Centro Brasileiro de Infra Estrutura - CBIE
Contribuição do Centro Brasileiro de Infra
Estrutura à Audiência Pública nº 002/2014
Novembro de 2014
Condições de Competitividade do Gás Natural
Olhar a questão da falta de competitividade do gás natural considerando apenas a questão da margem das
distribuidoras é uma forma limitada de se analisar o problema. O mercado de distribuição de gás natural
não é um monopólio natural clássico, uma vez que sofre concorrência de energéticos substitutos. No
segmento industrial, o gás natural concorre com outros energéticos como o óleo combustível, enquanto no
segmento residencial os principais concorrentes são o Gás liquefeito de Petróleo (GLP) e a energia elétrica.
No mercado de combustíveis automotivos, o Gás Natural Veicular (GNV) concorre com a gasolina e o
etanol.
Por conta dessa característica específica, a concessão de subsídios ou benefícios fiscais aos energéticos
concorrentes obriga as distribuidoras a conceder descontos sobre a margem de distribuição fixada pelo
órgão regulador, reduzindo sua receita, afetando seu equilíbrio econômico-financeiro e inibindo os
investimentos em expansão da rede.
A análise do Gráfico 1, permite verificar a condição desigual de competitividade enfrentada pelo gás
natural. Tomando como base o mês de janeiro de 2008, ano no qual a Petrobras iniciou a chamada NPP
(Nova Política de Preços) para o gás natural, pode-se observar que o preço do gás natural boliviano e do
gás natural nacional foram os que tiveram os maiores reajustes dentre os energéticos analisados, o que se
traduz na perda de competitividade do energético frente aos concorrentes. Mesmo a concessão de
descontos discricionários pela Petrobras sobre o preço do gás nacional, a partir de maio de 2011, não foi
capaz de reverter a situação. A condição é ainda mais grave no caso da Comgás, que tem 60% de seu
fornecimento proveniente de gás boliviano, que não foi favorecido pelo desconto.
1/7
Gráfico 1 - Competitividade do Gás Natural com Relação aos Demais Combustíveis
(Base 100 = jan./2008)
250
R$/MMBTU
200
150
100
ago/14
jul/14
jan/14
abr/14
jul/13
out/13
jan/13
abr/13
jul/12
out/12
jan/12
abr/12
jul/11
out/11
jan/11
abr/11
jul/10
out/10
jan/10
abr/10
jul/09
out/09
jan/09
abr/09
jul/08
out/08
jan/08
abr/08
50
Gasolina A
Diesel
GLP granel
OC
GLP P13
GN Nacional Com Desconto
GN Nacional Sem Desconto
GN Impor
Preço Composto
Fonte: ANP e MME
Além da questão da concorrência, é preciso levar em conta que a distribuição de gás natural é um
mercado que ainda não está universalizado. Uma boa comparação é a com o mercado de distribuição de
energia elétrica, que já está consolidado e universalizado, com total penetração nas unidades
consumidoras. Nesse caso, a margem de distribuição pode ser menor, uma vez que o elevado volume
comercializado garante a remuneração do investimento. No caso da distribuição de gás, que em muitas
áreas ainda pode ser considerado “greenfield”, o reduzido volume comercializado amplia o impacto
econômico e financeiro da redução de margens.
O CASO DO GLP NO MERCADO RESIDENCIAL
O acompanhamento do mercado de combustíveis e do preço final praticado ao consumidor mostra que o
GLP em botijões de 13 quilogramas (GLP P-13) é competitivo no segmento residencial frente ao gás
natural. Em setembro de 2014, o preço ao consumidor do GLP P-13 foi 40% menor do que o do gás
natural para o segmento residencial na Região Sudeste, por exemplo. Os casos mais impactantes são os
do São Paulo e Rio de Janeiro, estados nos quais o GLP foi 41% e 20%, respectivamente, mais barato do
que o gás natural em agosto de 2014. Esta situação já perdura há bastante tempo, pelo menos desde
2003, como mostra o Gráfico 2.
2/7
Gráfico 2 – Evolução da Competitividade do Gás Natural versus GLP P-13 no Setor
Residencial – Preços Energéticos ao Consumidor – São Paulo
140
R$/MMBTU
120
118
100
80
74
60
40
Residencial Comgas 18m³ (R$/MMBTU)
GLP P-13 São Paulo (R$/MMBTU)
Fonte: ANP e Comgás.
O GLP a granel e o P-45 também possuem vantagem competitiva em relação ao gás natural para algumas
faixas de consumo nos segmentos industrial e comercial.
A política de congelamento do preço doméstico do GLP P-13 na refinaria, pelo menos desde novembro de
2003 (dados disponíveis pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP),
prejudica a competividade do gás natural frente ao energético no setor residencial. O preço de GLP P-13
ao consumidor final residencial vem sendo reajustado apenas por fatores relacionados ao frete e
armazenagem.
A falta de competitividade também é evidente quando analisamos a variação dos preços para o gás natural
(Nacional e Importado da Bolívia) praticados no City Gate e comparamos com o preço do GLP praticado
nas refinarias (média Brasil). Atualmente, se avaliarmos estes dois energéticos em uma mesma base e
unidade (US$/MBTU), constatamos que o preço do GLP é inferior ao praticado em 2008, enquanto o gás
natural sofreu uma variação de 11% para o nacional e de 106% para o importado da Bolívia, conforme
Gráfico 3.
3/7
Gráfico 3 – Variação comparativa dos Preços de Gás Natural (Com Desconto) e GLP
desde 2006
120%
100%
80%
60%
Preço GLP
US$/MBTU
40%
Preço GN Nacional
(Com Desconto)
US$/MMBTU
20%
Preço GN Bolívia
US$/MBTU
0%
-20%
jan/08
jan/09
jan/10
jan/11
jan/12
jan/13
jan/14
Fonte: ANP e MME
Quando se trata da referência internacional observa-se que a relação entre os preços do GLP e do gás
natural praticada no Brasil está equivocada. O Gráfico 4 mostra que o preço médio praticado internamente
esteve 34% abaixo do observado no mercado internacional em agosto de 2014, segundo o critério de
paridade de importação, com base nos preços do GLP importado.
Gráfico 4 - Comparação dos Preços Nacional e Internacional do GLP com base na
Paridade de Importação (R$/kg) - janeiro de 2004 a agosto de 2014
2,5
60%
40%
R$/kg
2,0
20%
1,5
0%
1,0
-20%
0,5
jan
jun
nov
abr
set
fev
jul
dez
mai
out
mar
ago
jan
jun
nov
abr
set
fev
jul
dez
mai
out
mar
ago
jan
jun
0,0
-40%
-60%
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 20132014
GLP Importado (R$/kg)
GLP Brasil (R$/kg)
Diferença (%)
Fonte: ANP
4/7
Quando se compara os preços ao consumidor do GLP e do gás natural em outros países, também é
possível concluir que a relação de preços no Brasil vai na contramão da prática internacional. No caso
específico da Europa, a diferença entre o preço do GLP e do gás natural vai de cerca de 30% na Espanha
até quase quatro vezes como é o caso da Alemanha, conforme mostra o Gráfico 5.
Gráfico 5 - Comparação de Custos de GLP e Gás Natural Residencial - Europa
Centavos de Euro por kWh
30,00
25,00
24,56
24,51
20,00
17,83
17,67
15,00
10,14
10,00
7,23
7,34
6,56
7,47
7,69
5,00
0,00
Irlanda
Inglaterra
Cilindro GLP 13 kg
Alemanha
França
Espanha
Gás Natural Residencial
Fonte: Eurostat para o Gás Natural Residencial e preços de vendas de Cilindros
de GLP de 13kg na Europa em sites de vendas dos respectivos países
Não se trata de criticar ou pleitear o fim dos subsídios ao GLP para populações de baixa renda, que são de
grande importância para o desenvolvimento do bem-estar social do país. Na verdade, acreditamos que tal
política de subsídios deve ser mantida, porém reestruturada, de forma a atingir somente as populações
necessitadas, como ocorreu no caso do “vale gás”, criado pelo Decreto nº 4.102, de 24 de janeiro de
2002, com o objetivo de subsidiar o preço do GLP às famílias de baixa renda.
Tendo em vista a oferta futura de gás natural, advinda do pré-sal e, também, da exploração de gás não
convencional, é imprescindível que se inicie um processo gradual de uniformização na metodologia de
precificação dos diversos combustíveis que compõem nossa matriz energética. Deve-se padronizar a
incidência de impostos, de forma a favorecer o planejamento de longo prazo, a universalização dos
serviços e a competição entre combustíveis, baseada em sinais econômicos corretos, tanto para
consumidores como para os investidores, permitindo assim, o desenvolvimento econômico e social do país
em bases mais sólidas.
É função do órgão regulador estadual cria condições e estimular a universalização do uso do gás natural
no estado, inclusive, ajudando a desmistificar a ideia de que o preço do gás natural é elevado por conta
das margens de distribuição. Embora o realinhamento dos preços relativos dos diversos energéticos não
5/7
esteja ao alcance da Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (Arsesp) ou do
governo do estado de São Paulo, é importante estar atento à questão da competitividade e das
especificidades do mercado de distribuição de gás natural, por ocasião da definição das margens de
distribuição, sob a pena de limitar a capacidade de investimento das empresas e a inclusão de novos
consumidores a rede.
6/7
Download

contribuição CBIE - Arsesp - Governo do Estado de São Paulo