A PARIDADE DE GÊNERO
José Eustáquio Diniz Alves1
A presidente eleita do Chile, Michelle Bachelet, conseguiu duas importantes vitórias
em 2006: 1) se tornou a primeira mulher eleita da América do Sul; 2) criou o primeiro
gabinete paritário, composto igualmente por homens e mulheres (10 ministros para cada
sexo).
O que a presidente Michelle Bachelet conseguiu em um mês, em termos de
igualdade de gênero, foi mais do que se avançou desde a instalação do voto universal
durante a Revolução Francesa. Aliás, as mulheres ficaram de fora dos ideais de Liberdade,
Igualdade e Fraternidade, já que a história francesa, européia e mundial poderia ter sido
diferente – e melhor – se as mulheres tivessem conseguido o direito de eleger e serem
elegíveis durante a Revolução Francesa.
Inclusive, não faltaram vozes defendendo os direitos iguais há mais de 200 anos. O
Marquês de Condorcet foi um ardoroso defensor do voto feminino naqueles tempos
revolucionários. Em 1790 ele escreveu o seguinte: “Ou nenhum indivíduo da espécie
humana tem verdadeiros direitos, ou todos têm os mesmos; e aquele que vota contra o
direito do outro, seja qual for sua religião, cor ou sexo, desde logo abjurou os seus”.2
Segundo Condorcet, a exclusão feminina da política se deu através de um ato de
violência e só por meio de sofismas se pode justificar esta exclusão. Dizer que as mulheres
não gostam de política ou que não estão preparadas para exercê-la é reforçar os
preconceitos que contribuem para a discriminação e a segregação femininas.
Mais de um século depois da Revolução Francesa, o movimento sufragista começou
a obter vitórias expressivas. No Brasil, por exemplo, as mulheres conseguiram o direito de
voto em 1932 e, na França, só conseguiram o mesmo direito depois da Segunda Guerra
Mundial. Mas as mulheres francesas não ficaram acomodadas e, neste início de século XXI,
elas conseguiram uma outra vitória importante através do estabelecimento da paridade de
gênero na política, mas apenas em nível municipal.
A paridade entre candidaturas masculinas e femininas foi aplicada pela primeira vez
nas eleições municipais francesas ocorridas em 11 de março de 2001 (primeiro turno) e 18
de março de 2001 (segundo turno). A percentagem de mulheres eleitas para as cadeiras do
Conselho Municipal passou de 22% para 47,5% do total de vereadores eleitos. Nota-se que
a paridade está ganhando espaço no mundo.
Entretanto, o Brasil construiu sua sina de campeão sul-americano de desigualdade
de gênero na política. O gráfico abaixo mostra que o país tem a menor taxa de
representação feminina no Parlamento.
1
Professor do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências
Estatísticas – ENCE – do IBGE.
2
CONDORCET et al. Palavras de homens (1790-1793). Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1991.
Gráfico 1 - Percentagem de mulheres no Parlamento nos países da América do Sul,
1995-2004.
Argentina
Guyana
Bolivia
Suriname
Peru
Ecuador
Uruguay
Colombia
Chile
Venezuela
Paraguai
Brasil
0
5
10
15
1995
20
25
30
35
2004
Fonte: Women of Our World, Population Reference Bureau – PRB www.prb.org. 2005
O Brasil é campeão da desigualdade de gênero não só na política parlamentar. No
primeiro escalão da estrutura da Presidência da República existe apenas uma mulher para
14 cargos de alto nível. No ministério do governo Lula as mulheres ficam com cerca de
10% das pastas.
Portanto, a dupla vitória de Michelle Bachelet no Chile serve de exemplo para o
Brasil, a América do Sul e para o mundo. Especialmente, Bachelet mostra que é possível se
avançar com a paridade de gênero na política. Será que o Brasil vai aprender com o
exemplo chileno e avançar rumo à paridade neste ano eleitoral?
A Lei 9504 de 1997, que regula as eleições gerais de 2006, estabelece uma cota
mínima de 30% para as candidaturas de ambos os sexos. Contudo, a maioria dos partidos,
viciados em suas práticas sexistas, continua menosprezando este mínimo direito.
Desta maneira, faz-se necessário ampliar a luta, indo além das cotas. Só uma lei da
paridade pode estabelecer a justiça de gênero na política. Se as mulheres continuarem
excluídas do poder vão continuar sofrendo a opressão em outros campos da atividade
humana, como no caso da violência doméstica, que é apenas uma face de uma violência
muito maior.
Pela paridade entre os gêneros na política!
Download

A PARIDADE DE GÊNERO José Eustáquio Diniz Alves1 A