DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 2 (2009) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS APLICADAS AOS ADOLESCENTES INFRATORES SÃO EFICAZES OU INEFICIENTES? Vívian Martens Oliveira Banks dos Santos (PG- FEMPAR)• [...] Olha aí!/Olha aí! /É o meu guri / E ele chega.../ Chega no morro/ Com o carregamento/ Pulseira, cimento /Relógio, pneu, gravador/ Rezo até ele chegar/ Cá no alto/ Essa onda de assaltos/ Tá um horror [...] (“O meu guri” – Chico Buarque). RESUMO: Enfoca-se aqui um estudo, realizado em 2007-2008, com base em alguns procedimentos de Apuração de Ato Infracional Atribuído a Adolescente, da Vara da Infância e Juventude da Comarca de Marechal Cândido Rondon/PR, acerca das medidas socioeducativas que têm sido aplicadas aos jovens infratores, para averiguar se tais medidas têm alcançado o objetivo esperado pelos Promotores, Juízes e até mesmo pelo que prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e assim demonstrar que tais medidas, talvez, não sejam as soluções dos problemas dos jovens. PALAVRAS-CHAVE: Adolescente infrator. Ato infracional. ECA; medidas socioeducativas. ABSTRACT: It is emphasized here a study conducted in 2007-2008, based on some procedures of Determination of Offenses Assigned to Youth, of the Childhood and Youth at Marechal Cândido Rondon County, PR, concerned to educational actions that have been applied to adolescent offenders, in order to verify whether such actions have achieved the expected goal by the prosecutors, judges and also by what the Status of Children and Adolescents (ECA) presages, and thus, demonstrate that such actions may not be the solutions to the problems of the youth. KEYWORDS: Adolescent offenders. Infraction. ECA; educational actions. 1. INTRODUÇÃO Inicialmente faz-se necessário verificar quem é o adolescente. Quanto à etimologia, a palavra deriva do latim adolescere, significando ‘crescer’ ou ‘crescer até a maturidade’”, e, conforme Rolf Muss (1974), a adolescência seria uma das etapas do desenvolvimento do ser humano, que teria como características alterações físicas, psíquicas e sociais. Ressaltese que os dois últimos aspectos teriam diferentes significados em função da época e da cultura em que estão inseridos. Logo, a adolescência seria um período etário e um processo psicossomático transitório, entre as fases infantil e adulta, estando sujeito às circunstâncias sociais e históricas para a formação do indivíduo. Juridicamente ponderando, adolescente é o jovem entre 12 e 18 anos de idade (usase aqui o vocábulo “jovem”, visto que a terminologia “menor” deixou de ser usada, tendo • advogada DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 2 (2010) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao em vista seu caráter discriminatório). Neste sentido, Liberati (apud ISHIDA, 2006: 2) afirma que tal alteração técnica “visa evitar a rotulação da palavra menor como aquele em ‘situação irregular’, não permitindo a marginalização, a marca, o estigma [...]”. De acordo com ele, ainda: Na concepção técnico-jurídica, “menor” designa aquela pessoa que não atingiu ainda a maioridade, ou seja, 18 anos. A ele não se atribui a imputabilidade penal, nos termos do art. 104 do ECA c/c art. 27 do CP. Se isto não bastasse, a palavra “menor”, com o sentindo dado pelo antigo Código de Menores, era sinônimo de carente, abandonado, delinqüente, infrator, egresso da FEBEM, trombadinha, pivete (LIBERATI, 2006: 17). Realmente criou-se um estereótipo, calcado no vocábulo “menor”, o que pode ser comprovado através de elementos da cultura brasileira, como filmes, letras de canções populares, romances e reportagens jornalísticas. Dentre os filmes sobre o tema, em relevo o grande sucesso dirigido por Hector Babenco, em 1981, Pixote - a lei do mais fraco, baseado no romance-reportagem de José Louzeiro, A infância dos mortos. Trata-se da vida de um garoto com uns 10 anos de idade, que, para sobreviver, torna-se cafetão, traficante de drogas e assassino, além de usar drogas, tendo sido “escolado” nas instituições para os chamados menores infratores da época. Infelizmente, seu intérprete, Fernando Ramos da Silva, na vida real envereda pelo mundo do crime, morrendo assassinado. E é realizado um novo filme: Quem matou Pixote?, por José Joffily, em 1996, tentando explicar os fatos. Do seu primo Felipe Joffily, lançado em 2004, há Ódiquê?, denunciando a ascensão das classes mais altas ao crime: jovens de classe média e classe média alta, que, sem dinheiro e querendo viajar para a Bahia, envolvem-se em sequestro e roubo, transitando na linha fina que delimita a marginalidade e a malandragem. E há que se ressaltar o premiadíssimo Cidade de Deus, filme de Fernando Meirelles, 2002, inspirado no livro homônimo escrito por Paulo Lins. Ele também enfoca a marginalização de crianças e jovens brasileiros (no caso, suburbanos), que se tornam os “barões da droga”, drogando-se, traficando, assassinando e roubando. É a escalada do crime na sociedade brasileira, a passagem da “era da maconha” à “era da cocaína”. São as canções, porém, que melhor retratam e influenciam a sociedade, pois, por serem um recurso midiático barato, a população tem fácil acesso a elas. “Meu guri” (1981, Chico Buarque de Hollanda) é o canto da mãe, humilde e ingênua, moradora do morro, que não vê o filho, adolescente infrator, tornar-se marginal, sempre rezando por ele, pois o mundo está perigoso. Alegra-se, achando que ele “chegou lá”, fez sucesso, quando vê seu retrato no jornal : “[...] Chega estampado,/ Manchete, retrato/ Com venda nos olhos/ legenda e as iniciais [...]”. Do mesmo autor, em parceria com Francis Hime, 1978, é “Pivete”, um pequeno Garrincha, flanelinha de pernas tortas, que “descola uma bereta”, “batalha na sajeta”, e diz ao transeunte, num alto índice de sofisticação carioca e malandra: “Monsieur have money per mangiare?”. Mais recentemente, fazem sucesso certos raps e funks com letras chulas, que incitam ao sexo, ao uso de drogas e à violência, rebaixando a figura feminina. Enfim, verifica-se que o “ser adolescente” é muito complexo, pois além das alterações biológicas e psicológicas que sofrem os jovens neste período, eles têm ainda que passar por vários outros dilemas, encargos, responsabilidades, que, muitas vezes, são DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 2 (2010) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao verdadeiros fardos para a idade, o que podem provocar revolta, transgressão e desafio à autoridade de qualquer tipo. E então, quase no final do século XX, acontece a conquista, no plano sociojurídico, do ECA – Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que, no seu artigo 101, dispõe sobre proteção integral ao adolescente e à criança. O legislador nele instituiu os termos “criança” e “adolescente”, buscando, dessa forma, não permitir a marginalização, o estigma e o trauma (LIBERATI, 2006: 17). Referido artigo assim dispõe: Art. 2º: Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquele entre doze e dezoito anos de idade. Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade (ISHIDA, 2006: 2). Entretanto, polemiza-se bastante, nas rodas jurídicas ou não, quando se fala de jovem infrator e do ECA, muitas vezes discutindo-se estereótipos cristalizados pelo imaginário social. Para a sociedade, o adolescente infrator possui duas faces: a de vítima e a de delinquente juvenil/marginal. Sob o primeiro ângulo, observa-se a realidade de inúmeros jovens como a de alguém vitimizado, com inúmeros problemas: de ordem financeira, de brigas familiares, de ausência de lazer, de falta de acesso à educação, à cultura e à saúde (descaso estatal) e até de violência de ordem sexual. Por outro lado, olha-se para um jovem sem limites, violento, que abusa de tóxicos, irresponsável, marginalizado, e que, provavelmente, irá trilhar sua vida por uma via diversa daquela considerada “correta” pela sociedade. Deste modo, pergunta-se: será o adolescente infrator o real problema na existência em sociedade? Não será esta própria a causadora de dificuldades, inclusive as existentes na vida de tal adolescente? Para responder a tais questões, fez-se uma análise das medidas socioeducativas aplicadas ao adolescente que pratica atos infracionais na cidade de Marechal Cândido Rondon, e considerações acerca de sua eficácia. Quais os tipos de ato infracionais de maior incidência na região? Serão as medidas socioeducativas a solução para os problemas do adolescente infrator? Frente à importância de tais questionamentos, tanto no contexto social quanto no jurídico, ficou justificada, portanto, a escolha do tema. O método de abordagem utilizado foi, por conseguinte, o da pesquisa participante, isto é, baseada na descoberta através de estudo teórico e da investigação com 20 informantes (os adolescentes responderam de forma indireta a questionários e fizeram relatos orais, bem como a análise de 60 Procedimentos de Apuração de Ato Infracional Atribuídos a Adolescentes, do Fórum de Marechal Cândido Rondon-PR). A metodologia de procedimento teve, portanto, como base o levantamento bibliográfico (fontes convencionais), explorando-se a legislação, a doutrina e artigos, e também a busca em acervo digital, além da técnica de pesquisa empírica, pela qual se realizou a coleta de dados, de forma quantitativa, aplicando-se questionário e realizando-se entrevista com os jovens, com destaque à história oral, ou seja, o relato do jovem como fonte de coleta de informações. Confirmou-se, ao final, que a medida socioeducativa aplicada ao adolescente infrator não vem desempenhando o papel que deveria, conforme o previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, que prevê medidas, a priori, de caráter pedagógico para auxiliar tais jovens. Percebe-se que, apesar da aplicação dessas medidas, a incidência de jovens infratores vem aumentando ao invés de diminuir, assim como a reincidência. DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 2 (2010) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao 2. ASPECTOS DA APLICAÇÃO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS Não há como realizar um estudo sobre crianças e adolescentes sem mencionar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Conforme expõe Sabrina Chagas de Almeida (2007), ele “[...] resultou da fusão de duas emendas populares, que levaram ao Congresso cerca de 200 mil assinaturas de crianças e adolescentes” e seguiu o rastro da Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas (ONU), em final de 1989, espécie de carta magna direcionada a crianças de toda parte do mundo, que se tornou o “instrumento de direitos humanos mais aceito na história universal e foi enriquecido por uma série de diretrizes [...]” (CASTELFRANCHI, 2007). Tais diretrizes enriqueceram também o ECA, que adotou a Doutrina Jurídica da “Proteção Integral”, a qual parte do pressuposto de que todos os direitos da criança e do adolescente devem ser reconhecidos. Dentro deste novo quadro, prevaleceu a aplicação de medidas socioeducativas como forma de ‘reeducação’, de caráter pedagógico, procurando minimizar, quando não eliminar a marginalidade crescente no meio infanto-juvenil. Atentese, porém, às palavras de Antônio Chaves (apud D’ANDREA, 2005: 85): [...] Se o menor delinqüente vive numa sociedade profundamente desumana e injusta, é preciso acusar e mudar o modelo econômico e social, concentrador de rendas, estimulador de privilégios e da impunidade dos delitos de colarinho branco, responsável pelo verdadeiro genocídio social perpetrado contra a criança brasileira [...]. Reportagem sobre a violência, na Revista Época (2003, n. 279), aponta que cresceu em 53% o número de internos na Fundação Estadual para o Bem-Estar do Menor (FEBEM), em São Paulo, de dezembro de 2000 a julho de 2003. Entretanto o mais assustador é que nesse período aumentou o número de infratores que cumpriam medida socioeducativa por tentativa de homicídio, homicídio e latrocínio: 85,5%. E o que mais causa espanto é que desse total 20% são adolescentes entre 12 e 15 anos (antes eram 11%). E o mesmo artigo mostra que, no Rio de Janeiro, tanto o assassino como a vítima se parecem: são homens jovens e pobres, que matam no final de semana, usando revólver calibre 38, por motivo fútil, segundo o pesquisador do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj) Glácio Ary Dillon Soares (AZEVEDO; DANTAS, 2008). Informa Wilson D. Liberatti (2006: 90) que “não existe diferença entre os conceitos de ato infracional e crime, pois, de qualquer forma, ambos são condutas contrárias ao Direito, situando-se na categoria de ato ilícito”. O ato infracional é uma “ação condenável, de desrespeito às leis, à ordem pública, aos direitos dos cidadãos ou ao patrimônio, cometido por crianças ou adolescentes” (GIRAS, 2008). Dessa forma, toda infração prevista no Código Penal, na Lei de Contravenção Penal e em Leis Penais esparsas (como por exemplo, a Lei de Tóxico, a de Porte de Arma, entre outras), quando praticada por criança ou adolescente, corresponde a um ato infracional. Para que haja a caracterização de um ato infracional deve-se observar o princípio da legalidade, verificando-se se a conduta é típica, antijurídica e culpável. Quanto ao último DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 2 (2010) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao quesito, importa falar que dele fazem “parte” a exigibilidade de conduta diversa, a reprovabilidade da conduta e a consciência da ilicitude. Fica claro, por conseguinte, que somente haverá um ato infracional se houver figura típica penal que o preveja (SARAIVA, 2002: 31-32). Na doutrina, encontram-se divergências quanto ao fato de a criança e o adolescente cometerem ou não crime. Os seguidores da teoria finalista da ação, que situam dolo e culpa como tipo penal e tem como mentor Wenzel, afirmam que o menor de idade comete sim crime, já que este é um fato típico e antijurídico. Por outro lado, os seguidores da teoria clássica acreditam que o menor de idade não comete crime, recaindo o dolo e a culpa no conceito de culpabilidade e consequente imputabilidade. Conclui-se que o ECA somou as duas teorias para bem conceituar ato infracional, decidindo-se por aplicar a finalista aos adolescentes e a clássica às crianças (D´ANDREA, 2005: 86). Por fim, diversos são os fatores que provocam tais atitudes, consideradas criminosas ou culposas, por parte de crianças e jovens, e o Juiz da 2a Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Recife/PE, Dr. Luiz Carlos Figueiredo (ENTREVISTAS, 2008), traça um expressivo painel a respeito: Muitas são as causas da delinquência juvenil, no País e no mundo. No Brasil, basicamente, as principais causas são as seguintes: a) crise econômica; b) êxodo rural e favelização das periferias das grandes cidades; e) ausência de política de fixação do homem no campo e nas cidades de médio e pequeno porte; d) desemprego; e) aumento do consumo de drogas (em especial maconha e inalantes); f) desajuste familiar; g) cultura do País de que o "menor de 18 anos pode fazer o que quiser que nada lhe acontecerá"; h) divulgação massificada na TV de filmes de violência (incorporando ao cotidiano a imagem das gangues de rua dos Estados Unidos); i) falta de educação, saúde, etc. (políticas sociais básicas) [...] . A falta de políticas públicas voltadas para o jovem desamparado e a estrutura familiar precária é nítida, na sociedade brasileira, na qual pais não acompanham de forma adequada o desenvolvimento dos filhos, deixando muitas vezes à escola a responsabilidade de criação e formação de caráter. Por outro lado, a instituição escolar sente-se de mãos atadas, visto que não pode adotar medidas drásticas em relação ao comportamento dos adolescentes em sala de aula, em virtude das metas impostas pelo Governo (como a não reprovação, ausência de formas de punição/cobrança etc.). Ressalte-se também os fatores econômicos citados pelo Dr. Figueiredo, além da questão da divulgação da violência pelos meios de comunicação, o que leva àquilo que Hannah Harendt chama de “banalização do mal” e que gera mais violência. Vários motivos são assim apontados, quando da prática de ato infracional, mas poucos são os que tentam alcançar o foco do problema, ainda que o artigo 4º do ECA tente proteger a criança e o púbere, assegurando-lhes certos direitos básicos, suplementando o estatuído no art. 227, da Constituição Federal: Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária [...] (ISHIDA, 2006: 6). Na realidade, sabe-se que tal artigo não condiz com a realidade brasileira, tendo em vista que dos direitos supracitados, nem mesmo os básicos como saúde, alimentação e DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 2 (2010) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao educação são garantidos. Vale lembrar que a organização não governamental (ONG) liderada pela médica Zilda Arns tem possibilitado a muitas crianças o direito à vida, através de uma mistura alimentar que combate as carências nutricionais − já que o Estado não o consegue fazer −, mas que ainda assim não atinge a totalidade da população, embora se tenha em mente a continentalidade do país. Também o setor da educação é bastante precário: o exame aplicado mundialmente (PISA) mostrou que os brasileiros estão nos últimos lugares em Matemática e Língua Portuguesa (isso em relação às crianças que frequentam a escola, matriculadas no Ensino Fundamental. E aquelas que estão ausentes das salas de aula?). Quanto ao lazer, muitas crianças e jovens desconhecem a palavra, tanto abstrata como substantivamente, pois trabalham. A convivência em grande parte das famílias não existe, visto a mãe ser a chefe do lar (abandonado pelo pai) e ter que trabalhar desmedidamente para o sustento dos filhos. Percebe-se, portanto, que, por ficar pouco em casa, e chegando esgotada, não consegue orientar e ensinar adequadamente seus filhos, que se sentem abandonados e fragilizados, expostos à “educação da rua”. O ECA dispõe, no artigo 112, sobre as medidas socioeducativas cabíveis aos adolescentes infratores, sendo elas: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, regime de semiliberdade, internação em estabelecimento educacional, e por fim, as medidas de proteção previstas no art. 101, incisos I a VI: encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; orientação, apoio e acompanhamento temporários; matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente; requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; e, finalmente, inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos. Essas medidas são chamadas de medidas socioeducativas porque, explica Juarez de Oliveira, citado por Liberati (2006: 102), são a: [...] manifestação do Estado, em resposta ao ato infracional, praticado por menores de 18 anos, de natureza jurídica impositiva, sancionatória e retributiva, cuja aplicação objetiva inibir a reincidência, desenvolvida com finalidade pedagógica-educativa. Tem caráter impositivo, porque a medida é aplicada independente da vontade do infrator – com exceção daquelas aplicadas em sede de remição (sic), que têm finalidade transacional. Além de impositiva, as medidas socioeducativas têm cunho sancionatório, porque, com sua ação ou omissão, o infrator quebrou a regra de convivência dirigida a todos. E, por fim, ela pode ser considerada uma medida de natureza retributiva, na medida em que é uma resposta do Estado à prática do ato infracional praticado. 3. MARECHAL CÂNDIDO RONDON: A CIDADE FRENTE À PESQUISA Marechal Cândido Rondon, foco da pesquisa, situa-se no extremo oeste do Paraná, região fronteiriça com o Paraguai e o Mato Grosso do Sul, contando, em sua área urbana, com aproximadamente 31.250 habitantes, e na área rural cerca de 9.764, totalizando 41.014 habitantes. Seu IDH é de 0,829 (PNUD/2000), o seu Produto Interno DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 2 (2010) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao Bruto (PIB) é de R$ 603 322 373,00 (IBGE/2003), apresentando-se o PIB per capita com a taxa de R$ 13 911,37 (PREFEITURA, 2008; MARECHAL, 2008). A maioria das pessoas que reside na cidade é de origem européia: 95% descendem de alemães, 3% de italianos e 2% de poloneses, o que é denotado na arquitetura germânica das construções e nas suas festas típicas (WEIRICH, 2004: 123-128). A instalação da Comarca de Marechal ocorreu em 02 de julho de 1970, abrangendo hoje os municípios de Mercedes, Nova Santa Rosa, Quatro Pontes, Entre Rios do Oeste e Pato Bragado. A Comarca contava, na época da pesquisa, com 2 Juízes e 2 Promotores de Justiça. No decorrer da pesquisa realizada na Vara da Infância e Juventude da Comarca, constatou-se que durante o ano de 2007 houve 159 procedimentos de Apuração de Ato Infracional Atribuído a Adolescente e até o dia 06/03/2008, 20 processos já haviam sido autuados. Dos procedimentos do ano de 2007, 27 foram de representação. Quanto à pesquisa, propriamente dita, vários quesitos foram pensados, objetivando traçar o perfil do adolescente infrator da região: a) sexo; b) a faixa etária dos adolescentes; c) a escolarização; d) localidade da residência - bairro e/ou cidade, distrito; e) tipos de contravenção; f ) a reincidência; entre outros. A primeira observação relevante é que 87% dos adolescentes que praticaram atos infracionais eram meninos, sendo o restante, 13%, meninas. A partir de então, outros tipos de dados foram levantados, como o tipo de infrações praticadas na Comarca. Verificou-se que a contravenção de conduzir veículo motor sem habilitação é a mais cometida (15%), e ao se analisarem os procedimentos, notaram-se altos índices deste ato infracional nas vilas, distritos e cidades menores, como Nova Santa Rosa e Pato Bragado. Dos crimes contra o patrimônio, receptação (13%) sobressai, sendo seguida pelo furto qualificado (10%), furto simples (10%) e dano (6%). Insta ressaltar que na cidade de Marechal, por ter sido colonizada principalmente por alemães e por não possuir grandes elevações no relevo, usa-se muito a bicicleta como meio de transporte. Especula-se que existam na cidade cerca de duas bicicletas por habitante e, portanto, acabam os adolescentes, costumeiramente, adquirindo bicicletas furtadas e sem nota fiscal, posto que o furto de bicicletas para revenda ou desmanche e consequente venda avulsa de peças, para aquisição de drogas, também é grande. No âmbito dos crimes contra a pessoa, o de lesões corporais foi o mais relevante, com 10% dos atos praticados. Constatou-se que grande parte dos adolescentes entra em vias de fato durante o período escolar. Eles acabam se desentendendo por futilidades ou rixas de grupo. No que tange às infrações praticadas contra a pessoa, destaca-se a ameaça (6%). Com referência aos atos infracionais praticados por particular contra a administração em geral, destaca-se o desacato, previsto no art. 331, do Código Penal, com 6% de atos praticados. Dos procedimentos apurados, nota-se que o maior número, de todos os funcionários públicos que vieram a ser desacatados por adolescentes, eram Policiais Militares, haja vista que quando do patrulhamento escolar ou revista, os adolescentes costumam insultá-los de “porcos”, entre outros nomes ofensivos. A pesquisa mostrou que a maioria dos adolescentes que praticaram atos infracionais na Comarca contava com 15 anos de idade, ao tempo do fato, e a minoria dos adolescentes contava com 12 anos. Por coincidência ou não, constatou-se que grande parte deles praticou os atos em grupos, de forma associada. Assim, quando analisados os Procedimentos, verificou-se que adolescentes de uma mesma idade andam em ‘bandos’, o que é DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 2 (2010) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao considerado normal para esta fase, contudo, os mesmos (como se juntos se tornassem mais fortes) se unem para praticar pequenos furtos, para ameaçar outros jovens. Chama também a atenção o fato de o maior número de adolescentes infratores não serem os mais velhos (os de 17 anos), mas sim os de 15 anos de idade. O perímetro urbano de Marechal é composto de loteamentos que se estendem pelas principais Avenidas, a Rio Grande do Sul e a Maripá. Nos arredores da cidade, onde antes havia chácaras, hoje existem condomínios, jardins e vários loteamentos. Segundo Udilma Weirich (2004:78), os primeiros núcleos residenciais foram: Jardim Botafogo, Vila Gaúcha, Bairro Flamengo, Frigorífico, Jardim Higienópolis, entre outros, totalizando cerca de 153 blocos residenciais. O município tem ainda parte de seu território subdividido em áreas menores, conhecidas como distritos: Bom Jardim, Margarida, Novo Horizonte, Novo Três Passos, Porto Mendes e São Roque. Verificou-se que a maior parte dos adolescentes infratores, ou seja, 10% moram no Centro e no município de Nova Santa Rosa, sendo que os demais moram em Bairros como São Lucas e Higienópolis. O município de Pato Bragado também é um local, assim como Nova Santa Rosa, em que apesar do número de habitantes ser pequeno, há muitos casos de atos infracionais. No município de Marechal Cândido Rondon, os Bairros São Lucas, Jardim Higienópolis, Jardim Marechal, São Marcos, Vila Gaúcha e Botafogo são considerados locais de certa periculosidade, haja vista que a incidência de crimes por imputáveis, como tráfico de entorpecentes e homicídios, entre outros, costuma se dar nesses bairros, que além de tudo são mais afastados do centro da cidade. Através da coleta de dados, constatou-se que a maioria dos adolescentes infratores da Comarca de Rondon estuda em Colégios Estaduais (57%). Pode-se questionar se os alunos de Colégios Particulares não praticam atos infracionais ou se na realidade são acobertados por seus pais e pelo próprio Colégio, que, para não ver seu nome exposto em veículos de comunicação, prefere “abafar” o caso e resolver tudo com diálogo e advertências. Pode até ser que adolescentes de Colégios Particulares pratiquem tantos atos infracionais quanto os de Escolas Púbicas, no entanto, tais fatos, se existirem, não são judicializados, ou são-nos em minoria. Do total, 24% dos jovens declararam não estar estudando ao tempo da prática do ato infracional, o que levou à aplicação de medida protetiva de frequência em estabelecimento de ensino, conforme o previsto no artigo 101, inciso III, do ECA, por parte do Juiz da Vara da Infância e Juventude. Ainda 15% dos adolescentes fazem o supletivo (CEEBEJA), haja vista que estão em série atrasada, e, a grande maioria, diz ter vergonha de estudar com adolescentes mais novos, sendo um dos fatores gerados pela exclusão social, com certeza, o insucesso dos adolescentes na escola, além da dificuldade que os mesmos encontram para se inserir no mercado de trabalho. Tantas frustrações fazem com que o jovem acabe desde cedo entrando em contato com a criminalidade. Quanto ao ano escolar em que se encontravam, 35% dos adolescentes que responderam ao questionário encontram-se na sexta série; 25% na sétima; 15% na oitava; 15% na primeira série do Ensino Médio; e 10% dos adolescentes haviam estudado apenas até a 4ª série. DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 2 (2010) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao 44% dos adolescentes, isto é, a maioria, estudam, mas preferiam estar trabalhando (para ajudar a família ou ter autonomia); 13% não estudam, só trabalham; 43% gostam de estudar. A maioria dos informantes, 55%, disseram que seus pais eram separados; que viviam com a genitora ou com os avós. E dos 40% que declararam ter uma boa relação com o pai, apenas 2 tinham os pais separados; 35% não conheciam o pai; 15 % conheciam o genitor, mas com ele não mantinham relação; 10% afirmaram que tinham péssima relação com o pai. Dos adolescentes entrevistados, 75% afirmaram ter 4 irmãos ou mais, sendo um percentual preocupante, se levado em conta que grande parte destes adolescentes possui baixa renda familiar. Tal fato indicia a falta de planejamento familiar. Assim, o Estado poderia dar maior atenção a isso e realizar ações mais profundas nesse sentido, não apenas fornecendo meios contraceptivos, mas também esclarecendo a maneira de usá-los. De acordo com dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF (PELISSARI, 2008): “dez milhões de brasileiras, aproximadamente, vivem expostas à gravidez indesejada, seja por uso inadequado de métodos anticoncepcionais ou mesmo por falta de conhecimento e/ou acesso aos mesmos”. Da amostragem pesquisada, 59% dos adolescentes nunca haviam praticado atos infracionais e 41% praticavam-nos pela segunda, terceira, quarta, e até mesmo pela quinta vez. Apesar de a maioria dos adolescentes não ser reincidente, sabe-se que na Comarca existe determinado número de jovens, que, apesar de ter a eles aplicadas medidas sócioeducativas, insistem na prática de infrações. Dos adolescentes reincidentes, praticamente todos já haviam cumprido prestação de serviço à comunidade, sendo que poucos estavam com medidas a cumprir. Isso evidencia que o índice de reincidência entre os adolescentes já praticantes é alto, e que as medidas socioeducativas são, de certa forma, banalizadas por esses adolescentes, que não se importam em “pagar pena”, como eles mesmos falam, ou até mesmo em descumpri-las. Notou-se que os atos de maior gravidade – tráfico ilícito de substância entorpecente, roubo, furto qualificado – são infrações praticadas, na maioria das vezes, por adolescentes reincidentes. Da prática do tráfico de drogas, a maioria dos jovens infratores é proveniente do Estado de São Paulo, no entanto muito jovens da região são iludidos com a idéia de lucro fácil, e aceitam transportar a droga para outros Estados, destacando-se o Rio Grande do Sul. Interessante mostrar que grande parte dos adolescentes que infringem a lei (59% sem antecedentes) acreditam que o seu semelhante (41% reincidentes pela segunda, terceira, quarta e até quinta vez), quando da prática do ato infracional, deveria ser custodiado. . 4. A TÍTULO DE CONCLUSÃO Com o decorrer do tempo, a legislação referente ao tema enfocado passou por grandes transformações, aperfeiçoando-se, e sabe-se que, pelo fato de o jovem ser considerado inimputável e ainda relativamente capaz, terá tratamento diferenciado, como bem prevê o ECA. Deste modo, a ele serão aplicadas as chamadas medidas socioeducativas DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 2 (2010) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao (art. 112), que, para muitos autores e estudiosos da área, tem caráter híbrido, mesclando o caráter pedagógico com o punitivo. Essas medidas precisam ser aplicadas de maneira célere para que haja uma resposta positiva, ou seja, para que pesem de forma efetiva e pedagógica na vida do jovem que irá cumpri-las. Falhas existem: no seio familiar, na escola, na comunidade, na ausência de aparato estatal. O perfil do jovem infrator de Rondon foi traçado: são garotos, entre 15 a 17 anos, estudantes de escolas estaduais, provenientes de família numerosa (com mais de 5 membros) e baixa renda, moradores de bairros em que a criminalidade e a pobreza são mais evidentes, filhos de pais separados (muitas vezes desconhecidos). Vários professores colaboradores indagaram à pesquisadora o motivo por que a mesma estaria levantando dados acerca dos adolescentes, uma vez que sua meta eram as medidas socioeducativas e não os perfis dos jovens em si. Em que pesem essas medidas serem aplicadas aos jovens, acreditou-se que, ao se traçar um breve esboço sobre os mesmos, talvez, fossem alcançadas respostas para alguns dos questionamentos efetuados. Deste modo, conseguiu-se alcançar a hipótese levantada: a de constatar que o jovem infrator do município possui problemas de ordem social e que as medidas socioeducativas, de caráter pedagógico (nos casos de adolescentes reincidentes), não alcançam a raiz do problema: a falta de educação, de lazer, de assistência básica necessária e planejamento familiar. É frustrante trabalhar com a aplicação de medidas que deveriam, em tese, ajudar o adolescente na formação de seu caráter, na melhora de comportamento, na compreensão da palavra cidadania. Segundo os dados obtidos, o índice de não reincidência é maior do que o de reincidência; sabe-se, no entanto, que os adolescentes da região que voltam a praticar atos infracionais são os mesmos, “figuras carimbadas”, brasileirinhos “malandros”, segundo o senso comum, que, ao invés de frequentarem a escola, estão semanalmente na Delegacia, no Fórum, em oitivas, nas audiências, no Conselho Tutelar, e que, na realidade, não cumprem as medidas por não acreditarem nelas. Para grande parte da sociedade, esses jovens infratores são marginais, que deveriam ser banidos para não mais cometerem infrações. Para parte dessa mesma sociedade, adolescentes infratores são jovens marginalizados, vítimas também. O fato não é “passar a mão na cabeça” dos adolescentes infratores, agindo com o coração de grande pai, como se se fizesse vista grossa às “artes” cometidas pelos filhos. O fato é mostrar que os absolutamente capazes − Estado, sociedade, escola e família − precisam assumir as rédeas da situação para evitar que os relativamente capazes tomem atitudes incorretas, segundo as leis. Se adolescentes estão envolvidos com a criminalidade e se as medidas que a eles deveriam servir como re-educadoras não estão sendo eficientes, é porque algo está errado. Os valores da família perderam-se com o passar do tempo; as pessoas não se preocupam mais se os filhos estão fazendo suas tarefas; onde estão quando não se encontram em casa, e quem são seus amigos; não mais os castigam por falta de obediência/respeito. Há um abandono da “função familiar”, muitos pais deixando que a responsabilidade fique sobre os ombros dos educadores, inclusive recorrendo à justiça contra eles, em caso de alguma atitude mais severa, por eles tomada, em relação ao jovem. Por outro lado, a escola, apoiada pelo Estado, não se vê mais motivada a ensinar seus alunos, mas apenas a alcançar altos índices de aprovação e baixos índices de evasão escolar, permitindo que estudantes DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 2 (2010) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao despreparados passem de ano sem sequer saberem fazer um pequeno texto ou cálculos básicos. O Estado, por sua vez, assiste a tudo impassivelmente, deixando que os brasileirinhos “malandros” cada vez mais fixem tal estereótipo de folga e mau-caráter, deixando os bancos escolares, e, em decorrência, afastando-se de um mercado de trabalho globalizado, que exige mais e mais mão de obra altamente qualificada. Por certo, quando algum problema surge na mídia há um clamor alvoroçado, parece que algo vai ser feito para alterar o status quo, mas, logo o caso é esquecido e tudo volta à rotina. Para alguns sociólogos, isso seria resultado de uma sociedade pós-moderna, egoísta e fragmentada, que mais se preocupa com o simulacro do que com o real, com a aparência do que com a essência, consigo do que com o outro. A solução seria a conscientização de todos os setores da sociedade brasileira, infelizmente ainda moldada nos padrões patriarcais, ainda presa aos valores do período colonial, quando o senhor de engenho (óbvio que há exceções) apenas se preocupava com sua família, pouco se importando com os agregados, com o coletivo, explorando de todas as formas seus auxiliares, sem qualquer resquício de compaixão e humanidade, sem ter o que hoje é mais modismo do que outra coisa: a responsabilidade social, o engajamento, a atitude politicamente correta. Algumas possibilidades delineiam-se: creches, escolas e hospitais em suficiente quantidade e bem aparelhados, para atender a toda a população. Profissionais mais capacitados e com remuneração melhor, o que possibilitaria mais lazer e convivência com a família. Enfim, conclui-se que os direitos mais elementares não são garantidos por um Estado omisso, o que expõe o infante e o adolescente a toda sorte de adversidades. Não se pode mais argumentar que as medidas socioeducativas têm apenas caráter pedagógico e educativo. Sem dúvida alguma elas o têm, contudo trazem em si conteúdo punitivo, como reação da sociedade à conduta do adolescente infrator.. Esta circunstância já vinha sendo admitida pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, como bem expressou o Desembargador Yussef Cahali (FERREIRA, 2008): [...] as medidas socioeducativas previstas no ECA também visam a punir o delinqüente, mostrando-lhe a censura da sociedade ao ato infracional que cometeu, e proteger os cidadãos honestos da conduta criminosa daqueles que ainda não são penalmente responsáveis. Da mesma forma que o pai educa o filho, aplicando-lhe medidas punitivas, ou que a escola educa o aluno com medidas disciplinadoras, a sociedade reage à conduta do adolescente infrator, aplicando-lhe as medidas socioeducativas. Nota-se igualmente que a sociedade já trata o adolescente infrator como um criminoso e não mais como um jovem com problemas sociais. Logo, não há como se falar em reeducar adolescentes infratores, formando bons cidadãos, se as causas dos problemas não são alcançadas, se as soluções são superficiais, se reformas estruturais não são feitas, se a mídia pensa na criança e no jovem como potenciais consumidores e não como pessoas que têm direitos inalienáveis, que deveriam ser respeitados. O homem não é uma ilha, vive cercado de pessoas e com elas deve interagir, auxiliando-as, procurando fazer com que evoluam material e espiritualmente, pois assim também estará beneficiando a si mesmo, propiciando aos outros e a sua família um ambiente de paz e progresso. E é claro que o Estado, principalmente em uma sociedade DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 2 (2010) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao capitalista e manipulatória, deveria estar preocupado com a felicidade e o equilíbrio de seus membros, fornecendo-lhes condições mínimas de desenvolvimento, procurando evitar que sejam praticamente obrigados a trilhar caminhos inadequados, ligados à violência e à morte. 5. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Sabrina Chagas de. Separação de fato e a união estável: estudos sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: < http://www.neofito.com.br/artigos /art01/civil7.htm>. Acesso em: 24 set. 2007. AZEVEDO, Solange; DANTAS, Edna. Eles mataram. Revista ÉPOCA, 18/09/2003 – Edição nº 279. Disponível em:<http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,EDG600645990,00.html>. Acesso em: 24 fev. 2008. CASTELFRANCHI, Y. Estatuto da Criança e do Adolescente: um marco na luta pelos direitos. 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