Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese INTIMAÇÃO PESSOAL DO PROCURADOR DE ESTADO – PRERROGATIVA ESSENCIAL PARA A EFICIENTE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO 000310 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 2 DESENVOLVIMENTO .......................................................................................................... 3 Capítulo 1 – Prerrogativa da intimação pessoal – princípio da supremacia do interesse público sobre o particular ....................................................................................................... 3 Capítulo 2 – Evolução legislativa da prerrogativa da intimação pessoal nas outras carreiras jurídicas – funções essenciais à Justiça ................................................................. 6 Capítulo 3 – Competência para legislar sobre a prerrogativa da intimação pessoal ....... 10 Capítulo 4 – Prerrogativa da intimação pessoal do Procurado de Estado – futura previsão em lei federal ............................................................................................................ 19 CONCLUSÃO......................................................................................................................... 23 1 000311 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese INTRODUÇÃO O tema proposto na presente tese - prerrogativa da intimação pessoal do Procurador de Estado - é de suma importância para a eficiente prestação do serviço público que é advogar para o Estado. A falta da intimação pessoal acarreta inúmeros transtornos no dia a dia do Procurador de Estado. O deslocamento até o fórum para fazer carga dos autos, o número de ações sempre crescente, a escassez de servidores e estagiários são problemas que poderiam ser ao menos minimizados com a prerrogativa da intimação pessoal. A referida prerrogativa já está prevista para outras carreiras jurídicas, a exemplo do Ministério Público, da Advocacia Geral de União e da Defensoria Pública. Os Procuradores de Estado possuem tal prerrogativa apenas nas execuções fiscais e nas intimações de sentenças concessivas de mandado segurança. Alguns Estados da federação conseguiram na legislação estadual alcançar a prerrogativa da intimação pessoal do Procurador de Estado. Mas o entedimento jurisprudencial a respeito da competência para legislar sobre essa matéria pode comprometer o êxito legislativo e recomenda especial atenção. O tema é atual e merecedor de debates em um Congresso Nacional de Procuradores de Estado, em que estarão presentes Procuradores Gerais dos Estados, diversas entidades de classe e também Procuradores de Estado de todo o país. No decorrer do presente trabalho pretende-se analisar o tema segundo lições doutrinárias e jurisprudenciais e ainda sugerir caminhos para consolidar a prerrogativa da intimação pessoal de forma definitiva para todos os Estados da federação. 2 000312 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese DESENVOLVIMENTO Capítulo 1 – PRERROGATIVA DA INTIMAÇÃO PESSOAL – PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO SOBRE O PARTICULAR Os Procuradores de Estado são agentes públicos cuja atuação está inserida no que a doutrina de direito administrativo denomina de regime jurídico administrativo. Quem na verdade atua nos milhares de processos é o próprio Estado, devidamente representado por seus Procuradores. Por conta dos interesses que representa, em todas as áreas de atuação, o Estado dispõe de prerrogativas e sujeições, que não se encontram nas relações entre os particulares. E quando o Estado está litigando em juízo a questão não é diferente. Cumpre então desde logo esclarecer qual a razão de existência da prerrogativa processual, que consubstancia em uma das vertentes do regime jurídico administrativo no âmbito do direito processual. Que motivos levaram o legislador, por exemplo, a conferir prazo em dobro para o Estado recorrer e em quádruplo para contestar, a elencar casos em que sentenças desfavoráveis ao Estado devam ser necessariamente reexaminadas pelo tribunal e, também, a prever uma fase de execução diferenciada, conforme o regime dos precatórios? E, seguindo essa linha de raciocínio, porque é lídimo defender que também o Estado seja pessoalmente intimado de todas as decisões judiciais e em todos graus de jurisdição? O que justifica a existência das prerrogativas processuais é o interesse público que 1 permeia a atuação dos Procuradores de Estado . Não há como imaginar um particular com tais benesses, pois aí, sim, estaríamos diante de um privilégio. Nada justificaria a existência de um prazo processual diferente para o particular, ou mesmo a intimação de outra forma que não fosse pela imprensa oficial. 1 Considera-se no presente trabalho sempre o interesse público primário, da coletividade, e não o interesse público secundário, específico da pessoa jurídica de direito público interno. 3 000313 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese Na maioria das vezes os leigos equiparam as prerrogativas processuais aos privilégios, sem se ater à razão de existência do instituto jurídico em tela. Os privilégios são benefícios destituídos de fundamento e devem ser repelidos. As prerrogativas, ao contrário, devem ser sempre prestigiadas no ordenamento jurídico. Entre os interesses em jogo, público e particular, o primeiro sempre terá superioridade e deve prevalecer. É a síntese do princípio da supremacia do interesse público 2 sobre o particular. A respeito desse princípio Celso Antonio Bandeira de Mello ensina o seguinte: “Trata-se de verdadeiro axioma reconhecível no moderno Direito Público. Proclama a superioridade do interesse da coletividade, firmando a prevalência dele sobre o particular, como condição, até mesmo, da sobrevivência e asseguramento deste último.” 3 Maria Sylvia Zanella Di Pietro segue na mesma linha: “Esse princípio, também chamado de princípio da finalidade pública, está presente tanto no momento da elaboração da lei como no momento da sua execução em concreto pela Administração Pública. Ele inspira o legislador e vincula a autoridade administrativa em toda a sua atuação. No que diz respeito à sua influência na elaboração da lei, é oportuno lembrar que uma das distinções que se costuma fazer entre o direito privado e o direito público (e que vem desde o Direito Romano) leva em conta o interesse que se tem em vista proteger; o direito privado contém normas de interesse individual e, o direito público, normas de interesse público.” Leis devem ser inspiradas e elaboradas consoante o interesse público. No caso específico dos Procuradores de Estado, leis devem prever prerrogativas processuais para que o 4 serviço público de advocacia de Estado possa ser prestado de forma eficiente . 2 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 29ª ed. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 68. 3 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 64, grifos no original. 4 000314 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese 5 Vejamos também a lição sempre presente de Leonardo José Carneiro da Cunha : “É vetusta a idéia de que o todo vem antes das partes, remontando a Aristóteles o primado do público, resultando na contraposição do interessse coletivo ao interesse individual e na necessária subordinação, até a eventual supressão, do segundo ao primeiro, bem como na irredutibilidade do bem comum à soma dos bens individuais. Daí resulta o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, constituindo um dos alicerces de todo o direito público. É bem verdade que não há norma constitucional que albergue tal princípio. Sua consolidação, todavia, decorre, como visto, de uma idéia antiga e praticamente universal, segundo a qual se deve conferir prevalência ao coletivo em detrimento do individual. ... Ora, a Fazenda Pública, que é representada em juízo por seus procuradores, não reúne as mesmas condições que um particular para defender seus interesses em juízo. Além de estar defendendo interesse público, a Fazenda Pública mantém uma burocracia inerente à sua atividade, tendo dificuldade de ter acesso aos fatos, elementos e dados da causa. O volume de trabalho que cerca os advogados públicos impede, de igual modo, o desempenho de suas atividades nos prazos fixados para os particulares. ....” Como se vê, as prerrogativas processuais encontram fundamento no interesse público, que sempre estará acima do interesse dos particulares. O curioso é notar que diversas leis federais já conferem a prerrogativa da intimação pessoal para diversas outras carreiras jurídicas, conforme será visto no capítulo seguinte. O mesmo interesse público deve inspirar e fundamentar a elaboração de lei que confira ao Procurador de Estado a prerrogativa da intimação pessoal em todos os processos e em qualquer grau de jurisdição. 4 Constituição Federal: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: ...” 5 CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 5ª ed., rev., ampl. e atual. São Paulo: Dialética, 2007. p. 31. 5 000315 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese Capítulo 2 - EVOLUÇÃO LEGISLATIVA DA PRERROGATIVA DA INTIMAÇÃO PESSOAL NAS OUTRAS CARREIRAS JURÍDICAS – FUNÇÕES ESSENCIAIS À JUSTIÇA A prerrogativa da intimação pessoal foi inicialmente prevista para os defensores públicos e advogados que estivessem prestando Assistência Judiciária. Trata-se da Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, atualmente com a redação da Lei nº 7.871, de 8 de novembro de 1989: “Art. 5º ... § 5° Nos Estados onde a Assistência Judiciária seja organizada e por eles mantida, o Defensor Público, ou quem exerça cargo equivalente, será intimado pessoalmente de todos os atos do processo, em ambas as Instâncias, contando-se-lhes em dobro todos os prazos.” Para os Defensores Públicos da União e dos Estados a prerrogativa foi reafirmada na Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994. Os respectivos dispositivos foram ainda melhorados, prevendo também a vista dos autos, conforme a redação da Lei Complementar nº 132, de 7 de outubro de 2009: "Art. 44. São prerrogativas dos membros da Defensoria Pública da União: I – receber, inclusive quando necessário, mediante entrega dos autos com vista, intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição ou instância administrativa, contando-se-lhes em dobro todos os prazos; ... Art. 128. São prerrogativas dos membros da Defensoria Pública do Estado, dentre outras que a lei local estabelecer: I – receber, inclusive quando necessário, mediante entrega dos autos com vista, intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição ou instância administrativa, contando-se-lhes em dobro todos os prazos;” O Código de Processo Civil, Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, dispôs sobre a intimação pessoal para os membros do Ministério Público: “Art. 236. ... § 2o A intimação do Ministério Público, em qualquer caso será feita pessoalmente.” 6 000316 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese A prerrogativa dos membros do Ministério Público dos Estados também foi revista e aprimorada na Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993: “Art. 41. Constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, no exercício de sua função, além de outras previstas na Lei Orgânica: ... IV - receber intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição, através da entrega dos autos com vista;” A intimação pessoal dos membros do Ministério Público da União, que abrange o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Militar e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, também foi aperfeiçoada na Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993: “Art. 18. São prerrogativas dos membros do Ministério Público da União: ... II - processuais: ... h) receber intimação pessoalmente nos autos em qualquer processo e grau de jurisdição nos feitos em que tiver que oficiar.” A intimação pessoal dos membros da Advocacia Geral da União está prevista na Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993: “Art. 38. As intimações e notificações são feitas nas pessoas do Advogado da União ou do Procurador da Fazenda Nacional que oficie nos respectivos autos.” E foi reafirmada na Lei nº 9.028, de 12 de abril de 1995: “Art. 6º A intimação de membro da Advocacia-Geral da União, em qualquer caso, será feita pessoalmente.” Para os Procuradores Federais e para os Procuradores do Banco Central do Brasil a intimação pessoal está prevista na Lei nº 10.910, de 15 de julho de 2004: 7 000317 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese “Art. 17. Nos processos em que atuem em razão das atribuições de seus cargos, os ocupantes dos cargos das carreiras de Procurador Federal e de Procurador do Banco Central do Brasil serão intimados e notificados pessoalmente.” A intimação pessoal dos Procuradores da Fazenda Nacional também está prevista na Lei nº 11.033, de 21 de dezembro de 2004: “Art. 20. As intimações e notificações de que tratam os arts. 36 a 38 da Lei Complementar no 73, de 10 de fevereiro de 1993, inclusive aquelas pertinentes a processos administrativos, quando dirigidas a Procuradores da Fazenda Nacional, dar-se-ão pessoalmente mediante a entrega dos autos com vista.” Todas as carreiras jurídicas acima referidas tiveram a prerrogativa da intimação pessoal prevista em lei em razão dos interesses que representam, ou seja, mais uma aplicação direta do princípio da supremacia do interesse público sobre o particular. Essas carreiras jurídicas, sem exceção, exercem “funções essenciais à Justiça”, de acordo com a Constituição Federal6. O tratamento isonômico dispensado pelo legislador constituinte também é mais um argumento para que a prerrogativa da intimação pessoal seja conferida também aos Procuradores de Estado. As prerrogativas dessas carreiras devem ser as mesmas, sob pena de ofensa ao basilar princípio da igualdade. Os interesses defendidos pelos membros do Ministério Público, da Defensoria Pública e da Advocacia Geral da União são todos públicos, cada qual com a sua vertente de atuação. E que em nada diferem dos interesses também públicos defendidos pelos Procuradores de Estado. Atentar para o princípio da igualdade no presente caso é perseguir a prerrogativa da intimação pessoal para os Procuradores de Estado também com “vista dos autos”, tal como prevista para os membros do Ministério Público e da Defensoria Pública. A intimação pessoal 6 Capítulo IV - Das Funções Essenciais à Justiça, Seção I – Do Ministério Público, Seção II – Da Advocacia Pública, Seção III – Da Advocacia e da Defensoria Pública. 8 000318 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese sem vista dos autos não resguarda por completo o interesse público, pois não afasta a necessidade de deslocamentos até os fóruns para a realização das cargas dos autos. Em apenas duas específicas hipóteses os Procuradores de Estado contam com a prerrogativa da intimação pessoal: “Art. 25 - Na execução fiscal, qualquer intimação ao representante judicial da Fazenda Pública será feita pessoalmente.” (Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980) “Art. 9o As autoridades administrativas, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas da notificação da medida liminar, remeterão ao Ministério ou órgão a que se acham subordinadas e ao Advogado-Geral da União ou a quem tiver a representação judicial da União, do Estado, do Município ou da entidade apontada como coatora cópia autenticada do mandado notificatório, assim como indicações e elementos outros necessários às providências a serem tomadas para a eventual suspensão da medida e defesa do ato apontado como ilegal ou abusivo de poder. ... Art. 13. Concedido o mandado, o juiz transmitirá em ofício, por intermédio do oficial do juízo, ou pelo correio, mediante correspondência com aviso de recebimento, o inteiro teor da sentença à autoridade coatora e à pessoa jurídica interessada.” (Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009) As referidas hipóteses, respectivamente execução fiscal e sentença concessiva de mandado de segurança, representam uma ínfima parcela dentro do universo das ações judiciais acompanhadas pelos Procuradores de Estado de todo o país. Nos capítulos seguintes serão abordadas as possíveis espécies legislativas capazes de viabilizar a previsão da intimação pessoal para os Procuradores de Estado. 9 000319 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese Capítulo 3 – COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR SOBRE A PRERROGATIVA DA INTIMAÇÃO PESSOAL A questão tormentosa a ser enfrentada é a respeito da competência para legislar sobre a matéria em tela. É saber se a intimação pessoal é matéria de direito processual ou é um mero procedimento em matéria processual7. Se se tratar de matéria de direito processual, a competência será privativa da União e todas as leis estaduais que veicularem a prerrogativa da intimação pessoal serão inconstitucionais. Se se tratar de matéria de procedimento processual a competência será concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal, não padecendo as leis estaduais de qualquer inconstitucionalidade. Já há previsão de intimação pessoal de Procuradores de Estado em algumas legislações estaduais. Vejamos as seguintes leis locais apenas a título de exemplos: “Art. 44 - São prerrogativas dos Procuradores do Estado: … IV - tomar ciência pessoal de atos e termos dos processos em que funcionarem;” (LCE nº 15/80 – Lei Orgânica da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro) “Art. 81 - São prerrogativas do Procurador de Estado: … VI – receber intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição, mediante a entrega dos autos com vistas;” (LCE n 7/91 – Lei Orgânica da Advocacia Geral do Estado de Alagoas) “Art. 101. São prerrogativas do Procurador do Estado: ... IV - tomar ciência pessoal de atos e de termos dos processos em que funcionarem;” (LCE nº 95/01 – Lei Orgânica da Procuradoria-Geral do Estado do Mato Grosso do Sul) 7 Constituição Federal: “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; ... Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: ... XI - procedimentos em matéria processual; ...” 10 000320 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese “Art. 53 - Constituem direitos do Procurador do Estado, além das garantias e prerrogativas inerentes à profissão de advogado: ... III - receber intimação pessoal dos atos processuais relativos aos feitos sob seu patrocínio;” (LCE nº 34/09 – Lei Orgânica da Procuradoria Geral do Estado da Bahia) “Art. 88 - São prerrogativas do Procurador do Estado: ... VI - receber intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição, mediante a entrega dos autos em vistas;” (LCE nº 27/96 – Lei Orgânica da Advocacia-Geral do Estado de Sergipe) É bem verdade que existem precedentes jurisprudenciais no sentido da inconstitucionalidade destas leis estaduais, sob o fundamento de que a intimação pessoal seria matéria de direito processual e, portanto, de competência legislativa privativa da União. Mas também é certo que ainda não há julgamento no Supremo Tribunal Federal com repercussão geral a respeito da matéria, tampouco no Superior Tribunal de Justiça consoante o rito dos recursos repetitivos. Ademais, são poucas as decisões que enfrentam essa questão com enfoque na competência legislativa, se privativa ou concorrente. Mesmo quando presente lei estadual dispondo sobre tal prerrogativa, a maioria das decisões passa ao largo do centro da controvérsia, asseverando tão somente a lacuna na legislação federal a respeito da previsão de intimação pessoal do Procurador de Estado8. Assim, ainda há espaço para discussão da tese favorável aos Procuradores de Estado, no sentido da constitucionalidade das leis estaduais, presentes e futuras, segundo os argumentos a seguir alinhavados. 8 Nesse sentido, v. no Supremo Tribunal Federal: AI 840816, Relator Min. Joaquim Barbosa; AI 648193, Relator Min. Dias Toffoli; RE 469.371 AgR, Relatora Min. Cármen Lúcia; no Superior Tribunal de Justiça: AgRg no AI nº 970.341/BA, Relatora Min. convocada Jane Silva; AG 390.716/RJ, Relator Min. José Delgado; AgRg no AgRg no REsp 489.226/MG, Rel. Min. Luiz Fux. 11 000321 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese É importante fixar desde logo a diferença entre normas processuais e normas procedimentais. A lição de Cândido Rangel Dinamarco9 é suficiente para tanto: “Dando que no processo se entrelaçam o procedimento e a relação jurídica vinculativa de seus sujeitos, entende-se que as normas processuais stricto sensu seriam os preceitos destinados a definir os poderes, deveres, faculdades, ônus e sujeição dos sujeitos processuais (relação jurídica processual), sem interferir no desenho das atividades a realizar (procedimento). Normas procedimentais, nesse contexto, seriam aquelas de descrevem os modelos a seguir nas atividades, ou seja, (a) o elenco de atos que compõem cada procedimento, (b) a ordem de sucessão a presidir a realização desses atos, (c) a forma que deve ser observada em cada um deles (modo, lugar e tempo) e (d) os diferentes tipos de procedimentos disponíveis e adequados aos casos que a própria norma estabelece (infra, nn. 625626).” A doutrina do ilustre processualista é no sentido de que normas procedimentais são “aquelas que descrevem os modelos a seguir nas atividades”, ou seja, “a forma que deve ser observada em cada um deles (modo, lugar e tempo)”. A parte pode ser intimada de diversas formas, tais como pela imprensa oficial, por edital, por via eletrônica ou de forma pessoal. Se determinada lei estadual prever que a intimação de determinada parte será pessoal, essa lei estará disciplinando tão somente a forma, o modo com que se dará a intimação. Esse entendimento sobre a diferença entre normas processuais e procedimentais também pode ser encontrado na doutrina de Alexandre Freitas Câmara10, que faz menção inclusive a outros juristas: 9 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil I. 6ª ed., revista e atualizada. Malheiros: 2009, p. 69, grifos nossos. 10 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil - Volume I. 19ª ed. Lumen Juris: 2009, p. 134, grifos nossos. 12 000322 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese “Exemplo típico desta tendência a distinguir processo e procedimento se tem na obra de Humberto Theodoro Júnior, que afirma que “processo e procedimento são conceitos diversos e que os processualistas não confundem. Afirma o renomado jurista mineiro que processo “é o método, isto é, o sistema de compor a lide em juízo através de uma relação jurídica vinculativa de direito público, enquanto que procedimento é a forma material com que o processo se realiza em cada caso concreto”. De teor semelhante é a lição de outro notável processualista mineiro, Ernane Fidélis dos Santos, para quem “processo e procedimento são termos que não se confundem. O primeiro é a soma de atos que têm fim determinado, não importando a marcha que toma para atingi-lo. O segundo é o modo pelo qual o processo se forma e se movimenta, para atingir o respectivo fim.” ... Nesses termos, e levando-se em consideração o conceito de processo por mim adotado, posso dizer que processo é uma entidade complexa, de que o procedimento é um dos elementos formadores. O procedimento, como visto, é o aspecto extrínseco do processo. O processo não é procedimento, mas o resultado da soma de diversos fatores, um dos quais é exatamente o procedimento (e os outros são o contraditório e a relação jurídica processual).” A doutrina de Cassio Scarpinella Bueno11 acaba por unir esses dois conceitos ligados a normas procedimentais, quais sejam, forma e aspecto extrínseco dos atos: “Procedimento” é o lado extrínseco, palpável, sensível e constatável objetivamente, pelo qual se desenvolve o “processo” ao longo do tempo. “Procedimento” é a forma específica de manifestação, de organização, de estruturação do próprio processo, dos diversos atos e fatos relevantes para o processo (e, por isto, atos e fatos processuais) ao longo do tempo.” Uma da facetas do princípio do contraditório é a garantia de que os litigantes em processo judicial serão intimados de todas as decisões judiciais12. O Código de Processo Civil 11 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil. Teoria geral do direito processual civil. 6ª ed. Saraiva: 2012, p. 510, grifos nossos. 12 Constituição Federal: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindose aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: ... LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;” 13 000323 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese prevê a intimação das partes, o que sem dúvida é uma norma de direito processual. Como regra geral, o referido código dispõe que a intimação se faça pela imprensa oficial13. Mas essa forma de intimação de uma determinada parte pode ser alterada por lei. Se assim ocorrer, o que mudará será a parte física e visível do processo, ou seja, o modo pelo qual o aspecto extrínseco da intimação deverá ser realizado. Todos esses conceitos estão ligados a procedimento, e não a processo, conforme a mais abalizada doutrina. E não é só. Existe ainda um outro argumento. A prerrogativa processual da intimação pessoal para as outras carreiras jurídicas não está prevista no Código de Processo Civil, lei nacional, mas em outras leis federais esparsas, conforme visto no capítulo anterior do presente trabalho. Inclusive para o Ministério Público, a forma de intimação foi aprimorada e está atualmente prevista em leis federais posteriores ao Código de Processo Civil14. Essas leis federais esparsas não tratam de direito processual. Essas leis são, na maioria, leis orgânicas dessas diversas carreiras jurídicas, casos em que a União cuidou apenas de organizar e disciplinar a atividade exercida pelos respectivos membros dessas instituições15. Outras tantas são leis federais que da mesma forma nada se relacionam com o direito processual16. 13 Código de Processo Civil: “Art. 236. No Distrito Federal e nas Capitais dos Estados e dos Territórios, consideram-se feitas as intimações pela só publicação dos atos no órgão oficial.”. 14 A intimação pessoal do Ministério Público “com vista dos autos” não está prevista no Código de Processo Civil, mas, sim, na Lei nº 8.625/93 e na Lei Complementar nº 75/93 (v. capítulo anterior, p. 7). 15 Lei Complementar nº 80/94: “Organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e Territórios e prescreve norma gerais para sua criação nos Estados e dá outras providências.”; Lei Complementar nº 75/93: “Dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União”; Lei Complementar nº 73/93: “Institui a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União e dá outras providências.” 16 Lei nº 10.910/04, que prevê a prerrogativa da intimação pessoal para os Procuradores Federais e Procuradores do Banco Central: “Reestrutura a remuneração dos cargos das carreiras de Auditoria da Receita Federal, Auditoria-Fiscal da Previdência Social, Auditoria-Fiscal do Trabalho, altera o pró-labore, devido aos ocupantes dos cargos efetivos da carreira de Procurador da Fazenda Nacional, e a Gratificação de Desempenho de Atividade Jurídica – GDAJ, devida aos ocupantes dos cargos efetivos das carreiras de Advogados da União, de Procuradores Federais, de Procuradores do Banco Central do Brasil, de Defensores Públicos da União e aos integrantes dos quadros suplementares de que trata o art. 46 da Medida Provisória no 2.229-43, de 6 de setembro de 2001, e dá outras providências.”; Lei nº 11.033/04, que prevê a intimação pessoal para os Procuradores da Fazenda Nacional: “Altera a tributação do mercado financeiro e de capitais; institui o Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária – REPORTO; altera as Leis nº 10.865, de 30 de 14 000324 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese Aqui se faz necessário diferenciar as “leis nacionais” e as meras “leis federais”. Ambas são leis aprovadas pelo Congresso Nacional com sanção do Presidente da República. Mas enquanto as primeiras revelam uma atuação da União em nome de toda a Federação, expressando a soberania do Estado brasileiro, a exemplo do Código de Processo Civil, as segundas são leis que a União elabora como ente autônomo, dotado exatamente da mesma autonomia de quaisquer dos demais entes da Federação. Nesse sentido é a doutrina de Marisa Ferreira dos Santos17: “Há leis federais de natureza nacional (a exemplo do Código Penal) e leis federais dirigidas especificamente a interesses da própria União. Para Kelsen, conforme leciona José Nilo de Castro, o modelo estatal federal possui três ordens jurídicas, a saber: o ordenamento jurídico local, dos Estados Federados; o ordenamento jurídico central, do Estado federal - ambos ordenamentos jurídicos parciais -; e o ordenamento jurídico total, responsável pela convivência daquelas ordens jurídicas parciais. E a lei nacional encontra abrigo na norma jurídica total.” O que se vê em todas as “leis federais” mencionadas no capítulo anterior do presente trabalho é a União legislando como ente autônomo, disciplinando a atuação específica de determinados servidores públicos. Essas leis atendem a interesses específicos da União e, portanto, não são “leis nacionais”. Apenas a título de exemplo, qual então é a importância para o Estado de Sergipe que o Procurador do Banco Central tenha a prerrogativa da intimação pessoal prevista em lei federal? Absolutamente nenhuma. Isso não é matéria de direito processual. A União não estava no exercício da competência privativa quando editou a Lei Federal nº 10.910/0418. abril de 2004, 8.850, de 28 de janeiro de 1994, 8.383, de 30 de dezembro de 1991, 10.522, de 19 de julho de 2002, 9.430, de 27 de dezembro de 1996, e 10.925, de 23 de julho de 2004; e dá outras providências.”. 17 SANTOS, Marisa Ferreira dos, e outros. Curso de Direito Constitucional. 7ª edição. Saraiva: 2010, p. 313. 18 Lei nº 10.910/04: “Art. 17. Nos processos em que atuem em razão das atribuições de seus cargos, os ocupantes dos cargos das carreiras de Procurador Federal e de Procurador do Banco Central do Brasil serão intimados e notificados pessoalmente.”. 15 000325 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese Se é possível à União legislar sobre seus interesses como ente autônomo, o mesmo deve se dar em relação aos Estados. Assim, os Estados podem disciplinar a atividade das respectivas Procuradorias em leis estaduais, no exercício das mesmas autonomias constitucionais. Se há previsão de prerrogativa de intimação pessoal nessas tantas leis federais, isso é matéria de procedimento e não de direito processual, pois elaboradas consoante os interesses específicos da União. Da mesma forma, se há previsão de intimação pessoal nas leis estaduais, o interesse é meramente local, a matéria é de procedimento e não de direito processual. Legislar sobre forma ou modo de intimação é, portanto, legislar sobre norma procedimental. Lei estadual que discipline a forma ou o modo de intimação de determinada parte é lei constitucional, pois elaborada no exercício da competência concorrente dos Estados19. Existem diversos julgados favoráveis a essa tese nos Estados em que há lei estadual prevendo a intimação pessoal do Procurador de Estado, aptos ao menos a ensejar recurso especial por divergência jurisprudencial: “APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. PRELIMINAR DE NULIDADE DO PROCESSO POR IRREGULARIDADE DA INTIMAÇÃO ACOLHIDA. APELO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. PRELIMINAR DE NULIDADE DO PROCESSO POR CERCEAMENTO DE DEFESA. A TEOR DO ART. 58, III, DA LEI ORGÂNICA DA PROCURADORIA GERAL DO ESTADO DA BAHIA, CONSTITUI DIREITO DO PROCURADOR DO ESTADO, RECEBER INTIMAÇÃO PESSOAL DOS ATOS PROCESSUAIS RELATIVOS AOS FEITOS SOB SEU PATROCÍNIO. “A AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO EXECUTADO NO PROCESSO DE EXECUÇÃO, PARA APRESENTAR MANIFESTAÇÃO SOBRE O LAUDO DE AVALIAÇÃO, AFRONTA O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA, COROLÁRIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL”. “A CF DE 1988 19 Constituição Federal: “Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:... XI - procedimentos em matéria processual;” 16 000326 Capa Mensagem do Presidente Comissões CONCEDEU Programa Realização / Patrocínio / Apoio COMPETÊNCIA Título da Tese CONCORRENTE AOS ESTADOS- MEMBROS PARA LEGISLAREM SOBRE NORMAS DE PROCEDIMENTO EM MATÉRIA PROCESSUAL (ART. 24, XI). ASSIM, NA AUSÊNCIA DE LEI FEDERAL E EXISTINDO LEI LOCAL DISPONDO SOBRE A PRERROGATIVA DE INTIMAÇÃO PESSOAL AOS PROCURADORES ESTADUAIS, HÁ QUE SE OBSERVÁ-LA”. (APELAÇÃO nº 28375-8/2009, Órgão Julgador: PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Relatora Desembargadora MARIA DA PURIFICACAO DA SILVA, Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, Data do Julgamento: 15/03/2010) (in www.tjba.jus.br, g.n.) APELAÇÃO CÍVEL INTEMPESTIVIDADE - AÇÃO DE - REJEITADA COBRANÇA - - PRELIMINAR DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO PROCURADOR DO ESTADO - ARTIGO 88, VI DA LEI COMPLEMENTAR 27/96 E ARTIGO 188 DO CPC - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - ENTE PÚBLICO - ARTIGO 333, I DO CPC - DOCUMENTOS RESPALDANDO AS ALEGAÇÕES AUTORAIS - OBRIGATORIEDADE DO PAGAMENTO VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA - APELO IMPROVIDO - DECISÃO UNÂNIME. Inicialmente, devo rejeitar a preliminar de intempestividade do apelo, considerando que sequer houve intimação pessoal do Procurador do Estado, tal como determina o artigo 88 da Lei Complementar Estadual 27/21996, a saber: Art. 88 - São prerrogativas do Procurador do Estado: ... VI - receber intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição, mediante a entrega dos autos em vistas; Na verdade, o recurso foi interposto um dia após o prazo de 30 dias estabelecido pelo artigo art. 188 do CPC, contado da data da publicação da sentença no Diário da Justiça (fls. 274 e verso). Entretanto, como é sabido, o prazo somente deveria ter início quando da intimação pessoal do representante da Fazenda Pública. Não há que se falar, portanto, em intempestividade. Deste modo, é de se conhecer o recurso apelatório, tendo em vista que preencheu os requisitos de admissibilidade. ...” (APELAÇÃO CÍVEL Nº 3189/2009, 18ª VARA CÍVEL, Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, DESA. SUZANA MARIA CARVALHO OLIVEIRA, RELATOR, Julgado em 10/12/2010) (in www.tjse.jus.br, g.n.) Existem precedentes favoráveis até mesmo no Superior Tribunal de Justiça: 17 000327 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - PROVIMENTO SUBIDA DO RECURSO ESPECIAL - RECORRIBILIDADE - HIPÓTESES EXCEPCIONAIS - TEMPESTIVIDADE - PROCEDIMENTO EM MATÉRIA PROCESSUAL - COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE INTIMAÇÃO PESSOAL - PROCURADOR - ESTADO DA BAHIA EXISTÊNCIA DE LEI LOCAL (LEI 8.207/2002, ART. 58, III)- POSSIBILIDADE. Excepcionalmente esta Corte tem admitido recurso da decisão que dá provimento ao agravo de instrumento e manda subir o recurso especial. Contudo, tal hipótese só tem cabimento em casos excepcionais, quando ausentes os pressupostos de admissibilidade do próprio agravo de instrumento, o que não ocorre nestes autos. A Constituição Federal de 1988 concedeu competência concorrente aos Estadosmembros para legislarem sobre normas de procedimento em matéria processual (art. 24, XI). Assim, na ausência de lei federal e existindo lei local dispondo sobre a prerrogativa de intimação pessoal aos procuradores estaduais, há que se observá-la. Constituição Federal. Ausentes quaisquer dos pressupostos do art. 535 do CPC, e tendo em vista o princípio da fungibilidade recursal, deve o recurso ser recebido como agravo regimental. 535CPC - Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, ao qual se nega provimento. (710585 BA 2005/0155684-8, Relator: Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, Data de Julgamento: 06/12/2005, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 06/03/2006 p. 332) (in www.stj.jus.br, g.n.) Diante desses argumentos doutrinários e jurisprudenciais é possível afirmar a constitucionalidade das leis estaduais que conferem a prerrogativa de intimação pessoal aos Procuradores de Estado. A lei estadual representa, assim, um dos possíveis caminhos para que a prerrogativa seja alcançada e contribua para a eficiente prestação do serviço público de advocacia de Estado. Até em razão da menor dificuldade da aprovação de lei em Assembléia Legislativa, quando comparada com a aprovação de lei no Congresso Nacional. Enquanto o Supremo Tribunal Federal não decidir a questão da constitucionalidade ou da inconstitucionalidade das leis estaduais com tal previsão de forma definitiva, salvo melhor juízo, não há razão para desprezar essa importante espécie legislativa. 18 000328 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese Capítulo 4 – PRERROGATIVA DA INTIMAÇÃO PESSOAL DO PROCURADOR DE ESTADO – FUTURA PREVISÃO EM LEI FEDERAL A previsão da prerrogativa da intimação pessoal dos Procuradores de Estado em lei federal, quando e se aprovada, vai solucionar definitivamente a questão. Não há notícia de que as leis federais que conferiram essa prerrogativa para as outras carreiras jurídicas tenham sido de qualquer forma impugnadas. Não se discute o interesse público resguardado, a respectiva supremacia sobre os interesses particulares, tampouco a constitucionalidade de tais leis. A União sempre será competente para legislar sobre a prerrogativa da intimação pessoal. Se se entender que a matéria é de direito processual, a União estará no exercício da competência privativa. Se se entender que é matéria de procedimento processual, a União estará no exercício da competência concorrente. Se a lei federal provavelmente não vai encontrar resistência nos tribunais, certo é que a sua aprovação tem encontrado diversos obstáculos políticos que ainda deverão ser superados. Há muito tempo o tema está em discussão no Congresso Nacional. O Projeto de Lei nº 7.261 foi apresentado pelo Excelentíssimo Senhor Presidente da República em 2002, após manifestação conjunta do então Ministro de Estado da Justiça, Sr. Paulo de Tarso Ramos Ribeiro, e do também então Advogado-Geral da União, Sr. José Bonifácio Borges de Andrada. A redação original do projeto era a seguinte: “Art. 1º. A intimação dos representantes judiciais dos Estados e do Distrito Federal será feita pessoalmente, em qualquer processo e grau de jurisdição. Parágrafo único. As intimações a serem realizadas fora da sede do juízo serão feitas por carta registrada, com aviso de recebimento. Art. 2º. Esta Lei entra em vigor trinta dias após a data de sua publicação.” Após a aprovação na Câmara dos Deputados, o projeto seguiu ao Senado, casa legislativa em que foi aprovado com o seguinte substitutivo: 19 000329 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese “Art. 1º A intimação dos representantes judiciais dos Estados e do Distrito Federal, assim como dos membros da carreira de Procurador Federal, será feita pessoalmente, em qualquer processo e grau de jurisdição. § 1º As intimações a serem realizadas fora da sede do juízo serão feitas por carta registrada, com aviso de recebimento. §2º Aplica-se, quando couber, o disposto neste artigo aos Advogados ou Procuradores da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, das Assembléias Legislativas e da Câmara Legislativa do Distrito Federal, organizados em carreira, na forma do art. 132 da Constituição Federal. Art. 2º Esta Lei entra em vigor 30 (trinta) dias após a data de sua publicação.” O referido projeto de lei com o substitutivo retornou à Câmara dos Deputados e recebeu parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça em 22/01/2004. Mesmo após diversos requerimentos para inclusão na ordem do dia, o projeto ainda não foi votado em plenário20. A aprovação do Projeto de Lei nº 7.261/02 representaria inegável avanço para os Procuradores de Estado. Mas é de rigor salientar que nele não há previsão de intimação pessoal com vista dos autos, que é a prerrogativa mais completa e que já está prevista para os membros do Ministério Público e da Defensoria Pública. Uma outra possibilidade de se conseguir a prerrogativa da intimação pessoal para os Procuradores de Estado está na aprovação do Projeto do Novo Código de Processo Civil. Aprovado no Senado como Projeto de Lei nº 166/2010, o Projeto está na Câmara dos Deputados sob nº 8046/2010, atualmente com a seguinte redação: “Art. 106. A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público gozarão de prazo em dobro para todas as suas manifestações processuais, cuja contagem terá início a partir da vista pessoal dos autos, mediante carga ou remessa.” 20 in www.camara.gov.br - proposições, projetos de lei. Acesso em 25.07.2012. 20 000330 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese Na Câmara dos Deputados existem diversas propostas de emendas ao projeto aprovado no Senado Federal, algumas delas enfraquecendo ou até mesmo suprimindo a prerrogativa da intimação pessoal para os Procuradores de Estado21. As justificativas apresentadas pelos Deputados nessas propostas de emendas são sempre no sentido de que a intimação pessoal é um privilégio e não uma prerrogativa a ser fomentada, em total descompasso com a melhor doutrina de direito administrativo, conforme pormenorizadamente visto alhures. Em substitutivo que ainda será votado na Câmara dos Deputados, a consolidação dessas propostas até 27/04/2012 aponta para um dispositivo renumerado com a seguinte redação22: “Art. 164. A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público gozarão de prazo em dobro para todas as suas manifestações processuais, cuja contagem terá início a partir da intimação pessoal. Parágrafo único. A intimação pessoal far-se-á por carga, remessa ou meio eletrônico.” A proposta acima referida já enfraquece a prerrogativa, pois retira a necessidade de vista dos autos e ainda prevê a possibilidade de que a intimação seja feita por meio eletrônico. A vigília deve ser constante para que interesses outros que não públicos acabem por alterar a redação aprovada no Senado Federal. 21 EMC 404/2011, Deputado Júnior Coimbra: “Suprima-se o art. 106, do PL nº 8046 de 2010, que trata do Código de Processo Civil"; EMC 526/2011, Deputado Marçal Filho: “Acrescente-se ao art. 106 do projeto de lei 8046 de 2010 o seguinte parágrafo único: Art. 106. ... Parágrafo único. Não se aplica o disposto no caput deste artigo no tocante aos prazos relativos à execução e recursais para as manifestações processuais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e respectivas autarquias e fundações públicas sobre o privado quando o valor da causa não for superior a três salários mínimos nacionais.”, in www.camara.gov.br proposições, projetos de lei. Acesso em 25.07.2012. 22 Cf. site do Instituto Brasileiro de Direito Processual: http://direitoprocessual.org.br/fileManager/Consolida.pdf. Acesso em 25.07.2012. 21 000331 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese Uma terceira frente de atuação no Congresso Nacional é a gestação da Lei Orgânica Nacional da Advocacia Pública, que deve contemplar dentre outras tantas disposições a prerrogativa processual da intimação pessoal. A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados realizou em 10/07/2012 uma audiência pública para tratar desse tema, evento que contou com a presença de diversos parlamentares, advogados públicos e representantes das entidades de classe23. Argumentos jurídicos não faltam para que a prerrogativa da intimação pessoal seja definitivamente prevista em lei federal para os Procuradores de Estado. Uma atuação uníssona das entidades de classe, dos Procuradores Gerais e dos próprios Procuradores de Estado é imprescindível para demonstrar aos parlamentares que a aprovação de lei nesse sentido atende integralmente ao interesse público. Desta forma, os interesses particulares que ainda não permitiram a aprovação de lei federal nesse sentido devem finalmente ceder lugar ao interesse público. Aplica-se uma vez mais o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular. 23 in www2.camara.gov.br/agencia/noticias/ADMINISTRACAO-PUBLICA/422029-CCJ-DEBATERANECESSIDADE-DE-LEI-ORGANICA-PARA-A-ADVOCACIA-PUBLICA.html. Acesso em 25.07.2012. 22 000332 Capa Mensagem do Presidente Comissões Programa Realização / Patrocínio / Apoio Título da Tese CONCLUSÃO 1. A prerrogativa da intimação pessoal do Procurador de Estado é de suma importância para a eficiente prestação do serviço público que é advogar para o Estado. 2. O que justifica a existência das prerrogativas processuais é o interesse público que permeia a atuação dos Procuradores de Estado. 3. O Ministério Público, a Defensoria Pública e a Advocacia Geral da União tiveram a prerrogativa da intimação pessoal prevista em lei em razão dos interesses públicos que representam. 4. Essas carreiras jurídicas exercem “funções essenciais à Justiça”, de acordo com a Constituição Federal. O tratamento isonômico dispensado pelo legislador constituinte às Advocacias Públicas Estaduais também é mais um argumento para que a prerrogativa da intimação pessoal seja conferida também aos Procuradores de Estado. 5. A prerrogativa da intimação pessoal do Procurador do Estado deve ser acompanhada da “vista dos autos”, tal como a prerogativa dos membros do Ministério Público e da Defensoria Pública. 6. As leis estaduais que dispõem sobre a prerrogativa da intimação pessoal para Procuradores de Estado são constitucionais, pois o tema é mero procedimento em matéria processual, portanto, de competência legislativa concorrente. 7. A previsão da prerrogativa da intimação pessoal dos Procuradores de Estado em lei federal, quando e se aprovada, vai solucionar definitivamente a questão. 8. No Congresso Nacional deve haver uma atuação uníssona das entidades de classe, dos Procuradores Gerais e dos próprios Procuradores de Estado ao menos em três vertentes: Projeto de Lei nº 7.261/02, Projeto de Lei nº 8046/10 (Novo Código de Processo Civil) e Projeto de Lei Orgânica Nacional da Advocacia Pública. 23 000333