ECONOMIA41 DOMINGO, 5 DE JULHO DE 2015 A GAZETA A PRIMEIRA A GENTE NÃO ESQUECE Gravidade da crise assusta quem nunca passou por isso ARQUIVO É a primeira vez que os jovens entre 20 e 30 anos veem o Brasil numa grave crise econômica “Pela primeira vez, eles estão lidando com a reestruturação da equipe, tendo que demitir” RIO DE JANEIRO A primeira crise a gente nunca esquece. Uma geração de jovens adultos, entre 20 e 30 anos, enfrenta, pela primeiravez,algoquesóviu em livros ou nas histórias de seus pais: crise econômica com inflação alta, instabilidade política, descontrole fiscal e, principalmente, desemprego e recessão. A bonança do mercado de trabalho dos últimos dez anos dá lugar a uma taxa de desemprego de 16,4% para quem tem entre 18 e 24 anos. Há um ano, o percentual estava em 12,3%. A inflação, que parecia vencida, assusta novamente, em tornode9%aoano,corroendo os ganhos das famílias. A desesperançadiantedasexpectativas cada vez piores do desempenho econômico completa o quadro que essa geração terá que lidar. Oavançoeducacionaleo colchão de proteção social criado a partir da Constituição de 1988 e engordado nos últimos anos dão mais armas para essa geração em contraponto com seus pais. Em 2004, somente 32,9% — — PAULO SARDINHA PRESIDENTE DA ABRH Com o avanço do desemprego, as filas dos Sines só aumentaram nos últimos meses dos jovens entre 18 e 24 anos estavam na universidade.Em2013,essaparcela tinha subido para 55%. “As expectativas também estão mais altas. As famílias que têm ainda alguma gordura para queimar vão deixar os filhos se especializando mais até o mercado melhorar”, afirmou a antropóloga social e demógrafa JoiceVieira,queestudouatransição para a vida adulta. É isso que o estudante de Jornalismo Rafael Fernandes pretende fazer. Está na segunda faculdade - é formado em Relações Internacionais e domina inglês, francês e espanhol. “Nasci em 1990. Só ouvi histórias de crise dos meus pais. Minha moeda sempre foioreal.Estoumuitoassustado. O mercado de trabalho está expulsando profissionais que já são bem remunerados, especializados. Quandocomeçaraabsorver novamente, vão dar preferência a essas pessoas que já têmexperiência,coisaqueo recém-formado não tem”. RESPONSABILIDADE Asruaspodemserooutro caminho a ser tomado por essa geração. “É uma geração que foi criada na democracia, tem direito à voz. EstamosvendoissonaEuropa. São jovens bem formados que podem ser uma voz importante nesse momento, gerando soluções, pressionando e questionando”. Dentro das empresas, o medododesempregoseinstalou,naopiniãodaespecialistaemmarketingCarlaGalo, que viaja o Brasil todo fazendo palestras sobre gestão de negócios. “É uma geração que não tinha medo de romper. Se estava insatisfeito na empresa que não se alinhava aos seus propósitos, começava já a namorar outra.Agoravêoamigosendo demitido. Pela primeira vez está sentindo que seu emprego está ameaçado”. Ter que demitir também é outra missão que não estavanoradardessajuventude. Paulo Sardinha, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos, afirmaqueochoquechegou por meio da necessidade. “Pela primeira vez, estão lidando com a reestruturação da equipe, inclusive tendo que demitir pessoas mais velhas que eles. Não estão preparados para demitir, fizeramcarreiraolhandopara cima, ampliando a equipe. São mais técnicos, distantes de questões do orçamento. Agora são obrigados a ver as contas,fornecedores,nãodá para se preocupar somente com lado técnico”. Acostumados a consumir, essa juventude terá que deixar de lado os chamados bens de luxo. O economista EduardoVelho,queviveusituaçãosemelhantenosanos 1990, quando o então presidente Fernando Collor confiscou o dinheiro da população para combater a inflação, que custou ao país dois anos de recessão e a voltadainflaçãodemaneira mais explosiva ainda. “Esses jovens consomem muito, principalmente bens de luxo. Deve diminuir a venda de tablet e a procura porcursosextraclasse,como balé,academia.Masessageração é mais empreendedora, ao contrário da minha. Muitosestãomontandoseus próprios negócios quando têm alguma poupança”.