UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
CLECIR GROSS
A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO EM CIRÚRGIAS ESTÉTICAS
CURITIBA
2014
CLECIR GROSS
A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO EM CIRÚRGIAS ESTÉTICAS
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao
curso de direito da faculdade de ciências jurídicas
da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito
parcial para obtenção do título de Bacharel em
Direito.
Orientador: Prof. Clayton Reis.
CURITIBA
2014
TERMO DE APROVAÇÃO
CLECIR GROSS
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO EM CIRURGIAS ESTÉTICAS
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado e aprovado para obtenção do título de Bacharel no
Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.
Curitiba, ____de________ de 2014.
_________________________________________
Prof. Doutor Eduardo de Oliveira Leite
Coordenador do Núcleo de Monografias
Universidade Tuiuti do Paraná
_____________________________________
Orientador:
Prof. Clayton Reis
Faculdade de Ciências Jurídicas
Universidade Tuiuti do Paraná
Prof. ____________________________________
Faculdade de Ciências Jurídicas
Universidade Tuiuti do Paraná
Prof.____________________________________
Faculdade de Ciências Jurídicas
Universidade Tuiuti do Paraná
EPÍGRAFE
“O talento é um título de responsabilidade”.
Charles de Gaulle
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, Adelário Gross e Evaldina Gross
Ao meu esposo Nousinho Fernandes Escobar
Ao meu filho Fábio Pereira Junior
AGRADECIMENTOS
À Deus que me sustentou e me deu condições de realizar o sonho de me formar.
Ao meu orientador, Prof. Clayton Reis, que me deu a honra de ser sua
orientada.
À todos os professores do curso, que com dedicação muito me acrescentaram
em conhecimento ao longo desses cinco anos.
À minha mãe Evaldina Gross, que muito me apoiou em oração.
Ao meu filho, Fábio Pereira Junior, pela compreensão.
A minha irmã, Evanir Gross, que sempre me apoiou sempre que precisei.
As minhas amigas, Sheila Barbosa, Erica Rodrigues, Cleia Silva, que ao longo
desses cinco anos estiveram comigo, me apoiando e me incentivando.
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
Art. - Artigo
CAP. - Capítulo
CC - Código Civil
CFRB - Constituição Federal da República Federativa do Brasil
CPC - Código de Processo Civil
MIN. - Ministro
P. - Página
P. ex. - Por exemplo
RE - Recurso Extraordinário
REL. - Relator
RESP. - Recurso Especial
RT - Revista dos Tribunais
STF - Supremo Tribunal Federal
STJ - Superior Tribunal de Justiça
TJ – Tribunal de Justiça
RESUMO
O presente trabalho faz uma abordagem crítica sobre a responsabilidade civil do
médico em cirurgias de caráter estético. Esse é um tema do Direito Civil que é um dos
assuntos de maior importância e repercussão no universo extrajurídico, oferecendo a
pessoa uma proteção mínima e necessária contra os danos e fatores de perecimento
ocasionados por condutas culposas de terceiros, consagrando-se, assim, como um
efetivo instrumento garantidor dos bens materiais e imateriais afetados pertencentes a
um indivíduo. Mas quais os casos e até que ponto pode-se afirmar que o cirurgião tem
responsabilidade civil perante essas cirurgias estéticas? O dano à auto-estima do
paciente configura dano moral? Objetivou-se mostrar a relação do direito civil, direito
do consumir e a responsabilidade civil do médico cirurgião em cirurgias estéticas.
Pontuar o posicionamento da doutrina sobre a responsabilidade civil do cirurgião
plástico; relatar a diferença entre cirurgia plástica estética e cirurgia plástica
exclusivamente reparadora; evidenciar a influência dos aspectos psicológicos advindos
da cirurgia plástica estética; propor possíveis soluções para o problema que envolve a
relação de consumo entre médico-paciente. A metodologia é uma pesquisa de caráter
bibliográfico, então se concentrará na leitura, análise e interpretação de livros,
periódicos, documentos, mapas e manuscritos. Conclui-se que fica ao cargo do juiz
estabelecer a existência ou não de culpa e se existe nexo de causalidade entre a ação
médica ou omissão e o resultado danoso. Essa tarefa mostra-se muito árdua.
Palavras-Chave: Direito Civil, Responsabilidade Civil, Responsabilidade do médico.
ABSTRACT
This paper presents a critical approach to the liability of the doctor in the aesthetic
character surgeries. This is an issue of civil law which is one of the issues of greatest
importance and impact on extrajurídico universe, offering the person a minimum and
necessary protection against damage and dieback caused by wrongful conduct of
others factors, devoting themselves, as well as an effective instrument guarantor of
affected tangible and intangible assets owned by an individual. But which cases and to
what extent it can be stated that the surgeon has liability these cosmetic surgeries? The
damage to the self-esteem of the patient sets up moral damage? Aimed to show the
relationship of the civil law, the consume and the liability of the surgeon in aesthetic
surgery. Rate positioning the doctrine of liability of the plastic surgeon; report the
difference between cosmetic plastic surgery and reconstructive plastic surgery only;
demonstrate the influence of psychological aspects arising from cosmetic surgery;
propose possible solutions to the problem which involves the consumption relationship
between doctor and patient. The methodology is a survey of bibliographical character,
then will focus on reading, analysis and interpretation of books, periodicals,
documents, maps and manuscripts. We conclude that the office of the judge is to
establish the existence of fault and causation exists between the medical act or
omission and the harmful result. This task proves too arduous.
Keywords: Civil Law, Civil Liability, Responsibility of the physician.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................10
CAPÍTULO 1 – BREVE HISTÓRIA DA MEDICINA ........................................13
1.1 ANTIGO EGITO .................................................................................................13
1.2 NA FRANÇA .......................................................................................................14
1.3 NO BRASIL .........................................................................................................15
CAPÍTULO 2 – FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DO MÉDICO ................16
2.1 ATIVIDADE DE MEIO E A OBRIGAÇÃO DE RESULTADO .......................16
2.2 A CULPA DO MÉDICO: ANÁLISE DO ERRO MÉDICO...............................16
2.3 A TEORIA DO CONSENTIMENTO INFORMADO ........................................17
2.4 A RESPONSABILIDADE DO MÉDICO EM FACE DO ERRO
PROFISSIONAL........................................................................................................18
CAPÍTULO 3 - PRESSUPOSTOS FORMAIS DA RESPONSABILIDADE
CIVIL ........................................................................................................................20
3.1 DA CULPA E SEUS FUNDAMENTOS ............................................................20
3.2 DO DANO ...........................................................................................................21
3.3 DO NEXO DE CAUSALIDADE ........................................................................22
CAPÍTULO 4 - A RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA EM CIRURGIAS
ESTÉTICAS .............................................................................................................24
4.1 A OBRIGAÇÃO DE RESULTADO DO CIRURGIÃO ESTÉTICO .................26
4.2 OS DANOS CAUSADOS EM FACE DO ERRO DO CIRURGIÃO ESTÉTICO
....................................................................................................................................29
4.3 OS DANOS MORAIS, ESTÉTICOS E A PERDA DA CHANCE DO
PACIENTE ................................................................................................................31
4.3.1 Dano Moral .......................................................................................................31
4.3.2 Dano Estético ....................................................................................................32
4.3.3 Danos emergentes – Perda de uma chance .......................................................32
4.4 ORIENTAÇÕES JURISPRUDENCIAIS DE TRIBUNAIS BRASILEIROS ....33
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................36
REFERÊNCIAS .......................................................................................................39
10
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como pretensão demonstrar os problemas que
envolvem o instituto da responsabilidade civil do médico em cirurgias de cunho
estético. Em Direito Civil esse é um dos temas mais importantes e que tem enorme
repercussão na sociedade. Com o aumento do número de cirurgias estéticas torna-se
cada vez mais comum a existência de erros médicos e danos ao paciente/consumidor.
O instituto da responsabilidade civil oferece ao cidadão uma proteção mínima e
necessária contra os diversos danos ocasionados por condutas culposas de terceiros.
Desta forma, este instituto é um efetivo instrumento de garantia de bens materiais e
imateriais pertencentes ao cidadão e que possam ser atingidos por ação ou omissão de
terceiros.
De acordo com José Aguiar Dias 1 “toda manifestação da atividade humana traz
em si o problema da responsabilidade”. Sendo assim, onde existir ação humana, existe
responsabilidade. No entanto, surge uma problemática: a conceituação de
responsabilidade. Pablo Stolze Gagliano2 afirma que responsabilidade é “a obrigação
que alguém tem de assumir com as consequências jurídicas de sua atividade”.
De acordo com o entendimento de Silvio Salvo de Venosa3 “o que se avalia
geralmente em matéria de responsabilidade é uma conduta do agente, qual seja, um
encadeamento ou série de atos ou fatos, o que não impede que um único ato crie o
dever de indenizar”.
No estudo do instituto da responsabilidade civil depreende-se um aspecto
importante, que diz respeito à responsabilidade decorrente da relação de consumo
existente entre médico-paciente em cirurgias estéticas. Destaque-se que o cirurgião
plástico é tratado pela doutrina civilista e jurisprudência aparte dos demais médicos,
assim ele é responsabilizado objetivamente. Entre os médicos há o entendimento de
1
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade Civil. 9ª edição. Rio de Janeiro, 1994, p. 1.
GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de Direito Civil. 7ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1.
3
VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil – Responsabilidade Civil. Volume IV. 5ª edição. São Paulo:
Atlas Jurídico, 2005, p. 16.
2
11
que a responsabilidade do cirurgião plástico entendida de modo diferente do restante
da classe médica é um fator discriminante.
No que se refere a responsabilidade ou presunção de culpa do cirurgião plástico
não se pode afirmar que esse aspecto faz com que ele se torne a parte vulnerável da
relação médico-paciente. A hipossuficiência neste caso também é do consumidor.
Pontue-se que para a abordagem da responsabilidade civil médica, é imprescindível a
mentalidade de que todo procedimento médico tem um potencial muito grande de
trazer uma complicação, por mais simples que aquele seja, vez que cada indivíduo é
um ser individual e único, que reage de forma diferente a cada estímulo e
acontecimento do meio. Segundo Miguel Kfouri Neto4:
Em decorrência disso é que se faz pressuposto da responsabilidade a análise
da culpa, atendo-se a reparação civil a apenas os danos causados de maneira
reprovável e consagrando-se, com isso, a responsabilidade subjetiva, como
consta do artigo 14, § 4° do CDC: a responsabilidade pessoal dos
profissionais liberais será apurada mediante verificação de culpa.
Mesmo vigorando a teoria da culpa neste ramo do direito, é importante atentarse à comprovação de tal conduta culposa, pois, dependendo do caso concreto, pode-se
configurar um dever de meio ou de resultado, aspectos que são muito importantes para
o processo de reparação do dano. Desta forma, segundo Arnaldo Rizzardo5 “nos casos
de intervenções estéticas, a culpa se presume a partir de um resultado não desejado,
acontecimento que caracteriza o dever de resultado”. Portanto, mesmo que o
profissional de medicina não possa prometer um resultado milagroso para uma
determinada prática no combate de uma doença, no que diz respeito ao cirurgião
plástico a culpa do médico reside na atuação imprudente e ausente de diligência ou
imperícia a obrigação de resultado estará caracterizada. De acordo com G.C. Rosário6:
Com a verificação dos componentes da culpa – negligência, imprudência e
imperícia – o profissional liberal terá a seu favor a apreciação da situação em
4
KFOURI NETO, M. Responsabilidade civil do médico. In Revista dos Tribunais, 5ª edição. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 34.
5
RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 324.
6
ROSÁRIO, G.C.M. Responsabilidade civil na cirurgia plástica. Rio de Janeiro: Editora Lumen
Juris; 2004, p. 125.
12
que, tendo agido diligentemente, sem a prática de qualquer ato ou adoção de
conduta-meio que pudesse comprometer o resultado de seu trabalho,
invariavelmente sucedeu o defeito. De outro lado, se presente qualquer dos
componentes que cooperam para a culpa do fornecedor profissional liberal,
como tal deverá responder pelos danos causados ao consumidor.
No presente trabalho, no primeiro capítulo relata-se um breve histórico sobre a
responsabilidade no Brasil, pontuando-se seu surgimento no direito romano, bem
como, suas primeiras manifestações e a ligação com a vingança privada até chegar ao
Código Civil de 1916 e 2002. Também trata-se dos fundamentos históricos da cirurgia
estética. Demonstrando a motivação das pessoas que busca esse tipo de cirurgia, os
aspectos psicológicos e sua relação com o direito.
O terceiro capítulo aborda os pressupostos formais da responsabilidade civil.
Pontuando a culpa, o dano e o nexo de causalidade. Conceituando esses institutos à luz
da doutrina e jurisprudência.
No quarto capítulo argumenta-se sobre a responsabilidade civil médica em
cirurgias estéticas, aduzindo sobre a obrigação das partes e o que ocorre à luz da
doutrina com o cirurgião plástico quando pratica ilícito.
Por fim, nas considerações finais concluem-se quais são os conceitos e
apontamentos da doutrina e jurisprudência sobre a responsabilidade civil do cirurgião
plástico frente aos ilícitos praticados.
A escolha do tema se deu pela atualidade da matéria, pela relevância do assunto
e pela proximidade do tema ao nosso cotidiano. É um campo promissor para a
pesquisa e aprofundamento no que tange ao direito do trabalho.
13
CAPÍTULO 1 – BREVE HISTÓRIA DA MEDICINA
1.1 ANTIGO EGITO
A arqueologia tem encontrado muitos vestígios da existência de prováveis
técnicas cirúrgicas nos povos mais antigos. A medicina era associada com crendices e
religiões. Nota-se que desde as civilizações mesopotâmicas a prática da medicina
existia e era regulamentada pelo Código de Hamurabi. Algumas pinturas desta época
demonstram a atividade deste setor e alguns papiros mostram que a farmácia e a
cirurgia estavam bem adiantadas.
Partindo da crença segundo a qual a doença resultava do efeito de um
espírito maligno sobre o corpo – pelo que qualquer tratamento médico não
podia senão diminuir os sintomas, ficando a doença apenas curada quando o
demônio deixasse o corpo do doente – aos poucos o pensamento médico foi
progredindo, tendo o exorcismo ficado cada vez mais reservado para casos
verdadeiramente desesperantes. Este movimento, do mágico para o empírico,
parece resultar das práticas de dissecação, a partir das quais vão crescendo os
conhecimentos anatômicos e com eles o conhecimento sobre o diagnóstico.
Apesar de haver, naquela época, uma compreensão muito avançada sobre a
circulação sanguínea e sobre o papel do coração, não deixava de reinar a
crença que o pensamento se localizava no coração e se nutria do corpo. Os
antigos egípcios desenvolveram, pois, uma amalgama entre a medicina
empírica e a medicina mágica.7
Gradativamente a medicina evoluiu e foi se desvinculando da religião e
tornando-se mais empírica. No entanto, ainda era corrente a ideia de que o pensamento
era oriundo do coração. E, neste sentido, assemelha-se com o que a Bíblia demonstra
quando dá a entender que a motivação e os pensamentos do homem provêm do
coração.
A farmacologia do antigo Egito constituía uma grande parte da medicina da
época, como se pode ver pelo chamado papiro farmacológico de Ebres. Com
uma grande auréola mística, cada receita envolvia uma complexa preparação
de medicamentos, em que os compostos provinham do reino mineral,
vegetal, animal ou de substancias provindas de combinações das três
origens. 8
7
8
LEITURAS. A medicina em história – A medicina egípcia. Volume III, n.3. Maio/Junho, 2001, p. 51.
Ibidem.
14
No que diz respeito à relação do médico com o paciente no Antigo Egito, relatase:
O paciente entra na sala do médico e se queixa de dor de cabeça. Sai de lá
aliviado, com a promessa de que seu mal terá fim. Para isso, garante-lhe o
especialista, há uma receita infalível: beber, três vezes ao dia, a mistura de
gordura de crocodilo, sêmen e fezes dissolvidas em urina. Consultas como
essa eram comuns no Antigo Egito, em que a prosaica beberagem era, de
fato, tão popular quanto os comprimidos de analgésicos, hoje em dia. Em
diversos papiros, são citados medicamentos com ingredientes ainda mais
estranhos do que os dessa prescrição contra dores de cabeça. Não que, ao
longo da História, outras culturas não tenham criado remédios igualmente
esquisitos. Mas, sem sombra de dúvida, os relatos da terra dos faraós são os
mais antigos e ricos nesse sentido. Foi nos tempos em que se erguiam as
pirâmides, também, mais de um milênio antes de Cristo, que a Medicina
começou a se organizar. 9
Além dos elementos ligados a religião, a medicina egípcia era muito ligada à
receitas inusitadas como a supracitada de misturar gordura de crocodilo, sêmen e fezes
dissolvidas em urina. Desta forma, essas receitas funcionavam mais como um placebo
do que efetivamente um elemento de cura.
1.2 NA FRANÇA
A França foi, reconhecidamente, um dos berços da medicina no mundo. Grande
parte da evolução da ciência e da ideia da localização dos hospitais na cidade, do
combate às epidemias e ligação da medicina com dados estatísticos surgiram em solo
francês.
Em 1825, P. C. Alexandre Louis (1787-1872) publica em Paris um estudo
estatístico de 1960 casos de tuberculose. Médico e matemático, Louis é
também o precursor da avaliação da eficácia dos tratamentos clínicos
utilizando os métodos de estatística. A abordagem de doenças pelo “método
numérico” influencia o desenvolvimento dos primeiros estudos de
morbidade na Inglaterra e nos Estados Unidos, origem da Saúde Pública.
9
CARVALHO, Francisco Moreno de. Faraós no consultório: a medicina que veio do Egito.
Disponível
em:
http://super.abril.com.br/cotidiano/faraos-consultorio-medicina-veio-egito440858.shtml. Acessado em 05 out. 2014.
15
Assim, alguns dos discípulos de Louis iniciam o movimento da Medicina
Social na França.10
Após a Revolução Francesa de 1789 instala-se a chamada “medicina urbana”
com o intuito de preencher os espaços das cidades. Assim, cemitérios e hospitais
tinham seus locais pré-estabelecidos, arejando as vias e isolando as áreas mais fétidas.
1.3 NO BRASIL
A história da medicina no Brasil está intimamente ligada com a história dos
jesuítas. Os jesuítas além de trabalhar com a difusão da fé cristã, eles eram a âncora da
saúde da colônia. Muitos deles vinham para o Brasil formado em medicina, no entanto,
alguns atuavam como físicos, como sangradores e até cirurgiões. Muitos jesuítas se
concentravam em estudar plantas e ervas curativa. No Brasil proliferou-se a medicina
alternativa, mezinhas e parteiras substituíam o médico em muitos casos. Sobre isso,
Carvalho Viotti afirma:
De mezinheiras e parteiras que embutiam em suas ações elementos mais
mágicos ou supersticiosos do que estudados, do que “científicos”. Esses
médicos-historiadores, pautados em depoimentos como os de Frei Caetano
Brandão, bispo do Grão-Pará e Maranhão no século XVIII, que dizia ser
“melhor tratar-se a gente com um tapuia do sertão, que observa com mais
desembaraçado instinto, do que com um médico de Lisboa”, afirmam que os
poucos licenciados que aqui ousaram medicar, valendo-se de um saber
estrangeiro, nem sempre tinham condições – ou conhecimentos – para
socorrer os pobres colonos.11
No Brasil a frase corrente entre os historiadores da medicina é bem aplicada
“houve povos sem médicos, mas nunca houve povos sem medicina”. A medicina
informal perdurou por muito tempo até o século XX e os ventos do progresso e da
ciência chegar ao solo brasileiro. Na década de 1980 ocorreu o primeiro nascimento de
uma criança pela técnica de fertilização in vitro entre outros avanços. No entanto, com
o advento da tecnologia surgiu o problema do erro médico e a sua devida reparação.
10
ALMEIDA FILHO, Naomar. Bases Históricas da Epidemiologia. Cadernos de Saúde Pública. R.S.,
2 (3): 304-311, jul/set, 1986, p. 385.
11
VIOTTI, Ana Carolina de Carvalho. As práticas e os saberes médicos no Brasil colonial (16771808). Franca-SP: Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, 2012, p. 11.
16
CAPÍTULO 2 – FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DO MÉDICO
2.1 ATIVIDADE DE MEIO E A OBRIGAÇÃO DE RESULTADO
Observa-se que a obrigação do médico desde muito tempo vem sendo estudada
como uma obrigação de meio, excetuando-se as cirurgias plásticas estéticas ou
embelezadoras, a anestesiologia que são vistas pela doutrina como uma obrigação de
resultado.
No entanto, atualmente há uma mudança no pensamento jurídico sobre a
responsabilidade civil do cirurgião e anestesista ser de resultado. Essa mudança é fruto
do entendimento de que cada indivíduo possui um organismo próprio e com isso
prova-se a cada dia que não é possível determinar todas as reações fisiológicas
possíveis de um paciente em resposta a um ato médico: clínico ou cirúrgico.
No que diz respeito à conceituação de obrigação de meio entende-se como
aquela em que o devedor se compromete a desempenhar sua obrigação diligentemente,
utilizando dos meios possíveis para a tarefa. Entretanto, a obrigação de resultado o
devedor se obriga a realizar a tarefa previamente estabelecida, vinculando-se ao
resultado esperado, “na obrigação de meio a finalidade é a própria atividade do
devedor e na obrigação de resultado, o resultado dessa atividade”.12
2.2 A CULPA DO MÉDICO: ANÁLISE DO ERRO MÉDICO
Pontue-se que para se caracterizar a responsabilidade civil é necessária uma
conduta voluntária, o dano e o nexo de causalidade. Neste sentido, Kfouri Neto afirma:
São fatores de atribuição da responsabilidade por dano do agente: subjetivos
– dolo e culpa; objetivos – risco e equidade. Tais fatores de atribuição devem
ser previstos na lei. A responsabilidade do médico é subjetiva, calcada na
culpa stricto sensu (imperícia, negligência ou imprudência). 13
12
MAGALHAES, Teresa Ancona Lopez de. O dano estético. p. 32 apud KFOURI NETO, Miguel.
Responsabilidade Civil do Médico. P. 190.
13
KFOURI NETO, Miguel. Obra Citada. p. 81.
17
Assim, para se caracterizar a culpa é imprescindível a negligência ou falta de
cuidado. É suficiente a voluntariedade da conduta em contraposição com as normas da
prudência imposta pela profissão ou perícia comum. No que diz respeito ao conceito
de culpa Antunes Varela argumenta que “culpa é, no fundo, a imputação ético-jurídica
do fato a uma pessoa, mas imputação no sentido transcendente da reprovabilidade ou
censurabilidade.”
14
Na caracterização do erro médico é extremamente difícil a sua
confirmação. De um lado os advogados da parte autora demonizam a conduta médica e
pintam-na com as cores do erro, por outro lado os advogados da parte médica
apresentam laudos periciais que comprovam que o médico não faltou com o dever de
cuidado e não fugiu da técnica. Assim instaura-se a problemática. Neste sentido,
relata-se Kfouri Neto:
Delineia-se, após, o problema: a existência do dano – lesão, aleijão, morte
etc. – é irrefutável; a intervenção médica realizou-se, e isso também é
induvidoso. A ocorrência da culpa e o estabelecimento do nexo de
causalidade, então, passam a desafiar a argúcia do julgador, que se valerá,
nesta etapa final, de tudo quanto as partes trouxeram aos autos e das
informações que o próprio juízo determinou fossem prestadas pelas partes e
peritos.15
As demandas em ações de reparação por erro médico são muito longas, isto se
deve ao problema da verificação da culpa do profissional. Os meios de prova
admitidos são os normalmente aceitos em direito: depoimento pessoal do médico,
inquirição de testemunhas, provas documentais, prova pericial, informes, inspeção
judicial, presunções, a convicção e convencimento do juiz.
2.3 A TEORIA DO CONSENTIMENTO INFORMADO
Sabe-se que são inúmeras as formas de relação existentes entre o médico e o
paciente. De modo geral esse relacionamento pressupõe que todas as informações
relacionadas ao tratamento foram ditas e o paciente com esse conhecimento se
submete a intervenção médica consciente dos riscos dos possíveis resultados da
14
VARELA, João de Matos Antunes. Das obrigações em geral. Volume 1. São Paulo: Livraria
Almedina, 2008, p. 485.
15
KFOURI NETO, Miguel. Op. Cit. p. 89.
18
cirurgia ou tratamento. Pontue-se que é preciso ter muito cuidado no que se refere à
fixação de regras e conceitos universais no que diz respeito ao consentimento
informado, especialmente no que tange a indiferença ou ignorância e sentimentos do
paciente em relação ao procedimento médico. No entanto, o reconhecimento da
autonomia da pessoa, como paciente em uma intervenção médica constitui uma
contribuição para o aperfeiçoamento da medicina, pois visa o diálogo e respeito,
melhorando a relação médico-paciente.
2.4 A RESPONSABILIDADE DO MÉDICO EM FACE DO ERRO PROFISSIONAL
A responsabilidade do médico em face do erro profissional também se
caracteriza como um defeito na prestação de serviços. De acordo com o artigo 14 do
CDC (Lei 8.078, de 11.09.1990):
O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de
culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos
relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes e
inadequadas sobre a fruição e riscos.
Depreende-se da leitura do artigo supracitado que ocorrendo o dano o paciente
pode ingressar com ação de reparação em face do estabelecimento hospitalar ou clínica
que lhe prestou o serviço de forma defeituosa. Neste sentido, Kfouri Neto argumenta:
Em suma, existindo vínculo empregatício entre o médico e a casa hospitalar,
a vítima demandaria a reparação em face do estabelecimento, apenas
provada a efetiva ocorrência do dano, incumbindo ao hospital provar as
excludentes do artigo 14, § 3º, como único modo de se exonerar do
encargo.16
As excludentes do artigo 14, § 3º citadas por Kfouri Neto, são:
§ 3o O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
16
KFOURI NETO, Miguel. Obra Citada. p. 211.
19
No entanto, é importante citar a orientação jurisprudencial do STJ no sentido de que
mesmo existindo vínculo empregatício entre hospital/clínica e o médico a
responsabilidade é entendida como subjetiva:
CIVIL.
INDENIZAÇÃO.
MORTE.
CULPA.
MÉDICOS.
AFASTAMENTO. CONDENAÇÃO. HOSPITAL. RESPONSABILIDADE.
OBJETIVA. IMPOSSIBILIDADE. 1 - A responsabilidade dos hospitais, no
que tange à atuação técnico-profissional dos médicos que neles atuam ou a
eles sejam ligados por convênio, é subjetiva, ou seja, dependente da
comprovação de culpa dos prepostos, presumindo-se a dos preponentes.
Nesse sentido são as normas dos arts. 159, 1521, III, e 1545 do Código Civil
de 1916 e, atualmente, as dos arts. 186 e 951 do novo Código Civil, bem
com a súmula 341 - STF (É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo
ato culposo do empregado ou preposto.). 2 - Em razão disso, não se pode dar
guarida à tese do acórdão de, arrimado nas provas colhidas, excluir, de modo
expresso, a culpa dos médicos e, ao mesmo tempo, admitir a
responsabilidade objetiva do hospital, para condená-lo a pagar indenização
por morte de paciente. 3 - O art. 14 do CDC, conforme melhor doutrina, não
conflita com essa conclusão, dado que a responsabilidade objetiva, nele
prevista para o prestador de serviços, no presente caso, o hospital,
circunscreve-se apenas aos serviços única e exclusivamente relacionados
com o estabelecimento empresarial propriamente dito, ou seja, aqueles que
digam respeito à estadia do paciente (internação), instalações, equipamentos,
serviços auxiliares (enfermagem, exames, radiologia), etc e não aos serviços
técnicos-profissionais dos médicos que ali atuam, permanecendo estes na
relação subjetiva de preposição (culpa).(STJ, Relator: Ministro FERNANDO
GONÇALVES, Data de Julgamento: 16/06/2005, T4 - QUARTA TURMA)
No julgado supracitado entende-se que a responsabilidade dos hospitais quanto
a atuação do médico e de caráter objetiva e depende de comprovação. A
responsabilidade do hospital seria quanto à manutenção e defeito de equipamentos
presentes no hospital e não quanto às condutas individuais dos profissionais médicos.
Kfouri Neto aduz:
De Lege lata, por conseguinte, os médicos, enquanto profissionais liberais,
não se sujeitam às normas do Código de Defesa do Consumidor, em relação
a atos terapêuticos. Mesmo no âmbito da responsabilidade objetiva, o
hospital não poderá ser compelido a indenizar, a não ser que a culpa do
médico, preposto seu, resulte suficientemente clara e provada. 17
Mesmo a responsabilidade sendo de natureza objetiva o hospital pode
comprovar a responsabilidade de terceiros no ato.
17
KFOURI NETO, Miguel. Obra Citada. p. 214.
20
CAPÍTULO 3 - PRESSUPOSTOS FORMAIS DA RESPONSABILIDADE
CIVIL
3.1 DA CULPA E SEUS FUNDAMENTOS
A culpa é um dos pressupostos necessários para a caracterização da
responsabilidade civil. A culpa decorre da violação de um dever de cuidado ou não
observância de um preceito legal ou social. Assim, a conduta do agente no âmbito
social é indesejável porque traz prejuízo a terceiros.
Assim, pode-se afirmar de acordo com a doutrina, a culpa é a infração de
uma obrigação preexistente da qual a lei ordena a reparação quando causou
um dano a outrem. Outrem. Distinguem-se várias espécies de culpa, entre
elas, as culpas in eligendo, in vigilando e in custodiendo, concorrente, in
concreto e in abstracto. A culpa in eligendo corresponde à má escolha de
representante ou preposto e caracteriza-se, por exemplo, pelo fato de admitir
ou de manter o preponente a seu serviço empregado sem estar legalmente
habilitado, ou sem as aptidões. A culpa in vigilando consiste na falta de
fiscalização por parte do patrão, quer relativamente aos seus empregados,
quer no tocante à própria coisa.18
A culpa está ligada diretamente à responsabilidade civil, isto é, o agente que se
comporta de forma contrária à lei, não observando um dever, desprezando o bem
alheio ou não sendo diligente é responsabilizado pelo ato.
Este elemento está ligado de forma direta à responsabilidade, ou seja, aquele
que age de forma contrária aos preceitos legais, seja por inobservância de um dever,
desprezo ou falta de diligência, é responsável pelo ato.
A culpa é baseada na ação voluntária, ou, por negligência ou omissão
imprudente, e, portanto, só será atribuída a culpa a alguém quando se incorre em
alguma dessas hipóteses, bem como os preceitos do artigo 186 do Código Civil de
2002: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito ou causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito.”
18
BOSIO, Marco Antonio. Responsabilidade Civil em face da violação dos Direitos da
Personalidade. Curitiba: Juruá Editora, 2010, p. 244.
21
Portanto, para que se caracterize a culpa é necessário que o dever de cuidado
seja violado por um agente gerador. Como dito acima, a responsabilidade continua a
definir o ato deve ser cometido com dolo ou culpa, ou seja, quando se tratar de ação ou
omissão voluntária, configura a culpa lato sensu fraude ou culpa, por outro lado, os
danos resultantes de uma negligência ou ato precipitado do agente, assim configura-se
a culpa stricto sensu.
Nota-se que a doutrina civilista entende a culpa em graus, a classificação é feita
da seguinte forma: a) grave: aqui a culpa quase se nivela ao dolo, mas não se leva em
conta o elemento da intenção; b) leve: quando decorre da de uma falta de atenção e; c)
levíssima: quando a atenção do agente deveria ser além da atenção de um homem
médio.
Na classificação de culpa pela doutrina, encontra-se ainda a em relação à
natureza: a) in eligendo, quando o agente faz uma escolha errada; b) in ommittendo,
quando o agente omite-se de um dever de cuidado; c) in custodiendo quando o agente
não cuida de um determinado objeto, assim a culpa lhe é atribuída.
No presente trabalho monográfico, a análise da culpa é extremamente
importante porque se pretende observar se a obrigação decorrente de uma cirurgia
plástica é de meio ou de resultado. Isto porque se for de resultado a culpa é presumida,
não se exigindo provas.
3.2 DO DANO
Na conceituação de “dano” entende-se como o ato de prejudicar ou diminuir.
Assim, quando se fala em dano entende-se que algo se modificou e ficou imprestável
ou teve suas principais funções prejudicadas, diminuindo sua beleza. De acordo com
Ancona Lopez, sobre o conceito de dano:
Nota-se que etimologicamente a palavra dano vem de demere, que significa
tirar, apoucar, diminuir. Portanto, a idéia de dano surge das modificações do
estado de bem-estar da pessoa, que vem em seguida à diminuição, ou perda
de qualquer dos seus bens originários ou derivados extrapatrimoniais ou
patrimoniais. 19
19
LOPEZ, Teresa Ancona. O Dano Estético. 3ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 20.
22
Argumenta-se ainda que o antigo conceito de dano é uma diminuição do
patrimônio, tanto material como moral, segundo Ancona Lopez20. De acordo com
Segundo Lopez21a responsabilidade civil tem como elemento constituinte o dano. Sem
o dano inexistiria a responsabilidade do agente.
Este elemento, o dano, pode ser visto ou medido a responsabilidade de quem o
causou, ou seja, a extensão do dano será atribuído maior ou menor responsabilidade, e
que a responsabilidade e a conseqüência da obrigação de indenizar não é como para o
culpa, como boa parte da doutrina entende, como um dano muito grave pode ser
causado por alguém que tenha incorrido em um pequeno grau de culpa ou pode haver
um alto grau de culpa do agente, mas isso não resultar prejuízo para a vítima e
portanto, não há obrigação de indenizar.
De fato, para o Direito Civil, a análise da extensão dos danos, é essencial para
atribuir a obrigação de indenizar a vítima, já que não há delito, sem a existência de
danos.
3.3 DO NEXO DE CAUSALIDADE
Esta assunção da responsabilidade civil subjetiva liga o ato ilícito e o dano
causado à vítima, é importante saber que não será uma obrigação de indenizar se não
houver nexo de causalidade. Argumenta Luciana Mendes Pereira Roberto22 sobre o
nexo de causalidade:
Assim, tem-se que o dano somente gera responsabilidade quando for
possível estabelecer um nexo causal entre ele e seu autor. Importa saber qual
circunstancia foi a que determinou o prejuízo. O essencial é que deve haver
uma relação necessária entre o ato ilícito e o prejuízo, um nexo causal entre
ambos, para que fique absolutamente claro que o prejuízo só ocorreu em
decorrência de determinada ação ou omissão. A noção de nexo de
causalidade é uma noção normativa, pois a lei pode ampliá-la de imputação
subjetiva (responde pelo dano que causa) para a imputação objetiva (risco,
garantia, segurança) ao atribuir responsabilidade a quem não causou
diretamente o dano.
20
LOPEZ, Teresa Ancona. Obra citada, p. 23.
Idem.
22
ROBERTO, Luciana Mendes Pereira. Responsabilidade civil do profissional de saúde e
consentimento informado. Curitiba, PR: Juruá, 2005, p. 25
21
23
Depreende-se da citação acima que o nexo de causalidade é uma construção
normativa, uma vez que se pode imputar responsabilidade a alguém que não causou o
dano diretamente, no caso da responsabilidade objetiva quando a atividade realizada
pelo agente traz riscos para a os direitos de outrem por causa de sua natureza, tal como
recomendado pelo parágrafo único do artigo 272 do Código Civil. De qualquer forma,
para existir um dever de indenizar o nexo de causalidade deve estar presente entre a
atividade ilegal e o prejuízo correspondente feito, salvo nos casos previstos em lei, a
saber: fato de terceiro, culpa exclusiva da vítima, que é Art. 927, caput: “Aquele que
em ato ilícito, causar dano a outrem, é obrigado a repará-lo”.
24
CAPÍTULO 4 - A RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA EM CIRURGIAS
ESTÉTICAS
Pontue-se que os autores médicos geralmente afirmam que não existem
diferenças substanciais nos procedimentos e natureza do que se convencionou chamar
de cirurgia reconstrutiva (reparadora) e cirurgia plástica (estética). Alguns autores
argumentam que a motivação das cirurgias tem em comum o fato de reparar qualquer
mudança, é adquirida ou congênita, mas em um sentido, sem ser patológico, se desvia
da norma que poderia causar alguma insatisfação e/ou alteração na auto-estima do
paciente.
O principal objetivo desses procedimentos seria atender o anseio por maior
conforto e estética que seria obtido por meio de reparos. Estas cirurgias não seriam no
sentido de tornar as pessoas mais bonitas ou feias, apenas reparar algo que não estava
no padrão normalmente aceito para determinado órgão ou parte do corpo que sofreu
influência do envelhecimento natural ou congênito. No entanto, alguns autores
discordam, argumentando que boa parte destas cirurgias não tem como finalidade
reparar, pois algumas pessoas apresentam características externas dentro dos padrões
da normalidade para a faixa etária, mas ainda assim pretendem alterar o aspecto desta
parte do corpo.
Alguns autores são taxativos, e conceituam as cirurgias plásticas como
puramente estéticas ou a dividem em alguns grupos: a) o cliente que procura um
modelo ideal de beleza e formosura estética; b) o cliente que está atrás de corrigir uma
imperfeição da natureza que afeta seu estado psíquico, neste grupo estão as pessoas
que tem desvios na orelha ou maiores que o tamanho normal, para este segundo grupo
argumenta-se que há uma obrigação de resultado.
Assim, a medicina plástica se dividiria em: 1) grupo de cirurgia simplesmente
estética e; 2) grupo de cirurgias reparadoras. O médico deveria desestimular a cirurgia
estética, por ser desnecessária e pelos riscos corridos pelo paciente. Se o paciente tem
excessivo desprezo por uma determinada parte de seu corpo isso é devido a problemas
de natureza psicológica também. Assim o médico deveria aconselhar, pelo bom sendo
25
não realizar a cirurgia. No entanto, com o advento de clínicas e hospitais voltados para
atender este público, deu à atividade médica a natureza pecuniária.
Pontue-se que quando no médico existir apenas o interesse pecuniário, assim o
profissional assume o risco pelo resultado e deve ser responsabilizado pelo dano que
causar. Assim, se aceita a divisão de grupo das cirurgias estéticas entre as reparadoras
e as puramente estéticas. Vale diferenciar dando ênfase no desconforto psíquico
causada pela deformidade congênita ou gerada no paciente que o motiva a realizar o
procedimento.
Nota-se que alguns julgados como o (EAp, 1.232/87) encontra-se a distinção
entre os dois grupos. Entendia-se que as cirurgias puramente reparadoras aplicavam-se
os princípios da obrigação de meio.
De acordo com o entendimento de Castro23 as cirurgias reparadoras são aquelas
destinadas para corrigir um lábio leporino, a existência de cicatrizes, queimaduras ou
defeitos oriundos de outras cirurgias. Assim, define-se cirurgia estética como aquela
que ocorre com a finalidade de embeleza ou aperfeiçoar fisicamente um indivíduo.
Curiosamente, os mesmos autores médicos não têm a necessária precisão.
França24 põe a cirurgia plástica em dois grupos: reconstrutiva, reparadora ou corretiva,
e estética. Caracterizado a primeira como "condições congênitas ou adquiridas
desfigurantes e mutilação decorrente de trauma" e cita exemplos como o lábio
leporino, seqüelas de câncer de mama e lesões decorrentes de trauma facial. Falando
do segundo grupo, dá como exemplos a cirurgia em "olhos siameses e lábios cheios."
Assim, não conceitua em qual grupo se encaixam as denominadas estéticas em sentido
estrito da estética.
A propósito de demonstrar a imprecisão dos conceitos relacionados com a
cirurgia estética no que diz respeito à sua classificação é que gera enormes obstáculos
para a compreensão de todos os outros aspectos envolvidos na discussão, como se
pode prever o exame simples, que foi apresentado aqui. Deve o médico, cirurgião
plástico agir com muito mais cuidado do que um cirurgião atos de outras áreas,
inclusive, ser prudente, ser cercado de cuidados, a própria profissão oferece, e
23
24
CASTRO, J.M. Responsabilidade civil do médico. São Paulo: Editora Método, 2005, p. 132.
FRANÇA, G.V. Direito médico. 8ª edição. São Paulo: Fundo Editorial BYK, 2003, p. 241.
26
alertando, assim, aos seus pacientes o risco que serão apresentados e analisados em
relação aos benefícios da cirurgia. Se o risco é maior, o cirurgião plástico deve
recusar-se a encaminhar o paciente para o procedimento.
De acordo com Kfouri Neto25 o cirurgião plástico deve, em primeiro lugar,
determinar a veracidade das informações fornecidas pelo paciente, pesar os riscos que
enfrentam e os resultados esperados e, em seguida, verificar a possibilidade de
cirurgia, pedindo-lhe, no final, expondo o paciente todos os aspectos considerados e
criados em a fim de obter o seu consentimento. Este autor acredita que o campo da
cirurgia plástica a obrigação de informar é extremamente rigoroso e deve ser reportado
acidentes ainda mais raros e seqüelas mais freqüentes, "porque não há urgência ou
necessidade de intervir."
A lista de citações pode se tornar enorme, porque, na verdade, a gravidade da
valorização do trabalho do cirurgião plástico e quanto maior for preciso para ele as
funções de orientação e aconselhamento idéias são disseminadas entre os estudiosos.
Com o objetivo de embelezamento, o paciente procura o profissional estético
para a cirurgia plástica. Em pacientes de cirurgia plástica não são doentes, na maioria
dos casos, procuram um cirurgião plástico, a fim de corrigir um defeito ou um
problema cirurgião estético. Para este paciente o que importa é o resultado que espera
para ser perfeito.
Se após este procedimento, o cliente recebe o pior aspecto, o resultado não foi
alcançado, que é direito de reclamar perdas e danos, o resultado foi a razão pela qual o
processo de compensação promovido pelo paciente.
4.1 A OBRIGAÇÃO DE RESULTADO DO CIRURGIÃO ESTÉTICO
Agora se refere aos aspectos legais que, em última análise caracterizam a forma
como está a responsabilidade civil do cirurgião pelos danos causados na profissão, e
que passa a ser em palavras breves e simplificadas, a atribuição de natureza da
25
KFOURI NETO, M. Responsabilidade civil do médico. In Revista dos Tribunais, 5ª edição. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, 341.
27
obrigação de resultado e aos seus atos são classificados como estéticos (não
reparador).
A cirurgia plástica foi vista como algo pejorativo que empreguinou
jurisprudência, agora considerando os danos causados por esta a sua única produção
atribuível ao médico. O entendimento é que cirurgia plástica impõe uma obrigação de
resultado é de grande preconceito já existente de muito tempo. Também mostra traços
dessa origem baseada em acontecimentos históricos relacionados com o argumento de
que a vaidade humana entre os ingredientes de motivação para a cirurgia: em algumas
formas de cirurgias pode admitir como fato gerador de obrigação de resultado, como
traduzido em intervenções realizadas por vaidade, por o paciente que tem complexos
psicológicos, por necessidade orgânica que foi imposta.
Nota-se que a mais frequente forma de justificar a cirurgia á a que se constitui
numa mudança do aspecto corporal. A cirurgia plástica de embelezamento tem fins
exclusivamente estéticos.
Por a cirurgia plástica está tratando de uma pessoa com saúde e não doente, e
esta almeja que sua aparência seja melhorada ou mesmo mudada, exige-se que o
paciente consiga a que ele se propõe. Assim, o fundamento estético baseia-se no
julgamento moral da vaidade, onde busca a satisfação de um corpo perfeito, para
realização pessoal de cunho psicológico, é a vontade de operar para mudar, modificar.
No entanto, o medico cria expectativas no paciente de que alterações de aparência
positiva em decorrência da intervenção irão surgir, derivando assim, a obrigação de
resultado.
Ometto26 argumenta que há várias questões que não estão sob o domínio do
cirurgião plástico, tais como a evolução do processo de cicatrização, que depende de
fatores individuais como espessura e textura da pele, além de influências hereditárias e
hormonais. Ometto ainda pontua outros elementos inerentes às cirurgias em geral e à
anestesia, afirmando, com referência a esta última que não se sabe se o indivíduo
entrará em choque com a medicação, se haverá parada cardíaca, embolia pulmonar,
por exemplo. É importante lembrar que a implicação do fato é que também os
26
OMETTO, R.T.V. Responsabilidade civil do médico cirurgião. Capivari: Unimed Gráfica e Editora;
2004, p. 207.
28
fenômenos de reparação (nos quais se inclui a cicatrização) podem se dar de modo
assimétrico devido exclusivamente à álea.
Kfouri Neto27 argumenta que na cirurgia plástica podem ocorrer fatores
imprevisíveis e imponderáveis, subjacentes à saúde do paciente, que o médico não
conhece nem podia conhecer, “mesmo agindo com diligência e acuidade”. Conclui que
seu objetivo pode frustrar-se pela superveniência de causas que ele não podia prever
nem evitar. São pontuadas as mudanças (favoráveis) de atitude da sociedade e das
instituições com respeito à liceidade das cirurgias estéticas e com respeito ao exercício
da vaidade a qual, admitidos limites de “razoabilidade”, deixou de ser considerada “à
ou trance” manifestação de futilidade e superficialidade de caráter.
Castro28 aduz que a principal regra é respeitar toda e qualquer possibilidade de
causar dano, devendo-se evitar procedimentos nessas condições, mesmo contra a
vontade do paciente. O rigor deve modificar-se de acordo a gravidade da imperfeição.
Souza29estabelece que o dever de informação do médico prenda-se aos riscos mais
comuns, mas que em cirurgias estéticas estende-se até aos “riscos residuais”, assim
definidos aqueles muito raros.
Estas cautelas tanto dizem respeito às condições clínicas da pessoa e sua
capacidade de enfrentar o estresse cirúrgico e anestésico, como ainda fatores
específicos da atividade cirúrgica plástica. A doutrina preconiza que na cirurgia
plástica os riscos devem ser informados até os mais comuns, mesmo as remotas
possibilidades de complicação como de resultado.
Deve-se levar em conta peloo médico-cirurgião plástico, fatores como: o grau
de sobrepeso em pessoas que se candidatem a lipo aspiração; Idade e a possibilidade
de que alterações hormonais futuras possam ocorrer, entre outras. Outro elemento que
compõe a maior responsabilidade do cirurgião plástico com referência ao dever de
informação e orientação são exatamente os aspectos psíquicos acima aludidos,
envolvidos nas motivações das cirurgias plásticas. Deve o cirurgião plástico sopesar
com extremo cuidado a motivação psicológica da pessoa e divisamos aqui pelo menos
dois aspectos que devem tomar a atenção do profissional.
27
KFOURI NETO, M. Op. cit, p. 280.
CASTRO, J.M. Op. cit, 170.
29
SOUZA, N.T.C. Responsabilidade civil e penal do médico. Campinas: LZN Editora; 2003, p. 178.
28
29
Leva-se em conta também a eventual representação mental que faz o candidato
do resultado cirúrgico, no sentido, por exemplo, de que possa estar idealizando-o ou
depositando nele expectativas fantasiosas tais como solução de problemas conjugais.
Outro, certamente muito mais raro, mas merecedor de atenção pela gravidade vem a
ser a possibilidade de quadros psicopatológicos graves como a esquizofrenia, poder
manifestar-se, em fases iniciais, por sensações de mudanças corporais que acabam
motivando a pessoa a submeter-se a procedimentos cirúrgicos para “corrigi-los”. Neste
caso o resultado em termos de satisfação será sempre e necessariamente nulo.
Atualmente
os
entendimentos
jurisprudenciais
como
os
doutrinários
vem
encaminhando para o reconhecimento da obrigação de meio, embora ainda seja
minoritária, a predominância é pela obrigação de resultado, porém a tendência do
resultado de meio vem se alastrando a passos longos.
4.2 OS DANOS CAUSADOS EM FACE DO ERRO DO CIRURGIÃO ESTÉTICO
Pontue-se que não deve dizer que a frustração do resultado, a inexecução
defeituosa da obrigação equivale à inexecução total, judicial, ou que quase equivale a
não execução da obrigação é considerado o adimplemento parcial, onde o médico se
compromete com o paciente, contratante, são exatamente as formas naturalísticas que
foi procurado, onde pode se apresentar a execução defeituosa.
Entende-se o dano na cirurgia plástica como o fato de não alcançar r o resultado
pretendido, causando frustração de expectativa, ou até mesmo agravar os defeitos, o
que certamente piora as condições do paciente. O indicio de culpa do medico
caracteriza o insucesso da operação ficando incumbido de provar que a culpa não foi
sua. Que sua atuação foi correta cabe a ele a contraprova.
Pontue-se que existe casos, em que a simples não obtenção do resultado, sem
afeamento, não é considerada obrigação de resultado. Por exemplo, cita-se a apelação
cível 23.341 de 1982, do TJRJ (RT 566, p. 191) na qual se instalou deformidade
permanente, não corrigível, após tratamento de acne da face por “feeling”. O texto é
evidente no sentido de que o cirurgião não está obrigado a garantir o resultado, mas,
por outro lado, não pode produzir piora do aspecto, o que efetivamente aconteceu no
30
caso. Negar à alteração sentida apenas subjetivamente fundamento para a
responsabilização, não significa, entretanto, que se exija o afeamento. O dano não foi
gerado simplesmente do fato de o paciente ficar insatisfeito pelo resultado que obteve,
mas pela constatação de ter sido desviado indevidamente do esperado antes da
intervenção cirúrgica. Forma semelhante de expressão encontra-se em acórdão do STJ:
O profissional que se propõe a realizar cirurgia, visando a melhorar a
aparência física do paciente, assume o compromisso de que, no mínimo, não
lhe resultarão danos estéticos, cabendo ao cirurgião a avaliação dos riscos.
Responderá por tais danos, salvo culpa do paciente ou intervenção de fator
imprevisível, o que lhe cabe provar (STJ, 3a T., AgRg-AI 37.060- 9/RS, Rel.
Min. Eduardo Ribeiro, Ac. 28.11.1994).
Argumenta-se que a questão polêmica de resultado é de relação quelóide,
infecção e outras com responsabilidade civil do cirurgião plástico, considerando que
tais eventos podem decorrem da culpa aquiliana, como simples e puramente de
inadimplência do contrato. Entende-se que o mal resultado numa primeira
consideração pode ser constituído da expectativa da frustração ou pelo efeito
afiamento. Pode ser avaliada a expectativa frustrada segundo critério do ponto de vista
subjetivo do paciente.
Algumas intercorrências pode haver ou não que tenha
contribuído para o resultado.
Nota-se que pertence ao âmbito da responsabilidade ética e ao universo jurídico
civil a responsabilidade a um só tempo, o dano perpetrado em razão do profissional, o
dever de indenizar ou reparar o mesmo.
Entre o paciente e o médico deve existir contrato de prestação de serviço, não
havendo necessidade de ser escrito, conforme disciplina a lei civil e também pelo
Código de Ética Médica. No entanto não é contrato de prestação de serviço de
resultado, pois as referidas Leis acima citadas exigem prudência, diligências, perícia
técnica nos limites de sua ciência e esforço, não podendo tornar dependente a
prestação de determinado resultado.
A legislação impede no contrato a inclusão no contrato de prestação de serviços
médicos de cláusula de não indenizar, ou seja, o médico não pode estipular
contratualmente se exonerar da responsabilidade civil ou patrimonial.
31
4.3 OS DANOS MORAIS, ESTÉTICOS E A PERDA DA CHANCE DO PACIENTE
4.3.1 Dano Moral
O não cumprimento das obrigações do médico no exercício de sua profissão,
obriga-o a reparar o dano causado. Neste sentido, argumenta Maria Helena Diniz30
O fundamento primário da reparação está, como visto, no erro de conduta do
agente, no seu procedimento contrário à pré-determinação da norma, que
atine com a própria noção de culpa ou dolo. Se o agente procede em termos
contrários ao direito, desfere o primeiro impulso, no rumo do
estabelecimento do dever de reparar, que poderá ser excepcionalmente
ilidido, mas que, em princípio, constitui o primeiro momento da satisfação
de perdas e interesses. Esse direito lesado, na perspectiva médico-legal,
consiste no dano corporal (dano pessoal) que aponta para duas categorias
jurídicas: O dano patrimonial ou econômico e dano extra patrimonial ou não
econômico.
O denominado dano material envolve direta e imediatamente os interesses
econômicos, materiais da vítima do dano, assim, facilmente refere-se em termos
pecuniários. Entre
esses custos, estão as despesas
médico-hospitalares, a
impossibilidade de trabalhar, as sequelas que resultem na incapacidade permanente
para o trabalho. Assim, estes motivos são susceptíveis de indenização pecuniária.
O dano moral demonstra os prejuízos vividos, que são sentidos pela pessoa, mas
que não implicam uma perda pecuniária. Aqui entra em questão as injúrias que
ofendem a dignidade e a honra das pessoas, a sua reputação; é o caso dos sofrimentos
físicos experimentados por causa de ferimentos e na seqüência deles por causa,
nomeadamente, de tratamentos a dor física, portanto; também, o caso das angústias e
sofrimentos morais sempre ligados à dor, mas não só por isso, já que um internamento
hospitalar, uma operação cirúrgica, uma dúvida vivida quanto à evolução favorável do
caso, uma consciência do risco de vida.
No que diz respeito ao sofrimento moral, este dano encontra fundamento
jurídico nos casos de morte. Nota-se que o direito brasileiro admite a indenização por
30
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 17 ed. São Paulo:
Saraiva, 2003, p. 154.
32
prejuízo material e a reparação moral, "primeira na reintegração pecuniária ou
ressarcimento strictu sensu, ao passo que a segunda é sanção civil direta ao ofensor ou
reparação da ofensa”31
4.3.2 Dano Estético
De acordo com Kfouri Neto32 o dano estético também caracteriza como dano
moral, pois deste decorre, da deformidade estética no corpo da paciente ou em parte do
corpo.
Caracteriza o dano estético a lesão à beleza física, à harmonia das formas
externas de alguém. Ressalta-se que o conceito de belo é relativo. Ao
apreciar-se um prejuízo estético deve-se ter em mira a modificação sofrida
pela pessoa em relação ao que era antes. A existência do dano estético exige
que a lesão que enfeiou determinada pessoa seja duradoura – caso contrário,
não se poderá falar em dano estético propriamente dito (dano moral), mas
em atentado reparável à integridade física estética passageira, que se resolve
em perdas e danos habituais.
O dano estético constitui-se uma ofensa ao direito da personalidade. E no que
diz respeito à indenização trata-se de uma compensação, como uma forma de
restabelecer uma situação que foi modificada por causa do prejuízo ou dano causado.
Sobre indenização De Plácido e Silva argumenta que se constitui como o ato de
“integrar patrimônio da pessoa daquilo em se desfalcou pelos desembolsos, de
recompô-lo pelas perdas ou prejuízos sofridos (dano)” 33
4.3.3 Danos emergentes – Perda de uma chance
Os danos materiais devidos ao paciente compreendem a recomposição do
prejuízo correspondente àquilo que o paciente efetivamente perdeu em razão do ato
médico, denominando-se damnum emergem. Entretanto, não só o prejuízo é
31
DINIZ, Maria Helena. Obra citada, p. 156.
KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 7ª edição, revista, atualizada e
ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 115.
33
DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico. 17ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010, 815.
32
33
indenizável, mas, também, o quantum deixou, razoavelmente, de lucrar, caracterizando
o lucram cessante mesmos, liquida-se na proporção da lesão sofrida.
Pontue-se ainda que a é a perícia judicial que irá permitir a quantificação do
dano material e do dano moral, servindo como orientação a lição de Fernando Oliveira
Sá recomendando-se, além do reembolso das despesas médico-hospitalares que deu
causa a inclusão dos "parâmetros de valorização médico-legal do dano em direito
civil” consistente nos seguintes: (a) incapacidade temporária, (b) incapacidade
permanente, inclusive laborativa, (c) o quantum dor, (d) o dano estético e, por fim,
insistindo no (e) prejuízo de afirmação pessoal.
Existe uma diferença no denominado "prejuízo de afirmação pessoal"
consistindo num padrão suplementar do quantum doloris e do dano estético porque
denota que prejuízo funcional existente reflete-se algumas vezes nas capacidades de
ação ligadas a atividades lúdicas e de lazer pré-existentes ao traumatismo que
determinou o dano em apreço, revelando-se não só no âmbito esportivo como no
domínio musical por implicar uma significativa quebra na alegria de viver.
4.4 ORIENTAÇÕES JURISPRUDENCIAIS DE TRIBUNAIS BRASILEIROS
A respeito da prescrição para o ajuizamento da ação que objetive a
responsabilidade civil do cirurgião, esta será de três anos para requerer ação
ressarcitória sobre o erro, ocorre com o passar do tempo associada à inércia do
paciente em exercer o seu direito, por um eventual dano sofrido – desaparece a relação
jurídica entre o médico e o paciente. Cita-se abaixo importantes julgados sobre a
responsabilidade do cirurgião plástico:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO
POR DANOS MORAIS. ERRO MÉDICO. CIRURGIA PLÁSTICA.
VALOR DA INDENIZAÇÃO. REVISÃO. 1.- Na linha dos precedentes
desta Corte, a intervenção do Superior Tribunal de Justiça, em sede de
recurso especial, fica limitada aos casos em que o quantum indenizatório se
apresente irrisório ou exagerado diante do quadro fático delimitado em
primeiro e segundo graus de jurisdição. 2.- No caso dos autos, a quantia
afinal fixada pelo Acórdão recorrido (R$ 80.000,00), decorrente de erro
médico em cirurgia plástica estética que deixou cicatrizes nas pernas da
vítima, não pode ser declarada abusiva no âmbito desta Corte de caráter
nacional, devendo permanecer como julgado no Tribunal Estadual, pena de
34
invasão da competência reservada àquele Ente Federativo. 3.- Agravo
Regimental a que se nega provimento. (STJ - AgRg no REsp: 1388272 SC
2013/0187513-0, Relator: Ministro SIDNEI BENETI, Data de Julgamento:
24/09/2013, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe
08/10/2013)
No julgado acima a autora obteve marcas em suas pernas devido ao erro médico
na cirurgia plástica. O réu recorreu quanto ao valor da indenização, no entanto o STJ
manteve o valor de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) que havia sido arbitrado pela corte
estadual. Valor relativamente alto, no entanto não há como quantificar o valor do dano
estético sofrido.
CIVIL. ADMINISTRATIVO. CIRURGIA PLÁSTICA ESTÉTICA DA
MAMA. RESULTADO DESEJADO NÃO ALCANÇADO. PERDA DA
FUNÇÃO DE AMAMENTAÇÃO. HOSPITAL FEDERAL ENVOLVIDO.
RESPONSABILIDADE CIVIL SOLIDÁRIA. DANOS MORAIS E
MATERIAIS. MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
PROCEDÊNCIA. ART. 37, PARÁGRAFO 6º, DA CF/88 C/C ARTS.
1.056, 1.518 E 1538 DO CÓDIGO CIVIL. - COMPROVADO O DANO
ESTÉTICO CAUSADO À AUTORA EM CIRURGIA PLÁSTICA
ESTÉTICA, CABÍVEL INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E
MATERIAIS POR INADIMPLEMENTO DE OBRIGAÇÃO DE
RESULTADO. - PRESENTES OS REQUISITOS DA EXISTÊNCIA DE
DANO
PATRIMONIAL
E/OU
MORAL
SOFRIDO
PELO
ADMINISTRADO (A AUTORA) E O NEXO DE CAUSALIDADE
ENTRE O DANO E A CONDUTA OMISSIVA OU COMISSIVA DO
SERVIDOR (OS MÉDICOS QUE DERAM ALTA), NÃO HÁ COMO
DEIXAR DE RECONHECER A RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA
UFPB NO CASO, NOS MOLDES DO ART. 37, § 6º, DA CF/88. - DEVESE INCLUIR NO BOJO DA CONDENAÇÃO INDENIZAÇÃO POR
DANOS MATERIAIS E MORAIS E OS CUSTOS TOTAIS COM UMA
NOVA CIRURGIA REPARADORA E COM O TRATAMENTO
PSICOLÓGICO.
CONDENAÇÃO
EM
HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS MAJORADA PARA 10% SOBRE O VALOR DA
CONDENAÇÃO FACE À COMPLEXIDADE DA MATÉRIA, À
DURAÇÃO DO PROCESSO E AO DESEMPENHO DO CAUSÍDICO DA
AUTORA - APELAÇÃO DA AUTORA PROVIDA. APELAÇÕES DOS
RÉUS IMPROVIDAS. - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
(TRF-5 - AC: 246781 PB 2001.05.00.008016-6, Relator: Desembargador
Federal Castro Meira, Data de Julgamento: 02/08/2001, Primeira Turma,
Data de Publicação: DJ DATA-17/09/2001 PÁGINA-631)
No julgado supracitado o Tribunal Regional Federal da 5ª Região entendeu que
no presente caso houve responsabilidade solidária do hospital e o cirurgião plástico.
Além disso, seguiu o entendimento da obrigação de resultado do médico estético e que
houve inadimplemento desta obrigação causando dano estético na paciente e
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prejudicando a amamentação. Ainda, reconheceu o dano patrimonial sofrido pela
paciente, aliado ao dano moral pelo mal causado a sua saúde e auto-estima. O dano e o
nexo de causalidade foram observados e reconhecidos. Por fim, o Tribunal entendeu
que os responsáveis devem custear outra cirurgia reparadora. Este julgado sintetiza o
entendimento jurisprudencial sobre a responsabilidade civil do cirurgião estético.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do que foi exposto no presente trabalho, inicialmente introduzindo a
conceituação de responsabilidade civil; o relato histórico da sua aplicação em diversos
casos e, especialmente nos casos que envolviam cirurgias estéticas; os pressupostos da
responsabilidade civil de acordo com a doutrina civilista e jurisprudência nacional e;
por fim, pontuando as nuances envolvendo a responsabilidade civil do cirurgião
plástico, conclui-se que nem todo mau resultado é sinônimo de falha médica.
Nos casos em que se pretende demonstrar a responsabilidade civil do cirurgião
plástico apresenta algumas peculiaridades: a) muitas vezes o cirurgião plástico age
com todo o cuidado que lhe é exigido e esperado, mas algumas vezes as condições do
organismo do paciente favorecem o erro; b) muitas vezes existe uma dificuldade
enorme das vítimas encontrarem provas suficientes para as ações indenizatórias, assim
entra em cena o bom senso do arbítrio do juiz no momento da sentença.
Observe-se que atualmente não existe motivo justificável para o afastamento na
relação médico e paciente. Nesta relação deve existir confiança mútua e respeito, o
médico ciente da complexidade dos procedimentos e o paciente disposto a seguir as
orientações médicas. Assim, para evitar problemas futuros, o cirurgião estético tem o
dever de informar, e em cirurgias estéticas este dever adquire uma importância maior
que em outras relações médicas.
O cirurgião plástico é um profissional liberal e sua responsabilidade civil está
disciplinada no art. 14, § 4º do Código de Defesa do Consumido. Esta
responsabilidade é verificada mediante a observação de culpa. No exercício de sua
profissão, o médico não está obrigado a alcançar determinado resultado, porque entre
ele e o paciente há uma não existe uma obrigação de especificar um resultado. O
compromisso médico é avaliar e utilizar todos os recursos que estão ao seu alcance
para obter a cura do paciente, esgotando assim as providências cabíveis. No entanto,
existem algumas especialidades médicas, dentre elas a cirurgia plástica, que são
absolutamente obrigadas a produzir um resultado, diferenciando-se das demais práticas
médicas.
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No entanto, passando em revista de alguns julgados, percebe-se que o
entendimento da responsabilidade de resultado e absoluta dos cirurgiões plásticos vem
sendo revisto. Isto vem ocorrendo devido as peculiaridades médicas e aos inúmeros
fatores que estão envolvidos quando se fala em manipulação do corpo humano. Porque
cada organismo é diferente e tem reações diversas, mesmo utilizando as mesmas
práticas e intervenções médicas. Some-se a isso, a observância ou não do indivíduo às
indicações médicas pré e pós-cirúrgicas.
No Código de Defesa do Consumidor, o paciente é visto como um consumidor
e o médico é um fornecedor que tem atividades de prestação de serviços. Assim, as
intervenções médicas podem ser consideradas como uma atividade remunerada. Podese depreender deste entendimento que diante disso as disposições contidas no CDC são
aplicáveis nesta relação. No entanto, pontue-se que a responsabilidade civil quando se
tratar de assistência médica prestado por hospital não precisa da comprovação de
culpa.
Atualmente, se o paciente alega falha médica, ele pode pedir a inversão do ônus
da prova, de acordo com o disposto no art. 6º, inciso VIII:
A facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da
prova, a seu favor, do processo civil, quando, a critério do juiz, for
verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras
ordinárias de experiência.
Assim, equilibrou-se a relação entre consumidor e prestador de serviços
também nas relações médico/paciente, evitando-se que as vítimas tenham o prejuízo
completo da relação.
Pontue-se que existem muitas discussões sobre os conceitos e aplicação no que
diz respeito a responsabilidade civil, imprecisos os critérios para se definir o que seria
uma cirurgia estética reparador “perfeita”, caracterização do que seria um “mau
resultado”. Assim, a decisão judicial está ligada de forma indissociável a cada caso
concreto.
Conclui-se que a questão da natureza jurídica da obrigação do cirurgião plástico
ainda é bastante polêmica. Observa-se que a verificação da ocorrência do erro médico
é muito difícil para os operadores do direito.
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Nas demandas de reparação de danos decorrentes de erros estéticos de
cirurgiões, os autores destas ações tentam evidenciar a má-prática do cirurgião,
enquanto que a parte demandada tenda argumentar demonstrando laudos periciais que
não houve omissão ou erro do profissional de acordo com a medicina. Assim, compete
ao magistrado estabelecer se há culpa ou se existe nexo de causalidade entre a
ação/omissão média e o resultado danoso produzido no paciente/cliente. Essa é uma
tarefa difícil.
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