Aspectos históricos e perspectivas
atuais do desenvolvimento da
educação algébrica no Brasil
Antes do movimento da matemática moderna
Durante o movimento da matemática moderna
Após o movimento da matemática moderna
A álgebra antes do movimento da
matemática moderna



Século XIX e início do XX: disciplinas
matemáticas ensinadas separada e
sucessivamente na escola secundária.
Aritmética, Álgebra, Geometria e
Trigonometria, com programas, livros e
professores diferentes.
Equilíbrio enciclopédico: tudo era importante
e essencial; falta de clareza em relação aos
objetivos.
A álgebra antes do movimento da
matemática moderna



1931: Reforma Francisco Campos – primeira
organização nacional da educação no Brasil.
Legislação prevê uma única disciplina:
“Matemática”; gradativamente vão desaparecendo os
livros didáticos separados de Aritmética, Álgebra,
Geometria e Trigonometria.
Surgimento de coleções de livros para as cinco ou
quatro séries do ginásio (cinco na RFC, quatro na
Reforma Gustavo Capanema, de 1942).
A álgebra antes do movimento da
matemática moderna
Os tópicos ensinados:
 Cálculo algébrico (inclusive operações com
polinômios)
 Razões e proporções
 Equações e inequações do 1º grau
 Sistemas de equações
 Radicais (operações e propriedades)
A álgebra antes do movimento da
matemática moderna
Os tópicos ensinados:
 Equações do 2º grau
 Trinômio do 2º grau
 Equações redutíveis ao 2º grau
 Problemas do 2º grau
 Sistemas de equações do 2º grau
A álgebra antes do movimento da
matemática moderna


A abordagem utilizada: mecânica e
automatizada
Relação de complementaridade entre
Aritmética e Álgebra: a Álgebra, devido ao
seu poder de generalização, era encarada
como ferramenta mais potente que a
Aritmética, pelas suas possibilidades na
resolução de problemas.
A álgebra antes do movimento da
matemática moderna



A concepção de educação algébrica:
lingüístico-pragmática.
Ênfase no transformismo algébrico (processo
de obtenção de expressões algébricas
equivalentes entre si mediante o emprego de
regras e propriedades).
O transformismo algébrico seria um prérequisito para uma “álgebra aplicada”
(resolução de problemas).
A álgebra antes do movimento da
matemática moderna


A concepção de educação algébrica:
lingüístico-pragmática.
Caracterização do transformismo algébrico:
seqüência de tópicos que, partindo do estudo
das expressões algébricas, passava pelas
operações com essas mesmas expressões,
chegando às equações, para, finalmente,
utilizá-las na resolução de problemas.
A álgebra antes do movimento da matemática
moderna: um exemplo de um livro de 1928
Quadro 1
Ensino da Álgebra: multiplicação de expressões
algébricas
1º caso: Para multiplicar um monomio por outro,
multiplicam-se os coefficientes e, em continuação,
escrevem-se as letras, affectando cada uma de um
expoente egual á somma dos expoentes que a mesma
letra tem nos monomios, e ao producto obtido dá-se
o signal que lhe corresponde, segundo a regra dos
signaes.
A álgebra antes do movimento da matemática
moderna: um exemplo de um livro de 1928
Exemplos:
(3a²b) (4ab²c) = 12a³b³c;
(-7xy) (5x²z) = - 35 x³yz;
(5m2n4p6) (- 5m n³p5r4s) = - 25m³n7p11r4s;
(-3a³b4c)(-2a4b²c²d) = 6a7b6c³d.
A álgebra antes do movimento da matemática
moderna: um exemplo de um livro de 1928
2º caso: Regra. Para multiplicar um polynomio por um
monomio, multiplica-se, pela regra do primeiro caso,
cada um dos termos do polynomio pelo monomio, e
sommam-se os productos parciaes.
É a mesma regra da multiplicação de uma somma e de
uma differença indicada por um número, já
demonstrada em arithmetica.
(Pérez y Marín, Elementos de Álgebra, 6ª ed. São
Paulo: Liceu Coração de Jesus, 1928)
A álgebra durante o movimento da
matemática moderna


Dos fim dos anos 1950 ao fim dos anos 1970:
predomínio das idéias do movimento no
Brasil
Introdução de elementos unificadores dos
campos da aritmética, da álgebra e da
geometria: linguagem dos conjuntos,
estruturas algébricas (base para a construção
lógica do edifício matemático)
A álgebra durante o movimento da
matemática moderna


Lugar de destaque para a álgebra: os avanços da
Matemática desde o século XVIII resultaram da
algebrização da Matemática Clássica, tornando-a
mais rigorosa, precisa e abstrata.
A aritmética, em vez de, como anteriormente,
enfatizar as técnicas operatórias, passa a ser
apresentada como o estudo dos conjuntos numéricos,
ordenados segundo sua complexidade estrutural.
A álgebra durante o movimento da matemática
moderna: comparação de duas definições

“Equação é toda igualdade que exprime uma
relação entre as quantidades conhecidas e
desconhecidas de um problema, sendo as
quantidades conhecidas os dados do problema
ou da equação e as quantidades desconhecidas
as incógnitas” (Pérez y Marín, Elementos de
Álgebra, 6ª ed. São Paulo: Liceu Coração de
Jesus, 1928)
A álgebra durante o movimento da matemática
moderna: comparação de duas definições

“A toda sentença aberta, que encerra a relação
de igualdade e que se torna verdadeira para
determinados valores das variáveis, dá-se o
nome de equação. Para que as sentenças se
tornem verdadeiras é necessário que se dê às
variáveis valores que pertençam a um
determinado conjunto universo” (Zambuzzi,
Orlando. Ensino Moderno da Matemática. 4ª
ed. São Paulo: Editora do Brasil, v. 2, 1965).
A álgebra durante o movimento da matemática
moderna: comparação de duas definições

A preocupação pragmática do ensino antigo, que
fazia com que o conceito de equação viesse
imediatamente associado à necessidade de resolver
problemas está ausente da segunda definição. Em
seu lugar, coloca-se a ênfase na precisão matemática
do conceito e na linguagem “adequada” para
expressá-lo. (Antes de se chegar à definição de
equação, o estudante deveria digerir termos como
“sentença aberta”, “sentença numérica”, necessárias,
segundo os modernistas, à compreensão do conceito
de equação)
A álgebra durante o movimento da
matemática moderna


Propõe-se que o estudante domine os
conceitos abstratos de “operação”, “relação”,
“função”, relacionados ao produto cartesiano
de dois conjuntos.
A concepção de educação algébrica:
fundamentalista-estrutural: fundamentação
dos cálculos aritméticos através das
propriedades estruturais de cada conjunto
numérico estudado.
A álgebra durante o movimento da
matemática moderna

A concepção de educação algébrica:
fundamentalista-estrutural: a introdução de
propriedades estruturais dos números que
justificassem logicamente cada passagem do
transformismo algébrico capacitaria o
estudante a aplicar essas estruturas nos
diferentes contextos a que estivessem
subjacentes.
A álgebra durante o movimento da
matemática moderna

A concepção fundamentalista-estrutural levou a uma
reorganização dos conteúdos algébricos (expressões
algébricas, valores numéricos, operações, fatoração)
no sentido de que eles fossem precedidos, no ensino,
por “tópicos fundamentais”: conjuntos numéricos,
propriedades estruturais, estudo dos quantificadores,
sentenças abertas e fechadas, conjunto-universo,
conjunto-verdade, equações e inequações do 1º grau,
e sucedidos por “novos conteúdos algébricos”:
funções, vários tipos de funções etc.
Um exemplo de um livro didático do movimento da
matemática moderna (concepção fundamentalista-estrutural)
Demonstre que: (a.b): a = b
Transformações
(a.b): a =
(b.a): a =
= (b .a). 1/a =
= b. (a.1/a) =
= b.1 =
=b


Propriedades
comutativa
definição do divisor em R*
associativa
produto de elementos inversos
elemento neutro
A álgebra após o movimento da
matemática moderna


Com o movimento da matemática moderna, a a
Matemática perdeu seu caráter preponderantemente
informativo e pragmático.
Os modernistas não conseguiram realizar o seu
projeto formativo, segundo o qual a subordinação
dos conteúdos às estruturas seria capaz de dotar o
aluno da capacidade de aplicar essas formas
estruturais de pensamento aos mais diversos
domínios, inclusive os extra-matemáticos.
A álgebra após o movimento da
matemática moderna


O Brasil recebeu influências de várias ordens do
movimento da matemática moderna: americanas,
francesas e de propostas individuais, como as de
Papy e Zoltan Dienes.
O ensino da matemática foi também influenciado
pela corrente pedagógica do tecnicismo. As várias
forças se consolidaram por meio de uma política
educacional forjada no espírito da ideologia do
nacional desenvolvimentismo, que privilegiava a
formação técnica.
A álgebra após o movimento da
matemática moderna

Diante de um quadro contraditório,
expressado na polarização entre a ênfase
tecnicista no “fazer” e a ênfase estruturalista
no “compreender via fundamentação lógica”,
matemáticos e educadores matemáticos
passaram a questionar os pressupostos que
embasavam o ideário modernista.
A álgebra após o movimento da
matemática moderna


No final da década de 1970, começam a
aparecer tentativas de superação da situação,
que buscavam corrigir distorções e excessos
cometidos ao longo da trajetória do
movimento modernista.
Um exemplo é o esvaziamento do ensino da
geometria atribuído ao movimento, que se
procurou vencer em propostas a partir dessa
época.
A álgebra após o movimento da
matemática moderna

A proposta curricular de Matemática para o então
ensino de 1º grau do estado de São Paulo (1986), por
exemplo, além de defender uma abordagem mais
intuitiva da geometria do que a tradicionalmente
usada antes do movimento modernista, faz inúmeros
apelos a recursos geométricos no desenvolvimento
de tópicos algébricos, como as operações com
expressões algébricas, a fatoração e a resolução de
equações do 2º grau.
A álgebra após o movimento da
matemática moderna


A concepção de educação algébrica:
fundamentalista-analógica.
Tentativa de síntese entre as duas concepções
anteriores: 1) procura recuperar o valor
instrumental da álgebra; 2) procura manter o
caráter fundamentalista de justificação das
passagens presentes no transformismo
algébrico, só que não mais de forma lógicoestrutural.
A álgebra após o movimento da
matemática moderna



A concepção de educação algébrica:
fundamentalista-analógica.
A nova forma de justificar baseia-se, em geral, em
recursos analógicos geométricos, e, portanto, visuais.
Os adeptos dessa concepção acreditam que uma
“álgebra geométrica”, por tornar visíveis certas
identidades algébricas, seria didaticamente superior a
qualquer forma de abordagem estritamente lógicosimbólica.
A álgebra após o movimento da
matemática moderna




A concepção de educação algébrica: fundamentalistaanalógica.
Acredita-se que a etapa geométrico-visual constitui-se em um
estágio intermediário e/ou concomitante à abordagem lógicoformal.
Outro recurso analógico bastante comum é a “justificação” de
certas passagens do transformismo algébrico mediante a
utilização das leis do equilíbrio físico: uso de “materiais
concretos”, como balanças, gangorras etc.
O “concreto” aqui tem um significado diferente do “concreto”
ao qual fazem apelo os recursos estritamente geométricovisuais.
A álgebra após o movimento da
matemática moderna



A concepção de educação algébrica:
fundamentalista-analógica.
Nessa concepção, continua-se a conferir o papel
principal às “regras algébricas”, isto é, ao
transformismo algébrico. O ensino da álgebra é
reduzido ao ensino de sua linguagem.
A linguagem, tanto no plano histórico quanto no
pedagógico, é, pelo menos a princípio, a expressão
de um pensamento.
Novas perspectivas para a educação
algébrica




Quais seriam os elementos caracterizadores
do pensamento algébrico?
Percepção de regularidades
Percepção de aspectos invariantes em
contraste com outros que variam
Tentativas de expressar ou explicitar a
estrutura de uma situação-problema e a
presença do processo de generalização
Novas perspectivas para a educação
algébrica


O pensamento algébrico é um tipo especial de
pensamento que pode se manifestar não
somente nos campos da matemática, mas
também em outras áreas do conhecimento.
O pensamento algébrico pode expressar-se
através de várias linguagens: natural,
aritmética, geométrica ou de uma linguagem
específica, a linguagem algébrica, de natureza
estritamente simbólica.
Novas perspectivas para a educação
algébrica
Não há razão para sustentar que o ensino e a
aprendizagem da álgebra devam se iniciar
relativamente tarde na escolarização.
A introdução precoce e sem uma base
significativa de uma linguagem simbólicoabstrata pode prejudicar a aprendizagem da
álgebra, mas menosprezar o modo de
expressão simbólico-formal também pode
impedir o seu desenvolvimento.
Novas perspectivas para a educação
algébrica
Uma proposta de grandes etapas para o
desenvolvimento da educação algébrica
elementar
Iniciar com o trabalho com situações-problema
em lugar de investir primeiro no trabalho com
o transformismo.
Esse trabalho possibilitará a construção de uma
linguagem simbólica significativa para o
estudante.
Novas perspectivas para a educação
algébrica
Uma proposta de grandes etapas para o
desenvolvimento da educação algébrica
elementar
Na primeira etapa, o objetivo é chegar a
expressões simbólicas através da análise de
situações-problema significativas.
Numa segunda etapa, convém partir da
expressão algébrica e tentar atribuir-lhe
algumas significações.
Novas perspectivas para a educação
algébrica
Uma proposta de grandes etapas para o
desenvolvimento da educação algébrica elementar
Finalmente, na terceira etapa, a ênfase deve recair sobre
o transformismo algébrico.
Essas etapas não devem ser sucessivas e estanques, mas
integradas, dando ao estudante a oportunidade de
rever idéias mal elaboradas e de construir
solidamente seu pensamento algébrico.
Novas perspectivas para a educação
algébrica
As propostas para o ensino da álgebra que enfatizam
exclusivamente a geometrização, isto é, a
visualização, como forma de justificar as regras do
transformismo algébrico, aderindo completamente à
concepção fundamentalista-analógica de que
falamos, e continuando a se preocupar, antes de tudo,
com as “regras algébricas”, embora representem um
certo avanço do ponto de vista psicopedagógico,
desconhecem ou ignoram as duas primeiras etapas
fundamentais na construção do pensamento
algébrico.
Bibliografia
•
•
•
FIORENTINI, Dario; MIGUEL, Antonio & MIORIM, Maria
Ângela. Contribuição para um repensar... a Educação
Algébrica elementar. Pro-Posições, v. 4, n.1 (10), p. 78-91,
1993.
MIGUEL, Antonio; FIORENTINI, Dario; MIORIM, Maria
Ângela. Álgebra ou Geometria: para onde pende o pêndulo?
Pro-Posições, v. 3, n.1 (7), p. 39-54, mar 1992.
MIORIM, Maria Ângela; MIGUEL, Antonio; FIORENTINI,
Dario. Ressonâncias e dissonâncias do movimento pendular
entre álgebra e geometria no currículo escolar brasileiro.
Zetetiké, Campinas, n.1, mar. 1993, p. 19-39.
Download

A álgebra antes do movimento da matemática moderna