O CÂNONE, O POPULAR E A VOZ À CULTURA SILENCIADA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL TEORIA E PRÁTICA DE LEITURA – TURMA A JÚLIA BARROS A OFICINA PÚBLICO-ALVO Alunos do segundo ano do ensino médio de uma escola pública da zona sul de Porto Alegre, parte de uma periferia e do movimento cultural local. NÚMERO DE ALUNOS 10 alunos. Obs: A oficina seria ministrada no turno inverso ao da aula normal, não obrigatória, aos alunos que têm interesse na proposta da oficina e aos alunos que precisam recuperar nota nas disciplinas de LPL. Ainda, parte-se do pressuposto de que os alunos estejam estudando a segunda geração romântica nas aulas de LPL durante o período da aula normal. A OFICINA NÚMERO DE HORAS/AULA RECURSOS NECESSÁRIOS Aula 1: 1 hora. Xerox com folha para os alunos. Aula 2: 2 horas. Aparelho de som. Aula 3: 2 horas. Aula 4: 1 hora. TOTAL: 6 horas. A OFICINA JUSTIFICATIVAS OBJETIVOS Proponho esta oficina pois percebi, durante a minha (ainda) curta jornada como professora, a falta de aproximação entre o conteúdo formal e a realidade social dos alunos. Pretendo, então, oferecer ferramentas (textuais [dos gêneros notícia, poema, canção e imagem] e orais [por meio das discussões]) aos alunos para que eles percebam que o cânone (poeta da segunda geração romântica) e o popular (funk) são gêneros diferentes, com construções sociais diferente, que sofrem diferentes críticas e com diferentes consumidores, mas que, ao final, podem se aproximar em termos de musicalidade, temática e estrutura. A OFICINA RESULTADOS ESPERADOS FORMA DE AVALIAÇÃO Espero que, após a oficina, os alunos percebam que o cânone pode estar ao seu alcance; porém, antes disso, espero que eles desconstruam o muro que os separam da poesia, desenvolvendo a fruição (BARTHES, 2006) pela literatura. Compreendo a avaliação como o caminho, não o ponto de chegada. Portanto, o interesse pelo projeto, a participação nas discussões em aula, a produção das atividades em aula e o empenho no trabalho final serão avaliados com o mesmo peso. UNIDADE TEMÁTICA: pela falta de tempo para serem desenvolvidas reflexões maiores e mais densas, a unidade temática se constitui do objetivo em si: “A Aproximação entre o Funk e o Cânone”, levando em conta mais aspectos estruturais (rimas poéticas, forma, musicalidade) do que a temática geral do corpus. Contudo, pensar na mulher representada na poesia do século XIX e na mulher representada no funk do século XXI (e como representante do funk do século XXI) é o germen para a transformação desta oficina para o futuro projeto de estágio. AULA 1 1 hora Leitura em conjunto do texto ao lado. Perguntas de interpretação: 1. Do que o texto trata? 2. O que precisa mudar no funk para que ele se torne um movimento cultural? 3. Que palavras caracterizam e estão ligadas ao “Funk” no texto? 4. Você concorda com o fato deque o funk pode ser um movimento cultural? 5. Como se caracterizam as pessoas que consomem e que produzem o funk? Aula 2 2 horas (30 minutos atividade 1) Os alunos receberão uma folha com a imagem ao lado. Discutiremos alguns pontos por meio das perguntas norteadores e contextualizarei o ocorrido: 1. Você já havia visto esta imagem compartilhada nas redes sociais? 2. O aluno escreveu “É sério isso?!”. Qual foi a reação dele em ter visto uma questão sobre a Valesca Popozuda na prova? Por quê? 3. O que você acha do fato de um professor ter feito uma questão na prova sobre uma música da Valesca Popozuda? Spleen e Charutos I – Solidão (FUNK) Aula 2 2 horas Atividade 2 (30 minutos) Provocação: Sem falar que é uma adaptação do poema de Álvares de Azevedo, mostrarei o funk cantado pelo grupo Arranjos do Assobio. Depois, perguntarei: 1. O que vocês acharam do funk? 2. Do que se trata o funk? 3. Como a mulher é representada nesse funk? Como a mulher é normalmente representada no funk? 4. O que vocês achariam se eu colocasse esse funk na prova como o professor de filosofia colocou o funk da Valesca Popozuda? Nas nuvens cor de cinza Cor de cinza do horizonte A lu-lua amarela Amarela a face embuça Então embuça, embuça No amarelo a face embuça (2X) Parece que tem frio E no seu leito deitou para dormir (2X) A carapuça, a carapuça Deitou para dormir E-ergueu-se Vem da noite, vem da noite A vagabunda Vaga-va-vaga-va-vaga Vagabunda (2X) Parece que tem frio e no seu leito deitou para dormir (2x) A carapuça, a carapuça Deitou para dormir (2x) E-ergueu-se Vem da noite, vem da noite A vagabunda Vaga-va-vaga-va-vaga Vagabunda Sem xale, sem camisa e sem mantilha Vem nua e bela procurar amantes (4X) É doida por amor, amor da noite a filha dá Amor da noite a filha dá (5X) Spleen e Charutos I – Solidão (ORIGINAL) Nas nuvens cor de cinza do horizonte A lua amarelada a face embuça; Parece que tem frio e, no seu leito, Deitou, para dormir, a carapuça. Ergueu-se... vem da noite a vagabunda Sem xale, sem camisa e sem mantilha, Vem nua e bela procurar amantes... — É doida por amor da noite a filha. AULA 2 2 HORAS ATIVIDADE 3 (30 MINUTOS) Spleen e Charutos - Solidão Nas nuvens cor de cinza do horizonte A lua amarelada a face embuça; Parece que tem frio e, no seu leito, Deitou, para dormir, a carapuça. Ergueu-se... vem da noite a vagabunda Sem xale, sem camisa e sem mantilha, Vem nua e bela procurar amantes... — É doida por amor da noite a filha. Mostrar a parte I de Spleen e Charutos, do Álvares de Azevedo, e contextualizar o que a banda Arranjos para o Assobio fez. Depois, são feitas as perguntas de interpretação: 1. Do que ele trata? 2. Que características da segunda geração romântica podemos ver no poema original? 3. Como a mulher é retratada no poema? 4. Essas características se mantêm no funk? 5. Quais os aspectos temáticos e estruturais que convergem no poema e no funk? As nuvens são uns frades de joelhos, Rezam adormecendo no oratório... Todos têm o capuz e bons narizes E parecem sonhar o refeitório. As árvores prateiam-se na praia, Qual de uma fada os mágicos retiros... Ó lua, as doces brisas que sussurram Coam dos lábios teus como suspiros! Falando ao coração... que nota aérea Deste céu, destas águas se desata? Canta assim algum gênio adormecido Das ondas mortas no lençol de prata? Minh'alma tenebrosa se entristece, É muda como sala mortuária... Deito-me só e triste sem ter fome Vendo na mesa a ceia solitária. Ó lua, ó lua bela dos amores, Se tu és moça e tens um peito amigo, Não me deixes assim dormir solteiro, À meia-noite vem ceiar comigo! MINA SEDUÇÃO MC GUIMÊ Spleen e Charutos (Álvares de Azevedo) Aula 3 Atividade 1 (30 minutos) Na terceira aula, será feita a produção dos alunos. Mostrarei aos alunos a parte II de Spleen e Charutos “Meu Anjo” e o funk do Mc Guimé “Mina Sedução”. Como Álvares de Azevedo, no século XIX, representa a mulher? Por quê? 1. Como MC Guimê, no século XXI, representa a mulher? Por quê? 2. Que caminho a mulher trilhou nesses dois séculos? 3. Como é a estrutura de cada objeto e a distribuição de rimas? II Meu anjo Meu anjo tem o encanto, a maravilha, Da espontânea canção dos passarinhos; Tem os seios tão alvos, tão macios Como o pêlo sedoso dos arminhos. Triste de noite na janela a vejo E de seus lábios o gemido escuto. É leve a criatura vaporosa Como a froixa fumaça de um charuto. Parece até que sobre a fronte angélica Um anjo lhe depôs coroa e nimbo... Formosa a vejo assim entre meus sonhos Mais bela no vapor do meu cachimbo. como o vinho espanhol, um beijo dela Entorna ao sangue a luz do paraíso. Dá morte num desdém, num beijo vida, E celestes desmaios num sorrizo! Mas quis a minha sina que seu peito Não batesse por mim nem um minuto, E que ela fosse leviana e bela Como a leve fumaça de um charuto! Dinheiro no bolso, Perfeição em corpo, Aonde ela passa ela chama atenção, E a rapaziada quebrando pescoço. (2x) Charmosa, chique, elegante, Olhar radiante, sorriso brilhante, Unhas bem feitas, brincos combinando, Com o teu colar de puro diamante. Nextel na cintura, e o kit, De hollister, abercrombie fitch, A cor do batom que me chama atenção, E a pele saudável com victoria's secret. O perfume é calvin klein, dolce & gabbana Ou two one two, pra começar a noite, Manda trazer umas três de whisky, E uns seis red bull. Tratada que nem uma princesa, Dinheiro no bolso, fartura na mesa, E a família quer que ela se case, Olha só que beleza. Sempre se atualiza com a moda, Lançou um new beetle com cromo nas roda, Mais ela só se envolve com o nosso bonde, Porque ta ciente que a quadrilha é foda. MINA SEDUÇÃO MC GUIMÊ Spleen e Charutos (Álvares de Azevedo) Aula 3 Atividade 2 (uma hora e meia) Os alunos serão divididos em dois grupos. Um grupo será responsável por transformar a música da MC Guimê nos limites estruturais do poema, levando em conta a métrica, o vocabulário e a temática. Outro grupo será responsável por fazer aquilo que o Arranjos do Assobio fez: transformar o cânone no popular. Explorar a musicalidade presente em “Meu Anjo” para transformá-la em funk. Não será necessário usar todas as estrofes, mas a temática do poema deverá ser mantida. II Meu anjo Meu anjo tem o encanto, a maravilha, Da espontânea canção dos passarinhos; Tem os seios tão alvos, tão macios Como o pêlo sedoso dos arminhos. Triste de noite na janela a vejo E de seus lábios o gemido escuto. É leve a criatura vaporosa Como a froixa fumaça de um charuto. Parece até que sobre a fronte angélica Um anjo lhe depôs coroa e nimbo... Formosa a vejo assim entre meus sonhos Mais bela no vapor do meu cachimbo. como o vinho espanhol, um beijo dela Entorna ao sangue a luz do paraíso. Dá morte num desdém, num beijo vida, E celestes desmaios num sorrizo! Mas quis a minha sina que seu peito Não batesse por mim nem um minuto, E que ela fosse leviana e bela Como a leve fumaça de um charuto! Dinheiro no bolso, Perfeição em corpo, Aonde ela passa ela chama atenção, E a rapaziada quebrando pescoço. (2x) Charmosa, chique, elegante, Olhar radiante, sorriso brilhante, Unhas bem feitas, brincos combinando, Com o teu colar de puro diamante. Nextel na cintura, e o kit, De hollister, abercrombie fitch, A cor do batom que me chama atenção, E a pele saudável com victoria's secret. O perfume é calvin klein, dolce & gabbana Ou two one two, pra começar a noite, Manda trazer umas três de whisky, E uns seis red bull. Tratada que nem uma princesa, Dinheiro no bolso, fartura na mesa, E a família quer que ela se case, Olha só que beleza. Sempre se atualiza com a moda, Lançou um new beetle com cromo nas roda, Mais ela só se envolve com o nosso bonde, Porque ta ciente que a quadrilha é foda. Aula 4 1 hora Apresentação das atividades finais feitas pelos alunos. Referências bibliográficas AZEVEDO, Álvares de. Lira dos Vinte Anos. São Paulo: Ciranda Cultural, 2009. BARTHES, Roland. O prazer do texto. São Paulo: Perspectiva, 2006. Mc Guimê. Mina Sedução. Disponível em <http://www.vagalume.com.br/mc-guime/minaseducao.html>