2 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 O QUE CONTAM AS CRIANÇAS SOBRE AS ESCOLAS DA INFÂNCIA: APORTES TEÓRICOS SOBRE AS NARRATIVAS NA PESQUISA COM CRIANÇAS Maria da Conceição Passeggi (UFRN) Ecleide Cunico Furlanetto (UNICID) Iduína Mont ‘Alverne Braun Chaves (UFF) Luciane De Conti (UFPE) Maria Estela Costa Holanda Campelo (UFRN) Marineide de Oliveira Gomes (Unifesp –GRU) Simone Maria da Rocha (Doutoranda - PPGEd-UFRN) Resumo A comunicação refere-se à parte de pesquisa interinstitucional denominada: “Narrativas Infantis: o que contam as crianças sobre as escolas da infância? Que busca dar visibilidade às vozes das crianças como atores sociais, legitimando-as como seres capazes de refletir sobre suas experiências. Pressupomos que para se pensar a melhoria da educação básica no Brasil e ampliar a compreensão dos processos formativos docentes é necessário dar visibilidade às vozes das crianças. Narrando, as crianças ressignificam a pré-escola e os anos iniciais do ensino fundamental (escolas da infância) e contribuem com novos elementos para sua compreensão. A pesquisa visa compreender as significações construídas narrativamente por crianças de 04 a 10 anos de idade acerca das escolas da infância em municípios de quatro estados da federação: Natal|RN; São Paulo|SP; Recife |PE e Niterói|RJ, com vistas a obter subsídios para a elaboração de dispositivos de mediação pedagógica na formação de professores. Nesta apresentação, abordaremos os aportes teóricos do trabalho com narrativas infantis, como um tema contemporâneo importante na formação de professores que servirá para apoiar, posteriormente, uma articulação que sustente reflexões sobre infâncias e narrativas. Guiamo-nos por uma visão de educação integral, não segmentada e hierarquizada em um contexto nacional de expansão do atendimento na pré-escola e de implementação do ensino fundamental de nove anos. Iniciamos o texto com uma contextualização da pesquisa, situando uma concepção sobre criança e infâncias no âmbito das políticas públicas educacionais e alicerçando nossa opção metodológica na importância do recurso das narrativas com crianças pequenas. Finalizamos com possibilidades na formação de professores pela via da escuta das narrativas das crianças, na convicção de que esse viés se apresenta como um caminho profícuo para o favorecimento de ambientes narrativos nesses espaços institucionais, contribuindo para uma reflexão acerca das funções das escolas da infância e das Políticas Públicas nessa área. Palavras-chave: narrativas; escolas da infância; crianças como sujeitos. Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.003153 3 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 Introdução A presente comunicação insere-se no contexto da pesquisa: « Narrativas infantis. O que contam as crianças sobre as escolas da infância ? ». A investigação parte do pressuposto de que para se pensar na melhoria da Educação Básica no Brasil e se avançar na perspectiva da formação docente é necessário dar visibilidade às vozes das novas gerações dos atores sociais que ingressam na escola, possibilitando que falem das instituições educacionais reais por elas frequentadas. Larrosa lembra que a infância desestabiliza « a segurança de nossos saberes, questiona o poder de nossas práticas e abre um vazio em que se abisma o edifício bem construído de nossas instituições de acolhimento » (2010, p. 184). Pelo viés da criança, mira-se a educação básica no Brasil, que parece estar longe de atender às demandas da sociedade atual. Segundo Gatti (2011), sempre se privilegiou como objetivo da escola pública, no Brasil, a formação de mão de obra barata. Concepção que não mais atende às mudanças no mundo do trabalho, que se ressente deste descompasso na atual fase de desenvolvimento do país. Para que a educação básica possa contribuir para a construção de um tecido social que acolha as necessidades de seus partícipes, é necessário que se instale socialmente uma discussão com vistas a definir as finalidades das instituições escolares e evitar que seus problemas e desafios sejam enfrentados apenas com leis, decretos e normas. Concordamos com Gatti et al (2011), que a educação escolar deve ser prioridade das políticas públicas, considerando-se que ela se constitui essencialmente um fator de preservação humana e de coesão social. A proposta de investigação foi elaborada conjuntamente por pesquisadores que têm vínculos de pesquisa tecidos em torno das narrativas, como método de pesquisa e prática de formação, nas áreas de Psicologia e Educação, em perspectivas complementares. Sob esse ponto de vista, a investigação assume como objetivo principal: compreender as significações construídas narrativamente por crianç as de 04 a 10 anos de idade acerca das escolas da infância em municípios de quatro estados da federação: Natal|RN; São Paulo|SP; Recife|PE; Niterói|RJ, visando obter subsídios para a elaboração de dispositivos de mediação pedagógica na formação de professores. Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.003154 4 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 A presente proposta, ao contemplar crianças de 4 a 10 anos de idade, visa a compreender a criança em seu duplo estatuto: o de criança pequena que ingressa num mundo cultural mais amplo que a família e o de aluno como sujeito de sua formação intelectual e pessoal (SACRISTÁN, 2005). Parte-se do princípio que permeia toda a proposta: para a criança pequena, as formas de narrar a vida constituem um espaço de reconstrução do mundo e da maneira como ela o vê, a partir da especificidade de seu olhar globalizante, sincrético e holístico. O recurso às narrativas infantis, na perspectiva da abordagem qualitativa de pesquisa, apresenta-se, como o traçado metodológico adequado tendo em vista a natureza do problema investigado, os objetivos do estudo, a subjetividade dos dados e a flexibilidade das etapas da pesquisa (TRIVIÑOS, 1992). A pesquisa, ora apresentada, trabalha com um tema recorrente na contemporaneidade; as narrativas. Inclui as crianças pequenas como sujeitos ativos de direitos e não como objetos de pesquisa, cujas vozes são excluídas das Políticas Educacionais do primeiro segmento da educação básica no Brasil, em crescente processo de expansão e universalização, preconizadas na Emenda Constitucional n. 59/2009 e nas metas do Projeto de Lei do Plano Nacional de Educação (PL 8.035/2010). Os resultados da pesquisa visam identificar elementos suscetíveis de promoverem novos caminhos para o acolhimento da criança nas escolas da infância, por parte dos professores. Estima-se que a dimensão heurística da narrativa constitua para os participantes um legado para a vida, pelo estímulo à reflexão conjunta e ao redimensionamento de suas representações sobre si e a cultura escolar. Como parte inicial da pesquisa, foi realizada uma revisão de literatura com vistas a ampliar a compreensão a respeito de infâncias e narrativas infantis. Pretende-se nesse painel discutir as bases teórico-metodológicas que dão sustentação à investigação referida. Crianças, infâncias e políticas públicas educacionais Conforme afirmamos, compreender a criança como agente social tem sido a tônica de diversos autores, sobretudo, no campo da Sociologia da Infância e da Educação, cujos trabalhos exemplares servem de marco teórico para pesquisa, como esta, que envolve crianças, sobretudo as pequenas, a pautar-se em uma ética própria, com formas metodológicas adaptadas às condições e possibilidades desses sujeitos que Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.003155 5 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 são, desde que nascem, concebendo-a como crianças cidadãs, que fruem e recriam direito. Intencionamos com a pesquisa – em andamento - olhar a infância de modo a levar em conta a alteridade da criança (nas escolas da infância: educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental), legitimando-a como ser capaz de refletir ao narrar sobre suas experiências e, por essa via, trazer informações importantes sobre as escolas da infância e sobre a criança-sujeito. A reflexividade na infância, sobre a qual se baseia a presente proposta, permeia as diferentes abordagens realizadas nos últimos anos por pesquisadores preocupados em conferir à criança o estatuto de sujeito de direito, conforme atestam as publicações mais recentes nessa área. Em termos do corte etário - 04 a 10 anos - das crianças participantes deste trabalho, dois níveis da educação básica - educação infantil e ensino fundamental - serão aqui considerados. No que tange aos níveis iniciais da educação básica, o registro mais relevante dos últimos tempos tem sido a antecipação do ensino fundamental para seis anos de idade e a sua ampliação para nove anos de duração. Embora seja recente a obrigatoriedade de tais medidas, a motivação antiga nesse sentido é notória em muitos documentos oficiais da política educacional brasileira, conforme assinalam inúmeras publicações do MEC (BRASIL, 2004; BRASIL, 2006a; BRASIL, 2006b; BEAUCHAMP; PAGEL; NASCIMENTO, 2007, dentre outras). Portanto, o crescente interesse pela efetivação da antecipação e/ou ampliação do ensino obrigatório pode ser constatado em importantes documentos legais, como: a LDB (EN) 4.024/1961, que determinava a duração mínima de quatro anos para o ensino obrigatório - o primário -, mas criava a possibilidade de os sistemas de ensino ampliarem essa duração para até seis anos (artigos 26 e 27; e Parágrafo Único do Art. 26); a LDB (EN) 5.692/1971 que estendeu a obrigatoriedade do ensino de 1º grau para oito anos, atendendo alunos na faixa etária de 7-14 anos (Art.20), mas antecipando a possibilidade dos sistemas de ensino normatizarem acerca do ingresso de crianças com menos de sete anos de idade nesse nível de ensino (§ 1º do Art. 19); a LDB (EN) 9.394/1996 que manteve os oito anos de obrigatoriedade do ensino fundamental (Art.32), mas acenou para a matrícula facultativa de crianças de seis anos de idade nesse nível de ensino (inciso I; § 3º do Art. 87); o Plano Nacional de Educação do período 2001-2010 (Lei Federal nº 10.172/2001) que definiu como uma das metas relativas ao ensino fundamental, a sua ampliação para nove anos e a antecipação do seu início para a criança de seis anos de idade; a Lei Federal nº 11.114/2005 que alterou alguns artigos da atual LDB(EN), com o objetivo de Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.003156 6 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 tornar obrigatório o início do Ensino Fundamental aos seis anos de idade, porém sem definir a sua ampliação para nove anos; a Lei Federal nº 11.274/2006 que, de fato, instituiu o ensino fundamental de nove anos, com matrícula obrigatória para a criança de seis anos de idade. Convém registrar que, em decorrência da decisão política de antecipação/ampliação do ensino fundamental, têm sido imprescindíveis inúmeras tomadas de decisão, conforme assinalam estudos realizados no sudeste do país, por Moro (2009) e Samways e Saveli (2011) e outra investigação sobre a temática, empreendida por Silva (2010) no nordeste brasileiro, dentre outros. Destaca-se, no âmbito dessa questão, que as medidas de caráter administrativo e/ou burocrático são necessárias, mas insuficientes, uma vez que os princípios e intenções subjacentes e motivadores das referidas decisões políticas trazem implicações e desafios pedagógicos a serem enfrentados em toda a educação básica. Ressalta-se, porém, que tais implicações e desafios são mais prementes e pertinentes nos níveis concernentes à educação da infância, bem como nos anos finais do ensino fundamental, uma vez que a transição da educação infantil para o ensino fundamental e, no interior deste, a passagem da criança dos anos iniciais para os anos finais do ensino obrigatório são momentos que devem ser marcados por “[...] continuidade e ampliação, em vez de rupturas e negação” (BRASIL, 2004, p. 20), sejam com relação aos “saberes de experiência feitos”, sejam com relação a contextos socioafetivos e aprendizagens (in)formais anteriores. Em especial, o momento que atravessamos de perspectivas de universalização da pré-escola, de aumento em 50% da oferta de atendimento em creches (segundo as metas do Plano Nacional de Educação – PL 8.035/2010) e do desafio da implementação com qualidade social, do ensino fundamental de nove anos, entendemos que pesquisas que mirem as vozes e as narrativas de crianças de 0 a 10 anos de idade sobre as significações que têm de escola, contribuem para superar uma visão de criança como objeto de pesquisa, anunciam possibilidades metodológicas para a efetivação do discurso da criança como sujeito de direitos. Trata-se aqui de pensar a escola com as crianças e não pelas crianças. Certamente, as narrativas produzidas pelas crianças sobre as escolas da infância trarão elementos importantes para o debate sobre a formação de professores e as identidades docentes desses profissionais, que são plurais e construídas em espaços e tempos diferenciados (GOMES, 2009). Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.003157 7 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 As crianças como sujeitos de pesquisa e as narrativas como tema contemporâneo As Políticas Públicas para a Infância, de maneira geral, consideram, como interlocutores os adultos, seja pela necessidade dos serviços ou pelas demandas sociais. Foi assim nos casos da história das creches e das pré-escolas no Brasil. São muito recentes, entre nós, estudos e pesquisas que garantam a centralidade da criança-sujeito e a compreendam na sua inteireza e globalidade de corpo e de pensamento, movimento e emoção e, especialmente, pelo reconhecimento de suas formas específicas de ver e representar o mundo, por meio das narrativas. A reflexividade na infância, sobre a qual se baseia a presente proposta, permeia as diferentes abordagens realizadas nos últimos anos por pesquisadores preocupados em conferir à criança o estatuto de sujeito de direito, conforme atestam as publicações mais recentes nessa área. Os trabalhos de Corsaro (2009); Cruz (2008); Delalande et al (2006); Müller e Carvalho (2009) e Pino (2005), entre muitos outros, em diferentes países, sinalizam essa (r)evolução que vem operando a passagem da representação da criança como ser incompleto e imperfeito, que a tornava « invisível », para aquela de sujeito-ator que insere sua palavra no discurso social. O que hoje se chama de ‘culturas infantis’, aqui vale lembrar que, antes de tais autores, Florestan Fernandes, na década de 1940 no Brasil, já apontava a perspectiva empírica da criança enquanto agente social, ao investigar as diferentes formas de produção cultural pelas crianças, em um bairro de São Paulo, sem, contudo ter formulado teoricamente tal descoberta., mas, o que valida e legitima a palavra da criança pequena, não mais um infante que tem, no adulto, um porta voz do seu discurso? Pino (2005) aponta o caminho fecundo, introduzido por Vygotsky, na Psicologia, quando considera o caráter cultural do psiquismo humano. A consciência emerge mediante artefatos semióticos, entre os quais a linguagem verbal, culturalmente herdada. É pela apropriação da linguagem que a criança dota-se da possibilidade de se desdobrar como objeto de reflexão e como ser reflexivo, como espectador e espetáculo, como pensador e objeto pensado. Essa cisão entre o ser e a representação do ser, mediada pela(s) linguagem(s), confere um modo próprio de existência ao humano: a capacidade de voltar-se para si mesmo como um outro. Compete à pesquisa educacional tomar como objeto de estudo essa capacidade de reflexão que emerge na infância, Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.003158 8 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 enquanto “marca do humano”, e problematizar suas repercussões para pensar o desenvolvimento da criança, o papel da pré-escola e da escola e a produção do conhecimento que repercutam significativamente nas políticas públicas educacionais que se voltam para a infância. No campo da pesquisa com crianças, Ferreira (2008, p. 153) insiste, por sua vez, sobre a noção de reflexividade do ponto do vista do pesquisador para questionar as « práticas de investigação e os processos de produção de conhecimento » sobre a infância. A presente proposta, ao tomar como instrumento de pesquisa as narrativas de crianças da pré-escola e da escola, como elemento importante a ser estudado na contemporaneidade, ancora-se tanto na reflexividade da criança, quanto na reflexividade do pesquisador, admitindo que cada um, ao seu modo, opera o distanciamento de si para dar sentido ao que sabem e ao que fazem e nessa ação eles também se (trans)formam. Para o pesquisador, trata-se, essencialmente, de cuidar, com rigor, da interpretação do que dizem as crianças para dar sentido ao que aprendem e ao que vivem na escola. Esta primeira etapa da pesquisa de revisão bibliográfica evidenciou que a ação de narrar uma história é uma das formas privilegiadas de organizar e dar sentido à experiência (BRUNER, 1997), pois possibilita ao sujeito ordenar temporalmente a sua experiência, elaborando uma (re)significação dos eventos de sua vida. Nesse sentido, a narrativa abarca os planos subjetivo e intersubjetivo e as contínuas negociações de sentido e padrões culturais de temporalidade e espacialidade. É nesse sentido que o estudo das narrativas produzidas pela criança acerca de suas experiências cotidianas na escola torna-se uma ferramenta preciosa para o acesso às construções que elas fazem a respeito do que se passa em suas vidas e, assim, entendermos a subjetividade humana e sua complexidade. A partir dos elementos da cultura, a criança narra para si mesma e para o outro o que lhe acontece. A narrativa é um instrumento fundamental para a organização da experiência e já se encontra em pleno desenvolvimento na criança pequena, que dela se serve como elemento de comunicação, de ludicidade (NICOLOPOULOU, 2005; FELDMAN, 2005), de socialização e de construção identitária (NELSON, 2000). Para Bruner (1997a), as narrativas têm um caráter social: são criadas|contadas para justificar acontecimentos que fogem do modelo canônico e ressignificar a experiência de quem narra. Essa observação tem importantes consequências para se compreender como a criança reconfigura em suas narrativas as escolas da infância e como vai construindo a própria identidade, pois a noção de quem somos se constrói narrativamente pela Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.003159 9 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 reflexão e pelo retorno sobre si: o que Ricoeur (1991, 1997) denominou de identidade narrativa. Nessa direção, Smith, Bordini e Sperb (2009) asseveram que podemos considerar a narrativa como um aspecto prioritário do desenvolvimento a ser oportunizado e promovido na escola infantil, coerente com o caráter amplo, lúdico e de transição desse contexto. E nesse sentido, as autoras salientam a necessidade de investigar as oportunidades e a qualidade da interlocução que valorizem as narrativas de crianças no cotidiano das escolas brasileiras. Se for verdade que o homem é um ser contador de histórias, capaz de refletir sobre suas experiências, a investigação que faz uso das narrativas de si como instrumento de produção de dados tem um duplo mérito: levar o sujeito a contar sua história e a produzir um conhecimento mais elaborado sobre o mundo e sobre si mesmo, de modo que, ao se abrir um espaço para que a criança fale sobre sua experiência na escola e na pré-escola, multiplicam-se espaços de produção de conhecimento e de formação humana. A reflexividade imanente da narrativa poderá oportunizar aos participantes da pesquisa que construam uma nova representação de si e de suas experiências na escola, mediante uma nova versão simbólica da existência. Ou seja, a compreensão global do objeto investigado – a percepção da criança sobre as escolas da infância e sobre si mesma - visa construir um cenário no qual se estabeleça um diálogo que considere a criança um ser reflexivo que age, compreende e sofre a ação do outro em instituições educacionais, que o acolhem com vista ao seu pleno desenvolvimento. Considerações Finais Nesse sentido, os adultos responsáveis pelo acolhimento, inserção, desenvolvimento, aprendizagem e socialização da criança nessas instituições, no caso os professores, têm um papel específico a desempenhar em relação ao desenvolvimento da habilidade da criança em narrar, pois os estilos narrativos a serem construídos pela criança estão intimamente relacionados com os padrões culturais narrativos aprendidos em diferentes espaços de interação social. Por outras palavras, os modelos de construção das narrativas pessoais são primordialmente extraídos das experiências conversacionais com suporte de um adulto. Este aspecto indica o papel fundamental que as práticas educativas, em específico das artes do narrar, desempenham nos processos de Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.003160 10 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 socialização da criança ao inseri-la nas práticas narrativas de seu grupo cultural a fim de que ela possa se tornar um membro competente de sua cultura. Dessa forma, oportunizar que as crianças construam narrativas acerca de suas experiências na escola pode se constituir em um importante dispositivo de mediação pedagógica, pois além de possibilitar à criança a reorganização dessas experiências, conhecer o que as crianças significam acerca dessa vivência, permite ao educador compreender causas e conseqüências da sua atuação, levando-o a criar novas estratégias e possibilidades de interação, de ensino e de aprendizagem em um processo contínuo de investigação e reflexão pedagógica, além de trazer novos elementos para revisão e recriação dos Projetos Pedagógicos das escolas - sinalizando questões para as Políticas Públicas Educacionais -, de modo a se repensar a função social das escolas da infância, superando rupturas e descontinuidades, de modo a garantir algo já presente na LDB(EN) 9.394/96 e no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal 8.069/90), uma educação integral, porque concebida de maneira sistêmica e holística, tal como se apresenta a criança pequena em seu processo de entendimento e reconstrução do mundo. Nesse sentido, o favorecimento de ambientes em que a composição de narrativas da experiência possa transitar e se movimentar torna-se uma ferramenta de intervenção, a nosso ver, de grande importância para o trabalho dos profissionais da Educação, em especial, dos professores. Referências BEAUCHAMP, Jeanete; PAGEL, Sandra Denise; NASCIMENTO, Aricélia Ribeiro do. (Orgs.). Ensino fundamental de nove anos: orientações para a inclusão da criança de seis anos de idade. 2. ed. Brasília: MEC: SEB, 2007. BRASIL. Projeto de Lei n. 8.035/2010 – institui o Plano Nacional de Educação (20112020). Brasília: MEC, 2010. Acessível em: http://www2.camara.gov.br/atividadelegislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cec/plano-nacional-de-educacao/pl-80352010-plano-nacional-de-educacao-2011-2020 ________. Lei Federal nº. 11.274/2006. 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