Acompanhamento de preços de produtos para a saúde é
desnecessário e prejudicial ao mercado
* Rodrigo Alberto Correia da Silva
O mercado brasileiro de produtos para a saúde sofre por conta da publicação da Resolução da
Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária Anvisa, nº 185 de 13 de
outubro de 2006.
A referida norma determina que para o registro dos produtos para a saúde, perante a
autoridade sanitária brasileira, sem o qual os mesmos não poderão ser comercializados,
deverão ser prestadas informações econômicas e estratégicas pela requerente do registro.
Referidas informações, extremamente sensíveis são, entre outras:
- informações de custos do produto;
- informações sobre o preço do produto em diversos países;
- informações sobre o mercado esperado do produto;
- informações sobre as estratégias de lançamento e marketing do produto.
A determinação vem amparada pela lei que criou o controle de preços de medicamentos (lei
10.742/2003) que parte do princípio de que existem falhas de concorrência no mercado de
medicamentos e visa a ampliação do acesso a saúde da população brasileira através do
controle dos seus preços de venda.
A RDC 185/2006 que trata das informações econômicas para o registro de produtos para a
saúde parte das mesmas premissas e segue exatamente a mesma filosofia, diferenciando-se
apenas por não impor controle de preços de venda por falta de amparo legal.
A medida terá impactos negativos no mercado brasileiro de produtos para a saúde
especialmente pelo aumento de custo dos processos de registro dos produtos para a saúde,
bem como, pelo aumento da demora no registro destes produtos por acrescentar vasta
documentação e um novo enfoque de análise para o qual os técnicos da Anvisa não estão
adequadamente treinados.
Vale apontar que conforme estudo de 2006 realizado com diversas empresas do setor de saúde
do Brasil pela Câmara Americana de Comércio – Amcham o tempo médio de registro para os
produtos para a saúde já é hoje bastante elevado:
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É bastante preocupante a possibilidade destes aumentos de custo implicarem em necessidade
de repasse para os preços finais dos produtos para a saúde.
Preocupação também relevante das empresas de produtos para saúde diz respeito ao sigilo das
informações prestadas para a Anvisa dada a sua importância estratégica.
A ampliação do acesso à saúde é uma meta da sociedade brasileira com a qual a iniciativa
privada em produtos para a saúde compactua totalmente e pretende dar apoio com todas as
suas forças, por razões cívicas e comerciais, afinal quanto maior o acesso maior o mercado.
Contudo, nos parece que a utilização dos paradigmas do mercado de medicamentos no
mercado de produtos para a saúde não é adequada dadas as diferenças dos mercados, a
começar pelo fato de que a indústria de produtos médicos não tem uma cultura de publicação
de listas padronizadas de preços como tem a indústria farmacêutica.
O ponto principal desta diferença diz respeito ao comprador dos produtos em questão. No
caso dos medicamentos em grande parte (excetuando os comprados por órgãos públicos) o
seu comprador é o paciente, esteja ele comprando medicamentos na farmácia esteja ele sendo
medicado em hospitais é ele quem paga pelo medicamento.
Daí decorrem os problemas de acesso à informação, de agência, de desconhecimento do
produto, falta de comparação entre concorrentes e, portanto baixa intercambialidade, baixa
elasticidade da procura x preço e a própria essencialidade do bem.
A pessoa física consumidora de medicamentos é hipossuficiente na relação e não tem recursos
para os necessários cuidados com a sua saúde.
No caso dos produtos para a saúde em sua maioria o comprador será um serviço de saúde,
uma empresa, com médicos, administradores, financeiros, compradores profissionais e tudo o
mais para que não esteja em relação de hipossuficiência com o vendedor dos produtos
médicos.
No mesmo sentido o serviço de saúde, hospital ou clínica, público ou privado, não tem
necessidade de vida ou morte na aquisição de produtos para a saúde, se o faz, o é para sua
conveniência e estratégia.
Assim, já não temos no mercado de produtos para saúde os mesmos vícios de concorrência do
mercado de medicamentos que são próprios do mercado de venda de bens para o consumidor
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No mercado de produtos para a saúde não existe falta de informação para o comprador destes
produtos, pois este têm condições técnicas e econômicas de obtê-las e analisá-las.
Por estas razões é que ao contrário da indústria de medicamentos que tem seus preços de
alguma forma acompanhados a indústria de produtos médicos não sofre este tipo de
intervenção estatal já que a livre concorrência e o avanço da tecnologia se encarregam
progressivamente da redução de preços dos produtos mais antigos.
No mercado nacional e produtos para a saúde temos ampla concorrência entre fabricantes
nacionais e importadores do mundo todo, não se encontrando os mesmos níveis de
concentração por mercado relevante encontrados em alguns mercados relevantes de
medicamentos.
Vale considerar ainda que para a mesma finalidade existe uma infinidade de produtos para
saúde de diversos fabricantes ficando a cargo do comprador do serviço de saúde avaliar com o
seu corpo médico qual terá o melhor custo efetividade.
Os serviços de saúde públicos ou privados têm toda a condição de coletar informações
técnicas, verificar os preços no mercado internacional e mais importante comparar os diversos
produtos oferecidos, pois os conhecem, são técnicos tanto quanto os das empresas
vendedoras.
Salientamos ainda as insuperáveis dificuldades na comparação das informações econômicas
que serão fornecidas pelas empresas ao registrar seus produtos dadas as infinitas variações de
especificações e descrições dos produtos para a saúde que tornarão a medida inócua.
Conforme o exposto, o mercado de produtos para a saúde difere muito do mercado de
medicamentos de modo que a medida em questão não alcançará o objetivo da ampliação do
acesso da população a saúde.
Entre os produtos para saúde estão os serviços de saúde que estes sim alcançam a população
diretamente ou com financiamento da assistência a saúde pública ou suplementar.
Ainda que a medida seja eficaz na redução de alguns produtos para saúde, para os serviços de
saúde não há como garantir que estes repassem o benefício para a população ou para os
financiadores do sistema o que retira os eventuais efeitos positivos da medida, deixando
apenas seus efeitos negativos.
A exigência específica de informações sobre os planos de marketing das empresas para os
produtos que pretendem registrar, que seriam executados em futuro incerto dadas as
deficiências da própria Anvisa na concessão dos registros, não fazem sentido prático.
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No momento de concessão do registro do produto a empresa poderá não ter ainda um plano de
marketing finalizado e atualizado com a realidade do mercado, pois pode pretender lançar o
produto em um momento posterior, inclusive considerando a imprevisibilidade do momento
da concessão.
É importante notar, ainda, que estes estudos têm um alto custo para as empresas tendo em
conta a escassez de dados sobre estes mercados e a exigência pode levar a um aumento
expressivo de custos que tanto poderá ser repassado para os preços ao consumidor, quanto
inviabilizar o lançamento de novos produtos, favorecendo, assim, a concentração de mercado.
A resolução em questão exige que a empresa requerente do registro informe o seu preço em
uma lista de países, (Alemanha; Austrália; Canadá; Espanha; Estados Unidos da América;
França; Itália; Japão; Portugal; Reino Unido).
A exigência não leva em consideração que o produto poderá ser comercializado em outros
países por empresas que não têm qualquer ligação com a requerente do registro do produto,
como nos casos de distribuição de produtos importados, de modo que esta não terá acesso a
estas informações não podendo, portanto, fornecê-los para a Anvisa.
A penalidade de suspensão de vendas dos produtos cujas informações não atendam aos
requisitos da Anvisa está em desacordo com a legislação em vigor que prevê a aplicação de
penalidades de forma gradativa, sendo a suspensão de venda a maior delas e aplicada somente
após o curso de processo administrativo garantida a ampla defesa e o contraditório.
A suspensão da venda do produto que já estará no mercado é um risco sanitário muito maior
do que a falta de prestação de informações econômicas pelo titular do registro.
A legislação sanitária prevê a suspensão de venda como medida emergencial para estancar o
risco sanitário provocado por produtos que causem risco aos pacientes ou sejam ineficazes e,
não para irregularidades quanto a informações econômicas.
O cenário apontado acima foi criado pela Lei 10.742/2003 quando criou regras para o
mercado de medicamentos e de maneira inconseqüente incluiu os produtos médicos nas
disposições de acompanhamento de preços, nos mesmos moldes, e depois foi agravado pela
Anvisa ao publicar e RDC 185/2006 exigindo informações de maneira incorreta e impondo
penalidade desproporcional que impede a comercialização de produtos vitais para aqueles que
deles necessitam.
No curto prazo estas atitudes trazem custos para o sistema de fornecimento e financiamento
da saúde, no médio prazo tornam mais insalubre o ambiente para o investimento em
lançamento e produção dos produtos no Brasil e no longo prazo reduz o acesso do povo
brasileiro a produtos para saúde e seus fornecedores.
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