A C Ó R D Ã O (7ª Turma) GMIGM/fs/fn RECURSO DE REVISTA - DEMISSÃO POR JUSTA CAUSA - ART. 482, B-, DA CLT - MAU COMPORTAMENTO - CARACTERIZAÇÃO. 1. Conforme estabelece o art. 482, -b-, da CLT constitui justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador a constatação de mau procedimento do empregado. 2. -In casu-, a decisão regional considerou não haver prova robusta a embasar a demissão motivada, pois, embora a evidência dos fatos trazidos pela análise das imagens por perito do juízo, não teria havido comprovação efetiva de prática de ato ilícito no ambiente de trabalho a justificar sua demissão por justa causa. 3. Ora, dos elementos fáticos e do conjunto probatório delineados no acórdão regional se percebe nitidamente o enquadramento da conduta obreira na alínea -b- do art. 482 da CLT, uma vez que se evidenciou consumo de substância entorpecente em intervalo para refeição e descanso no estabelecimento da Reclamada. Recurso de revista provido. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-93500-64.2009.5.03.0142, em que é Recorrente E & M INDÚSTRIA MECÁNICA LTDA. e Recorrido SAULO GOES LOPES. RELATÓRIo Contra o acórdão do 3º Regional que deu provimento parcial ao recurso ordinário do Reclamante (seq. 1, págs. 630-635 e 645-646), recorre a Reclamada postulando o reexame da questão relativa ao afastamento da demissão por justa causa (seq. 1, págs. 649-657); Admitido o apelo (seq. 1, págs. 663-666), foram apresentadas contrarrazões (seq. 1, págs. 673-675), tendo sido dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 83, § 2º, II, do RITST. É o relatório. V O T O I) CONHECIMENTO PRESSUPOSTOS GENÉRICOS O recurso é tempestivo (seq. 1, págs. 647 e 649) e a representação regular (seq. 1, pág. 601), com custas processuais recolhidas (seq. 1, pág. 660) e depósito recursal efetuado no valor da condenação (seq. 1, pág. 658) . 2) PRESSUPOSTOS ESPECÍFICOS DISPENSA POR JUSTA CAUSA - INCONTINÊNCIA DE CONDUTA - MAU PROCEDIMENTO - CARACTERIZAÇÃO Tese do Regional: A decisão de demissão por justa causa do Reclamante teve por fundamento, a suspeita de utilização de substância entorpecente - maconha - no estabelecimento da Reclamada. Diante de denúncia anônima feita às autoridades policiais locais, houve a instalação na Reclamada de câmeras de vídeo no local de gozo de intervalo para repouso e alimentação dos seus empregados. As gravações, por sua vez, comprovaram que houve trabalhadores da Reclamada, dentre os quais o próprio Reclamante, utilizando dois cigarros ao mesmo tempo, sendo que um deles teria sido enrolado a mão o qual era trocado constantemente pelos fumantes. Tais imagens foram submetidas, por ordem judicial, à perícia técnica que atestou não só a autenticidade das imagens (sem edições ou montagem), como também o próprio perito em depoimento pessoal afirmou, com base na análise minuciosa das imagens e por experiência própria, tratar-se a hipótese dos autos de consumo de cigarro de maconha pelo Reclamante e outros colegas. Conquanto a veracidade das imagens e opiniões embasadas a respeito, há que haver prova mais robusta a supedanear a demissão havida, pois muito embora a evidência dos fatos trazidos pela análise das imagens, não houve comprovação efetiva de prática de ato ilícito no ambiente do Empregador. Logo, -o que se tem em suma, é uma suspeita, que é séria, da prática de ilícito, mas não a certeza deste fato- (seq. 1, pág. 634). Por esse motivo, deve ser reformada a sentença para, aplicando a culpa recíproca, afastar os efeitos da demissão por justa causa, já que a Reclamada decidiu por demitir motivadamente o Reclamante com base tão somente em suspeita, enquanto que o Reclamante por haver agido de forma a fazer crer que estivesse praticando ato ilícito durante o seu intervalo para descanso e alimentação, ato este que repercute no ambiente de trabalho, dadas as consequências do uso de entorpecentes no comportamento do ser humano (seq. 1, págs. 632-635). Antítese Recursal: Restou suficientemente comprovado nos autos, através de laudo pericial e depoimento pessoal do perito, a falta gravíssima cometida pelo Reclamante ao fazer uso de substância entorpecente, durante o expediente de trabalho, o que pôs em risco não só a sua própria segurança, mas também a dos demais empregados da Reclamada, além de configurar um mau exemplo para todos os funcionários até porque se tratava de um membro da CIPA. Ademais, segundo o perito, em seu depoimento, a análise das imagens comprovaria que haveria alteração comportamental daqueles que consumiram a droga durante até cerca de uma hora, podendo haver, inclusive, devaneio pelos usuários. Tal comportamento rompe inegavelmente com a fidúcia que deve existir entre empregador e empregado, de sorte a tornar insuportável a mantença da relação empregatícia relativamente ao Obreiro. Extrai-se, portanto, do julgado recorrido, inequívoca e direta vulneração aos arts. 482, b-, e 818 da CLT, 145, 333, II, 420, 421 e 436 do CPC, além de divergir da jurisprudência de outros tribunais regionais (seq. 1, págs. 649-657). Síntese Decisória: Trata-se, nos autos, da demissão por justa causa levada a efeito pela Reclamada em face do mau proceder do Reclamante ao fazer uso de substância entorpecente, dentro do estabelecimento do Empregador e ainda durante o intervalo para descanso e alimentação. No ponto, convém ressaltar que há duas possíveis visões críticas acerca do fato trazido nos autos, qual seja, o consumo de entorpecentes no ambiente de trabalho. Sem dúvida alguma, se o olhar se desse à luz do Direito Penal - por seu natural rigor não se poderia tomar as imagens, ainda que corroboradas com a análise do experiente perito, como prova cabal e suficiente a embasar uma condenação penal, simplesmente porque, em delitos que deixam vestígios, é imprescindível a prova material que deve decorrer do próprio corpo de delito, ou seja, a análise da substância contida no cigarro mostrado nas imagens, a comprovar que se tratava de -Cannabis Sativa-. De outro norte, impende salientar que o Poder Disciplinar do Empregador, como todo e qualquer poder disciplinar, tem conteúdo e substrato mais aberto, porque se suporta em relação interpessoal e na confiança que inegavelmente deve existir entre Empregador e Empregado. Não há de se falar, aqui, em tipicidade para que o ato disciplinar lesivo seja assim compreendido. Por isso, a própria Consolidação das Leis do Trabalho enumera no art. 482 da CLT, além do mau comportamento, outras causas até menos graves da tratada aqui nos autos, suficientes a embasar a despedida motivada. Nesse sentido, a decisão regional, ao relatar que o laudo pericial concluiu que -pela análise minuciosa das imagens, gestos, expressões corporais de seus usuários e trocas sucessivas de mão em mão, infere-se como sendo característico de quem está fumando a substância entorpecente, qual seja, maconha- (seq. 1, pág. 633 - grifos no original) configurou um quadro fático seguro de que teria realmente havido o uso de entorpecente no ambiente de trabalho. Além disso, ficou comprovado pela perícia que as imagens são absolutamente autênticas e que não sofreram alterações (montagem). Acresça-se, ademais que, em depoimento pessoal, o perito asseverou, -por experiência própria, pelas atitudes e pela movimentação dos empregados que se encontravam dentro do carro, afirma com certeza absoluta que o cigarro trazido pelo quarto empregado a que se referiu tem todas as características de maconha [...]; que pelo que se foi visto disse o perito que não deixa nenhuma sombra de dúvida que o cigarro não era convencional, mas de maconha e que a forma com que os fumantes tragavam e aspergiam a fumaça demoradamente, volta a resaltar que do ponto de vista técnico não tem dúvida estarem os envolvidos fumando cigarro de maconha- (seq. 1, pág. 633 grifos no original). Dessa forma, do contexto fático probatório delineado pelo Regional, depreende-se que a Corte de origem, ao afastar a dispensa por justa causa, efetivamente violou o art. 482, b-, da CLT, porque, sem sombra de dúvidas, a conduta do Reclamante configurou -mau comportamento- a respaldar a demissão motivada. Diante de todo o exposto, conclui-se que a revista patronal enseja admissibilidade, ante a ofensa ao art. 482, -b-, da CLT, razão pela qual dela CONHEÇO. II) MÉRITO DISPENSA POR JUSTA CAUSA - INCONTINÊNCIA DE CONDUTA - MAU PROCEDIMENTO - CARACTERIZAÇÃO Conhecido o recurso de revista por violação do art. 482, b-, da CLT, seu PROVIMENTO é mero corolário para, reformando o acórdão regional, restabelecer a sentença que manteve a dispensa do Reclamante por justa causa. ISTO POSTO ACORDAM os Ministros da Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista por violação do art. 482, -b-, da CLT, e, no mérito, dar-lhe provimento para, reformando o acórdão regional, restabelecer a sentença que manteve a dispensa do Reclamante por justa causa. Brasília, 23 de maio de 2012. Firmado por assinatura digital (Lei nº 11.419/2006) Ives Gandra Martins Filho Ministro Relator fls. PROCESSO Nº TST-RR-93500-64.2009.5.03.0142 Firmado por assinatura digital em 23/05/2012 pelo sistema AssineJus da Justiça do Trabalho, nos termos da Lei nº 11.419/2006, que instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira.