PALESTRA – NASCITURO 15 -06-2011 Art. 1º. Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil. Na acepção jurídica, segundo Washington de Barros Monteiro, pessoa é o ente físico ou moral, suscetível de direitos e obrigações. Espécies de pessoas: pessoa física ou natural ( o ser humano) e pessoa jurídica ou pessoa moral (empresas, associações, etc.). Art. 2º. A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Conceito de nascituro: Silvio Rodrigues: nascituro é o ser já concebido, mas que ainda se encontra no ventre materno. Todo aquele que nasce com vida torna-se pessoa, ou seja, adquire personalidade. Personalidade civil: aptidão para adquirir direitos e assumir obrigações na ordem civil. Surge com o nascimento com vida. Considera-se nascido com vida a criança que respirou. Se respirou, viveu. Se viveu adquire e transmite direitos, ainda que tenha vivido poucos segundos. Diferença entre adquirir pessoalmente tais direitos. direitos e exercer Nem todos podem exercer pessoalmente seus direitos, isto em razão da idade, do estado de saúde, do desenvolvimento intelectual de determinadas pessoas. O incapaz é sujeito de direitos, mas, não pode exercê-los pessoalmente. Dúvida quanto ao nascimento com vida e morte em seguida. Cabe à medicina dizer se houve nascimento com vida. Na prática: caso tenha havido nascimento com vida, haverá dois registros: o de nascimento e o de óbito. Lei dos Registros Públicos: Art. 53. No caso de ter a criança nascido morta ou no de ter morrido na ocasião do parto, será, não obstante, feito o assento com os elementos que couberem e com remissão ao do óbito § 1º No caso de ter a criança nascido morta, será o registro feito no livro "C Auxiliar", com os elementos que couberem. § 2º No caso de a criança morrer na ocasião do parto, tendo, entretanto, respirado, serão feitos os dois assentos, o de nascimento e o de óbito, com os elementos cabíveis e com remissões recíprocas. Segundo a doutrina tradicional, o nascituro, enquanto tal, não tem personalidade e, portanto, não adquire direitos. Todavia, esses direitos são resguardados desde a concepção. Modernas teorias: ressalvados os direitos patrimoniais materiais (decorrentes de herança, doação e seguro), o nascituro adquire direitos desde a concepção, como os chamados Direitos da Personalidade: Direito à Vida (proibição do aborto), Direito à Integridade Física (cirurgias intra-uterinas). Teria assim, o nascituro direito a uma gestação saudável (ECA). Estatuto da Criança e do Adolescente: Art. 8° - É assegurado à gestante, através do Sistema Único de Saúde, o atendimento pré e perinatal. § 1° - A gestante será encaminhada aos diferentes níveis de atendimento, segundo critérios médicos específicos, obedecendo-se aos princípios de regionalização e hierarquização do Sistema. § 2° - A parturiente será atendida preferencialmente pelo mesmo médico que a acompanhou na fase pré-natal. § 3° - Incumbe ao Poder Público propiciar apoio alimentar à gestante e à nutriz que dele necessitem. § 4º Incumbe ao poder público proporcionar assistência psicológica à gestante e à mãe, no período pré e pós-natal, inclusive como forma de prevenir ou minorar as consequências do estado puerperal.1 ( conjunto de regras de proteção à mãe e ao nascituro) Para os direitos patrimoniais materiais: enorme importância prática entre o nascer com vida, embora haja a morte imediatamente após e o nascer morto. Se a criança nasce morta, não recebe e nem transmite direitos. Se nasce com vida, ainda que por pouquíssimo tempo, recebe e transmite direitos. Exemplo com base em Silvio Rodrigues: “Suponha-se que um indivíduo, sem filhos, morreu deixando esposa grávida. Se a criança nascer morta, o patrimônio do de cujus passará aos herdeiros deste; se a criança nasceu viva, morrendo no segundo subseqüente, o patrimônio de seu pai pré-morto passará a seu filho (que viveu um segundo) e o patrimônio deste filho a seus herdeiros, no caso, sua mãe. Na hipótese de seguro de vida, em que o segurado tenha indicado como beneficiários seus filhos, tendo dois filhos vivos e a esposa grávida. Havendo nascimento com morte (nati-morto), o capital será dividido em duas partes iguais. Havendo nascimento com vida, o capital será dividido em três partes iguais. Tendo o terceiro filho vivido um só segundo, a parte do capital que a ele couber passará para sua herdeira, a mãe. Lembrar que a seguradora deve aguardar o parto, para então efetuar o pagamento de uma das partes a quem de direito. DO ACÓRDÃO DO STJ EMENTA 1- Atropelamento de mulher grávida, quando trafegava de bicicleta por via pública, acarretando a morte do feto quatro dias depois com trinta e cinco semanas de gestação. 2- Reconhecimento do direito dos pais de receberem a indenização por danos pessoais, prevista na legislação regulamentadora do seguro DPVAT, em face da morte do feto. 3 -Proteção conferida pelo sistema jurídico à vida intra-uterina,desde a concepção, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana. 4 -Interpretação sistemático-teleológica do conceito de danos pessoais previsto na Lei nº 6.194/74 (arts. 3º e 4º). 5 -Recurso especial provido, vencido o relator, julgando-se procedente o pedido. Penso que o acórdão estabelece, em princípio, dois limites: a decisão se aplicaria só para o DPVAT e ao feto viável. “Em prevendo, a LF n. 6.194, o direito à percepção de indenização pelo seguro obrigatório DPVAT à pessoa vitimada, , fez-se alcançar também o nascituro.” “Em outras palavras, deve-se estabelecer se o presente caso enquadra-se na expressão "indenizações por morte" estatuída no enunciado normativo acima transcrito (Lei do DPVAT). Tenho que a interpretação mais razoável desse enunciado normativo, consentânea com a nossa ordem jurídico-constitucional, centrada na proteção dos direitos fundamentais, é no sentido de que o conceito de "dano-morte", como modalidade de "danos pessoais", não se restringe ao óbito da pessoa natural, dotada de personalidade jurídica, mas alcança, igualmente, a pessoa já formada, plenamente apta à vida extra-uterina, embora ainda não nascida, que, por uma fatalidade, acabara vendo a sua existência abreviada em acidente automobilístico. Note-se que a filha dos postulantes encontrava-se na 35ª semana de vida, nono mês de gestação, ou seja, era plenamente hábil à vida pós-uterina, autônoma no seu desenvolvimento, apenas não independente, porque necessitava, ainda, por mais alguns dias, da "alimentação" que lhe provia sua mãe (alimentação aqui compreendida como o sustento para a sua sobrevivência no ambiente intra-uterino). Era indivíduo totalmente autônomo, intrinsecamente dotado de individualidade genética, emocional e sentimental, como interessantemente relata Márcio Accioly de Andrade na obra Dignidade da Pessoa Humana, Fundamentos e Critérios Interpretativos (Organizado por Arasses Almeida Filho e Plínio Melgaré, Editora Malheiros, São Paulo: 2010, pp. 140/141).” “Com a vênia das relevantes vozes em contrário, não logro retirar essa importante parcela da população brasileira do alcance de seguro obrigatório, seguro que, como bem destacou o e. relator, tem caráter especial devido a sua marcante finalidade social, voltado a minorar os deletérios danos pessoais causados às vítimas de sinistros automobilísticos.” (parcela da população brasileira: os nascituros) “No presente caso, sonegar-se o direito à cobertura pelo seguro obrigatório de danos pessoais consubstanciados no fato "morte do nascituro" entoaria, ao fim e ao cabo -especialmente aos pais já combalidos com a incomensurável perda -a sua não existência, malogrando-se o respeito e a dignidade que o ordenamento deve reconhecer e reconhece inclusive àquele que ainda não nascera (art. 7º da LF n. 8.069/90). “Sobrelevando-se os direitos à tutela da pessoa humana, tenho por plenamente possível extrair da legislação infraconstitucional que disciplinara o seguro obrigatório a contemplação do direito à indenização pela morte do nascituro.” O Acórdão não desejou inovar na interpretação do art. 2º, do CCB. Com efeito, não haveria, sequer, necessidade de se proceder à nova exegese do dispositivo de lei (art. 2º do CCB) que reconhece o início da personalidade civil -não é o que aqui se pretende -senão evitar o esvaziamento da existência digna de um ser humano que chegou, de forma tão serôdia, à morte, preservando-se, ainda, o ideal que todo o pai faz em torno do seu filho, sua significação, sua relevância na vida familiar.(Nesta parte final do parágrafo o acórdão aproxima-se da indenização por dano moral?.) Haveria no acórdão abertura para a aplicação a todo contrato de seguro? Por derradeiro, não haveria ainda considerar-se empecilho o fato de o nascituro, em não possuindo personalidade jurídica, não ser apto à transmissão de direitos aos seus ascendentes, porque aqui se está diante de contrato de seguro (em que pese legal). CONCLUSÕES: 1 O acórdão não alterou a interpretação tradicional dada ao art. 2º, CCB, principalmente quanto aos direitos materiais. 2 Em relação seguro DPVAT, o acórdão representa um precedente da maior importância, havendo probabilidade desse entendimento se cristalizar. 3 Em relação aos demais seguros de pessoas, é possível, mas não é provável, que os fundamentos do acórdão sejam a eles aplicáveis. Via de conseqüência, no processo de regulação de sinistros não há necessidade de que sejam alterados os critérios em vigor.