25/08/2015
SEGUNDA TURMA
EXTRADIÇÃO 1.393 DISTRITO FEDERAL
: MIN. DIAS TOFFOLI
: GOVERNO DO PARAGUAI
: VILMAR ACOSTA MARQUES
: JOSÉ ELNICIO MOREIRA DE SOUZA
: HERVITAN CRISTIAN CARULLA
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RELATOR
REQTE.(S)
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RELATÓRIO
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O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI (RELATOR):
Trata-se de extradição instrutória, encaminhada pelo Ministro de
Estado da Justiça e requerida, por via diplomática, pelo Governo do
Paraguai, com base no Acordo de Extradição entre os Estados Parte do
Mercosul, promulgado pelo Decreto nº 4.975, de 30 de janeiro de 2004, em
que se pede a extradição do nacional paraguaio Vilmar Acosta Marques.
Colhe-se da Nota Verbal nº 3/055/2015 que o extraditando está sendo
processado naquele país por suposta participação em dois crimes de
homicídio doloso executados em 16/10/14 contra as vítimas Pablo Medina
Velazques e Antônia Maribel Almada Chamorro, no Departamento de
Canindeyú, República do Paraguai.
Por meio da Resolução Fiscal nº 55, de 18/10/14, o Ministério Público
do Paraguai ordenou a detenção preventiva do extraditando e solicitou ao
Juizado Penal de Garantias de Curuguaty, Departamento de Canindeyú, a
declaração de revelia e a sua detenção, por homicídio doloso (art. 105,
parágrafos 1º e 2º, incisos 2 e 4, do Código Penal Paraguaio), “em
conformidade com a ata de imputação nº 55, do dia 29 de outubro do ano
2014” (fl. 212).
Em 30/10/14, o Juizado Penal de Garantias de Curuguaty, nos autos
da “causa nº 1.527/2014”, declarou a revelia do extraditando e ordenou
sua captura, com fundamento no art. 82 do Código de Processo Penal
Paraguaio (fls. 215/218). Posteriormente, em 6/11/14, o mesmo Juizado
expediu ordem de captura internacional do extraditando (fl. 224).
Em 6/3/15, nos autos da PPE nº 741, decretei a prisão preventiva do
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extraditando, por entender preenchidos os requisitos previstos no Acordo
de Extradição entre os Estados Parte do Mercosul e, nessa mesma data, a
Polícia Federal cumpriu o respectivo mandado de prisão.
Em 9/3/15, nos termos do art. 21-A do Regimento Interno do
Supremo Tribunal Federal, deleguei competência ao Magistrado Instrutor
Rodrigo Capez, convocado para atuar em meu Gabinete, para interrogar
o extraditando.
Em 8/5/15, o extraditando foi interrogado (fls. 345/347) e apresentou
sua defesa (fls. 375/392), instruindo-a com documentos (fls. 396/530).
Sustenta o extraditando, em síntese, sua condição de brasileiro nato, por
ter nascido no município de Paranhos, Estado do Mato Grosso do Sul, em
cujo Serviço de Registro Civil foi tardiamente registrado em 5/12/88, por
ordem judicial, assim como o foram cinco de seus irmãos.
Aduz, em sua defesa, para comprovar sua nacionalidade brasileira,
que seus pais se casaram em 7/3/67 no município de Caarapó/MS e, em
12/11/81, registraram seu irmão Osmar César Marques Gonzales no
Serviço de Registro Civil de Paranhos. Acrescenta que seus próprios
filhos, Cláudio Vilmar Marques Paiva e Alex Ajala Gonzales, nascidos no
município de Paranhos em, respectivamente, 1º/1º/05 e em 25/11/97,
também são brasileiros natos.
A seu ver, o fato de seus pais, seus filhos e seus irmãos terem sido
registrados no Brasil e possuírem documentos relacionados a sua
condição de brasileiros (título de eleitor, CPF, cartão nacional de saúde),
bem como o fato de ser proprietário de uma motocicleta registrada no
Brasil, comprovariam ser ele brasileiro, tanto mais que sua cédula de
identidade foi expedida em 20/6/2000 pela Secretaria de Segurança
Pública do Mato Grosso do Sul, ao passo que sua cédula de identificação
paraguaia foi expedida, posteriormente, em 19/12/03.
Alega, ainda, a falsidade de seu registro civil no Paraguai, aduzindo
que ele próprio mandou falsificá-lo e o utilizou para eleger-se vereador e
prefeito da cidade paraguaia de Ypejhu. Insurge-se, ainda, contra as
certidões supostamente comprobatórias de seu nascimento no Paraguai,
apresentadas pelo Estado Requerente.
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Ante o exposto, requer o indeferimento do pedido de extradição.
O Procurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot Monteiro de
Barros, opinou pelo deferimento do pedido de extradição (fls. 534/579).
Assevera Sua Excelência, em seu parecer, que todas as provas
indicam que o extraditando é nacional paraguaio e que seu assento de
nascimento no Registro Civil de Paranhos/MS, por ser ideologicamente
falso, foi cancelado por decisão do juízo da Vara Única da Comarca de
Sete Quedas/MS, que antecipou os efeitos da tutela jurisdicional em ação
anulatória de registro civil proposta pelo Ministério Público, o que afasta
a presunção de sua veracidade.
Considerando-se que a Procuradoria-Geral da República, em seu
parecer, juntou novos documentos, determinei à defesa que sobre eles se
manifestasse no prazo de 3 (três) dias.
O extraditando se manifestou por intermédio da petição nº 32.050/15
– STF, reiterando sua condição de brasileiro nato, nos termos do art. 12, I,
da Constituição Federal, por haver nascido no Brasil, mais precisamente
no domicílio de Pedro Dembinski, conforme depoimento por si prestado,
na condição de testemunha, perante o juízo da Vara de Sete Quedas, nos
autos da ação anulatória de registro civil. Requer, outrossim, seja
requisitada ao referido juízo cópia da gravação dessa audiência (fls.
573/580).
Por intermédio da petição nº 36.439/15, a Procuradoria-Geral da
República, informou que “novos documentos, obtidos após o parecer
oferecido nessa extradição tornam inequívoca a falsidade do registro
brasileiro”, esclarecendo que, por determinação do Tribunal de Justiça de
Mato Grosso do Sul, foi expedido ofício ao Hospital Municipal de
Paranhos/MS para que informasse se a genitora do extraditando nele teria
sido atendida nos anos de 1974, 1975 e 1976, sendo que a resposta foi
negativa. Por fim, com relação ao extraditando, o mesmo hospital
informou haver o registro de seu atendimento apenas em 29/2/08.
À vista dessa petição e dos novos documentos que a instruíram,
determinei que a defesa sobre eles se manifestasse em 3 (três) dias.
A Secretaria Judiciária certificou o decurso, in albis, do prazo
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assinalado à defesa.
Por intermédio da petição nº 41.454/15 – STF, a defesa do
extraditando alegou ter sido errônea a intimação do advogado José
Elnício Moreira de Souza, OAB/MS nº 6.275, para se manifestar sobre os
novos documentos apresentados pela Procuradoria-Geral da República,
ao fundamento de que referido advogado substabeleceu seus poderes ao
advogado Hervitan Cristian Carulla, OAB/MT nº 19.133.
Requereu, ainda, fosse realizada nova intimação, na pessoa desse
último, para a manifestação em questão (fls. 639/641).
Esse pedido foi por mim indeferido, pelos seguintes fundamentos:
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“Conforme se observa do instrumento de fl. 346, o
advogado José Elnício Moreira de Souza, OAB/MS nº 6.275
substabeleceu, com reserva de iguais poderes, o mandato ao
advogado Hervitan Cristian Carulla, OAB/MT nº 19.133.
Válida, portanto, a intimação feita em nome do primeiro
advogado.
Como já tive a oportunidade de assentar, realizada a
intimação em nome de advogado constituído pelo réu, que teria
outorgado substabelecimento, com reserva de poderes, a outro
defensor,
‘(...) inegável a jurisprudência da Corte no sentido de
que, ‘quando a parte tem mais de um advogado, basta que
a intimação seja realizada em nome de um deles. Se o
advogado, ao outorgar o substabelecimento com reserva
de poderes, não o faz para o substabelecido acompanhar
especificamente a tramitação do processo na superior
instância e nem, tampouco, requer que o nome dele figure
nas publicações, inclusive para efeito de intimação,
pertinentes ao julgamento da causa, reputa-se inocorrente
a invalidade da intimação’ (HC nº 79.592/MT, Primeira
Turma, Relator o Ministro Ilmar Galvão, DJ de 12/5/2000).
No mesmo sentido o MS nº 21.209/DF-AgR, Tribunal
Pleno, Relator o Ministro Nelson Jobim, DJ de 3/12/04’
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(RHC 118.132/SP, Primeira Turma, de minha relatoria, DJe
de 29/11/13).
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Ademais, ‘nos termos da orientação firmada nesta Corte, é
válida a intimação realizada em nome de um dos advogados
constituídos pela parte, sendo desnecessária a intimação de
todos eles’ (AI nº 726.743/MG-AgR, Segunda Turma, Relator o
Ministro Joaquim Barbosa, DJe de 5/4/11).
Registro que, no substabelecimento, além da reserva de
iguais poderes, não se ressalvou que as intimações deveriam
ser feitas exclusivamente na pessoa do advogado
substabelecido, o que afasta a pretendida nulidade da
intimação.
No mesmo sentido, destaco trecho do voto condutor do
HC nº 114.846/SP-ED, Primeira Turma, Relator o Ministro
Roberto Barroso, DJe de 19/12/14):
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‘Conclui-se, portanto, que no substabelecimento não
foi mencionado que as intimações deveriam ser
exclusivamente no nome do impetrante e, assim, poderia
haver intimação no nome de qualquer advogado
constituído. Nessa linha é jurisprudência desta Corte que
considera ‘válida a intimação das decisões que inadmitiram os
recursos extraordinário e especial interpostos pela defesa em
nome de um dos advogados constituídos pela Paciente, uma vez
que, pelos documentos dos autos, não há pedido expresso para
intimação exclusiva no nome do Impetrante’ (HC 102.575. Rel.ª
Min.ª Cármen Lúcia)’.
Registro, por fim, que a defesa do extraditando, por
intermédio da petição nº 41.455/15-STF, subscrita pelo
advogado substabelecido, efetivamente se manifestou sobre
os novos documentos juntados pelo Ministério Público
Federal, o que torna prejudicado o pedido de renovação do
prazo para essa finalidade” (grifei).
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A defesa do extraditando, por intermédio da referida petição nº
41.455/15-STF, após se manifestar sobre os documentos apresentados pela
Procuradoria-Geral da República, reiterou o pleito de indeferimento do
pedido extradicional, aduzindo que, além de ser brasileiro nato pelo
critério do jus solis, por ter nascido em território brasileiro (art. 12, I, a,
CF), também o seria pelo critério do jus sanguinis, ao fundamento de que
seus pais são brasileiros e se casaram em 7/3/67, na cidade de Caarapó,
Mato Grosso do Sul (fls. 645/667).
É o relatório.
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VOTO
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O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI (RELATOR):
Conforme relatado, trata-se de extradição instrutória requerida pelo
Governo do Paraguai fundada em título prisional preventivo expedido
em desfavor do extraditando Vilmar Acosta Marques no país requerente.
De acordo com a Nota Verbal nº 3/055/2015, o extraditando está
sendo processado naquele país por ter sido o suposto mandante de dois
homicídios qualificados executados em 16/10/14 contra as vítimas Pablo
Medina Velazques e Antônia Maribel Almada Chamorro, no
Departamento de Canindeyú, República do Paraguai.
Preliminarmente, indefiro a conversão do julgamento em
diligência requerida pelo extraditando (fls. 579/580) para a requisição de
mídia contendo a gravação da audiência realizada na ação anulatória de
seu registro civil brasileiro, uma vez que a defesa já promoveu a juntada
dos termos de depoimentos prestados pelas testemunhas de seu interesse
(fls. 581/590).
A providência reclamada, portanto, é irrelevante para a instrução do
feito.
Superada essa preliminar, a questão a ser enfrentada, por ser
prejudicial ao exame de mérito, é a da nacionalidade do extraditando.
O extraditando confessou ter dois assentos de nascimento: o
primeiro, lavrado no Paraguai, em nome de Vilmar Acosta Marques, e o
segundo, lavrado muitos anos anos depois, no Brasil, em nome de Vilmar
Marques Gonzales.
Como os dois registros apontam que o extraditando nasceu, na
mesma data, em ambos os países, a impossibilidade lógica de sua
coexistência é manifesta.
Os peritos da Polícia Federal, por meio de exame papiloscópico,
constataram que as individuais datiloscópicas do extraditando
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identificam-se com as de Vilmar Marques Gonzales, identificado
civilmente no Estado de Mato Grosso do Sul sob nº 1.345.939/SSP (vide
laudo da perícia papiloscópica nº 15/2015 no apenso 01).
Os peritos, apesar da baixa qualidade da digitalização das
individuais datiloscópicas em nome de Vilmar Acosta Marques,
encaminhadas pela INTERPOL, comprovaram ainda “que a classificação
datiloscópica das impressões digitais do prontuário em nome de
VILMAR MARQUES GONZALES é coincidente com a classificação
primária das impressões digitais constantes na individual datiloscópica
em nome de VILMAR ACOSTA MARQUES” (vide laudo pericial nº
3/2015, às fls. 16/17, e laudo de perícia papiloscópica nº 15/2015, no
apenso 01, grifo nosso).
É incontroverso, portanto, que o suposto nacional brasileiro
Vilmar Marques Gonzales e o suposto nacional paraguaio Vilmar
Acosta Marques são a mesma pessoa.
Resta saber se é verdadeiro o assento de nascimento lavrado no
Brasil, o que se erigiria em óbice à extradição, haja vista que, nos termos
do art. 5º, LI, da Constituição Federal,
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“nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado,
em caso de crime comum, praticado antes da naturalização ou
de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, na forma da lei”.
A resposta é desenganadoramente negativa.
Nos termos do art. 1.604 do Código Civil, “ninguém pode vindicar
estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo
provando-se erro ou falsidade do registro”.
Na Ext. nº 1.141/República Oriental do Uruguai-QO, Pleno, Relatora
a Ministra Cármen Lúcia, DJ de 7/10/14, discutiu-se a existência de
dúvida a respeito da nacionalidade do extraditando, registrado
civilmente no Uruguai, cinco anos após o seu nascimento, e no Brasil,
dezesseis anos após o seu nascimento.
Nesse julgamento, observou o Ministro Celso de Mello que
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“(...) o extraditando suscitou uma questão prejudicial,
que é altamente relevante, porque concerne à alegada
titularidade, por ele, da condição jurídica de brasileiro nato.
Essa questão prejudicial, se acolhida, representará
insuperável obstáculo ao conhecimento da ação de extradição
passiva, pois encontra fundamento na própria Constituição, que
proclama a inextraditabilidade do brasileiro nato (CF, art. 5º,
inciso LI).
Como aqui salientou o eminente Ministro CEZAR
PELUSO, o registro civil produz todos os seus efeitos
enquanto não for desconstituído. Essa é uma regra básica que
prevalece em matéria registral. Há, aí, uma presunção ‘juris
tantum’, meramente relativa, de legitimidade do ato registral.
A cessação da eficácia jurídica do assento de nascimento
em causa, lavrado por órgão competente do Registro Civil das
Pessoas Naturais, depende, para efetivar-se, de desconstituição
ordenada por autoridade judiciária.
Até que sobrevenha essa desconstituição judicial,
subsiste, no que concerne ao mencionado assento de
nascimento, a presunção de legitimidade e de veracidade de
referido ato estatal, cuja fé pública – é importante salientar – é
resguardada pela própria Constituição Federal, como resulta
claro da norma inscrita em seu art. 19, inciso II.
Considerada a presunção de legitimidade e de veracidade
que resulta do ato registral em questão, tenho sérias dúvidas a
propósito da subsistência da prisão cautelar, mesmo aquela de
caráter domiciliar, do ora extraditando, pois milita, em favor
deste, a condição jurídica de brasileiro nato, como o evidencia
certidão de nascimento extraída do Registro Civil das Pessoas
Naturais de Bento Gonçalves/RS”.
E, mais adiante, aduziu que
“[a] questão básica consiste em saber se o assento de
nascimento, ainda que tardiamente lavrado em órgão
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competente do Registro Civil das Pessoas Naturais no Estado
do Rio Grande do Sul, teria sido, ou não, desconstituído por
decisão judicial, pois, enquanto tal não ocorrer, esse ato
registral produzirá todos os seus efeitos jurídicos, notadamente
aquele que atribui a condição de brasileiro nato à pessoa a que
se refere”.
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Na espécie, o juízo da Vara Única da Comarca de Sete Quedas/MS,
em ação anulatória de registro civil ajuizada pelo Parquet estadual,
deferiu pleito de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional e cancelou
o assento de nascimento do extraditando no Brasil, in verbis:
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“Trata-se de ação anulatória de registro civil ajuizada pelo
Ministério Público Estadual em face de Vilmar Acosta Marques,
paraguaio, que atualmente encontra-se no prédio da Polícia
Federal em Campo Grande. Aduziu, em apertada síntese, que o
requerido é paraguaio e foi registrado naquele país na cidade
de Ypehu, tendo nascido no dia 13.07.1975, filho de Vidal
Acosta e Eva Marques de Acosta. Acontece que além da
certidão de nascimento paraguaia, o requerido possui certidão
de nascimento brasileira, desta feita com o nome de Vilmar
Marques Gonzales, com a mesma data de nascimento e nome
dos pais, apenas com a menção de que o nascimento ocorreu na
cidade de Paranhos.
Apontou ainda como prova de que o requerido é
paraguaio e a certidão de nascimento brasileira não condiz com
a realidade o fato dele ter ocupado até pouco tempo atrás o
cargo de representante do executivo da cidade paraguaia de
Ipehu, dele saindo apenas após ser acusado pelos órgãos de
segurança pública do Paraguai de ser o mandante do
assassinato do jornalista Pablo Medina e da estudante de
jornalismo Maribel Almada.
Pediu tutela antecipada para anular o registro civil do
requerido, diante da sua inveracidade. Com a inicial vieram
documentos.
(…)
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No caso em tela não há dúvida de que o assento de
nascimento lavrado perante o cartório de registro civil de
Paranhos é inválido, na medida em que não representa a
realidade.
Primeiro, há de se apontar a existência de certidão de
nascimento feita no Paraguai, mais precisamente em Ypehu
(cidade que faz fronteira seca com Paranhos) apontando
nascimento de Vilmar Acosta Marques no dia 13.07.1975, filho
de Vidal Acosta e Eva Marques de Acosta, sendo tal documento
emitido em 09.12.1978.
De outro lado, consta no registro civil de Paranhos o
assento - que se pretende anular - de Vilmar Marques Gonzales,
filho de Vidal Acosta Gonzales e Eva Marques Gonzales,
também nascido no dia 13.07.1975, mas do lado de cá da
fronteira, na cidade de Paranhos, pertencente a esta comarca. O
documento brasileiro foi feito em 05.12.1988, diante de processo
de registro tardio.
Em que pese pequena diferença do nome do autor e de
seus pais entre o registro paraguaio e o brasileiro, decorrente
basicamente da inserção na certidão brasileira do sobrenome
Gonzales, dúvida não paira de que se trata da mesma pessoa.
O laudo pericial feito pela Polícia Federal, ainda que
diante da baixa qualidade da digitalização do documento
oriundo do Paraguai, não tenha feito o confronto integral,
aponta que as classificações datiloscópicas primárias são
coincidentes, entre o documento de identificação civil feito no
Paraguai por Vilmar Acosta Marques e no Brasil por Vilmar
Marques Gonzales.
Reforça ainda mais a presente convicção o fato de que
seria uma extrema coincidência duas pessoas com nome
praticamente iguais, com nome dos pais praticamente iguais,
terem nascido no mesmo dia, cada qual de um lado da
fronteira, mormente na década de 1970, oportunidade em que a
região era ainda menos povoada.
O requerido ao depor na Polícia Federal diz que nasceu no
Hospital de Paranhos, informação que não corresponde [à] de
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sua certidão de nascimento, onde figura nascimento em
domicílio paterno. Aliás, pouco crível o registro tardio de
criança nascida em hospital.
Segue agora o maior fundamento para ter a certeza de que
o requerido é paraguaio, não brasileiro, pois além de seu
registro de nascimento ter sido feito no Paraguai muito antes do
que no Brasil, o próprio requerido admitiu que já foi vereador e
prefeito de Ypehu, o que somente poderia acontecer se fosse
paraguaio. Também no depoimento prestado perante a Polícia
Federal na data de hoje o requerido admite que deixou o cargo
de prefeito diante da acusação de ser o mandante do
assassinato de um jornalista e uma estudante de jornalismo.
Basta uma simples conferida nos sítios do Paraguai para
conferir que o prefeito de Ypehu que foragiu após ser acusado
de mandante de crime de homicídio é a pessoa de Vilmar
Acosta, conhecido pelo apelido de Neneco, não o seu nome
brasileiro Vilmar Marques Gonzales.
Não pode, infelizmente seja bastante comum nesta região
de fronteira, sobretudo diante da generosidade da avaliação da
prova no registro tardio no afã de facilitar o acesso à cidadania
das pessoas, o sujeito nascido na República do Paraguai e lá
registrado, ter outro documento de registro civil, como se
nascido fosse em território brasileiro.
Eis, mais que demonstrada, a verossimilhança.
O fundado receito de dano irreparável ou de difícil
reparação também está presente, na medida em que há
necessidade de desconstituição do assento de nascimento em
questão para que seja levado a cabo o procedimento de
extradição do réu, para que em território paraguaio responda às
acusações que lhe são dirigidas.
Ante o exposto, defiro o pleito de antecipação dos efeitos
da tutela jurisdicional para o fim de cancelar o assento de
nascimento de Vilmar Marques Gonzales, filho de Vidal Acosta
Gonzales e Eva Marques Gonzales, nascido aos 13.07.1975,
matrícula n° 0628440255 1988 1 00007 123 0004348 96.”
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Desta feita, diversamente da controvérsia retratada na citada Ext nº
1.141/República Oriental do Uruguai-QO, a validade do registro civil do
extraditando no Brasil é objeto de ação própria na Justiça Comum
Estadual e os efeitos que dele emanam foram suspensos por decisão
judicial.
Como foi judicialmente afastada a presunção juris tantum de
veracidade do ato registrário brasileiro, por decisão que, embora
provisória, continua a projetar seus efeitos, não há óbice à análise do
mérito do pedido de extradição.
Nesse particular, embora esta não seja a sede própria para a
determinação da real nacionalidade do extraditando, inúmeros
elementos de prova constantes destes autos reforçam a convicção de
que ele é natural do Paraguai, corroborando a decisão de primeiro grau
pelo cancelamento de seu registro civil tardio brasileiro.
De acordo com a Direção Geral do Registro do Estado Civil do
Ministério da Justiça do Paraguai, o extraditando Vilmar Acosta Marques,
filho de Vidal Acosta e de Eva Marques de Acosta, nasceu em 13 de julho
de 1975 na cidade de Ypejhu, no Paraguai, e foi registrado naquele
órgão em 9 de dezembro de 1978 (vide certidões de “ata de nascimento”
às fls. 100 e 102 e as respectivas traduções às fls. 101 e 103).
Diversamente do que sustenta a defesa, não há qualquer dúvida de
que 9 de dezembro de 1978 é a efetiva data da inscrição do extraditando
no registro civil paraguaio.
Com efeito, a data de 17 de março de 1988, constante da certidão de
nascimento de fl. 102, é tão somente a data de emissão desse documento.
Por óbvio, a data de emissão de certidão de nascimento não se
confunde com a data da lavratura do próprio assento de nascimento.
E não é só.
O extraditando é eleitor inscrito na Justiça Eleitoral paraguaia (fl.
139) e, em 2/3/90, foi registrado civilmente, sob nº 2.675.907, no
Departamento de Identificações da Polícia do Paraguai, constando desse
registro que ele nasceu em Ypejhu, naquele País, em 13 de julho de 1975
(fl. 96).
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Outrossim, o extraditando foi vereador, na legislatura 2006/2010, e
Prefeito, de 2010 a 2014, da cidade de Ypejhu, no Paraguai. Não obstante
esse último mandato se estendesse a 2015, o extraditando abandonou o
cargo e se evadiu do Paraguai, após a decretação de sua prisão preventiva
pelos homicídios a ele ora imputados.
Observo que sua eleição para Prefeito de Ypejhu foi impugnada pelo
candidato oponente, ao fundamento de que teria dupla nacionalidade,
brasileira e paraguaia.
Na contestação apresentada ao Tribunal Eleitoral Paraguaio, o
extraditando asseverou que era paraguaio nato e se chamaria Vilmar
Acosta Marques, negando, por outro lado, que se chamasse Vilmar
Marques Gonzales e fosse brasileiro (fls. 154/160).
Aliás, o extraditando constituiu, por instrumento público, os
advogados que o defenderam naquela causa eleitoral e, perante a “escrivã
juramentada” (tabeliã), identificou-se como o paraguaio Vilmar Acosta
Marques, apresentando cédula de identidade paraguaia (fls. 161/162).
Também ao ser ouvido pelo Ministério Público do Paraguai em
investigações referentes a outros homicídios, o extraditando, em duas
ocasiões distintas (17/2/11 e 18/2/11), qualificou-se como Vilmar Acosta
Marquez, paraguaio, natural de Ypejhú (fls. 199 e 202).
Ao propor ação penal privada contra o jornalista Pablo Medina, por
crimes contra sua honra, o extraditando, mais uma vez, qualificou-se
como paraguaio, assinando a peça inicial conjuntamente com seu
advogado (fls. 110/120).
Ao ser interrogado, o extraditando procurou fazer crer que nasceu
em Paranhos/MS, mas admitiu que nunca estudou no Brasil e que
somente frequentou escolas paraguaias. Acrescentou que seu pai reside,
de longa data, no Paraguai, onde também residia sua falecida mãe.
Outrossim, o único imóvel de que é titular, conforme declarou ao ser
interrogado, situa-se no Paraguai.
O extraditando, em sua defesa, alega que seu registro civil paraguaio
é falso, mas a justificativa por ele apresentada para essa suposta falsidade
é pueril.
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Em seu interrogatório, ao ser indagado sobre o motivo de ter sido
registrado no Paraguai, o extraditando alegou que, “na época, vendia leite
na rua” e o registrador paraguaio era seu cliente. “Todo dia ele brincava
comigo e um dia perguntou se eu tinha registro e eu falei que não”.
“Quando eu tinha doze anos ele emitiu esse documento”. Alegou que,
embora feito esse registro em 1988, ele foi falsamente antedatado para
1978.
Essa versão, além de inverossímil, é mendaz, por contrastar com a
data em que, consoante já exposto, foi lavrado o seu assento civil no
Paraguai: 9 de dezembro de 1978, quando tinha apenas três anos de
idade. Conforme também já demonstrado, 1988 é, tão somente, o ano de
emissão de uma das certidões de nascimento paraguaias que instruem o
presente feito, e não o ano de lavratura do respectivo assento.
À vista de tão robustos elementos de convicção, o extraditando,
indubitavelmente, é paraguaio nato, por ter nascido em solo paraguaio.
Não se olvida que, por decisão do Juiz de Direito Paulo César
Ferreira da Silva, da Comarca de Amambaí, Mato Grosso do Sul (à qual, à
época, pertencia o Município de Paranhos) foi lavrado, em 5 de
dezembro de 1988, o assento tardio de nascimento do extraditando no
Serviço de Registro Civil de Paranhos, onde foi registrado como Vilmar
Marques Gonzales, filho de Vidal Acosta Gonzales e de Eva Dias
Marques, nascido em 13 de julho de 1978, em Paranhos, no domicílio
materno (fls. 395/400).
Esse registro, todavia, como já exposto, foi cancelado por decisão
que antecipou os efeitos da tutela jurisdicional em ação anulatória de
registro civil proposta pelo Ministério Público.
Por sua vez, embora, na averbação feita à margem do assento de
nascimento, conste que o “registro foi feito de acordo com o despacho do
MM. Juiz de Direito Dr. Paulo César Pereira da Silva, da Comarca de
Amambaí, em 09-11-88, arquivado neste Cartório” (fl. 400), o oficial do
registro, sintomaticamente, não encontrou em seus arquivos o
requerimento de registro tardio e nem a decisão que o autorizou (fls.
397/398 e fl. 73 dos autos da PPE nº 741).
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E não é só: o distribuidor da Comarca de Amambaí também não
registra qualquer feito em nome do extraditando (fl. 74 dos autos da PPE
nº 741).
É certo que, de acordo com o registrador civil de Paranhos, o juiz
corregedor dessa serventia, àquela época, despachava no próprio
requerimento de registro tardio e o devolvia ao registrador, sem maiores
formalidades, para arquivamento em pasta própria.
Ocorre que, como ressaltado, essa pasta também não foi localizada
(fl. 399).
Sintomático, ainda, que o extraditando, ao ser ouvido na Polícia
Federal, tenha declarado haver nascido no hospital de Paranhos/MS,
quando o registro tardio de nascimento brasileiro aponta que ele teria
nascido no domicílio materno, supostamente situado naquele município.
Nesse particular, o extraditando, ao ser interrogado em juízo na
presente extradição, alegou ter nascido no domicílio materno, em
Paranhos.
Ocorre que a defesa promoveu a juntada de termo de depoimento de
Pedro Dembinski, testemunha de defesa nos autos da ação anulatória de
registro civil do extraditando, que apresentou uma terceira e inovadora
versão: a de que o extraditando teria nascido no domicílio dessa
testemunha (fls. 589/590).
Por sua vez, o Hospital Municipal de Paranhos/MS, de acordo com
novos documentos apresentados pelo Procurador-Geral da República,
informou não haver nenhum registro de atendimento de Eva Marques
Gonzalez, genitora do extraditando, nos anos de 1974, 1975 e 1976 (fls.
627/628).
Todas essas contradições evidenciam, uma vez mais, a falsidade do
registro tardio brasileiro do extraditando, e sepultam a versão de que
teria nascido no Brasil.
Também não se olvida que a defesa, em abono à tese de que o
extraditando seria brasileiro nato, apresentou fotocópias de certidão de
casamento e de cédulas de identidade (fls. 405/409) para demonstrar que
seu pai, Vidal Acosta Gonzalez, seria natural de Ponta Porã/MS; sua mãe,
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Eva Dias Marques, seria natural de Caarapó/MS e que ambos teriam se
casado no Serviço de Registro Civil de Caarapó.
Ocorre que a certidão de fl. 107 comprova que a avó paterna do
extraditando, Francisca Rosa González de Acosta, é paraguaia, natural de
Ypejhu, mesmo município em que nasceu o extraditando, e registrou seu
filho Vidal (pai do extraditando), em 9 de outubro de 1948, no serviço
de registro civil de Ypejhu, declarando que ele havia nascido em sua
casa, naquela localidade.
Logo, além de fundada dúvida a respeito da nacionalidade brasileira
de seu pai, o que milita em seu desfavor, há prova documental de que o
extraditando, seu genitor e sua avó paterna são paraguaios e nasceram
em Ypejhu.
Todas essas dúvidas se estendem, inevitavelmente, à própria
identidade de sua genitora.
O fato de, conforme sustenta sua defesa, o extraditando haver
recebido atendimento médico em hospital de Paranhos/MS em 2006, 2008
e 2009, e de ter dois filhos nascidos nesse município (fls. 426 e 429) não
infirma a conclusão de que o extraditando é natural de Ypejhu, até porque
essas cidades são contíguas, possibilitando a fronteira seca rápido e fácil
deslocamento entre ambas.
O próprio extraditando, ao ser interrogado, declarou que, embora
residisse no Paraguai, sempre buscava atendimento médico em Paranhos,
porque Ypejhu não tinha hospital.
Analogamente, o fato de ter, no Brasil, cédula de identidade (RG),
inscrição no cadastro de pessoa física (CPF) e título eleitoral (fls. 434/435)
não abona a tese da nacionalidade brasileira, haja vista que se trata de
documentos baseados no falso registro tardio brasileiro.
Como bem salientado pela Procuradoria-Geral da República em seu
parecer,
“[i]nfelizmente, necessário consignar ser evento comum
estrangeiros residentes na faixa de fronteira, fraudulentamente,
conseguirem registro de nascimento no Brasil com o fito de
usufruir dos serviços públicos brasileiros, principalmente os de
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saúde e previdência, e até mesmo para envolvimento no tráfico
ilícito de entorpecentes e de armas na faixa internacional de
fronteira”.
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O extraditando, repise-se, teve seu assento de nascimento lavrado no
Paraguai apenas três anos após seu nascimento, foi registrado civilmente
na Polícia do Paraguai, sempre estudou nesse país, onde viveu a maior
parte de sua vida, é eleitor paraguaio e foi eleito vereador e prefeito
naquele País, com base em sua nacionalidade paraguaia.
O extraditando, portanto, sempre gozou, em sua plenitude, da
nacionalidade paraguaia, a qual, agora, convenientemente, após se
evadir para o Brasil em razão dos graves crimes a ele imputados, rejeita.
Por sua vez, a precedência do registro paraguaio sobre o registro
brasileiro, com uma diferença de dez anos entre ambos, reforça a
convicção de que o extraditando é paraguaio nato, ao que se soma a
circunstância de seu pai ter requerido o registro tardio no Brasil do
extraditando e de seus cinco irmãos de cambulhada (vide declaração do
oficial de registro civil de Paranhos à fl. 73 dos autos da PPE nº 741), os
quais, do mesmo modo que o extraditando, já haviam sido
precedentemente registrados no Paraguai (fls. 550/566).
A esse respeito, confira-se: Osmar César Acosta Marquez, nascido
em 2/11/81 em Ipejhu, foi registrado civilmente no Paraguai em 17/4/82
(fl. 552); Lorenzo Acosta Marquez, nascido em Ipejhu em 10/8/79, foi
registrado civilmente no Paraguai em 10/9/80 (fl. 555); Elio Acosta
Marquez, nascido em Ipejhu em 25/9/76, foi registrado civilmente no
Paraguai em 9/12/78 (fl. 558); Francisca Acosta Marquez, nascida em
Ipejhu em 9/3/69, foi registrada civilmente no Paraguai em 26/12/73 (fl.
561) e Cecília Acosta Marquez, nascida em Ipejhu em 1º/2/74, foi
registrada civilmente no Paraguai em 9/12/78 (fl. 561).
Como se vê, o extraditando e seus irmãos (todos filhos do mesmo
pai e da mesma mãe), nasceram em Ipejhu e foram registrados no
Paraguai, em datas diversas e relativamente próximas a seu nascimento,
com larguíssima antecedência em relação ao registro civil tardio de
todos eles no Brasil, realizado de cambulhada, repita-se, numa mesma
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data, muitos anos após seu nascimento.
Todos esses fatos, aos quais se acresce a existência de decisão judicial
em que, embora provisoriamente, se cancelou seu registro de nascimento
brasileiro, ao fundamento de sua falsidade, corroboram, uma vez mais, a
conclusão de que o extraditando é paraguaio nato.
Superada a questão da nacionalidade, passo ao exame de mérito da
extradição.
Por meio da Resolução Fiscal nº 55, de 18/10/14, o Ministério Público
do Paraguai ordenou a detenção preventiva do extraditando e solicitou ao
Juizado Penal de Garantias de Curuguaty, Departamento de Canindeyú,
“em conformidade com a ata de imputação nº 55, do dia 29 de outubro do
ano 2014”, a declaração de revelia e a sua detenção, por homicídio
qualificado, nos termos do art. 105, §§ 1º e 2º, incisos 2º (“a ação coloc[ou]
em perigo imediato a vida de terceiros”) e 4º (“de forma traiçoeira,
aproveitando intencionalmente a condição indefesa da vítima”), do
Código Penal Paraguaio (fl. 212).
Em 30/10/14, o Juizado Penal de Garantias de Curuguaty, nos autos
da “causa nº 1.527/2014”, declarou a revelia do extraditando e ordenou
sua prisão, com fundamento no art. 82 do Código de Processo Penal
Paraguaio (fls. 215/218). Posteriormente, em 6/11/14, o mesmo Juizado
expediu ordem de captura internacional do extraditando (fl. 224).
Os crimes ora imputados ao extraditando foram descritos na
Resolução Fiscal nº 55 do Ministério Público do Paraguai (fls. 207/210).
Por sua vez, o pedido de extradição formulado pelo Juizado Penal de
Garantias de Curuguaty narra minudentemente as circunstâncias em que
os crimes foram praticados:
““Segundo o Ministério Público, VILMAR ACOSTA
MARQUES, com o apelido NENECO, de nacionalidade
paraguaia, de 39 anos de idade, estado civil solteiro, nascido no
dia 13 de julho de 1975, na localidade de Ypejhu, domiciliado no
bairro Virgen dei Rosário da cidade de Ypejhu, com cédula de
identidade nº 2.552.777, filho de Vidal Acosta e Eva Marquez;
mantinha uma inimizade com PABLO MEDINA VELAZQUEZ,
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paraguaio, solteiro, de 58 anos de idade, com documento de
identidade Nº 709184, domiciliado na cidade de Curuguaty,
jornalista, correspondente do jornal ABC COLOR e vítima do
crime de homicídio.
A mencionada inimizade devia-se a que Pablo Medina
realizava constantes publicações jornalísticas contra Vilmar
Acosta, a quem lhe atribuía supostas vinculações com o
narcotráfico na zona, estas publicações foram feitas antes de sua
eleição como Prefeito da cidade de Ypejhú e continuaram as
publicações estando Vilmar Acosta em tal cargo. Por causa de
tais publicações o senhor PABLO MEDINA teria recebido
ameaças de morte por parte do senhor VILMAR ACOSTA
MARQUES.
Pelos indícios e elementos coletados existentes na pasta de
investigação, o Ministério Público sustenta que Vilmar Acosta
Marques teria mandado chamar o seu irmão WILSON ACOSTA
MARQUES do Brasil para que, junto a seu sobrinho FLAVIO
ACOSTA, planificassem e realizassem o homicídio de PABLO
MEDINA VELAZQUEZ.
Assim sendo, tal plano foi executado no dia 16 de outubro
do ano de 2014, quando PABLO MEDINA VELAZQUEZ, sua
assistente ANTONIA MARIBEL ALMADA CHAMORRO e a
irmã da mesma JUANA RUTH ALMADA CHAMORRO,
retornavam da colônia Crescendo González do Departamento
de Canindeyú, depois de tirarem fotografias das pragas que
atacavam o cultivo na zona.
Nesse sentido, sendo aproximadamente as 14:10 horas do
dia 16 de outubro de 2014, a uma distância de oito quilômetros
antes de chegar à zona urbana da cidade de Villa Ygatimí,
Departamento de Canindeyú, República do Paraguai, num
caminho dessa zona que liga esta cidade e a Colônia Ko'e Porá,
WILSON ACOSTA MARQUES e FLAVIO ACOSTA, utilizando
vestimenta militar, haviam interceptado a caminhonete marca
MITSUBISHI, modelo L200, de cor branca, com chapa Nº ABC033, conduzida por Pablo Medina.
Uma vez que o Senhor Pablo Medina deteve a marcha
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acreditando que se tratavam de militares, estas pessoas que
seriam WILSON ACOSTA MARQUES e FLAVIO ACOSTA
perguntaram se ele era Pablo Medina, o qual respondeu que
sim era, e sem dizer mais realizaram vários disparos contra o
chofer Pablo Medina, tais tiros também impactaram ANTONIA
MARIBEL ALMADA CHAMORRO, a qual estava no banco
dianteiro. Uma vez executados todos os tiros possíveis para ter
como segura a morte de Pablo, ambas pessoas fugiram.
Uma vez comunicado o fato, o agente fiscal se constituiu
no local do acontecimento, acompanhado do médico forense de
turno Dr. Malías Arce, quem constatou que PABLO MEDINA já
não apresentava sinais de vida, o corpo foi encontrado sentado
no banco do motorista dentro do veículo; enquanto que
ANTONIA MARIBEL ALMADA CHAMORRO, quem estava
sentada no banco do passageiro e, ainda apresentava sinais de
vida, pelo que foi derivada ao hospital de Curuguaty onde
chegou sem sinais de vida.
Entretanto, JUANA RUTH
ALMADA CHAMORRO quem estava no banco de trás não
apresentava lesões de bala, dado que pôde se jogar ao chão da
caminhonete.
Os corpos de PABLO MEDINA VELAZQUEZ e
ANTONIA MARIBEL ALMADA CHAMORRO foram
remetidos ao necrotério do hospital de Curuguaty, onde foi
realizada a autopsia. O Médico Forense concluiu como causa da
morte de ambas as vítimas "Destruição da massa encefálica por
disparos de arma de tiro". Igualmente, segundo o informe da
Divisão Criminalista da Polícia Nacional o Sr, Pablo Medina
recebeu impactos de projétil calibre 9mm e disparos de escopeta
calibre 12mm e a senhorita Antonia Almada tinha recebido
impactos de bala de 9mm.
Assim sendo, perante o Ministério Público, prestou
declaração como testemunha JUANA RUTH ALMADA
CHAMORRO, única sobrevivente, quem relatou as
circunstâncias de como aconteceu o fato; igualmente esta
testemunha realizou um Reconhecimento de Pessoas por
fotografias, em caráter de Antecipação Jurisdicional de Prova
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(Prova Antecipada). E assim que, de todas as fotos mostradas
para JUANA ALMADA sobre os possíveis participantes do
crime de HOMICÍDIO DOLOSO, ela reconheceu o rosto de um
dos sujeitos que dispararam contra PABLO MEDINA e
ANTONIA ALMADA, tal fotografia corresponde a WILSON
ACOSTA MARQUES, quem logo foi imputado e cuja revelia foi
solicitada por Requerimento Fiscal nº 55 de data 16/10/14, o
mesmo, até a presente data encontra-se foragido e com ordem
de captura internacional.
Com relação à inimizade existente entre a vítima PABLO
MEDINA VELAZQUEZ e VILMAR ACOSTA MARQUES
existem vários elementos, como são as constantes publicações
nas quais Pablo o atribuía como suposto nexo com o tráfico de
drogas na zona de fronteira com o Brasil e o cometimento cie
alguns crimes de homicídio na zona de Vil Ia Ygatimí e Ypejhú.
Segundo a informação dada pela Polícia Nacional, logrouse identificar a FLAVIO ACOSTA RIVERO como o outro
participante do homicídio. Nesse sentido, o pessoal policial
designado para a investigação entrevistou um morador das
redondezas do lugar do crime, quem manifestou ter visto
FLAVIO ACOSTA RIVEROS na casa de um vizinho seu, a quem
o escutou perguntar se o motorista da caminhonete que passava
nesse momento era PABLO MEDINA[.]
Por outro lado, Flavio Acosta, uma vez que confirmou que
a pessoa que dirigia a caminhonete era Pablo Medina, teria
ligada para Wilson Acosta e Vilmar Acosta para comunicar-lhes
esta informação. Esta afirmação se desprende do registro e
intercâmbios de ligações telefônicas com que conta o Ministério
Público.
Uma vez cumprida com esta missão de acompanhamento,
por instrução de VILMAR COSTA MARQUES, Flavio Acosta
seguiu a caminhonete de Pablo Medina, ultrapassou a mesma e
foi encontrar-se com Wilson Acosta, para esperar a passagem
da caminhonete da vítima. Enquanto isso Vilmar Acosta ficou
na cidade de Ypejhú, esperando a ligação de confirmação do
homicídio de Pablo Medina.
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Cabe assinalar que mediante as evidências coletadas foi
possível confirmar que houve várias comunicações entre os
imputados, antes, durante e de maneira posterior ao
cometimento do crime. FLAVIO ACOSTA utilizava o número
telefônico 0982-677482, para comunicar-se constantemente com
VILMAR ACOSTA MARQUES, enquanto que este utilizava o
número telefônico N° 0981-758591, cujo titular da linha era seu
chofer Arnaldo Javier Cabrera López enquanto que WILSON
ACOSTA MARQUES utilizava a linha telefônica Nº 0985-686
890.
No dia 08 de dezembro de 2014, sendo aproximadamente
08:00 horas foi detido ARNALDO JAVIER CABRERA LOPEZ
(chofer de Vilmar Acosta Marques) imputado na presente
causa, quem no momento de dar sua declaração manifestou que
no dia 16/10/2014, sendo aproximadamente as 11:00 horas
recebeu no número 0981-758591 a ligação de FLAVIO ACOSTA
quem lhe solicitou que passasse a comunicação com Vilmar
Acosta. Acrescentou que escutou a comunicação entre os
citados onde FLAVIO, escutou que confirmou a VILMAR que o
senhor PABLO MEDINA estava na zona, desde esse momento
ficou com seu telefone celular. Posteriormente, Vilmar chamou
Wilson perguntando-lhe se terminou com ‘o trabalho’, e em
seguida escutou Vilmar dizer ‘beleza pura’ e desligou a ligação.
Igualmente recalcou que o aparelho celular com o número
citado era utilizado pelo seu patrão o cidadão paraguaio
VILMAR ACOSTA MARQUES.
Também pôde-se confirmar as localizações dos celulares
de FLAVIO ACOSTA, WILSON ACOSTA e VILMAR ACOSTA
MARQUES, mediante o relatório das antenas ou células das
telefonias. Em tal sentido, conforme esta análise, Flavio Acosta e
Wilson Acosta foram localizados no lugar e hora do crime,
enquanto que Vilmar Acosta Marques foi localizado na cidade
de Ypejhú na hora em que aconteceu o crime.
Portanto, de acordo com as diligências realizadas na
presente causa, para o Ministério Público surgem sérias
suspeitas sobre a participação de VILMAR ACOSTA
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MARQUES no crime de Homicídio contra Pablo Medina e
Antonia Almada, fato em que também estão envolvidos como
autores diretos: WILSON ACOSTA MARQUES e FLAVIO
ACOSTA RIVEROS. Conforme o exposto sustenta-se que
VILMAR ACOSTA MARQUES teria mandado seu irmão
WILSON ACOSTA MARQUES e a seu sobrinho FLAVIO
ACOSTA RIVEROS, para que acab[ass]em com a vida de
PABLO MEDINA, os quais assim o realizaram.”
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O pedido de extradição, portanto, foi devidamente instruído pelo
Estado requerente com cópia da ordem de prisão expedida por
autoridade judiciária competente, havendo indicações seguras a respeito
do local, da data, da natureza e das circunstâncias dos fatos delituosos
(art. 80 da Lei nº 6.815/80 e art. 18 do Acordo de Extradição entre os
Estados Partes do Mercosul).
O Estado requerente possui competência para a instrução e o
julgamento dos crimes imputados ao extraditando, descritos nos
documentos que instruem a Nota Verbal nº 3/055/2015, pois eles foram
praticados em seu território (art. 78, I, da Lei nº 6.815/80).
Os crimes também não possuem qualquer conotação política,
afastando-se, portanto, a vedação do art. 77 da Lei nº 6.815/80 e do art. 5º
do Acordo de Extradição entre os Estados Parte do Mercosul.
Neste particular, na Ext. 524, Pleno, Relator o Ministro Celso de
Mello, DJ de 8/3/91, ressaltou-se que
“a noção de criminalidade política é ampla. Os autores
costumam analisá-la em face de posições doutrinárias que
reduzem a teoria do crime político a um dualismo conceitual,
que distingue, de um lado, o crime político absoluto ou puro (é
o crime político em sentido próprio) e, de outro, o crime
político relativo ou misto (é o delito político em sentido
impróprio). Aquele, traduzindo-se em ações que atinjam a
personalidade do Estado, ou que buscam alterar-lhe ou afetarlhe a ordem política e social (Manoel Gonçalves Ferreira Filho,
op. cit., p. 609; Francisco de Assis Toledo, ‘Princípios básicos de
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Direito Penal’, p. 135, item 119, 3ª ed., 1997, inter plures); este –
o crime político em sentido impróprio – embora exprimindo
uma concreta motivação político-social de seu agente, projeta-se
em comportamentos geradores de uma lesão jurídica de índole
comum”.
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Por sua vez, na Ext. 1.085, Pleno, Relator o Ministro Cezar Peluso,
DJe de 16/4/10, o Supremo Tribunal Federal decidiu que homicídio
praticado em plena normalidade institucional de Estado Democrático de
direito, desvestido de propósito político imediato ou conotação de reação
legítima a regime opressivo, não caracteriza crime político. Transcrevo, na
parte que interessa, a ementa desse julgado:
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“EXTRADIÇÃO.
Passiva.
Crime
político.
Não
caracterização. Quatro homicídios qualificados, cometidos por
membro de organização revolucionária clandestina. Prática
sob império e normalidade institucional de Estado
Democrático de direito, sem conotação de reação legítima
contra atos arbitrários ou tirânicos. Carência de motivação
política. Crimes comuns configurados. Preliminar rejeitada.
Voto vencido. Não configura crime político, para fim de obstar
a acolhimento de pedido de homicídio praticado por membro
de organização revolucionária clandestina, em plena
normalidade institucional de Estado Democrático de direito,
sem nenhum propósito político imediato ou conotação de
reação legítima a regime opressivo (...)”.
Como destacado no voto condutor desse acórdão, em lição
inteiramente aplicável à espécie,
“(...) a natureza dos delitos pelos quais o extraditando foi
condenado, marcados sobremaneira pela absoluta carência de
motivação política, intensa premeditação, extrema violência e
grave intimidação social, não se afeiçoa de modo algum ao
modelo conceptual de delito político que impede a extradição
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de súditos estrangeiros, ao menos nos contornos definidos e
consolidados pela Corte nos precedentes já mencionados (EXT
nº 493, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de 03.08.1990;
EXT nº 694, Rel. Min. SYDNEY SANCHES, DJ de 22.08.1997;
EXT nº 794, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, DJ de 24.05.2002 e
EXT nº 994, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, DJ de 04.08.2006).
(...)
Os homicídios dolosos, cometidos com premeditação pelo
ora extraditando, não guardam relação próxima nem remota
com fins altruístas que caracterizam movimentos políticos
voltados à implantação de nova ordem econômica e social.
Revelam, antes, puro intuito de vingança pessoal, enquanto
praticados contra dois policiais, cujas funções eram exercidas
em presídios que abrigavam presos políticos e comuns (i), e
dois comerciantes que teriam reagido a anteriores tentativas de
assalto a seus estabelecimentos (ii)”.
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Nesse contexto, e não obstante o extraditando, ao ser interrogado,
tenha procurado dar coloração política às acusações contra ele deduzidas,
não resta a menor dúvida de os crimes a ele imputados (homicídios de
um jornalista e de sua assistente, mediante recurso que impossibilitou a
sua defesa), são despidos de natureza política e se inserem na
criminalidade comum.
O requisito da dupla tipicidade foi preenchido, haja vista que os
fatos encontram correspondência no art. 121, § 2º, IV, do Código Penal
Brasileiro.
Também se encontra presente o requisito da dupla punibilidade,
haja vista que não ocorreu a prescrição da pretensão punitiva sob a óptica
da legislação de nenhum dos Estados (art. 77, VI, da Lei nº 6.815/80 e art.
9º do Acordo de Extradição).
O homicídio doloso, em sua forma qualificada, é punido, nos termos
do art. 105, §§ 1º e 2º, do Código Penal Paraguaio, com pena máxima de
trinta anos.
Outrossim, de acordo com o art. 102, § 1º, do Código Penal
Paraguaio, a prescrição da pretensão punitiva se verifica em quinze anos,
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quando prevista pena máxima igual ou superior a quinze anos; em três
anos, quando prevista pena privativa de liberdade de até três anos ou
multa e, nos demais casos, no mesmo tempo da pena máxima privativa
de liberdade (fl. 253).
Como os fatos imputados ao extraditando ocorreram em 16/10/14
não ocorreu, segundo a legislação paraguaia, prescrição.
Do mesmo modo, à luz da legislação brasileira, não se operou essa
causa de extinção da punibilidade, uma vez que a pena máxima
cominada ao homicídio doloso qualificado também é de trinta anos de
reclusão (art. 121, § 2º, IV, do Código Penal), cuja prescrição se verifica,
nos termos do art. 109, I, do Código Penal, em vinte anos.
Portanto, sob todos os ângulos, não há que se falar em prescrição da
pretensão punitiva.
O extraditando, ao ser interrogado, negou ter sido o mandante do
duplo homicídio, alegando que essa imputação deriva do fato de ter
movido uma ação penal contra a vítima Pablo por crimes contra sua
honra. Disse que sofria perseguição política, acrescentando que era do
Partido Colorado, ao passo que a referida vítima era do partido Liberal,
de oposição.
Descabe, todavia, incursionar no mérito dessas alegações.
Esta Suprema Corte tem, reiteradamente, assinalado que
“o modelo extradicional vigente no Brasil – que consagra o
sistema de contenciosidade limitada, fundado em norma legal
(Estatuto do Estrangeiro, art. 85, § 1º) reputada compatível com
o texto da Constituição da República (RTJ 105/4-5 - RTJ 160/433434 - RTJ 161/409-411 - RTJ 183/42-43 - Ext 811/República do
Peru) – não autoriza que se renove, no âmbito da ação de
extradição passiva promovida perante o Supremo Tribunal
Federal, o litígio penal que lhe deu origem, nem que se efetive o
reexame do quadro probatório ou a discussão sobre o mérito da
acusação ou da condenação emanadas de órgão competente do
Estado estrangeiro” (Ext nº 866/PT, Tribunal Pleno, Relator o
Ministro Celso de Mello, DJ de 13/2/04).
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Perfilhando esse entendimento, destaco, também, os seguintes
precedentes:
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“EXTRADIÇÃO. GOVERNO DA ITÁLIA. FORMAÇÃO
DE QUADRILHA VOLTADA AO TRÁFICO ILÍCITO DE
ENTORPECENTES,
CONCURSO
EM
EXTORSÃO
E
CONCURSO EM LESÕES GRAVES. EXTRADITANDO QUE
POSSUI DOENÇA MENTAL ATESTADA POR LAUDO.
PRELIMINAR
DE
PREJUDICIALIDADE
AFASTADA.
ANÁLISE QUE CABE AO ESTADO REQUERENTE.
PRESENÇA DA DUPLA TIPICIDADE. INOCORRÊNCIA DE
EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE, TANTO PELA LEI
BRASILEIRA COMO PELA LEI ITALIANA QUANTO AOS
FATOS RELATIVOS AOS MANDADOS DE PRISÃO
EXPEDIDOS PELA JUSTIÇA ITALIANA. AUSÊNCIA DE
ÓBICE AO DEFERIMENTO DA EXTRADIÇÃO. PRESCRIÇÃO
DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA RECONHECIDA, NOS
TERMOS
DA LEGISLAÇÃO
BRASILEIRA.
PEDIDO
PARCIALMENTE DEFERIDO. 1. Os crimes de tráfico ilícito de
substâncias entorpecentes, associação para o tráfico, extorsão e
lesões graves, pelos quais o extraditando foi condenado na
Itália, encontram tipos penais correspondentes no ordenamento
jurídico brasileiro. Presente, portanto, o requisito da dupla
tipicidade. 2. Não cabe a esta Corte examinar matéria atinente à
eventual inimputabilidade do extraditando, pois no Brasil o
processo extradicional se pauta pelo princípio da
contenciosidade limitada. Cabe ao Estado requerente a análise
sobre aplicação de pena ou medida de segurança ao
extraditando. 3. A prescrição da pretensão executória regulada
pela pena residual em caso de fuga não admite o cômputo do
tempo de prisão provisória. Precedentes. Prescrição consumada
em 11.06.2006, em relação à sentença penal condenatória
proferida pela justiça italiana em 11.06.1994, nos termos da
legislação brasileira. 4. Prescrição não ocorrida, porém, à luz da
legislação brasileira, tampouco nos termos da lei italiana,
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quanto aos fatos que deram origem aos mandados de prisão
expedidos pela justiça italiana. 5. Pedido de extradição
parcialmente deferido” (Ext nº 932/IT, Tribunal Pleno, Relator o
Ministro Joaquim Barbosa, DJ de 28/3/08 - grifos nossos);
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“EXTRADIÇÃO PASSIVA DE CARÁTER EXECUTÓRIO INEXISTÊNCIA DE TRATADO DE EXTRADIÇÃO ENTRE O
BRASIL E A REPÚBLICA TCHECA - PROMESSA DE
RECIPROCIDADE - FUNDAMENTO JURÍDICO SUFICIENTE
- DUPLA TIPICIDADE - CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DO
DELITO DE ESTELIONATO - PRETENDIDA NULIDADE DO
JULGAMENTO
DO
EXTRADITANDO,
PORQUE
ALEGADAMENTE REALIZADO SOB A ÉGIDE DE REGIME
AUTORITÁRIO - INOCORRÊNCIA - ALEGAÇÃO DE
AUSÊNCIA DE FAIR TRIAL E DE JULGAMENTO POLÍTICO
AFIRMAÇÃO
INCONSISTENTE
PRETENDIDA
DISCUSSÃO SOBRE A PROVA PENAL PRODUZIDA
PERANTE TRIBUNAL DO ESTADO REQUERENTE INADMISSIBILIDADE - SISTEMA DE CONTENCIOSIDADE
LIMITADA - EXTRADIÇÃO DEFERIDA. INEXISTÊNCIA DE
TRATADO DE EXTRADIÇÃO E OFERECIMENTO DE
PROMESSA DE RECIPROCIDADE POR PARTE DO ESTADO
REQUERENTE. - A inexistência de tratado de extradição não
impede a formulação e o eventual atendimento do pleito
extradicional, desde que o Estado requerente prometa
reciprocidade de tratamento ao Brasil, mediante expediente
(Nota Verbal) formalmente transmitido por via diplomática.
Doutrina. Precedentes. EXTRADIÇÃO E RESPEITO AOS
DIREITOS HUMANOS: PARADIGMA ÉTICO-JURÍDICO CUJA
OBSERVÂNCIA CONDICIONA O DEFERIMENTO DO
PEDIDO EXTRADICIONAL. - A essencialidade da cooperação
internacional na repressão penal aos delitos comuns não
exonera o Estado brasileiro – e, em particular, o Supremo
Tribunal Federal – de velar pelo respeito aos direitos
fundamentais do súdito estrangeiro que venha a sofrer, em
nosso País, processo extradicional instaurado por iniciativa de
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qualquer Estado estrangeiro. O extraditando assume, no
processo extradicional, a condição indisponível de sujeito de
direitos, cuja intangibilidade há de ser preservada pelo Estado a
que foi dirigido o pedido de extradição (o Brasil, no caso). - O
Supremo Tribunal Federal não deve autorizar a extradição, se se
demonstrar que o ordenamento jurídico do Estado estrangeiro
que a requer não se revela capaz de assegurar, aos réus, em
juízo criminal, os direitos básicos que resultam do postulado do
due process of law (RTJ 134/56-58 - RTJ 177/485-488),
notadamente as prerrogativas inerentes à garantia da ampla
defesa, à garantia do contraditório, à igualdade entre as partes
perante o juiz natural e à garantia de imparcialidade do
magistrado processante. Demonstração, no caso, de que o
regime político que informa as instituições do Estado
requerente reveste-se de caráter democrático, assegurador das
liberdades públicas fundamentais. EXTRADIÇÃO E DUPLA
TIPICIDADE. - A possível diversidade formal concernente ao
nomen juris das entidades delituosas não atua como causa
obstativa da extradição, desde que o fato imputado constitua
crime sob a dupla perspectiva dos ordenamentos jurídicos
vigentes no Brasil e no Estado estrangeiro que requer a
efetivação da medida extradicional. O postulado da dupla
tipicidade – por constituir requisito essencial ao atendimento
do pedido de extradição – impõe que o ilícito penal atribuído ao
extraditando seja juridicamente qualificado como crime tanto
no Brasil quanto no Estado requerente, sendo irrelevante, para
esse específico efeito, a eventual variação terminológica
registrada nas leis penais em confronto. O que realmente
importa, na aferição do postulado da dupla tipicidade, é a
presença dos elementos estruturantes do tipo penal (essentialia
delicti), tais como definidos nos preceitos primários de
incriminação constantes da legislação brasileira e vigentes no
ordenamento
positivo
do
Estado
requerente,
independentemente da designação formal por eles atribuída
aos fatos delituosos. PROCESSO EXTRADICIONAL E
SISTEMA
DE
CONTENCIOSIDADE
LIMITADA:
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INADMISSIBILIDADE DE DISCUSSÃO SOBRE A PROVA
PENAL PRODUZIDA PERANTE O TRIBUNAL DO ESTADO
REQUERENTE. - A ação de extradição passiva não confere, ao
Supremo Tribunal Federal, qualquer poder de indagação sobre
o mérito da pretensão deduzida pelo Estado requerente ou
sobre o contexto probatório em que a postulação extradicional
se apóia. - O sistema de contenciosidade limitada, que
caracteriza o regime jurídico da extradição passiva no direito
positivo brasileiro (RTJ 140/436 - RTJ 160/105 - RTJ 161/409-411 RTJ 170/746-747 - RTJ 183/42-43), não permite qualquer
indagação probatória pertinente ao ilícito criminal cuja
persecução, no exterior, justificou o ajuizamento da demanda
extradicional perante o Supremo Tribunal Federal. Revelar-se-á
excepcionalmente possível, no entanto, a análise, pelo Supremo
Tribunal Federal, de aspectos materiais concernentes à própria
substância da imputação penal, sempre que tal exame se
mostrar indispensável à solução de controvérsia pertinente (a) à
ocorrência de prescrição penal, (b) à observância do princípio
da dupla tipicidade ou (c) à configuração eventualmente
política tanto do delito atribuído ao extraditando quanto das
razões que levaram o Estado estrangeiro a requerer a extradição
de determinada pessoa ao Governo brasileiro” (Ext nº 897/TC,
Tribunal Pleno, Relator o Ministro Celso de Mello, DJ de
18/2/05 - grifos nossos).
Nesse sentido ainda, o magistério de Mirtô Fraga, para quem,
“ao apreciar a legalidade e a procedência do pedido, o
Supremo examina os pressupostos (art. 77) e as condições (art.
78) da extradição. Não se manifesta sobre o mérito do pedido,
não aprecia a justiça ou injustiça da condenação ou do processo
no Estado requerente (...)” (O Novo Estatuto do Estrangeiro
Comentado. 1. ed. Editora Forense, Rio de Janeiro, 1985, p. 336).
Por fim, nos termos da Súmula nº 421 do Supremo Tribunal Federal,
“não impede a extradição a circunstância de ser o extraditando casado
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com brasileira ou ter filho brasileiro”.
Irrelevante, portanto, para fins de extradição, o fato de o
extraditando ter dois filhos brasileiros.
Nesse sentido, Ext. nº 1.074/RFA, Pleno, Relator o Ministro Celso de
Mello, DJe de 13/6/08, de cuja ementa destaco:
sã
o
“EXISTÊNCIA DE FAMÍLIA BRASILEIRA (UNIÃO
ESTÁVEL),
NOTADAMENTE
DE
FILHO
COM
NACIONALIDADE BRASILEIRA ORIGINÁRIA – SITUAÇÃO
QUE NÃO IMPEDE A EXTRADIÇÃO – COMPATIBILIDADE
DA SÚMULA 421/STF COM A VIGENTE CONSTITUIÇÃO
DA REPÚBLICA – PEDIDO DE EXTRADIÇÃO DEFERIDO.
re
vi
- A existência de relações familiares, a comprovação de
vínculo conjugal ou a convivência ‘more uxorio’ do extraditando
com pessoa de nacionalidade brasileira constituem fatos
destituídos de relevância jurídica para efeitos extradicionais,
não impedindo, em conseqüência, a efetivação da extradição
do súdito estrangeiro. Precedentes.
Em
- Não impede a extradição o fato de o súdito estrangeiro
ser casado ou viver em união estável com pessoa de
nacionalidade brasileira, ainda que com esta possua filho
brasileiro.
- A Súmula 421/STF revela-se compatível com a vigente
Constituição da República, pois, em tema de cooperação
internacional na repressão a atos de criminalidade comum, a
existência de vínculos conjugais e/ou familiares com pessoas de
nacionalidade brasileira não se qualifica como causa obstativa
da extradição. Precedentes.”
Portanto, de acordo com minha compreensão, estão presentes os
requisitos legais necessários ao deferimento da extradição.
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Ante o exposto, defiro o pedido de extradição.
Na hipótese de eventual condenação do extraditando pelos crimes
que motivaram o pedido extradicional, o Estado Requerente deverá
efetuar a detração do tempo de prisão ao qual ele tiver sido submetido no
Brasil, conforme previsto no art. 91, II, da Lei nº 6.815/80 e no art. 17 do
Acordo de Extradição entre os Estados Partes do Mercosul, observandose, para esse fim, que o extraditando foi preso, preventivamente, em 6 de
março de 2015.
É como voto.
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Leia a íntegra do relatório e voto do relator