controle por via de ação direta.
Vale lembrar que a Emenda Constitucional 45/2004, trouxe como requisito de
admissibilidade do Recurso Extraordinário a demonstração de Repercussão Geral da
questão controvertida. Deu-se, portanto um perfil mais objetivo ao controle difuso, ao
dotá-lo de efeito vinculante e eficácia erga omnes.
82
A partir de então, a Suprema Corte ao analisar o Recurso Extraordinário
começa examinar e julgar questões constitucionais, com relevância do ponto de vista
econômico, político, social e jurídico que transcendam os interesses subjetivos das
pessoas interessadas.
O fenômeno da objetivação gera estabilidade as decisões proferidas pela
Suprema Corte, garantindo ainda mais a força normativa da constituição, com a
unificação de seus precedentes quando versados sobre a mesma matéria, garantido
mais segurança jurídica ao ordenamento pátrio.
Adquire-se então mais celeridade na tramitação dos Recursos Extraordinários
no Supremo Tribunal Federal.
A releitura dada ao Recurso Extraordinário com fenômeno da objetivação tem
íntimas ligações com novo papel do Supremo Tribunal Federal, não possui também
qualquer vício constitucional, pelo contrário se apresenta nos moldes vários
princípios processuais encontrados na Carta Magna.
83
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Igor Viana Reis - Universidade Católica de Brasília