OS TRIBUNAIS DE CONTAS E A EFICIÊNCIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS Ronaldo Chadid1 RESUMO O presente artigo aborda a atuação dos Tribunais de Contas no controle da gestão das verbas públicas e na intervenção da aplicação das políticas públicas, compreendido em suas três etapas integrantes: formulação, implementação e controle. A pesquisa foi realizada através de levantamentos bibliográficos acerca do tema e do estudo dos diplomas legais que regem e norteiam a atuação do controle externo. Tem como objetivo demonstrar que o controle exercido pelos Tribunais de Contas deve ser um instrumento de efetivação das políticas públicas, a partir da contextualização do controle com os novos paradigmas apontados pela doutrina contemporânea e em conformidade com os ditames constitucionais. Nessa perspectiva, almeja-se superar a ideia do controle formal limitado apenas aos aspectos inerentes à legalidade, e buscando na Constituição Federal valores que propiciem uma atuação voltada para uma análise qualitativa das políticas públicas, em especial à luz do Princípio da Eficiência. Palavras-chave: Controle Externo. Tribunal de Contas. Políticas Públicas ABSTRACT This article addresses the role of the Courts of Accounts in control of the management of public funds and the intervention of the application of public policy, understood in its members three steps: formulation, implementation and control. The survey was conducted through literature surveys on the subject and the study of statutes that govern and guide the actions of external control. Aims to demonstrate that the control exercised by the Courts of Accounts must be an effective instrument of public policy, from the context of the control with the new paradigms highlighted by contemporary doctrine and in accordance with constitutional dictates. From this perspective, the goal is to overcome the idea of formal control only limited aspects inherent lawfulness, in the Federal Constitution and seeking values that provide a performance-oriented qualitative analysis of public policies, particularly in light of the Principle of Efficiency. Key-Words: External Control. Court of Auditors. Public Policy 1 Conselheiro e Corregedor-Geral do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul. Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná; Especialista em Direito Civil e Empresarial pelo Instituto Nacional de Pós-Graduação/UCDB. Cursou MBA em Gestão Pública pela Uninter de Curitiba/Pr; Mestre em Direito do Estado pela Universidade de Franca/SP; Doutorando em Direito Administrativo, pela Universidade de Salamanca / Espanha. E-mail: [email protected] INTRODUÇÃO O confronto das arrecadações tributárias com as políticas públicas desenvolvidas pela Administração Pública tem revelado o descontentamento da sociedade, face uma realidade de precariedades em setores essenciais para a dignidade da pessoa humana, como saúde e educação. É cediço que a boa aplicação dos recursos públicos constitui ponto nodal do modelo democrático-republicano do Estado Brasileiro, trazendo como permanente desafio o aperfeiçoamento de mecanismos e o fortalecimento das instituições envolvidas no sistema de Controle da Administração Pública, dentre elas, a atuação dos Tribunais de Contas. Destarte, as expectativas da subsistência do Erário e da regular manutenção da máquina pública com a verificação correta da utilização do dinheiro público estão lançadas à responsabilidade dos Tribunais de Contas. Eis, portanto, a justificativa do presente artigo: verificar como a atuação dos Tribunais de Contas, no exercício do controle externo sobre as políticas públicas implementadas pela Administração Pública, podem garantir a boa aplicação dos recursos e a efetividade dos serviços, através da fiscalização de todas as fases que compõem a realização das políticas públicas. Como objetivo geral, foca-se o estudo do papel do controle externo frente aos atos da Administração Pública, identificando os diferentes modos de intervenção em fases específicas das políticas públicas, e principalmente, verificar como a atuação dos Tribunais de Contas pode contribuir para a real concretização dos direitos fundamentais, na busca de uma gestão pública aprimorada. A escolha do tema da pesquisa resulta da necessidade de aperfeiçoamento das ações dos Tribunais de Contas diante da sinalização de descrédito da sociedade quanto aos institutos de poder e dos seus órgãos de controle, aproximando as decisões emanadas das Cortes de Contas dos valores principiológicos que regem a Administração Pública, na busca da efetivação das políticas públicas. A metodologia utilizada foi a bibliográfica exploratória, pautada no estudo da doutrina e da legislação pertinente ao tema abordado, buscando-se contextualizar no âmbito da tratativa das políticas públicas, o importante papel desempenhado pelos órgãos incumbidos do controle externo. 1. CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E A REPARTIÇÃO ORGÂNICA-FUNCIONAL DO PODER O Estado Democrático de Direito, consubstanciado no artigo 1º da Carta Republicana2, vincula o ordenamento jurídico pátrio, dentre outros, à participação popular, à limitação e ao controle do poder estatal. No particular aspecto da limitação e do controle, vislumbra-se que os poderes devem exercer suas competências em prol e em respeito aos direitos fundamentais, sob o constante e sistematizado controle. Portanto, não há como se falar em democracia, sem a existência do controle, que além da salvaguarda dos direitos fundamentais do cidadão, evita o abuso de poder. Acerca da estreita relação existente entre a democracia e o controle, explica Jorge Ulisses Jacoby Fernandes: Essa concepção [de controle], como facilmente se percebe, só pode permear num país que adote um regime democrático. O controle, como uma função do Estado, exige, como o regime democrático, um grau de desenvolvimento da sociedade e dos agentes da Administração para alcançar seu escopo, evoluindo de modo permanente, como num ciclo de realimentação: democracia – controle – democracia.3 Reconhecido por princípio fundamental da Administração Pública, o Controle pode ser definido como “conjunto de mecanismos jurídicos e administrativos por meio dos quais se exerce o poder de fiscalização e de revisão da atividade administrativa em qualquer das esferas de Poder.” 4 Dentre as várias espécies e classificações de controle, em uma primeira cisão estrutural, temos o controle político e o administrativo. O primeiro, exercido estruturalmente entre os Poderes, cuja repartição e entrelaçamento dá origem ao que se chama de “controle de freios e contrapesos” expressão oriunda do direito norte-americano check and balances5.A exemplo, temos o controle exercido pelo Executivo sobre o Legislativo através do veto político por alegação de contrariedade ao interesse público (art. 66, §1º, CF) e aquele exercido pelo Legislativo e Executivo sobre o Judiciário quando os integrantes das Cortes de Superposição (art. 101, parágrafo único) são aprovados e nomeados por aqueles. 2 Art; 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito (...). 3 FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tomada de contas especial: processo e procedimento nos Tribunais de Contas e na Administração Pública. p. 24. 4 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25.ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 929. 5LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 12.ed. rev., atual. eampl. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 73. Pensa-se que justamente neste propósito é que às Funções Orgânicas do Estado Brasileiro não se talharam à característica da autonomia, como preferiu fazer o Constituinte Originário ao definir a distribuição de poder político, administrativo e financeiro aos Entes de Federação. Tal entrelaçamento de controle é importante na esfera política, visto que justamente no campo macroestrutural, os Poderes com funções orgânicas: criadora e fiscalizadora (Legislativo), gerencial (Executivo) e pacificadora (Judiciário) dão a estabilidade necessária para atingimento dos objetivos colimados pelo detentor primitivo do poder – o povo (art. 1º, parágrafo único, CF). Para o jurista José dos Santos Carvalho Filho, o controle jurisdicional consiste na relevante missão de aferir a constitucionalidade e a legalidade, mormente sob o prisma da salvaguarda dos direitos fundamentais do cidadão. E destaca: A importância do controle judicial, convém que se diga, é mais destacada se levarmos em conta os direitos e garantias fundamentais, estatuídos na Constituição. O Judiciário, por ser um Poder equidistante do interesse das pessoas públicas e privadas, assegura sempre um julgamento em que o único fator de motivação é a lei ou a Constituição. Assim, quando o Legislativo e o Executivo se desprendem de seus parâmetros e ofendem tais direitos do indivíduo ou da coletividade, é o controle judicial que vai restaurar a situação de legitimidade, sem que o mais humilde indivíduo se veja prejudicado pelo todo-poderoso Estado.6 Trata-se, portanto, do controle exercido pelo Poder Judiciário, compreendendo a apreciação de atos, processos e contratos administrativos, atividades ou operações materiais e, até mesmo, omissão da Administração, sendo certo que os limites de interferência no mérito administrativo tem comportado novas interpretações, conforme leciona Benjamin Zymler: A proteção judiciária assegura a incolumidade do princípio da legalidade que orienta a atuação dos poderes públicos. Quanto ao alcance desse mecanismo controlador, é de se destacar a crescente tendência de ampliação do controle jurisdicional, que vem propiciando enfocar a ação administrativa não mais pela ótica de legalidade e da constitucionalidade formal apenas. Passam a constituir objeto de apreciação pelo Judiciário os motivos e os fins do ato administrativo, não como consectários da discricionariedade e mérito, mas sim como elementos integrantes da legalidade.7 Tratando-se de controle, não se pode olvidar daquele exercido pelo detentor da res pública: o povo. Neste contexto, temos o controle social fundamentado no modelo 6 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 18. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. 7 ZYMLER. Benjamin. Direito Administrativo e Controle. Belo Horizonte: Editora Forum, 2006, p. 263. republicano, ganhando especial destaque com a aprovação da Lei Federal nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, a qual entrou em vigor em maio de 2012, regulamentando o direito de livre acesso às informações sob tutela do poder público, previsto no artigo 5º da Constituição Federal, consolidando o regime democrático do país, ampliando a participação cidadã e fortalecendo os instrumentos de controle da gestão pública. Quanto ao controle administrativo, este situa-se num campo mais pragmático e concreto, vez que “pretende alvejar os órgãos incumbidos de exercer uma das funções do Estado – a função administrativa”8. É da essência deste último, a preocupação com a regular movimentação da máquina pública e as suas consequências, já que decorre das ações governamentais a dignificação da pessoa humana através das prestações mínimas existenciais pelo Estado, bem como as relações internacionais que associa a capacidade de gestão do país aos riscos para pretensos acordos internacionais. Neste mirante, por mais que o controle administrativo desenvolva-se em nível mais específico que o político, a má atuação dos órgãos incumbidos do primeiro tem o condão de atingir toda estrutura política do país. Ou seja, atuam em campos distintos, mas são de importância elementar para o Estado. Em passo acelerado, para não se desviar dos objetivos deste artigo, temos ainda no campo das classificações, o controle nominado pelo Poder que o exerce, e, partindo deste parâmetro, outra divisão: se interno ou externo. Feitas tais considerações, passa-se ao estudo do Controle AdministrativoFinanceiro Externo exercido pelos Tribunais de Contas (art. 71, CF). As funções e atribuições dos Tribunais de Contas prestam-se na maioria dos casos, ao controle posterior de atos de gestão da Administração Direta e Indireta, em especial, em relação à análise dos aspectos de legalidade e regularidade dos atos administrativos executivos. De maneira mais contida também atua preventivamente como no caso do confronto das propostas das Leis Orçamentárias aos princípios norteadores da Administração Pública, (p. ex.: art. 78, § 2º da Constituição do Estado de Mato Grosso do Sul). No que concerne ao controle posterior, deparando-se com irregularidades e ilegalidades, o Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul, por exemplo, pode aplicar aos responsáveis as medidas sancionatórias previstas no artigo 44 da Lei 8 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25.ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 929. Complementar n. 160, de 02 de janeiro de 2012, c.c Art. 195 e seguintes do seu Regimento Interno (Resolução Normativa n. 57 de 7 de junho de 2006), quais sejam: multa, inabilitação para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança, declaração de inidoneidade para licitar e contratar com o Poder Público. Ademais, para resguardo do erário público, os diplomas legais em comento preveem ainda as seguintes medidas repressoras: impugnação da despesa (art.312, inciso II, alínea “b” do Regimento Interno); ressarcimento do dano causado ao erário (art. 61 da Lei Complementar n. 160/2012); o bloqueio de bens e contas bancárias da entidade e do órgão jurisdicionado que não realizar tempestivamente sua prestação de contas (art.57, inciso II da Lei Complementar n. 160/2012) e arresto dos bens dos responsáveis julgados em débito com a Fazenda Pública mediante solicitação à Procuradoria Geral do Estado (art. 199 do Regimento Interno). Caso o Tribunal de Contas constate a malversação de verbas públicas decorrente de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, a aplicação de multa (dotada de eficácia executiva) é medida que se impõe, já que neste caso, ainda que na função atípica de julgamento do órgão fiscalizador, a atuação é vinculada. No entanto, superando o modelo da tripartição clássica, a distribuição orgânica e funcional do Poder Estatal não se limita mais às tradicionalmente constitucionalizadas: legislativa, executiva e jurisdicional. Embora uno e indivisível, o poder do Estado possui diversos modos de expressão de forma que cada um deles se desdobra numa função a ser exercida. Deste modo, o Poder é redistribuído de modo a possibilitar a execução de especialidades de diferentes funções. Neste sentido, “a competência, longe de ser um instituto que reparte o Poder Estatal, simplesmente incumbe a determinados entes e órgãos a missão de exercitá-lo, seja de modo exclusivo, compartilhado ou em associação”.9 Sendo, pois, detentor de garantias de autonomia funcional, administrativa e financeira, idênticas a dos demais Tribunais do Judiciário, foram-lhe incumbidas funções que o identificam e o distinguem como uma estrutura política da soberania, no desempenho de diversas atribuições de proteção de direitos fundamentais10, e que traduzem os anseios do chamado Estado de Bem-Estar Social. 9 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. O parlamento e a sociedade como destinatários do trabalho dos Tribunais de Contas. O novo Tribunal de Contas. 3. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2005. p.97. 10 Idem, p. 104. 2. O ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL O Welfare State, Estado de Bem-Estar, constitui-se um sistema de proteção social, desenvolvido pós-Segunda Guerra Mundial e que emergiu dos países capitalistas, configurando-se, segundo Marta Rodrigues: (...) como um campo de escolhas e de soluções de conflitos para decidir sobre a distribuição dos frutos do trabalho social e o acesso de camadas expressivas da população à proteção contra os riscos inerentes à vida em sociedade (como invalidez, exclusão, doença, desemprego involuntário).11 E complementa a autora que, neste contexto, o Estado propicia dentre as diversas medidas econômicas e de política social “a segurança no mercado de trabalho (com p. ex. garantia de salários, de postos e condições de trabalho e representação dos interesses do trabalho), garantia de renda (seguro-desemprego, auxílio-família e auxílio-doença), proteção contra riscos da vida social (saúde, habitação e educação) e pleno emprego, tornando-os direitos sociais assegurados pelo Estado e que, no Estado de Bem-Estar Social constituem-se a própria expressão dos direitos de cidadania”. A evolução do reconhecimento desses direitos sociais varia entre os Estados, pois depende de sua trajetória política, histórica, cultural, educacional e econômica, o que leva a diferentes tipos de Estado de Bem-Estar Social. No Brasil, é cediço que as bases institucionais e legais para Welfare State iniciaram na década de 1930-1940, tendo como marco fundamental a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), mas que, ainda de maneira seletiva tornou o sistema de proteção brasileiro quase que exclusiva a determinados setores, em especial ao funcionalismo público. Como os governos populistas entre 1945 a 1964, e posteriormente após o Golpe de 1964 o Welfare State brasileiro caracterizou-se pela centralização política e financeira no nível federal e que resultaram na ineficiência e ineficácia dos programas sociais, que eram de alto custo e de pouco alcance aos beneficiários. Com a Nova República, pós-regime militar, vieram a tona os graves problemas sociais, de exclusão social, de pobreza e persistência na desigualdade de renda e atrasos nos serviços essenciais à vida como saúde e educação e, à medida em que foram reconhecidos direitos sociais o Estado foi ampliando a sua atuação em resposta às necessidades da população. 11 RODRIGUES, Marta Maria Assunção. Políticas públicas. São Paulo: Publifolha, 2011. p.63. O Estado então, considerado o sujeito em melhores condições para satisfação das necessidades relacionadas à dignidade da pessoa humana, qualifica as de maior relevância, exercendo sua atuação. No entanto, conforme bem observa Marçal Justen Filho, o Estado não é, necessariamente o agente econômico mais eficiente, de forma que, mesmo que qualificado o serviço como público, a atuação estatal pode ser absolutamente secundária, como no caso dos serviços de comunicação de massa por meio de televisão12. Assumindo o Estado outros encargos de natureza econômica e social boa parte dos serviços qualificados como públicos ou se encontram centralizadas no Poder que diretamente exerce sua atividade, ou sofrem a chamada descentralização por serviços, técnica ou funcional, que ocorre quando o Ente (União, Estados ou Municípios) cria uma pessoa jurídica de direito público ou privado, atribuindo-lhe a titularidade e a execução de determinado serviço público (empresas públicas, autarquias e fundações públicas), ou pela a descentralização por colaboração, por meio das mais variadas formas: por acordo de vontades, como concessões, terceirizações, parcerias público-privadas, ou por ato administrativo unilateral, como autorizações e permissões13. A escolha pela centralização ou descentralização desses serviços públicos reflete o plano de implementação das Políticas Públicas adotado pelo Ente Federativo, muitas vezes pautadas, não em qualidade ou resultados, mas apenas no fator quantitativo afim de cumprir apenas o percentual constitucional e legal instituído como obrigatório para as despesas públicas. 3. POLÍTICAS PÚBLICAS NO DESENVOLVIMENTO DOS DIREITOS SOCIAIS A doutrina diverge sobre a natureza das Políticas Públicas, se seriam atos, normas ou atividades. Norberto Bobbio define Políticas Públicas como a “intervenção do Estado no ordenamento da sociedade por meio de ações jurídicas, sociais e administrativas”14, dando significado ao termo a “conjunto de atos”. 12 JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Didática, 2003. p. 3435. 13 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2011. p. 4558. 14 BOBBIO, Norberto et alii. Dicionário de política. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998. p. 782. Maria Paula Dallari afirma que “são programas de ação governamental visando a coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados.”15 Assim, Políticas Públicas contextualizam a existência de programas de ação, ou seja, por atividades coordenadas16 e que, a nosso ver, devem ser implementadas por meio de normas e ações que objetivem a concretização das necessidades socialmente relevantes. Essa intervenção, realizada nas mais diversas áreas pelo Estado constitui expressão das Políticas Públicas e condicionam a aplicação do investimento e das despesas do Erário. Nesse contexto, a implementação das Políticas Públicas não se condiciona à criação de novo órgão ou repartição mas, ao contrário, consiste em estabelecer uma conexão entre as atribuições de órgãos já existentes, de modo a efetivar um direito social17. No caso brasileiro, as Políticas Públicas no âmbito assistência social estão assentes em programas de distribuição de renda mínima que atendem às populações carentes e que representam um poder eleitoral muito grande nas mãos do Poder Executivo.18 Já as despesas em seguridade social, educação, saúde, cultura, ciência, tecnologia, comunicação social, meio ambiente que formam o “núcleo substancial do regime democrático”19, constituem a base do investimento na consecução da ordem social, e mais que isso, na afirmação dos alicerces para o desenvolvimento do país. Nesse ponto é que as Políticas Públicas devem ser exemplarmente geridas e dimensionadas. Bem diagnosticar as demandas e necessidades, planejar os meios e disponibilizar os recursos adequados são os objetivos a serem alcançados para o desenvolvimento dos direitos sociais e para o incremento da efetividade e eficiência do gasto. No entanto, os dispêndios em, por exemplo, educação e saúde, que deveriam estar ligados ao progresso do país, assegurando aos cidadãos as condições mínimas de inserção num mundo globalizado, os indicadores governamentais20 demonstram que as Políticas Públicas encontram-se em dissonância com o que a sociedade necessita e o mercado almeja, 15 DALLARI, Maria Paula. Direito administrativo e políticas públicas. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 241. CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Limites da iniciativa parlamentar sobre políticas públicas. fev. 2013. p. 22. Disponível em: http://www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_discussao/TD122JoaoTrindadeCavalcanteFilho.pdf. Acesso em : 25.03.2013. 17 Idem, ibidem. 18 APPIO, Eduardo. Controle judicial das políticas públicas no Brasil. Curitiba: Juruá, 2012. p. 147. 19 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 1166. 20 Ver: Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul.Índice de desenvolvimento da educação básica e gastos em educação: contribuições para análise das contas municipais do estado do Mato Grosso do Sul. Campo Grande: DGGM, 2012.< http://www.tce.ms.gov.br/publico/ideb/TCE_RELATORIO_IDEB_codigo_qr_completo.pdf> 16 uma vez que ainda há grande exclusão de pessoas que não tenham tido acesso à instrução escolar fundamental e à saúde básica, ou que tenham um baixo rendimento ou aproveitamento, e que se identifica pela baixa produção de textos, na impropriedade corrente da utilização da língua portuguesa e na evidente deficiência para realização de operações matemáticas básicas. Neste passo é que, o encontro das Políticas Públicas com o princípio constitucional da eficiência se faz necessário para consolidação da ordem social e do crescimento cultural, econômico e sustentável do país. 4. POLÍTICAS PÚBLICAS E O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA EFICIÊNCIA Dentre os princípios constitucionais da Administração Pública diretamente ligados à análise qualitativa da aplicação das Políticas Públicas encontra-se o princípio da eficiência. Bem observa Alexandre de Moraes, que a Emenda Constitucional n. 19/98 acresceu expressamente o princípio da eficiência aos princípios constitucionais da Administração Pública, quedando as discussões que pairavam em torno da existência implícita desse princípio na Constituição Federal21. No entanto, ainda persistem as controvérsias sobre as delimitações do significado de efetividade, eficácia e eficiência. Se as Políticas Públicas são a tradução das normas insculpidas na Constituição Federal, a efetividade, eficácia e eficiência devem ser analisadas sob a ótica da realização de seus ditames. Efetividade da norma, assim considerada, ocorre quando o comportamento adotado pelos destinatários das normas estão em consonância com o esperado. Eficácia da norma se considera quando o texto legal é formulado para que os objetivos sejam alcançados e, eficiência da norma se os benefícios oriundos da lei compensam os custos impostos por ela, além de serem os menores possíveis. Portanto, segundo a doutrina de Fernanda Marinela, a eficiência abrange a efetividade e a eficácia, de modo que, “exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional” e consistente “na busca de resultados práticos de produtividade, de economicidade, com a consequente redução de desperdícios do dinheiro público”.22 21 22 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada. 8. ed.São Paulo: Atlas, 2011. p. 725. MARINELA, Fernanda. Direito administrativo. 3. ed. Salvador: Juspodium, 2007. p. 44. Comunga desse entendimento o mestre constitucionalista Alexandre de Moraes, posicionando-se no sentido de que o princípio da eficiência compõe-se das seguintes características: direcionamento da atividade e dos serviços públicos à efetividade do bem comum, imparcialidade, neutralidade, transparência, participação e aproximação dos serviços públicos da população, eficácia, desburocratização e busca da qualidade23, e que refletem mais e mais a vinculação dos atos de Poder aos ditames constitucionais. O desenvolvimento do país traduzido na implementação das Políticas Públicas se realiza pela atuação do Estado frente os planos traçados pela Administração Pública, o que requer a aplicação direta do princípio da eficiência como forma de concretização da própria Constituição Federal. 5. POLÍTICAS PÚBLICAS E A CONCRETIZAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO A descentralização dos serviços públicos deveria ser o reflexo das Políticas Públicas traçadas pelos governos, nas suas diversas esferas de Poder (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) e que devem ser compatíveis e harmônicas com os fundamentos e objetivos preconizados pela Constituição Federal24. Nesse contexto, é imprescindível atentar para a constitucionalização dos diversos ramos do direito, ocasionada pela incidência no seu domínio dos princípios constitucionais, tanto os específicos como (e principalmente) os de caráter geral, que se irradiam por todo o sistema jurídico.25 Bem observa Alexandre de Moraes que, tendo a Constituição Federal estabelecido vários objetivos fundamentais a serem seguidos pelas autoridades constituídas, devem estes servir como vetores de interpretação, de edição das leis e de sua aplicação. Não sendo os objetivos do art. 3º de natureza taxativa, os poderes públicos devem buscar os meios e instrumentos para promover condições de igualdade real e efetiva, devendo existir uma política legislativa e administrativa com a adoção de normas especiais tendentes a corrigir os efeitos de tratamento desigual, buscando a concretização da igualdade social26. Em última análise significa que as Políticas Públicas possuem natureza limitada. Ao contrário do que se preconiza parte da doutrina, entendendo que dentre suas características 23 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada. 8. ed.São Paulo: Atlas, 2011. p. 728-730. Vide arts. 1º e 3º da Constituição Federal. 25 REIS, José Sávio dos. Princípio da eficiência: o que se espera das instituições. In: Revista do Ministério Público de Minas Gerais. ed. 22. 2011. 26 MORAES, Alexandre de. Idem. p. 78. 24 encontra-se a abrangência e a não limitação a leis e regras27, opinamos pelo caráter vinculativo das Políticas Públicas aos preceitos, fundamentos, princípios e objetivos constitucionais, uma vez que a Lei Maior configura-se como Carta Política de observação obrigatória e que não se presta apenas como limitadora do agir dos poderes públicos28, mas como verdadeira diretriz governamental e interpretativa na formulação de Políticas Públicas. No desafio de, não somente fiscalizar burocraticamente os atos de administração, mas de certificar e interferir nas ações da Administração Pública que devem buscar a realização da Justiça Social abandona-se o conceito estanque e restrito das atribuições e funções dos Tribunais de Contas. 6. FUNÇÕES E COMPETÊNCIAS DOS TRIBUNAIS DE CONTAS E A FUNÇÃO DE EFETIVAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS A Constituição Federal, em seus artigos 70 e 71, concedeu aos Tribunais de Contas diversas funções e competências, que a doutrina elenca em nove básicas29: a) função fiscalizadora com a competência de realizar auditorias e inspeções nos órgãos e entidades; b) função judicante, na medida em que efetivamente realiza o julgamento de contas da atividade do Poder Público; c) função sancionadora, multando os responsáveis pela prática de atos irregulares ou ilegais e determinando o ressarcimento dos prejuízos ao erário; d) função pedagógica, no exercício da competência de emitir comunicações, recomendações e orientações; e) função consultiva, quando lhe compete emitir pareceres; f) função informativa, no envio de informações ao Poder Legislativo, expedir alertas previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal e divulgar dados sobre a atividade da Administração; g) função normativa, ao editar normas de sua competência; h) função ouvidora, no recebimento de denúncias; 27 SOUZA, Celina. Políticas públicas: uma revisão da literatura. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/soc/n16/a03n16.pdf. Acesso em: 27 de março de 2013. p. 36. 28 DINIZ, Maria Helena. Norma constitucional e seus efeitos. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 13. 29 ZYMLER, Benjamin, ALMEIDA, Guilherme Henrique De La Rocque. O controle externo das concessões de serviços públicos e das parcerias público-privadas. Belo Horizonte: Fórum, 2005. p. 143-144. i) função corretiva, quando fixa prazos para correção de irregularidades ou que sustem os atos impugnados. 6.1 Jurisdição Especial dos Tribunais de Contas Importante e controversa é a questão da função judicante dos tribunais de contas, que, embora evidente na constituição, gera debates diante da inadmissibilidade de jurisdição a outro poder que não o Judiciário. A discussão faz parte do estudo de renomados doutrinadores30, como lembra Luiz Bernardo Dias Costa: Como o texto da Constituição Federal apresenta o vocábulo “julgamento das contas”, vários autores conferem a característica de jurisdicional a essa atribuição, como por exemplo, Carlos S. de Barros Jr., Jarbas Maranhão e Aécio Mennucci. Por outro lado, Cretella Júnior e Odete Medauar não vislumbram nessa e em qualquer outra atribuição do Tribunal de Contas natureza jurisdicional.31 Enfatiza Jorge Ulisses Jacoby Fernandes: É consabido que para o exercício de qualquer função, exige-se a definição por lei anterior e a determinação de seus limites. Nesse ponto, mostra-se incompreensível o nó górdio que se pretende atribuir à questão, dividindo de um lado os que defendem o exercício da função jurisdicional pelos Tribunais de Contas e, de outro, em pleno antagonismo, os que simplesmente a inadmitem.32 Em uma singela pesquisa do tema no direito comparado33, têm-se as lições de Alessandro Pizzorusso, ao abordar a tratativa da jurisdição da Corte de Contas Italiana, que nesse aspecto, muito se aproxima do direito pátrio34: Si bien la Constitución se inspira, aparentemente, en el princípio de la unidad de jurisdicción – teoricamente deducible de la prohibición de instituir jueces extraordinarios o especiales – lo cierto es que su mismo texto 30 Enfatiza Jorge Ulisses Jacoby Fernandes que: “Não é apenas parte da doutrina que reconhece a função jurisdicional, mas parcela mais dedicada ao estudo do tema. Jarbas Maranhão refere-se ao julgamento de contas como desempenho de atividade judicante pelo órgão. 31 Costa, Luiz Bernardo Dias. Tribunal de Contas: evolução e principais atribuições no Estado Democrático de Direito. Belo Horizonte: Editora Forum, 2006, p. 104 32 FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil. Belo Horizonte: Editora Forum. 2012, p 172. 33 Segundo Frederico Pardini:"a análise comparativa dos dispositivos constitucionais e legais coloca o Tribunal de Contas do Brasil formal e potencialmente à frente até mesmo de Tribunais de Contas considerados os melhores existentes, como o da França, Bélgica e Itália, tribunais esses que tanto contribuíram, inicialmente, para definir, no início do período republicano, o modelo inicial da nossa Corte de Contas. (PARDINI, Frederico. Trbiunal de Contas da União: órgão de destaque constitucional, Tese de Doutorado, Faculdade de Direito da UFMG, 1997) 34 Igualmente, tem-se a lição de Elio Fazzalari, ao reconhecer que a Corte de Contas exerce função jurisdicional. in FAZZALARI, Elio, Istituzioni di Diritto Processuale, 8 ed. CEDAM, Padova, 1996, p.237 introduce ciertas excepciones explícitas a esta regla (…) al reconecer la jurisdicción del Tribunal de Cuentas.35 Encontramos o mesmo posicionamento no direito espanhol, onde Yolanda Gómez Sánchez assevera que: las funciones fiscalizadora y jurisdicional del Tribunal de Cuentas están rigorosamente diferenciadas em lo que a su naturaliza se refiere y es preciso reconocer que, funcionalmente, la segunda está concebida como complemento o instrumento de la primeira y no como mero agregado basado en motivos de especialización u oportunidade36. No ponderado entendimento de Frederico Pardini: É claro que o conteúdo da jurisdição dos Tribunais do Poder Judiciário difere do conteúdo da jurisdição do Tribunal de Contas da União. O conteúdo da jurisdição do Tribunal de Contas, exercida com exclusividade, examina a legalidade, legitimidade e economicidade expressas pelos elementos e valores contidos na prestação ou na tomada de contas públicas; enquanto a jurisdição dos órgãos judicantes do Poder Judiciário, exercida, também, com exclusividade, examina a legalidade e, de certa forma, a moralidade relativas ao comportamento, direito e deveres das duas partes que compõe a relação processual.37 Comunga do mesmo entendimento o ilustre Promotor Rogério Roberto Gonçalves de Abreu, que ao abordar o conteúdo do inciso II do artigo 71 da Constituição Federal explica que: Neste caso, não estamos perquirindo elementos de ordem política, mas de ordem exclusivamente técnica, torna-se o Tribunal de Contas o órgão constitucionalmente competente, agora nos termos do artigo 71, II, da Constituição Federal, para julgar tais contas prestadas e, constatando tecnicamente a ocorrência de prejuízo ao erário, assume o TC a função de responsabilizá-lo pela devida recomposição do patrimônio público lesado pelo ato administrativo praticado. (...) Diante das considerações acima formuladas, e considerando-se que o controle judicial dos atos administrativos se limita à apreciação da legalidade e formalidade, não sendo permitido ao Poder Judiciário, no exercício de tal controle, adentrar no mérito do ato para pesquisar-lhe a chamada justiça da decisão, fácil visualizar-se estarem completamente excluídas, por absoluta incompetência constitucional do poder judicante (consagrando-se a competência constitucional dos Tribunais de Contas), quaisquer ataques ao mérito de 35 PIZZORUSSO, Alessandro. Lecciones de Derecho Constitucional, Centro de Estudios Constitucionales, Madrid, 1984, p. 91 36 SÁNCHEZ, Yolanda Gómez. El Tribunal de Cuentas: el control económico-financeiro externo em el ordenamento constitucional español. Madrid: Marcial Pons, Ediciones Jurídicas y Sociales, 2001. p. 221. 37 PARDINI, Frederico. Tribunal de Contas: órgão de destaque constitucional. In FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil. Belo Horizonte: Editora Forum. 2012, p. 173/174. julgamento realizado pelo Tribunal de Contas, ou seja, ao mérito do ato administrativo decisório.38 Não obstante os posicionamentos que defendem o monopólio absoluto do Poder Judiciário, o texto constitucional prevê casos cuja competência para julgamento foi atribuído a órgão distinto, a saber: julgar as contas prestadas pelo Presidente da República (competência exclusiva do Congresso Nacional); julgar o presidente e o vice-presidente da República, nos crimes de responsabilidade, e os ministros de Estado, nos crimes da mesma natureza, conexos com aquele (competência privativa do Senado Federal); processar os ministros do Supremo Tribunal Federal, o procurador-geral da República e o advogado-geral da União nos crimes de responsabilidade (competência privativa do Senado Federal); julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiro, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo poder público federal, e as contas daqueles que derem causa, perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário (Competência do Tribunal de Contas da União).39 Em evidência, portanto, que a jurisdição de contas é privativa do Tribunal instituído pela Constituição para julgar as contas dos responsáveis por dinheiros ou bens públicos. É certo também, que o judiciário não tem função primeira no exame de tais contas, não tem autoridade para rever, para apurar o alcance dos responsáveis, para os liberar. Essa função é própria e privativa do Tribunal de Contas40, com exceção à ocorrência de preterição a direito subjetivo do jurisdicionado quando, por exemplo, existir algum tipo de cerceamento de defesa, afronta ao contraditório ou ao devido processo legal. Isto em função do princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário, conforme determina o art. 5º, inc. XXXV41 da Constituição Federal. Ensina Nelson Nery Júnior que: “embora o destinatário principal desta norma seja o legislador, o comando constitucional atinge a todos indistintamente, vale dizer, não pode o legislador e ninguém mais impedir que o jurisdicionado vá a juízo deduzir pretensão”42. 38 ABREU, Roberto Gonçalves de. Limites ao controle judicial dos atos dos Tribunais de Contas. in FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil. Belo Horizonte: Editora Forum. 2012, p.179. 39 In FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil. Belo Horizonte: Editora Forum. 2012, p. 154 40 JAPPUR, José. Jurisdição do Tribunal de Contas. Revista do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro n. 3. 41 Art. 5º, XXXV, CF. a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada; 42 NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 2. ed. São Paulo: RT, 1995. p. 87. De igual maneira, ensina Arruda Alvim: “Em primeiro lugar, verifiquemos a ubiquidade. Por este termo, entende-se que a administração da justiça, no sistema jurídico brasileiro, alcança tudo e todos, garantia que deflui do art. 5º, XXXV, da CF/88 ” 43. E mais adiante conclui o autor: (...) também na Constituição Federal, o enunciado de que a instrução de qualquer processo, inclusive na esfera administrativa (art. 5º, LV), será necessariamente contraditória, com ampla defesa e com meios e recursos a isso inerentes. Para o processo civil (lato sensu) e penal, vale dizer, há menção expressa à garantia para aquele que é acusado, ou, para aquele que possa perder seus bens, está assegurado constitucionalmente o direito ao devido processo legal (art. 5º, LIV). Diz-se, ademais, na CF, que nenhuma lesão ou ameaça de lesão a direito pode ser subtraída à apreciação do Judiciário (art. 5º, XXXV); se alguém sofrer uma condenação civil sem ter tido sequer a oportunidade de ser ouvido, estar-se-á, obliquamente, violando a Constituição Federal, especialmente, o art. 5º, incs. XXXV c/c LIV44. O Supremo Tribunal Federal também tem se posicionado firmemente no sentido de assegurar o pleno direito de defesa no julgamento de contas de prefeitos, realizado pela Câmara de Vereadores, com base em parecer elaborado pelo Tribunal de Contas que recomenda a rejeição (art. 31, §1º, e 71 c.c art. 75, CF)45. De forma complementar, cumpre destacar que o STF também se pronunciou sobre a impossibilidade do Judiciário anular decisões em processos de contas, salvo se não observado o devido processo legal.46 Destarte, em uma análise sistêmica do texto constitucional, e amparado no entendimento doutrinário e jurisprudencial que reconhece a jurisdição especial das Cortes de Contas, é certo que, excetuando-se a hipótese de preterição a direito subjetivo do jurisdicionado, não pode o Poder Judiciário rever as decisões emanadas das Cortes de Contas, pois como bem explanou Jorge Ulisses Jacoby Fernandes: “Todas as manifestações das Cortes de Contas têm valor e força coercitiva, como já referido, mas apenas a inscrita no inc. II do art. 71 da Constituição Federal – “Julgar as contas dos [...]” – corresponde a um julgamento, merecendo de todos os órgãos, o respeito, sendo, em tudo e por tudo, exatamente igual à manifestação do Poder Judiciário”. Oportunamente, traz-se à baila as brilhantes palavras de Seabra Fagundes: 43 ARRUDA ALVIM. Manual de direito processual civil: parte geral. v. 1. 9. ed. São Paulo: RT, 2005. p. 9394. 44 Idem, ibidem. 45 Cf. observado por Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco (Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p.539) referindo-se aos acórdãos RE 261.885, Rel. Ilmar Galvão, julgado em 5.12.2000, DJ de 16.3.2001 e cf ainda decisão do Ministro Celso de Mello no RE 235.593, dj DE 22.4.2004. 46 Cf. observado por Jorge Ulisses Jacoby Fernandes. (Tribunais de Contas do Brasil, Belo Horizonte: Editora Forum. 2012, p.194) referindo-se ao REsp n. 55.821/PR, Rel. Victor Nunes, julgado em 18.09.1967, DJ de 24.11.1967; MS nº. 7.280. Relator: Henrique D´Ávila, publicado no DJ 17/09/1964 O teor jurisdicional das decisões, nesses casos, se depreende da própria substância delas; não do emprego da palavra julgamento pelos textos do direito positivo. Resulta do sentido definitivo da manifestação da Corte, pois se a regularidade das contas pudesse dar lugar a nova apreciação (pelo Poder Judiciário), o seu pronunciamento seria mero e inútil formalismo, restando inexplicável a mobilização, para fazê-lo, de um órgão altamente qualificado pelos requisitos de investidura e garantias dos seus membros (...)47 Por fim, examinando a questão, conclui Jorge Ulisses Jacoby Fernandes que o exercício da função de julgar não é restrito ao Poder Judiciário, sendo certo que os Tribunais de Contas possuem competência constitucional de julgar contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiro, bens e valores públicos. O termo julgamento não pode ter outro significado que não corresponda ao exercício da jurisdição, o que só é efetivo se produzir coisa julgada. Avaliando as decisões que não reconhecem a existência de coisa julgada nas decisões proferidas pelos Tribunais de Contas, comenta o autor: Um detido exame das poucas decisões judiciais que não prestigiaram a definitividade das decisões das Cortes de contas revela que, lamentavelmente, incorreram em alguns dos seguintes equívocos: a) desconheceram o funcionamento dos Tribunais de Contas e confundiram-no com mera auditoria; b) não tiveram ciência da amplitude concedida à ampla defesa nessas Cortes e, portanto, buscaram impedir sua efetividade em face da alegação de cerceamento à defesa e ao contraditório; c) gravíssimas deficiências na defesa das decisões dos Tribunais de Contas, normalmente atribuídas aos órgãos que têm pode dever representar a própria Administração e também sujeitos à jurisdição desses tribunais; d) preconceito atribuível a uma deformada imagem dessas Cortes, decorrentes de acontecimentos episódicos.48 É cediço que o ordenamento jurídico pátrio adota o sistema de jurisdição única, ou inglês, significando que somente o Poder Judiciário exerce a função jurisdicional. Entretanto, como visto anteriormente, a Constituição Federal admitiu expressamente várias exceções a esse decantado monopólio absoluto do Poder Judiciário, como por exemplo, o julgamento das contas do Presidente da República, cuja competência é privativa do Congresso Nacional. Certamente, a discussão acerca do sistema da jurisdição una frente à jurisdição especial dos Tribunais de Contas não é matéria pacífica na doutrina e se trata de um tema cujo estudo precisa ser aprofundado, pois como bem esclarece Jorge Ulisses Jacoby: 47 FAGUNDES, Seabra. Os Tribunais de Contas na estrutura constitucional brasileira. In FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil. Belo Horizonte: Editora Forum. 2012, pgs. 180/181 48 FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil. Belo Horizonte: Editora Forum. 2012, pgs. 194/195. Num extremo, por má vontade ou ignorância, ou ambas, perfilam os que desprezam a relevância dessas instituições e, como corolário, só podem ver nas respectivas decisões res nullius; no outro, integrantes de uma elite mais esclarecida, atenta ao inegável avanço institucional que se vem operando, reconhecem que são salutares e necessárias, ponderando pelo valor jurídico e ampla eficácia das decisões dos Tribunais de Contas. Em decorrência, parcela de juristas de escol tem demonstrado pouco interesse no aprofundamento do tema, enquanto outra, por incompreensão das peculiaridades dessa atividade, procura forçar ou ajustar os matizes ao espectro inadequado das teses do direito processual, deformando sua natureza jurídica e seus exatos contornos.49 Não obstante a importância das informações consubstanciadas nas obras bibliográficas, bem como, o relevo intelectual dos posicionamentos sobre o exercício da jurisdição dos Tribunais de Contas, vale lembrar, oportunamente, que sua existência no plano teórico não conduz ao que ocorre na prática, eis que as Cortes de Contas desempenham seu papel constitucional nos termos delineados no inciso II do artigo 71 da Carta Republicana, julgando as contas de gestão, e garantindo através de suas decisões (com força de título executivo), a salvaguarda do erário público. Além dessas, e não menos importante, os Tribunais de Contas, possuem outra função, que constitui reflexo dos anteriores: a função de efetivação ou de efetividade das Políticas Públicas, o que pode ser realizado de diferentes formas no exercício de suas competências. Isso porque além de ser, formalmente, o órgão de previsão constitucional que fiscaliza a efetivação das Políticas Públicas, materialmente é o órgão constitucional subordinante, uma vez que, na realização de suas funções constitui expressão imediata da soberania, além de ser garantidor dos valores maiores do Estado Democrático de Direito50. Muito embora se entenda que não caiba aos Tribunais de Contas avaliar sobre a discricionariedade para escolha das conveniências para determinado caso, não se sujeitando à revisão nem mesmo pelo Poder Judiciário, tal interpretação não se presta à restrição absoluta. O art. 70 da Constituição Federal, alude à legalidade, legitimidade e economicidade para fins de fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, onde segundo Marçal Justen Filho, a expressão legitimidade deve ser interpretada em sentido mais amplo que a legalidade, pois não significa apenas a compatibilidade do ato com as normas legais, mas a correção do ato segundo os princípios fundamentais e as 49 FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Limites à Revisibilidade Judicial das Decisões dos Tribunais de Contas. Disponível em: http://200.198.41.151:8081/tribunal_contas/1998/02/-sumario?next=4. Acesso em 11/09/2013. 50 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Idem. p.104-105. circunstâncias concretas existentes à época da realização do ato e que, abrangerá, sob alguns aspectos o exercício da discricionariedade, ainda que não contemple o mérito da escolha do agente estatal.51 Pode se considerar próprio da natureza do poder conferido aos Tribunais de Contas interferirem no exercício das atividades dos demais Poderes na medida em que é constitucionalmente responsável pela função de verificar a compatibilidade de suas atividades com a Constituição Federal. Nesse sentido cumpre identificar em que momento é efetuado o controle das Políticas Públicas. Sabrina Nunes Iocken entende que referido controle se dá no exercício das funções a que chama de provocação, comprometimento e sancionatória. Na função de provocação, quando induz que determinado problema seja inserido na agenda política através de alertas ou determinados estudos técnicos. Na função de comprometimento quando na constatação de irregularidades exige do poder público um compromisso de correção e por último, na função sancionatória quando aplica multas52. No entanto, no exercício de qualquer das funções exercidas pelos Tribunais de Contas o objeto deve recair sobre os elementos que subsidiaram a discricionariedade administrativa para implementação dos programas avaliados ou eleitos como os essenciais. Assim, seja de maneira preventiva, concomitante à realização da execução da obra ou serviço, ou posterior a eles, as decisões das Cortes de Contas devem pautar-se na valoração de conteúdo definido nos dispositivos constitucionais que são de caráter impositivo e vinculado aos direitos fundamentais e à realização de seus objetivos. A exemplo disso, fazer com que os Municípios implementem o disposto no art. 4753 da Lei Complementar nº 123/06, proporcionando o desenvolvimento local, por meio do incentivo das contratações de micro e pequenas empresas nos processos licitatórios, na forma preconizada pela legislação, constitui dever de observância dos Tribunais de Contas, uma vez que, a fiscalização, não somente a verificação quanto a regularidade contratual oriunda das licitações deve ser objeto de sua apreciação. 51 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 8. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 1134. IOCKEN, Sabrina Nunes. As funções do Tribunal de Contas no controle de políticas públicas. Dissertação. Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina. 20.09.2012. 53 Art. 47, da Lei Complementar 123/2006: “nas contratações públicas da União, dos Estados e dos Municípios, poderá ser concedido tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica, desde que previsto e regulamentado na legislação do respectivo ente.” 52 Interferir nas decisões de escolha e implementação de ações que tenham reflexo no equilíbrio ambiental, e para garantir um meio ambiente preservado com preocupação no bem-estar humano, constitui tarefa dos Tribunais de Contas quando se avaliam, por exemplo, os contratos de limpeza pública e aterramento em todas as suas fases, necessitando atenção especial em função da complexidade decorrente da diversidade de interesses e valores em questão para fazer suplantar o interesse social frente ao particular. Outro exemplo é a exigência do Estudo e Relatório de Impacto Ambiental para realização de obras públicas. Promover a capacitação dos jurisdicionados para assuntos técnicos e fomentar a discussão do Controle Público da Administração propiciando o estudo sobre aspectos estratégicos e técnicos da Administração Pública também constitui forma de atuação dos Tribunais de Contas para implementação das Políticas Públicas. Realizar parcerias com Associações de Municípios, Controladoria Geral da União e Ministérios Públicos; realizar avaliações junto à população sobre a qualidade dos serviços oferecidos; divulgar amplamente os gastos e investimentos públicos nos diversos setores eleitos pela Administração Pública; proceder ao levantamento atualizado dos investimentos e análise em conformidade com os planos de ação; realizar inspeções periódicas in loco dos investimentos em infraestrutura realizados para aferir a capacidade de duração das obras realizadas; instituir política de gestão de pessoas idênticas aos utilizados na iniciativa privada junto aos Tribunais de Contas e aos jurisdicionados constituem ferramentas eficientes, possíveis e desejáveis para tornar Políticas Públicas em resultados reais de melhoria e desenvolvimento do país. 6.2 Auditorias Operacionais – Instrumento de Efetividade para as Políticas Públicas No exercício da função de auditoria, merece especial destaque em relação ao tema em comento, a auditoria operacional54, cujo conceito é bem explanado pelo estudo apresentado por Arlindo Carvalho Rocha: O conceito que mais se aproxima do que deva ser uma auditoria operacional, dentro do enfoque do Controle Externo, entretanto, é aquele que concebe a Auditoria Operacional como uma avaliação da eficácia de uma entidade em cumprir seus objetivos, programas e metas, e da legalidade, economicidade e eficiência na administração de seus recursos.(...) Preliminarmente, cabe ressaltar que a auditoria operacional é uma evolução natural da auditoria tradicional, que deixou de ser especificamente contábil para tornar-se 54 Também denominada como auditoria gerencial, auditoria de programas, auditoria de resultados ou auditoria moderna. abrangente, acrescentando à verificação da legalidade e correção dos registros contábeis, a determinação da economicidade e eficácia das entidades.55 Embora não seja um assunto novo, a auditoria operacional é uma técnica de emprego e estudo relativamente recentes nos órgãos de controle externo. Sabe-se que o precursor da adoção deste método foi o Tribunal de Contas da União, que o aplica desde meados da década de 90. Trata-se de uma aprimoração da auditoria de regularidade, que surgiu diante da necessidade de dar uma resposta à sociedade quanto à atuação da Administração Pública na gestão das verbas públicas. A idéia é que a legalidade é apenas um aspecto a ser analisado no ato do administrador, pois conforme própria determinação do artigo 70 da Carta Magna, têm os Tribunais de Contas poderes para exercer a "fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas" (grifo nosso). Nessa esteira, temos que a adoção da auditoria operacional faz-se necessária diante da necessidade do controle e da permanente avaliação do desempenho das entidades governamentais vinculadas ao aspecto ético-moral de responder à sociedade pelo bom emprego dos recursos públicos, pois um dos princípios fundamentais das sociedades democráticas é o de que o Poder Público tem a obrigação de prestar contas de suas ações, não só explicitando os objetivos e programas contemplados com recursos públicos, como também a forma como tais recursos foram empregados e os resultados obtidos.56 Portanto, não basta para implementação das Políticas Públicas que os gastos limitem-se ao percentual a ser dispendido em cada área, determinada pelo Estado como essencial ao atendimento das necessidades sociais. Assim, cresce a importância da valorização do conteúdo das Políticas Públicas na medida em que “deve abarcar desde a análise dos motivos que tornam necessária determinada intervenção, o planejamento das ações para o desenvolvimento da iniciativa, a definição dos agentes encarregados de implementá-la, o levantamento das normas disciplinadoras pela qual será regida, até a fundamental avaliação de 55 ROCHA, Arlindo Carvalho. Função da Auditoria Operacional na Avaliação e no Controle de Entidades Governamentais. Acesso em 28/03/2013. Disponível em: http://www.betatreinamento.com.br/visita/Funcao%20da%20Audit%20Op.htm 56 IDEM. impactos, sejam potenciais – em uma avaliação ex-ante, que estabelece expectativas e justifica a aprovação da política – sejam reais, medidos durante ou após sua execução.”57 Assim, seja de maneira preventiva58, concomitante59 à realização da execução da obra ou serviço, ou posterior60 a eles, as decisões das Cortes de Contas devem pautar-se na valoração de conteúdo definido nos dispositivos constitucionais que são de caráter impositivo e vinculado aos direitos fundamentais e à realização de seus objetivos. Desta forma, gradativamente, amplia-se o processo fiscalizatório e, conjuntamente com a análise da regularidade e legalidade na realização das receitas e na aplicação das receitas, deve o Tribunal de Contas realizar a auditoria governamental e operacional com vistas a acompanhar, aprimorar e contribuir com a eficiência das Políticas Públicas., pois como bem delineou Jorge Ulysses Jacoby Fernandes: No novo milênio, tal como já prevê a atual Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União e de todas as esferas de governo, os Tribunais de Contas analisam a eficiência dos órgãos jurisdicionados. Por esse motivo, no mundo inteiro, as entidades de fiscalização externa caminham por abandonar o controle contábil e buscar o controle gerencial, que não se limita a dizer se a despesa foi realizada de acordo com os critérios de validade da contabilidade, mas define a contabilidade analítica de custos e busca de resultados efetivos. Luz para o princípio da eficiência, colaborando com o processo decisório de políticas públicas, como o controle tradicionalmente estabelece o feedback para o sistema administrativo, o redirecionamento das ações programadas.61 Grifou-se 57 MENEGUIN, Fernando B; FREITAS, Igor Vilas Boas de .Aplicação em avaliação de políticas públicas: metodologia e estudos de casos. In: Núcleo de Estudos e Pesquisas do Senado, n. 123, Março de 2013. p. 1. URL: www.senado.gov.br/conleg/nepsf1.html<acesso em 25.03.2013> 58 TCU. Acórdão 436/2008 Plenário (...) Elabore procedimento formal para condução de processos licitatórios, em atenção ao princípio constitucional da eficiência, com vistas ao atendimento da legislação pertinente, delegando atribuições e imputando responsabilidade as diversas áreas envolvidas nas contratações. TCU. Acórdão 341/2009 Plenário: Realize a análise de custo/beneficio em cada Processo de contratação, relacionado a terceirização de serviços de sua área-meio, para aferir se é mais vantajoso terceirizar o serviço ou executá-lo com empregados do próprio quadro, tendo em vista os princípios constitucionais da eficiência e da economicidade, insculpidos nos arts. 37, caput, e 70, caput, da Constituição Federal de 1988. 59 TCU. Acórdão 331/2009 Plenário (Voto do Ministro Relator) Inadmissível que a própria Administração reconheça como legitima a superestimava de quantitativos de serviços como forma de margem de segurança para eventuais distorções. Assiste total razão a Secob nesse ponto. Em hipótese alguma a insuficiência do projeto básico justifica a adoção de ato incompatível com os princípios da legalidade - por absoluta falta de amparo na Lei de Licitações - e da eficiência, ensejador de expedição de determinação ao Órgão para que proceda a sua anulação, sem prejuízo da aplicação de multa aos Responsáveis que lhe deram causa. 60 Irregularidades na contratação de serviços de hemodiálise e terapia substitutiva renal - TRS pela Secretaria de Saúde do Distrito Federal/SES-DF. Realização de Inspeção. Constatação de ineficiência na prestação dos serviços. Contrato Irregular firmado com a Empresa Imunotech Ltda. Suspenso. Pendência na adoção de providências determinadas ou recomendadas pela CGU e auditoria do próprio órgão. Conhecimento. Procedência. Determinações e comunicação. Restituição à unidade técnica para acompanhamento (ACÓRDÃO 2357/2011 ATA 36 - PLENÁRIO. Relator: JOSÉ JORGE - REPRESENTAÇÃO. Diário Oficial da União: vide data do DOU na ATA 36 - Plenário, de 31/08/2011) 61 FERNANDES, Jorge Ulysses Jacoby. Tribunal de Contas do Brasil: Jurisdição e Competência. 2ª ed. Belo Horizonte:Fórum, 2005, p.265 Cabe salientar que, ao contrário do Poder Judiciário que tem limitada as informações sobre atuação financeira da Administração Pública para conseguir fazer valer a implementação das Políticas Públicas, os Tribunais de Contas mantêm em seus registros uma quantidade enorme de informações; verdadeiro aparato técnico para identificação das reais prioridades sociais e que podem culminar com a revisão (e não substituição) dos atos praticados pelos demais Poderes, e que coloca o Tribunal de Contas na ordem do dia e na vanguarda para efetivação das Políticas Públicas para o progresso e crescimento do país. CONCLUSÃO As Políticas Públicas devem traduzir os fundamentos, objetivos e princípios insculpidos na Constituição Federal, e por esta força normativa a atuação do Poder Público deve estar limitada. No entanto, num aspecto mais importante, que é o de dar direcionamento às ações oriundas das Políticas Públicas eleitas pela Administração, revela-se a vinculação de sua atuação para preservação e garantia da dignidade da pessoa humana, a realização dos direitos sociais e a constituição do Estado de Bem-Estar social. As Políticas Públicas, portanto, constituem-se de modelos, de programas, de atos e de normas que consolidam os direitos sociais que devem ser inspecionados, analisados e fiscalizados pelos Tribunais de Contas, órgãos constitucionalmente incumbidos de garantir a regular aplicação da verba pública com vistas à garantia do desenvolvimento de políticas públicas que sejam consentâneas com o esperado pela sociedade, guardando obediência não apenas à lei, mas também a valores de ordem constitucional como a economia, a eficiência e a efetividade. É certo que os Tribunais de Contas sofreram grande evolução com o advento da Constituição Federal de 1988, passando a desempenhar funções e competências que ultrapassam os conceitos de tripartição de poderes. Com efeito, o modelo de controle preconizado pela nossa Carta Magna atribui aos Tribunais de Contas missão que supera a barreira da legalidade, buscando satisfação de resultado, estando por conseqüência, compelidos e autorizados a buscar os valores contidos em princípios constitucionais na aferição das políticas públicas. A forma de se proteger os valores constitucionais e a realização das Políticas Públicas pelos Tribunais de Contas deve ocorrer tanto de maneira preventiva, quanto no momento da atuação da Administração, bem como em momento posterior, assegurando o correto emprego do dinheiro público, a busca do interesse social e o desenvolvimento do país, o que será possível através do aprimoramento dos meios de atuação e do fortalecimento dos órgãos incumbidos pelo controle externo. Nesse contexto, apresentam-se os Tribunais de Contas em sua atuação preventiva através de pareces aos jurisdicionados, onde, oportunamente, pode emitir alertas e orientações quanto à destinação das verbas públicas e sua regular aplicação. Concomitante à atuação do gestor público, as auditorias operacionais apresentam-se como o instrumento adequado para, não apenas resguardar a legalidade do ato, mas também analisar o planejamento, a organização, a eficiência, a economicidade e por fim, o resultado das políticas públicas em relação aos objetivos pretendidos. Em uma derradeira situação, constatada a malversação do dinheiro público, podem as Cortes de Contas sancionar os ordenadores de despesas com medidas que vão desde a aplicação de multas até a impugnação dos valores despendidos para o ressarcimento ao erário. Em conformidade com o exposto, dispõe o ordenamento jurídico brasileiro de um sistema de controle capaz de, através de uma atuação nos moldes delineados pela Constituição Federal de 1.988, buscar do poder público o desenvolvimento e a efetivação de políticas públicas que garantam à sociedade saúde, educação, moradia e condições de vida que correspondam ao princípio fundamental da República Federativa do Brasil: a Dignidade da Pessoa Humana, e ainda, que expressem a eficiência, a economicidade e os demais valores constitucionais que regem a atuação do administrador público. Como consignou o então Ministro Carlos Ayres Britto: o Tribunal de Contas cuida de tudo o que é de todos; evita a desadministração e o desgoverno, e contribui para o melhor compartilhamento do patrimônio social. O desiderato constitucional é esse: se na prática os Tribunais de Contas ainda não corresponderam à confiança que a lei maior lhes atribuiu, tratase de disfunção ou defecção que urge corrigir. 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