DISCIPLINA: ELEMENTOS DE MATEMÁTICA AVANÇADA
UNIDADE 3: ÁLGEBRA LINEAR. OPERADORES
OBJETIVOS: Ao final desta unidade você deverá:
- identificar operadores ortogonais e unitários e conhecer as suas propriedades;
- identificar operadores simétricos e hermitianos e conhecer as suas propriedades;
- resolver problemas de autovalores e autovetores de matrizes e operadores.
1 INTRODUÇÃO
Nesta unidade, definiremos e estudaremos operadores ortogonais, unitários,
simétricos e hermitianos a partir de suas propriedades e das propriedades das
matrizes desses operadores em bases ortogonais com vários exemplos. Também
abordaremos o problema de autovalores e autovetores de matrizes e operadores.
Definiremos o polinômio e a equação característica e veremos a sua relação com o
problema de diagonalização de matrizes e operadores.
2 OPERADORES ORTOGONAIS, UNITÁRIOS,
SIMÉTRICOS E HERMITIANOS.
Estudaremos nesta seção um tipo especial de transformações lineares
definidas sobre espaços com produto interno. Elas possuem propriedades que fazem
com que elas sejam de muita utilidade em aplicações físicas. Na linguagem utilizada
na Mecânica Quântica, usa-se o termo operador ao invés de transformação linear,
embora representem o mesmo objeto matemático. De agora em diante, é assim que
chamaremos as transformações lineares: operadores.
2.1 Algumas Definições
2.1.1 Operadores ortogonais e unitários:
Seja
um espaço de Hilbert e
chamado de ortogonal (no caso
um operador. Esse operador é
), ou unitário (no caso
preserve o produto interno. Isso quer dizer que
1
vale que
), desde que
Exemplo 1: Seja a rotação definida na unidade anterior,
que, se
, então
Se tomarmos um vetor
Para ver que
tal
, e aplicamos a rotação, obtemos:
é ortogonal devemos mostrar que
.
Aplicando a definição de produto interno nesse espaço, juntamente com a definição
de
, vemos que
Desse modo podemos afirmar que o operador
de ver, preserva o produto interno.
Exemplo 2: Seja
tal que
2
é ortogonal pois, como acabamos
Para ver se esse operador é realmente unitário, vamos calcular
portanto, como
, podemos afirmar que
é um operador unitário. É
fácil ver que como consequência da preservação do produto interno dos operadores
unitários, eles também preservam a norma de um vetor, a distância entre vetores, e
o ângulo entre vetores. Isso quer dizer que:
onde
é o ângulo entre
e
Exemplo 3: Seja
seja
e
.
o operador unitário do exemplo anterior e
, vamos ver que
, assim:
3
Por outro lado, temos que
4
Portanto verificamos que
que
. Deixamos para o leitor interessado verificar
. Em relação à norma dos vetores, podemos apreciar, no
desenvolvimento do exemplo, que ficou verificado que
e
.
É interessante estudar o que acontece com as matrizes associadas a
operadores unitários em bases ortonormais. Para isso vamos enunciar e demonstrar
a seguinte propriedade:
Seja
um espaço de Hilbert e
se for o caso de
um operador unitário (ou ortogonal,
), seja
uma base ortonormal de
uma matriz unitária (ou ortogonal, se for o caso de
, então
é
). As definições de matrizes
unitárias e ortogonais foram dadas nos exercícios 20 e 21 do final da Unidade 1. Vale
a pena relembrar: uma matriz quadrada real é chamada de ortogonal desde que
a sua inversa seja a sua transposta, e uma matriz quadrada complexa é
chamada de unitária desde que a sua inversa seja a sua transposta conjugada.
Para demonstrar a propriedade acima, vamos escrever, segundo a definição
de matriz associada a um operador numa dada base, que
e
onde
matriz
(
) representa o elemento de matriz da linha
( ) e da coluna
( ) da
. Logo, pelas propriedades de base ortonormal e de operador unitário,
temos
ou seja
Conjugando ambos dois membros, e sabendo que como
5
,
, temos que
ou, equivalentemente, segundo a definição de produto de matrizes,
.
Deixamos ao leitor interessado completar a demonstração, provando que
. Sendo assim, fica mostrado que
demonstração no caso que
é, efetivamente, uma matriz unitária. A
seja um espaço vetorial real, está contida na
demonstração anterior, já que, se
, temos que
porque
. Nesse
caso, segundo a definição de matrizes ortogonais, temos que
.
Exemplo 1: Seja
e seja
primeiramente
tal que
uma base ortonormal de
:
portanto
6
. Vamos determinar
e
2.1.2 Operadores simétricos e hermitianos
Seja
um espaço de Hilber,t e
chamado de simétrico (no caso
um operador. Esse operador é
), ou hermitiano (no caso
), desde que
, se satisfaça que
Vale a pena relembrar que o produto interno
Exemplo 1: Seja
com o produto
interno definido por
e seja
tal que
Vamos tomar os polinômios
e
e
pertencentes a
com
vamos calcular
7
, tal que
, e
onde temos definido
como,
, com
. As integrais
e
são
nulas, porque o intervalo de integração é simétrico e o integrando é uma função
ímpar da variável de integração. Sendo assim, temos que
INICIO DE BOXE
SAIBA MAIS
As integrais do tipo
com
e
, são muito usadas na área de Probabilidade e Estatística e
são resolvidas com técnicas que aprenderemos na unidade dedicada a Funções de
8
Variável Complexa. Mas, no caso particular de
, ela pode ser calculada da
seguinte maneira:
Usando coordenadas polares,
e
, com
, essa integral
fica
Fazendo a substituição
Portanto,
,
e
. No nosso caso
integração, vemos que
. Temos assim, que
. Logo, observando os limitantes de
. Seguidamente apresentamos algumas
dessas integrais:
FIM DE BOXE
Por outro lado a integral
vale
, já
vale
Seguidamente, calculamos
9
. Substituindo acima, obtemos
Vemos assim que,
modo que o operador
, podendo afirmar desse
é um operador hermitiano.
É interessante estudar o que acontece com as matrizes associadas a
operadores simétricos ou hermitianos em bases ortonormais. Para isso, vamos
enunciar e demonstrar a seguinte propriedade:
Seja
um espaço de Hilbert e
simétrico, se for o caso de
então
um operador hermitiano (ou
), seja
uma base ortonormal de
é uma matriz hermitiana (ou simétrica, se for o caso de
,
). Para dar
inicio à demonstração, vamos escrever
onde
são o elementos de matriz de
. Calculemos agora o produto interno
10
onde temos usado a definição de operador hermitiano. Vemos assim que
Portanto,
e
o resultado é
é uma matriz hermitiana. Se o espaço vetorial
e se satisfaz a igualdade
.
é real,
, o que define uma matriz
simétrica.
Exemplo 1: Seja
e seja
igual a
e seja
tal que
. Calculemos o produto interno
e verifiquemos que é
:
Sendo assim, o operador
é hermitiano. Vamos calcular, a seguir, a sua matriz
associada a base ortonormal
de
:
11
portanto
Logo, podemos concluir que
é uma matriz hermitiana, como queríamos verificar.
3 PROBLEMA DE AUTOVALORES E AUTOVETORES.
O problema de autovalores e autovetores de um operador,
, é muito
importante em diversas áreas da Física. Trata-se de encontrar vetores não nulos de
um espaço vetorial
com
e
e escalares de
tal que, se satisfaça a seguinte relação:
. A equação acima é conhecida pelo nome de equação de
autovalores e autovetores do
operador
suporemos que o nosso espaço vetorial
.
Embora
não
seja
necessário,
possui produto interno, já que é esse o
caso de maior interesse na Física.
3.1 Autovalores e Autovetores de uma Matriz
Como vimos nas seções anteriores, um operador admite uma representação
matricial. Por conta disso vamos introduzir o problema em termos de matrizes.
3.1.1 Definição
Dada uma matriz
, dizemos que a matriz coluna (ou vetor coluna,
que é outra terminologia usada mais frequentemente) não nula,
autovetor da matriz
onde
desde que se satisfaça a relação
é conhecido pelo nome de autovalor de
correspondente (ou
associado) ao autovetor . A equação acima pode ser escrita também, da forma
onde
é
é a matriz coluna nula de
, ou ainda
12
sendo que
é a matriz identidade de
onde temos usado a notação
. Explicitamente, podemos escrever:
,
. Desenvolvendo o produto de
matrizes, encontramos o seguinte sistema de equações homogêneo para as
incógnitas
,
,...
:
Tal sistema só terá solução diferente da solução
Se
, teríamos
13
...
, desde que
ou seja, um polinômio de segundo grau na variável
equação
, igualado a zero. Em geral, a
equivale ao problema de achar as raízes de um polinômio de
grau .
A equação
é chamada equação característica da matriz
, e o polinômio
e conhecido pelo nome de polinômio característico da matriz
polinômio característicos são os autovalores da matriz
conjunto de
valores de ,
,
. As raízes do
. Em general são um
.
INICIO DE BOXE
ATENÇÃO
É importante salientar duas questões: a primeira é que, mesmo no caso
, os autovalores podem ser complexos porque os polinômios com coeficientes
reais podem ter raízes complexas, e a segunda é que podemos ter dois ou mais
autovalores iguais porque os polinômios pode ter raízes iguais. Por exemplo, o
polinômio
,
, que é um polinômio de grau 6, possui 3 raízes,
,
; só que
Em termos das multiplicidades,
aparece três vezes e
, das raízes
aparece duas vezes.
, isso se escreve
,
e
. Notar também que a somatória de todas as multiplicidades é igual ao grau do
polinômio, ou seja,
onde
é o grau do polinômio e
é o número de raízes distintas.
FIM DE BOXE
Para cada valor de
teremos um autovetor
. Vejamos isso com um
exemplo.
Exemplo 1: Achar os autovalores e os autovetores da matriz
por
14
, dada
A equação característica é dada por
Os autovalores dessa matriz são as raízes dessa equação, ou seja,
e
.
Para achar os autovetores devemos resolver o sistema de equações dado por
para cada um dos autovalores achados. Se
, obtemos que
e
tomar qualquer valor. Portanto, qualquer vetor coluna da forma
autovetor associado ao autovalor
equações acima fica
temos que a primeira das
e a segunda
. Sendo assim, qualquer vetor
autovetor associado ao autovalor
multipliquemos por
a
matriz
matriz
, pode ser um
. Verifiquemos a seguir a equação de
. Tomemos os vetores
e
e
:
Portanto podemos afirmar que os vetores
da
pode ser um
. Se
coluna com as duas componentes iguais, como por exemplo
autovalores para
pode
correspondentes
aos
e
autovalores
são autovetores
e
,
respetivamente.
3.1.2 Diagonalização de Matrizes
Os autovetores de uma matriz podem ser arranjados em forma de uma
matriz, que chamaremos , da seguinte maneira:
15
Ou seja, que
. Pode-se mostrar que
é inversível e que a matriz
é uma matriz diagonal. Mais ainda, os elementos da diagonal são os
autovalores de
. Vamos verificar isso com um exemplo.
Exemplo 1:vamos agora formar a matriz
da matriz
e definamos a matriz
,
. Logo
16
com os autovetores
e
Vemos assim que, a matriz
os autovalores de
é uma matriz diagonal onde, na diagonal, estão
. Portanto, temos diagonalizado a matriz. É interessante
observar que
. Facilmente vemos que,
.
3.2 Autovalores e AutoVetores de um Operador
Pelo que acabamos de ver, o problema de achar os autovalores e autovetores
de um operador pode-se reduzir a achar os autovalores e autovetores da matriz
desse operador numa dada base. Isso quer dizer que o problema
pode ser
abordado a partir da relação
Exemplo 1: Seja
e seja
e
definido por
. Primeiro achemos a matriz de
na base
:
Portanto
Por outro lado, levando em conta o fato de que
característica é
, ou ainda,
que os autovalores são
Se
e
, a equação
. Sendo assim, vemos
. O sistema de equações a ser resolvido é:
temos que
17
Isso quer dizer que qualquer vetor do tipo
serve como autovetor. Já, se
, podemos apreciar que
Neste caso, o autovetor deverá ter a forma
coluna de
e
. Tomemos, por exemplo, os vetores
, formado pelas componentes, na base
, dos vetores de
e
, respectivamente. Em
termos de matrizes, verificamos que
Já, em termo de operadores, verificamos que
Verificamos assim que, achar os autovalores e os autovetores do operador
equivale a achar os autovalores e os autovetores da matriz
,
.
Exemplo 2: Seja o mesmo operador do exemplo anterior, e seja a base
. Primeiro achemos a matriz de
Facilmente vemos que,
e
e
na base :
. Por outro lado,
. Sendo assim, temos que
A equação característica,
e
, fica
. Logo,
. Notar que, em relação ao exemplo anterior, mudamos a base, mas
os autovalores continuaram os mesmos. Vejamos agora o que acontece com os
autovetores. O sistema de equações a ser resolvido é
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No caso
, temos que
Isso quer dizer, como no exemplo anterior, que qualquer vetor do tipo
serve como autovetor. Consideremos agora, o caso
. O sistema fica:
Portanto, neste caso, o autovetor deverá ter a forma
. Vemos assim que,
embora os autovalores sejam os mesmos, ante uma mudança de base, os
autovetores, em geral, não são os mesmos. Tomemos, por exemplo, os vetores
coluna de
e
, formado pelas componentes, na base
, dos vetores de
e
, respectivamente. Em
termos de matrizes, verificamos que
Olhando para estes dois últimos exemplos, podemos afirmar que acabamos
de verificar a seguinte propriedade: os autovalores de um operador não
mudam frente a mudanças de base. Escrevamos agora os vetores
do exemplo anterior na base
e
na base
. Sabendo que na base
as componentes de são
podemos escrever
19
e
são
e
, respectivamente,
Sendo assim, vemos que
de
,
e
e
, na base
, que são da forma dos autovetores
(com
e
), como deve ser. É interessante
esclarecer que diagonalizar um operador é digonalizar a sua matriz, ou seja, achar a
base de autovetores que deixa a matriz na sua forma diagonal.
INICIO DE BOXE
EXERCÍCIOS PROPOSTOS
1. Considerar o operador
tal que
e
Determinar se é um operador ortogonal com o produto interno definido por
.
2. Considerar o operador
tal que
e
Determinar se é um operador unitário com o produto interno definido por
.
3. Seja a rotação
Mostrar que
tal que se
então
, definida por
, é uma
transformação ortogonal correspondente a uma rotação de ângulo
4. Determinar se os seguintes operadores, de
20
, são ortogonais:
.
5. Achar as matrizes dos operadores
,
,
e
do exercício anterior nas bases
e
.
Calcular os respectivos determinantes.
6. Seja
com o produto interno definido
por
e seja
tal que
Determinar se
7. Seja
é hermitiano.
o conjunto de funções complexas de variáveis reais
e
definido por
com o produto interno definido por
. Achar a matriz do operador , definido por
, na base
e mostre que se trata de um operador hermitiano.
8. Achar a matriz do operador do exercício anterior na base
9. Seja
espaço, e seja
com o produto interno definido da maneira usual para esse
tal que
21
Mostre que
é hermitiano.
10. Seja
com o produto interno definido da maneira usual para esse
espaço, e seja
Mostre que
tal que
é hermitiano.
11. Seja
com o produto interno definido da maneira usual para esse
espaço, e seja
Mostre que
tal que
é hermitiano.
12. Achar os polinômios característicos das seguintes matrizes:
13. Achar os autovalores e auto-vetores das seguintes matrizes:
22
14. Diagonalizar as matrizes
,
e
do exercício anterior.
15. Achar os autovalores e auto-vetores do operador do exercício 9.
16. Achar os autovalores e auto-vetores do operador do exercício 10.
17. Achar os autovalores e auto-vetores do operador do exercício 11.
18. Mostrar que os autovalores de um operador hermitiano são reais.
RESUMINDO
Nesta unidade, definimos operadores ortogonais, unitários, simétricos e
hermitianos e estudamos as suas propriedades e as propriedades das matrizes
desses operadores em bases ortogonais com vários exemplos. Também abordamos o
problema de autovetores e autovalores de matrizes e operadores. Definimos
polinômio e equação característica e vimos a sua relação com o problema de
diagonalização de matrizes e operadores.
23
Referências
BUTKOV, E. Mathematical Physics, Addison Wesley Publishing Company Inc.,
United States of America, 1968.
BOLDRINI,
J. L.; RODRIGUES, COSTA S. I.; FIQUEREDO, V. L.; WETZLER H. G.
Álgebra Linear, São Paulo, HARBRA Ltda., 1980.
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1 INTRODUÇÃO 2 OPERADORES ORTOGONAIS