UNP-UNIVERSIDADE POTIGUAR ALQUIMY ART PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM ARTETERAPIA SUERDA VIVIANE FELINTO DE CARVALHO A INTERVENÇÃO DA ARTETERAPIA E A EXPRESSÃO CORPORAL NA TERCEIRA IDADE NATAL – RN 2009 SUERDA VIVIANE FELINTO DE CARVALHO INTERVENÇÃO DA ARTETERAPIA E A EXPRESSÃO CORPORAL NA TERCEIRA IDADE Monografia apresentada à Universidade Potiguar – UnP, como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Arteterapia. Orientadora: Profª Margaret Rose B. Pela NATAL – RN 2009 Dedico a minha mãe que está sempre comigo, a quem devo o que sou. E a meu esposo e minha sogra que sempre me apoiaram no meu dia-a-dia. AGRADECIMENTOS A Deus, pela oportunidade que tem concebido em minha vida. Pela paciência e força de vontade que me impulsiona no meu dia a dia. A todos que acreditaram que a realização deste sonho seria possível e confiaram no meu potencial. Ao meu pai e aos meus irmãos, pelo apoio no dia a dia. Aos meus amigos, que estiveram presentes dando força e acreditando que era possível, em especial, a amiga Sônia Soares. A minha orientadora de estágio, Márcia Bottinni, sempre presente. A minha arteterapeuta, Maria Salete dos Santos, que me acompanhou durante o meu processo de desenvolvimento pessoal e profissional (transformação). Com carinho especial, é a vocês que eu ofereço a minha gratidão. “A arte é, portanto, a única linguagem capaz de se comunicar com a alma, é a única capaz de compreendê-la na sutileza das suas nuances.” Irene Arcuri RESUMO Esta monografia tem como objetivo mostrar como a utilização do trabalho corporal sob a ótica da Arteterapia pode possibilitar uma melhor qualidade de vida, principalmente à população na terceira idade. A sociedade atual privilegia os valores da juventude, deixando a população idosa com uma percepção distorcida de suas reais possibilidades criativas, bloqueando e interferindo nas suas atividades diárias. O atendimento arteterapêutico, um Estágio Supervisionado, visou à aplicação de técnicas que promovessem um encontro consigo mesmo, em busca da transformação pessoal, de modo a ajudar a enfrentar as diversidades e conflitos no dia a dia. A ênfase foi dada ao trabalho corporal onde se pode resgatar as memórias e marcas registradas ao longo do tempo, no corpo, conectando-as diretamente com as lembranças e sensações de conteúdos esquecidos. A base teórica utilizada encontra respaldo em autores da área da Arteterapia com Allessandrini, Arcuri e Urrutigarray, o enfoque da Psicologia Analítica de Jung e no estudo do corpo e do movimento, Wiel e Laban. Para o teórico sobre envelhecimento Fraimam, entre outros. O trabalho desenvolveu-se no formato das oficinas criativas de Allessandrini (1996). Conclui-se que o trabalho arteterapêutico promoveu novas oportunidades ao grupo de idosos que demonstraram mais tranqüilidade e diminuição da ansiedade, agitação, nervosismo e perceberam um significativo avanço no seu estado físico e mental, refletindo, portanto, em uma melhor qualidade de vida. Palavras-chave: Arteterapia. Envelhecimento. Trabalho corporal. ABSTRACT The paper aims to show how the use of bodywork in Art Therapy can enable a better quality of life, mainly to the elderly population. The present society privileges the values of youth. Thus, the elderly population has a distorted perception of their real creative possibilities, blocking and interfering with their daily activities. The art therapeutic care, a supervised internalship, applied techniques to promoted the meeting with the self looking for a personal change in their lives. This change will help them to face the adversities and conflicts in daily life. The emphasis was given to bodywork where memories and marks of time lived were rescued, connecting them directly with the memories and feelings of forgotten contents. The theoretical basis used for the development of this paper was drawn from authors of Art Therapy such as Allessandrini, Arcuri and Urrutigarry, the focus of Jung’s analytical psychology and for the study of body and movement, Wiel and Laban, the theory on aging was givem from Fraiaman and others. The work was developed through Creative Workshops from ALlessandrini (1996). I was concluded that Art Therapy opportunities to the elderly group people promoted more tranquility and decrease of anxiety, agitation, stress and it could be noticed a very significant advance on their physical and mental state, reflecting therefore, in a better quality of life. Key-words: Art therapy. Aging. Bodywork. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 12 2 O IDOSO NOS DIAS DE HOJE ......................................................................... 16 2.1 A ARTETERAPIA E A TERCEIRA IDADE ......................................................... 18 2.2 COMO A ARTETERAPIA PODE AJUDAR O INDIVÍDUO NA TERCEIRA IDADE ... 21 3 A EXPRESSÃO CORPORAL NA PRÁTICA DA ARTETERAPIA .................... 27 4 OFICINA CRIATIVA E AS TÉCNICAS EXPRESIVAS COLIGADAS AO TRABALHO CORPORAL ......................................................................................... 32 4.1 TÉCNICAS EXPRESSIVAS COLIGADAS AO TRABALHO CORPORAL .......... 33 4.2 OFICINAS TERAPÊUTICAS REALIZADAS COM IDOSOS. ............................. 34 5 VIVÊNCIAS EXPERIENCIADAS COM OS IDOSOS ......................................... 37 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...............................................................................41 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 42 10 APRESENTAÇÃO Iniciar o curso de Arteterapia foi a concretização de um sonho planejado desde a minha graduação no curso de licenciatura em Arte Educação. Durante as aulas fui entendendo que o processo ia muito além do que eu imaginava, e foi nos meus atendimentos pessoais como uma arteterapeuta que comecei entender que era um caminho que eu estava percorrendo em busca da minha individuação. Sempre acreditei que a arte contribuía não só para a educação, mas também para o desenvolvimento e crescimento pessoal. Comecei a compreender o comportamento e atitudes do outro, a acolher na hora certa, pois é papel do arteterapeuta chegar e escutar melhor o outro ajudando a percorrer pelo desconhecido, mexendo com nossos conflitos interiores e ajudando a um encontro de si com o mundo. O objeto de estudo foi direcionado para ‘idosos’, pois foi nosso instrumento de trabalho e aprendizagem durante o estágio no qual me identifiquei bastante com essa clientela. Vejo a arteterapia como elemento de integração do ser humano no sentido mais amplo da palavra, reorganizando e estruturando idéias, através do estímulo ao criativo levando-nos a uma reflexão do nosso papel no mundo. Ao perceber a importância da arteterapia no meu processo de desenvolvimento pessoal, comecei a acreditar que é possível ajudar a encaminhar o processo de descoberta do individuo através da mesma. Ao pensarmos em uma clientela para o estágio, escolhi a terceira idade por considerar ser um momento da vida do ser humano em que mais se precisa de força e apoio para se viver bem, pois iremos colher o que plantamos durante a nossa trajetória de vida, e nem sempre recebemos o que esperamos. Considero a auto-estima fator principal nesse momento da vida, pois é através da mesma que o idoso tem estímulo para buscar prazer nas atividades que o cerca no dia-a-dia. Podemos considerar que essa fase pós metanóia requer cuidado e atenção das pessoas que o rodeia independente que seja da família ou não, propiciar esse momento de encontro e busca pela harmonia interior pode ser o caminho percorrido pela arteterapia, levando o idoso ser agente transformador do seu processo de auto-descoberta. Sabemos que o mesmo procura se sentir útil para a sociedade em busca de um reconhecimento e acolhimento para garantir seu espaço no meio em que vive. Vivemos em uma sociedade que muitas 11 vezes não temos tempo para o outro, a cobrança no trabalho, a correria do dia a dia nos deixa atarefados, ficamos cada vez mais distantes dos nossos familiares, muitas vezes sem dar atenção aos que mais precisam, sem participar e perceber a chegada da velhice como alguns teóricos falam. 12 1 INTRODUÇÃO A situação do idoso no Brasil e no mundo é caracterizada de forma pejorativa, ou seja, negativamente, vivemos em uma sociedade em que os valores cultivados de sensações, aparência e imagens são postos em primeiro lugar, buscando-se a todo preço ter um corpo jovem, sentir prazer e ser feliz, tendo como ponto de referência o padrão jovem. Esquecendo-se de cuidar do universo interior para que se consiga realmente o equilíbrio emocional e tenha-se uma boa qualidade de vida. Acredita-se que o que mais paira na cabeça dos idosos é a seguinte questão: "Como envelhecer numa sociedade que privilegia de forma tão acentuada os valores da juventude"? (FRAIMAM, 2006, p.19). A idade é uma das grandes variáveis que regulam o comportamento social e as relações entre indivíduos e grupos em todas as sociedades. Percebe-se que à medida que os anos se passam reforça-se ainda mais a resistência em revelar a idade por motivo de vergonha e medo da rejeição social, tornando-se um ciclo vicioso na sociedade e fortalecendo o preconceito contra a terceira idade e aumentando cada vez mais a apologia à juventude. É necessário assumir a realidade da passagem dos anos com seus prós e contras. O envelhecimento da população brasileira e mundial vem se acentuando. Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e estatística), em 2000, o grupo de pessoas entre 0 e 14 anos representava 30% da população brasileira, enquanto os maiores de 65 anos eram apenas 5%; em 2050, os dois grupos se igualarão em 18%.(RODRIGUES & ROCHA in SELEÇÕES READER’S DIGEST, 2008, p. 128). Considera-se um avanço populacional, mas uma questão é relevante abordar, como é vivida essa longevidade? Acredita-se que por falta de um acolhimento social, o idoso comece a se sentir invalidado se auto-avaliando como alguém que não tem mais produtividade, perdendo as forças e se encaminhando para um isolamento, começando a desenvolver uma série de problemas que varia entre as mais diversas doenças que conhece-se como depressão, estresse, AVC, entre outras. Se a sociedade se conscientizasse da importância do valor da experiência acumulada que um idoso traz, a relação social com os mesmos seria muito melhor, 13 saber ouvir seus conselhos, suas emoções, seus anseios e saber, acima de tudo, que é um reflexo pertinente a todos os seres humanos no amanhã. Jung (apud ARCURI, 2006, p.55) compara a vida humana com o sol, com 180 graus de seu arco e a vida sendo dividida em quatro partes. A primeira parte, ele representou como sendo a infância, na qual não teríamos problemas conscientes; na verdade, quando crianças, somos problemas para os outros (pais, educadores, médicos etc.). Nesse estágio de consciência não há problemas, pois a dependência aos pais nos mantém imersos na atmosfera dos pais. Depois, na adolescência, com a maturidade sexual, há de fato um rompimento com os pais; deixamos a vida simbiótica, o que será considerado como um nascimento psíquico; No terceiro estágio avançamos em direção à consciência da divisão, nesse momento no ingresso da vida adulta, temos dúvidas a respeito de nós mesmos. Se houver um preparo, essa passagem pode ser tranquila, mas se existirem ilusões que impeçam a visão da realidade, poderão surgir dificuldades. Geralmente quando atingimos a meia idade (40/50anos), algumas mudanças começam a ocorrer de forma sutil, por isso nem sempre são percebidas, sendo que essas mudanças acontecem no inconsciente. As estatísticas têm mostrado que as depressões são mais frequentes nessa época. As mudanças de que falamos podem ser as mais diversas; antigos traços de infância poderão vir à tona, antigas inclinações; os interesses, enfim, poderão ser totalmente mudados. (JUNG apud ARCURI, 2006, p. 55). Depois de haver esbanjado luz e calor sobre o mundo, o sol recolhe os seus raios para iluminar-se a si mesmo. Em vez de fazer o mesmo, muitos indivíduos idosos preferem ser hipocondríacos avarentos, dogmatistas e laudatores temporis acti (louvadores do passado) e até mesmo eternos adolescentes, lastimosos sucedâneos da iluminação de si mesmo, consequência inevitável da ilusão de que a segunda metade da vida deve ser regida pelos princípios da primeira. (JUNG apud ARCURI, 2006, p. 55) Sabe-se que a sociedade quando oferece algum tipo de atividade ou lazer aos idosos nem sempre pensa na qualidade do serviço, ou seja, preocupa-se em aglomerar várias pessoas em um mesmo espaço físico, pois o objetivo é fazer marketing político, isto é, com a filosofia de que está trabalhando o social. Não existe 14 um acolhimento, uma preocupação em distribuir atividades significantes para os mesmos, deixando à margem da ociosidade. É aquele idoso que passa por um momento de dificuldade, que tem seus conflitos mal resolvidos e não encontra um ambiente acolhedor, ele ficará com a probabilidade de desencadear vários problemas posteriores o que causa seu isolamento com a sociedade. Observa-se que as relações interpessoais e intrapessoais dos clientes não são valorizadas como fator importante, não se oferece um apoio, um momento de conversa, de escuta. Envelhecer é um processo natural da vida, na qual todo ser humano irá fazer parte, é uma etapa que precisa ser vivida com muita intensidade, amor e alegria, buscando prazer nos mais simples acontecimentos do dia-a-dia. Mas o que percebemos é que acontece ao contrário, o idoso chega a essa fase com muitas atribulações e não curte nem o que plantou durante sua trajetória de vida pessoal, acumulando os conflitos mal resolvidos de si mesmo e juntando com os problemas dos familiares, que além de contribuir para esse desgaste não colaboram e não compreendem esse momento tão importante da vida dos mesmos, dificultando ainda mais essa passagem da vida. É importante ressaltar que são diversos aspectos que permeiam essa fase e que também contribuem para diminuir o prazer em viver, alguns pontos como, a auto-imagem que já não é mesma, pois o tempo se encarrega de acelerar a degradação, em decorrência vem a baixa estima, a perda de pessoas íntimas que já não vivem com eles, a aposentadoria, a exclusão no mercado de trabalho, a viuvez. Fatores negativos que aceleram o envelhecimento. (CHOPRA, 1997, p. 91) • Depressão. • Incapacidade de expressar as emoções. • Sentir-se incapaz para modificar-se e modificar os outros, viver sozinho. • Solidão, ausência de amigos íntimos. • Falta de uma rotina diária regular. • Falta de uma rotina de trabalho regular. • Insatisfação com o trabalho. • Ter que trabalhar mais de quarenta horas por semana. • Dificuldades financeiras, dívidas. • Preocupação habitual ou excessiva. 15 • Arrependimento por sacrifícios feitos no passado, irritabilidade, enraivecer com facilidade ou ser incapaz de exprimir a raiva que sente. • Criticar demais a si mesmo e aos outros. • Fatores positivos que retardam o envelhecimento • Casamento feliz (ou relacionamento satisfatório) • Satisfação no trabalho • Sensação de felicidade pessoal • Capacidade de felicidade de rir com facilidade • Vida sexual satisfatória • Capacidade de fazer e manter amigos íntimos • Rotina diária regular • Rotina de trabalho regular • Tirar pelo menos uma semana de férias por ano • Sentir-se capaz de controlar a própria vida pessoal • Tempo de lazer agradável, hobbies satisfatórios. • Capacidade de exprimir os sentimentos facilmente, visão otimista do futuro. • Sentir-se financeiramente seguro, viver de acordo com suas disponibilidades. Acredita-se que na terceira idade é importante despertar um olhar para dentro se si e perceber as experiências acumuladas e tomar consciência de sua importância enquanto pessoa para a constituição da família a qual faz parte e da sociedade. Buscar a paz interior e viver o hoje sem pensar no amanhã, esse tem que ser o projeto de vida do idoso. O mesmo não pode se programar para algo que seja no futuro distante, e sim para o agora. 16 2 O IDOSO NOS DIAS DE HOJE O que se escreve com tinta pode se perder por a ação de uma única gota d’água, mas o que esta escrito no coração permanece por toda a eternidade. (Provérbio Tibetano) O envelhecimento é visto pelo conjunto da sociedade como um tabu, como algo desagradável e que, portanto deve ser negado. Lidar com as questões da velhice e do envelhecer tanto nosso, quanto do outro, requer uma abertura especial. (ARCURI 2006, p. 34). O idoso consegue ser reconhecido se continuar produtivo, com isso o mesmo precisa prolonga o tempo de duração das energias da plenitude da vida, buscando assim seu espaço na sociedade, reconhecendo que é uma das fases que mais requer atenção e compreensão nesse momento. Chegar à velhice com saúde é privilégio de poucos. Por isso, ela é associada à doença e a degeneração. "Ser velho, na sociedade, é estar debilitado, não em decorrência de um processo natural de envelhecimento, mas por maustratos, alimentação inadequada e horários desorganizados, relacionamentos interrompidos ao longo do tempo... "daquele tempo" do qual os velhos se recordam saudosos, suspirosos." (FRAIMAN, 2006, p. 31) 1 1 meuslivros.weblog.com.pt. Acesso em: 20/04/2009 17 E como a arteterapia pode ajudar nessa fase da vida? A arteterapia pode proporcionar ao idoso um despertar para o mundo interior onde o mesmo comece a se perceber como um ser em processo de transformação pessoal e vá em busca de sua individuação, pois sabe-se que esse processo é contínuo. O ser humano está sempre em processo de mudança, descobrir-se e perceber-se é um ponto fundamental para a busca de viver bem, aceitando seus limites, seus conflitos e saber lidar com os mesmos no seu dia a dia. As atividades que estimulam o criativo possibilitam uma abertura de ideias através dos recursos artísticos onde proporcionam ao individuo uma nova forma de ver e perceber o mundo ampliando seus horizontes, permitindo ao idoso expressarse e perceber significado exercendo um forte papel social, facilitando despertar para as emoções, evocando seus conflitos interiores e reestruturando seu (eu) consigo e com o outro. Através das oficinas criativas o individuo poderá desenvolver o imaginário e seu lado criativo, elevando consequentemente sua auto-estima em um momento de escuta de acolhimento, no contato com os recursos expressivos, no caminhar pelo desconhecido em busca dos significados simbólicos para si mesmos. Acredita-se que para acontecer todo esse processo é necessário ter força de vontade e essa tem que partir do próprio ser que está inserido na situação ou “problema” vivenciado, pois de nada adiantará todo esforço se a consciência está presa a padrões de comportamentos limitadores que não conseguem se libertar para um olhar diferente e ver as coisas boas que a vida oferece. Rever crenças e paradigmas através da arte e do processo criador é uma das principais tarefas do arteterapeuta, um facilitador do aprendizado simbólico e da educação emocional. Sabe-se que o reflexo de um idoso mal resolvido na vida é complicado, pois não se sente integrado enquanto pessoa e tende a transmitir seu mal-estar para quem está mais próximo, tornando desagradável, ranzinza, onde ofender o outro para ele nada tem valor, seu mau-humor angustia a todos que o rodeiam, deixando que todos se afastem, pois vivem com uma máscara (persona) demonstrando serem fortes e que não precisam de ninguém, mas percebe-se aí a fragilidade, o cuidado de que os mesmos precisam. 18 2.1 A ARTETERAPIA E A TERCEIRA IDADE A arteterapia é uma técnica terapêutica que trabalha o desenvolvimento humano, exercitando a criatividade e as habilidades manuais como pintar, desenhar, colar, recortar, fazer esculturas, onde possibilita o autoconhecimento e ajuda a elevar a autoestima. Sentimentos, emoções, esperanças e desejos nem sempre podem ser expressos por palavras. Às vezes sofremos com uma depressão que teima em aparecer sem nenhum motivo aparente, uma agressividade gratuita ou sintomas de estresse que, aos poucos, vão minando as energias, levando o indivíduo a uma desestrutura psicológica. Nos últimos tempos a arteterapia vem sendo aconselhada para quem quer se conhecer melhor e compreender o que se passa em seu íntimo. (FERRETTI Apud REVISTA VIVA SEDA, 2007, p. 45.) A proposta não é transformar em um artista habilidoso, e sim aproveitar os aspectos lúdicos da atividade escolhida para entrar em contato com os aspectos íntimos da personalidade. A finalidade não é formar artistas nem ter uma expectativa estética, pelo contrário, as pessoas precisam esquecer todo processo de belasartes. No tratamento, não existe o feio ou bonito, o que importa é a forma do 19 inconsciente na matéria, a maneira como a pessoa vai se expressar e os símbolos que aparecem. Os símbolos que normalmente se repetem em pinturas e esculturas, ajudam a desvendar conflitos. “Na comunicação não verbal, os pacientes se sentem soltos, não têm reservas nem resistências e quase sempre se surpreendem com reações que afloram, pois o inconsciente se manifesta mais rápido”. (FERRETTI Apud REVISTA VIVA SEDA, 2007, p. 45). "A arte proporciona um aprendizado para a vida. Só por vencer as dificuldades dos materiais, dá para perceber quais os pontos que devem ser controlados, como a impaciência e a ansiedade. Isso ajuda nas relações do cotidiano", diz Ferretti (Apud REVISTA VIVA SEDA, 2007, p. 45). "Se um pinguinho de tinta cai num pedacinho azul do papel... Num instante imagino Uma linda gaivota a voar no céu..." (VINÍCIUS E TOQUINHO, CD AQUARELA, 1983) Percebe-se a arteterapia ser uma via de acesso ao inconsciente pelo qual de outra forma não seria possível alcançar com tanto êxito e desvendar nossos conflitos internos para melhor lidar com os mesmos. A mesma vem auxiliando pessoas de todas as idades, sexo, religião na área de saúde e educação na compreensão e elaboração de alguns conteúdos emocionais que presentes em todas as etapas da vida ganham formas significativas na velhice. A arte pode elevar o homem de um estado de fragmentação a um estado de ser integro, total. A arte capacita o homem para compreender a realidade e o ajuda não só a suportá-la como a transformá-la, aumentando-lhe a determinação de torná-la mais humana e mais hospitaleira para a humanidade. (FISCHER apud FABIETI, 2004, p. 18). Acredita-se que um das razões da importância da arteterapia em nossa vida é a de recuperar momentos esquecidos, relembrar e buscar habilidades perdidas e sepultadas pelo avanço tecnológico. A mesma consegue sua função terapêutica por permitir a passagem de conteúdos inconscientes, não assimilados, transmutados em outros conscientizados, ela visualiza conteúdos expressivos, onde a forma converte a expressão subjetiva em comunicação objetivada. 20 A arteterapia tem muito a contribuir uma vez que é um processo terapêutico que auxilia a resgatar, desbloquear e fortalecer potenciais criativos, através de formas de expressões diversas. Através do ato criativo, a expressão revelação e reconhecimento do mundo interno e inconsciente serão favorecidos, permitindo libertar criaturas que nunca vieram à luz, presas que estavam em modos antigos de funcionar. (PHILIPNNI, 2000). Para Elieser (Apud REVISTA VIVA SEDA 2007, p. 46) cada material usado para a arteterapia tem uma ação específica no corpo, gerando uma harmonia interna que, consequentemente, promove um contato íntimo com os tipos usados e suas conseqüências: sabe-se que essas reações podem ser diferentes para cada cliente, dependendo do momento em que está vivendo com suas peculiaridades. Desenho: Ajuda na coordenação visual e motora, desenvolvendo a intelectualidade. Pintura: Harmoniza a parte afetiva e as emoções por meio das cores e da água. Modelagem: Atua na pele e nas glândulas endócrinas, dá mais sensibilidade tátil, desenvolve a ação e impulsiona a vontade. Tecelagem e bordado: São rituais de paciência, de concentração e desenvolvimento do pensamento. Dança: Ajuda a se reconhecer e a explorar o espaço. Traz graciosidade e leveza e aumenta o nível de endorfina, substância do cérebro que dá sensação de prazer. Teatro: Facilita o reconhecimento do outro na relação, permite a empatia com o outro. Música: Coloca a pessoa em contato com ela mesma e com suas emoções mais profundas. Origami: Permite o desenvolvimento do gesto preciso, da delicadeza, da acuidade visual, da memória, do lidar com números e da percepção espacial. Mosaico: Estimula a percepção – o todo com a parte e a parte com o todo –, organiza as idéias, ordena e fortalece as emoções, desenvolve percepções múltiplas e o concretizar. Eco-Arte: Instalações que aproveitam o material e o espaço que a natureza oferece. Favorece a percepção espacial. 21 Colagem: O trabalho com diferentes materiais estimula o tato, o olfato, a visão e a organização espacial. 2.2 COMO A ARTETERAPIA PODE AJUDAR O INDIVÍDUO NA TERCEIRA IDADE Enquanto a primeira metade da vida é apenas uma infatigável aspiração de felicidade, a segunda metade, pelo contrário, é dominada por um sentimento doloroso de receio, porque se acaba por perceber mais ou menos claramente que toda a felicidade não passa de quimera, que só o sofrimento é real. Por isso, os espíritos sensatos visam menos aos prazeres do que a uma ausência de desgosto, a um estado de algum modo invulnerável. - Nos meus anos de mocidade, uma campainha da porta causava-me alegria porque pensava: "Bom! É qualquer coisa que sucede". Mais tarde, experimentado pela vida, este mesmo ruído despertava-me um sentimento vizinho do medo; dizia de mim para mim: "Que sucederá" (SCHOPENHAUER apud MONTEIRO, 2008, p.152). A terceira idade é uma fase da vida que pode ser considerada especial se for vista com os olhos da sabedoria,buscando entender e compreender o processo de transformação física e psíquica, no sentido mais amplo da palavra, aceitando e compartilhando as experiências vividas no decorrer da vida, somando e contribuindo para um envelhecimento saudável, onde acredita-se que se tenha uma ressignificação de atitudes pessoais nesse momento. (BARRETO Apud REVISTA VIVA MELHOR, 1993, p. 14). A arteterapia pode contribuir de forma significativa para a transformação do individuo, ajudando o mesmo ser um idoso saudável, passando pela transição de forma natural e ainda contagiando a todos com suas experiências adquiridas ao longo do tempo. Para viver esta fase de bem com a vida é um desafio que se busca, mas sabe-se que esta estruturação se dá durante a nossa formação, ou seja, segundo Winnicott, (1967) desde o nascimento começa a nossa formação e estruturação psíquica. O que refletimos na velhice poderá ser conflitos da nossa 22 infância, adolescência ou até mesmo na fase adulta. Apreender a conviver com essa situação é tarefa difícil. A arteterapia atende as necessidades do individuo que se encontra em um momento de desequilíbrio interno, auxiliando na integração das idéias, dando suporte e estruturação as emoções evocadas para viver com força e vitalidade os problemas encontrados no dia a dia ou os que emergem do íntimo. Dentro de um processo de envelhecimento, a presença da mesma promove através de seu processo criativo uma melhor qualidade de vida aos idosos, pois a criatividade é a essencialidade no homem. "Ao exercer o seu potencial criador, trabalhando, criando em todos os âmbitos do seu fazer, o homem configura a sua vida e lhe dá um sentido. E é do mesmo modo necessário." (OSTROWER, 1987, p. 160.) Além de ser necessário explorar o criativo dos idosos é preciso que os mesmos aceitem as marcas deixadas no corpo nessa fase da vida. Com o passar do tempo, o corpo vai registrando marcas e acontecimentos que não são percebidos conscientemente, e são associadas à idade, mas na verdade elas são reflexos também do padrão de vida que o individuo tem, é uma espécie de arquivo que acumula informações. Eu não tinha este rosto de hoje, assim tão calmo, assim triste, assim amargo, nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo. Eu não tinha estas mãos sem forças, tão paradas e frias e mortas; Eu não tinha esse coração que nem se mostra. Eu não dei por esta mudança, tão simples, tão certa, tão fácil: -Em que espelho ficou perdida a minha face? (MEIRELES Apud MONTEIRO, 2008, p. 35) As experiências traumáticas também são vividas através do corpo, e para que se consiga superar e ativar essas experiências corporais existem as técnicas expressivas, que são sensibilizações corporais que funcionam tanto para oferecer estímulos, quanto para desbloquear e permitir que ele se expressem livremente. "O corpo é a expressão flagrante dos anos vividos: as marcas vividas e não vividas no finito e na infinidade do tempo atemporal. O corpo como movimento é a apresentação da existência e da forma de ser humano; esse ser que seu corpo." (ARCURI, 2006, p. 65). 23 Muitas memórias são esquecidas, mas na memória corporal tudo que é vivido ainda pulsa, tem fome de vida. Através das experiências clínicas com os idosos, foi observado como essas marcas trazem informações sobre a vida dos indivíduos e vem em forma de imagens simbólicas que fazem com que os clientes revivam momentos por eles esquecidos e tomem consciência do seu corpo nessa fase da vida. O trabalho corporal tem um valor significativo para essas memórias, o conduzir das atividades, o caminho percorrido, e as sensações evocadas são de um dinamismo incomparável. As conseqüências físicas e psicológicas deixadas ou herdadas no decorrer da vida do ser humano são bem visíveis nas marcas do corpo. Mas o corpo em si mesmo nada faz, basta observar um corpo morto. A consciência apresenta as informações que se manifestam no corpo e que se tornam visíveis. A consciência apresenta as informações que se manifestam no corpo e que se tornam visíveis, pois muitas vezes o idoso não se sente "velho", pois a transformação aconteceu só no corpo, enquanto a mente reflete ser mais jovem, para ele o que envelheceu foi só o físico. Sabe-se que aquilo que pensamos e sentimos afeta o corpo, a origem dos problemas psicológicos se manifestam também por meio de sintomas físicos. Segundo Chopra. (1997, p.87), existem três modos distintos e separados de medir a idade de alguém: A idade cronológica é aquela que você tem segundo o calendário. A idade biológica é a idade do seu corpo em termos de sinais críticos da vida e processos celulares. Idade psicológica, a idade que você sente que tem. Acredita-se que somente a primeira é fixa, e também a menos confiável das três. Uma pessoa de 50 anos pode ser quase tão saudável como quando tinha 25, enquanto que outra de 50 pode ter um corpo de 60 ou mesmo de 70 anos. Para saber realmente qual é a sua idade, a segunda medida, a idade biológica entra em ação; ela nos diz como o tempo afetou seus órgãos e tecidos comparados com outras pessoas da mesma idade cronológica. (CHOPRA, 1997, p. 91) O tempo não afetou uniformemente seu corpo, contudo, praticamente cada célula, tecido e órgão envelhecem dentro de seu próprio calendário, o que torna a idade biológica muito mais complexa do que a cronológica. 24 Mas as influências sociais e psicológicas sempre estão agindo, nossos estilos de vida nos submetem a várias condições e as diferenças nas formas de envelhecimento mostram-se muito cedo na vida. Drummond diz que "ao alimentar sua vida interior, você esta usando o poder da consciência para derrotar o envelhecimento na sua origem." (1984, p. 7). Analogia feita por (DRUMMOND apud ARCURI 2006, p. 24) entre corpo e autoconhecimento. As contradições do corpo Meu corpo não é meu corpo è ilusão de outro ser. Sabe a arte de esconder-me E é de tal modo sagaz que a mim de mim ele oculta, Meu corpo, não meu agente, Meu envelope selado, Meu resolver de assustar Tornou-se meu carcereiro Me sabe mais que me sei. Sabe-se que um dos recursos artísticos que favorecem a melhora da qualidade de vida dos seres humanos e dos idosos é a expressão corporal, ou seja, a dança. São diversos estilos em sua modalidade, o fato é que a música associadas aos movimentos corporais transmitem um bem estar ao indivíduo que a pratica. Na terceira idade existem algumas limitações no nível físico, e principalmente, no psicológico é uma das fases das perdas, na qual se acentuam os problemas de saúde, depressão, de rejeição, etc... Ao mesmo tempo é uma das fases de grandes possibilidades. Depende de cada pessoa poder transformar estes limites em algo maior, que transcendam o "estar ficando velho". Esta é fase da sabedoria, da maturidade, e quando há conexão com o lado positivo desta etapa da vida podem ser vividas experiências maravilhosas, bastantes enriquecedoras. Existe algo muito importante nessa fase, que é a realização de um novo projeto de vida, poder se perguntar "o que eu fiz?" e o que eu posso fazer? "Isto traz uma nova perspectiva para a vida, sabendo que se pode contribuir com em um novo ritmo. As pessoas ficam com mais tempo e então podem criar, estruturar este novo momento, fazendo o que sempre gostaram e que muitas vezes não tiveram tempo, oportunidade ou condições de fazer. Uma nova porta se abre para 25 estas pessoas quando tomam consciência da importância de estar vivenciando este momento. (BARRETO Apud REVISTA VIVA MELHOR, 1993, p. 14) No envelhecer, é comum estar diante das mais radicais experiências. Nossa existência depara com a totalidade de nosso ser, quando as convenções, organogramas e fórmulas de nossa vida não mais são suficientes para fazer todo o sentido. Cada vez mais o exterior torna-se relativo, e o interior, remete à voz do intimo. É de fundamental importância ouvir a voz do íntimo, pois só através dela o indivíduo conseguirá um norte para a busca do prazer em viver, caso contrário viverá em meio às dúvidas e conflitos emocionais, procurando onde está o vazio e a resposta esta guardada no interior de cada um, basta buscar, para encontrar, e essa busca podemos chamar como o próprio Jung denominou de individuação. Processo pelo qual todo ser humano deveria estar em busca, de um encontro consigo mesmo, não só na velhice, mas em toda trajetória de vida pessoal. O homem que envelhece deveria saber que sua vida não está em ascensão nem em expansão, mas um processo interior inexorável produz uma contração na vida. (...) para o homem que envelhece é um dever e uma necessidade dedicar atenção séria ao seu próprio si mesmo (KIERKERGAARD apud MONTEIRO, 2008, p. 113). Entende-se que esse encontro e essa busca é o processo de individuação que começa a despertar no individuo que a ela procura. A individuação segundo JUNG, é um processo que percorre toda evolução humana (no nível pessoal e, analogamente, no coletivo) e refere-se ao processo de torna-se uma pessoa inteira, indivisível e completa, com sensação de auto realização. (URRUTIGARAY, 2004, p. 72.) A utilização das técnicas em arteterapia poderá mediar uma conexão amorosa entre a visualização do sentido na imagem produzida, com as sensações pertinentes ao uso dos diferentes materiais e a descobertas das emoções sentidas no desfrute do trabalho concluído. O indivíduo quando começa a vivenciar esse processo é percebido através da mudança de comportamento e atitudes, como também nas ações no seu dia-adia. Portanto, o trabalho com arteterapia é um convite á individuação, por que supõe risco de poder expressar-se, ir contra as regras vigentes, aos modelos idealizados, a tradição os costumes, a conformidade. 26 Viver é caminhar em buscar do ser do nosso ser, de sermos inteiros, plenos, um caminho que Jung chamou de individuação. É necessário distinguir individualismo, que representa uma noção centrada no eu de ação e pensamento livres e independentes, de individuação, que significa levar à plena realização as qualidades pessoais e coletivas da pessoa. A individuação, como processo pode ser observada em importantes fases da vida e em épocas de crises, quando o destino transtorna o propósito e a expectativa da consciência do ego. A unilateralidade da vida consciente é corrigida, compensada, pela interação do inconsciente. Isso descreve a luta pela realização plena que, acredita Jung, é inerente a todo ser humano. É possível que ela nunca seja alcançada; mas é a finalidade do processo de individuação. (BENNET, 1985, p.141). A distinção entre o que somos para os outros e aquilo que somos para nós mesmos vai se tornando mais nítida à medida que o processo de individuação avança. Só então integrando a individualidade, a persona passa a ser consciente do individuo e tanto mais verdadeira quanto mais espelhasse o indivíduo na sua autenticidade. Ao observar atitudes independentes de alguém que tenha total dependência de algo ou alguém pode-se acreditar que é um passo para caminhar em busca dessa integração tão desejada por todo ser humano, mesmo que seja de forma inconsciente ou consciente, o prazer em viver em plenitude é o objetivo da sociedade atual. (URRUTIGARAY, 2004, p. 72). O viver em harmonia também depende de buscar o amor e estar aberto para o mesmo entrar, já dizia (LELOUP apud ARCURI, 2006, p. 45). “Há lugares de nós mesmos que não existem enquanto o amor não penetrar. Há lugares de nós mesmos que não podemos reconhecer enquanto o olhar do outro, com benevolência e sem julgamento, não reconhecer”. É preciso acreditar que com o tempo tudo se resolverá, pois “o tempo e essa força que nos envelhece, que nos entristece, que nos mata, que nos leva embora e nos distancia. Que fazer esquecer o tempo? Ame o tempo, sacerdote das razões humanas”. (MELO Apud ARCURI, 2006, p. 89). 27 3 EXPRESSÃO CORPORAL NA PRÁTICA DA ARTERAPIA 2 O trabalho corporal pode ser visto como ponto de manifestação de nossos conflitos pessoais e emocionais e, portanto, o corpo também nos ajuda a lidar melhor com os sentimentos. Segundo Weil (2007, p. 7), pela linguagem do corpo você diz muitas coisas aos outros. Contudo, ele tem muita coisa a dizer para nós, pois o nosso corpo é, antes de tudo, um centro de informações para nós mesmos. Observa-se que o corpo, além de ser fonte de informações sobre os estados da saúde, é um recurso que pode ser utilizado para alcançar o bem-estar ou equilíbrio de si próprio. Saber cuidar do corpo é um dos desafios da nossa sociedade. Corpo e mente caminham juntos e são reflexos de nosso self (eu), o universo interior. Segundo o psicólogo (PELLETIER Apud FERGUSON, p. 254) nossas expectativas se traduzem em doença física, porque o corpo sente como se estivesse em perigo mesmo que a ameaça seja imaginária. Acredita-se que pelo modo de vida que as pessoas vivem, pouco se dá atenção ao corpo. Este acumula as tensões do dia a dia, as memórias e lembranças do passado que não conseguem vir à tona. Tudo isto resulta em um corpo doente, 2 meuslivros.weblog.com.pt. Acesso em: 20/04/2009 28 com marcas e cicatrizes e conseqüências que muitas vezes não encontram explicações. Observa-se cada vez mais uma sociedade doentia, que não consegue parar e analisar a importância da qualidade de vida, principalmente na terceira idade, onde o corpo demonstra o peso das marcas de uma jornada. O trabalho corporal pode ajudar ao indivíduo a conectar corpo e psique. Sendo um dos canais expressivos da arteterapia, “a expressão corporal abrange uma infinidade de técnicas e de propostas onde o toque, a massagem, a dança e o movimento estão intrinsecamente vinculados. O trabalho corporal pode ser o fio condutor do processo arteterapêutico” Tantos os processos biológicos quanto os psíquicos se processam no corpo, de forma que não se pode falar em corpo e mente separadamente. Ambos refletemse um no outro mutuamente e o tempo todo. Nossa psique está registrada no corpo. As primeiras vivências, desde a fase intra-uterina, configuram qualidades emocionais que surgem a partir das sensações físicas. Estas deixam registros de situações vividas e ou vivências, sensorialmente, formando nossa memória corporal. Ao trabalhar o corpo nos conectamos diretamente com essa memória, trazendo lembrança das sensações e às vezes de conteúdos esquecidos. A expressão corporal é um dos canais expressivos usados na arteterapia. Tem como proposta favorecer experiências diversas que levam à consciência e ao conhecimento corporal, buscando a organização e a reorganização do movimento através da criatividade, tanto de forma individual como coletiva. O trabalho corporal se dá através do toque, das técnicas de respiração, da leitura corporal,da dança e da movimentação espontânea ou conduzida. As diversas técnicas utilizadas permitem a vivência do corpo profundo, ou seja, que é sentido internamente, despertando um vivido antigo enterrado em nossa pele, nossos músculos, nossas vísceras, e aquilo que não podia nem ser pensado, nem dito, e às vezes mesmo nem percebido, é despertado através de movimento, do experimento e das emoções. A consciência do movimento corporal facilita a assimilação de nosso mundo interior, provocando mudanças significativas em nossas vidas, como a melhora da auto-estima, a feminilidade retraída, leveza no corpo e na mente e o despertar para a importância do corpo físico enquanto matéria. 29 A expressão corporal fala para além das palavras, trazendo uma parte direta para o universo imaginário e simbólico. (BAPTISTA, 2009). 3 A qualidade simbólica do gesto se traduz em imagens. Símbolos são trazidos do gesto para o concreto, por meio de desenhos, pinturas, escultura, história e poesia. Da mesma maneira, histórias, formas figurativas e gráficas se transformam em movimentos expressivos permitindo que novas imagens se configurem desencadeando diferentes processos internos, onde se vivencia mais do que percebido, projetado e 4 conscientemente expresso. (BAPTISTA, 2009) . O movimento no corpo traz um renascimento de nossas memórias, abrindo uma possibilidade de reviver e dar continuidade a algo que nos pertenceu e ficou esquecido. Ao expressar gestos o individuo deixa vir à tona algo que lhe pertenceu e ficou esquecido. O expressar o que não foi falado mas vivenciado é representado simbolicamente através do movimento. Para Mommensohn & Petrella (2006, p. 43), Laban foi um grande estudioso do movimento, e via a questão da dança de modo comparável à habilidade circense. Não importava desenvolver habilidades para virar inúmeras piruetas,ou dar saltos altíssimos, mas a capacidade de criar e explorar idéias por meio da improvisação, para Laban, o importante era desenvolver a capacidade de compreender e usar o corpo expressivamente,visto que para ele estava clara a relação entre corpo, os sentimentos e a razão. O mesmo percebeu que as ações do corpo, tanto as posturais como os gestos, se originam de impulsos internos. Na visão de Laban o movimento era a origem de todo ser e o elemento básico da vida considerando a dança o retrato puro da vida: A dança representa a cultura, a sociabilidade. A dança é a força motriz, que alinha a representação impalpável da religião. A dança é todo conhecimento, visão e construção que complementa o pesquisador e o homem da ação. Também é o retrato dos acontecimentos do mundo, é o circulo dentro do qual vibra o corpo humano. (MOMMENSOHN & PETRELLA, 2006, p. 46) Dentre as diversas formas de expressão corporal, acredita-se que a dança é uma das formas que mais integra e promove a autoestima no individuo, a mesma propõe a sensação de bem estar e leveza, é um dinamismo incomparável no momento da dança, pois a mesma ajuda a se reconhecer no espaço, traz 3 4 Baptista, Disponível em:<www.cebrafapo.com.br > Acesso em:19/04/2009. Baptista, Disponível em:<www.cebrafapo.com.br > Acesso em:19/04/2009. 30 graciosidade e leveza e aumenta o nível de endorfina, substância do cérebro que dá sensação de prazer. Segundo Rosana Braga (nº 14), dançar é reconhecer o divino que existe dentro de cada um. É reverenciar o invisível superior que ronda a existência de todo ser humano. “A dança pede o homem liberto, vibrando em equilíbrio com todas as forças”. (AUGUSTINUS Apud REVISTA VIVA MELHOR, 1993, p. 07). A dança e o canto sempre estiveram presentes na vida dos povos, seja em celebrações, rituais ou simplesmente para se conectar com Deus como uma oração. Reflete a necessidade de comunhão, de celebração de união entre as pessoas. Os povos antigos tinham essa sabedoria de dançar e cantar, tudo era celebrado, cantado e dançado: nascimento, casamento, plantio, colheita, morte. As danças brasileiras trazem a força do nosso povo, como também toda alegria e sensualidade. As cirandas nos ajudam a contactar a nossa criança, o nosso jeito inocente e puro de viver, a nossa alegria e felicidade, a expressão mais pura de nossa essência. As danças indígenas nos conectam com o centramento, a força e poder que estão dentro de nós para realizar aquilo que cada um precisa. Cada tribo tem seus cantos e suas danças específicos e muitos são recebidos em sonhos e não tem significado especifico. O que observamos é a conexão com os elementos da natureza (fogo, terra, água e ar). E o estar presente aqui e agora. Algumas delas são dançadas por horas e horas e muitas vezes com um objetivo específico, como por exemplo, pedir paz, ajudar a trazer a chuva, ajudar na caça, etc... (BARRETO Apud REVISTA VIVA MELHOR, 1993, p. 13) Segundo Barreto (Apud REVISTA VIVA MELHOR, 1993, p. 18) os benefícios trazidos pelas danças podem ser elencados como: • Trazem a leveza, a alegria, a beleza, a paz, a serenidade, o amor que existe dentro de cada um. • Proporciona o trabalho em grupo sem que a pessoa perca sua individualidade. • Desenvolvem o apoio mútuo, a integração, a comunhão e a cooperação. • São instrumentos suaves de autoconhecimento e autocura. • Incentivam o indivíduo a expressar o que ele tem de melhor dentro de si. • Harmonizam o grupo antes e depois de praticar suas tarefas cotidianas. • Trazem musicalidade e ritmo para a vida diária. 31 • Equilibram o corpo físico, emocional, mental e espiritual. • Ampliam a percepção, a concentração e a atenção. • Trazem maior autodisciplina e centramento. • Encorajam as pessoas a ocupar o seu lugar e o seu espaço. • Trazem flexibilidade e autoconfiança para a vida. • Desenvolvem a autoestima, ajudando a transformar medos, angústias, ansiedades. • Ajudam a combater o stress, a depressão. • Ampliam a percepção e a intuição. Ao observar e analisar os benefícios proporcionados pela dança, podemos acreditar que na terceira idade é um ótimo recurso artístico para explorar o corpo, e que além de fazer muito bem é uma atividade bem acessível a todos homens e mulheres principalmente idoso, devolvendo aos mesmos o prazer de viver bem aceitando os limites do corpo e percebendo que algo novo está sendo despertado, uma vida cheia de esperança e paz consigo mesmos, em plena terceira idade. 32 4 OFICINA CRIATIVA E AS TÉCNICAS EXPRESSIVAS COLIGADAS AO TRABALHO CORPORAL O trabalho arteterapêutico foi realizado em 33 encontros com 1h:30min junto a um grupo de idosas. A preparação e reflexão dos atendimentos utilizaram o formato das Oficinas Criativas. A Oficina Criativa (ALESSANDRINI, 1996), foi objeto de estudo durante o programa de mestrado da pesquisadora responsável pelo presente projeto. Essa metodologia orienta o profissional sobre como pensar uma proposta de trabalho educacional ou em contexto terapêutico. O formato da Oficina Criativa possui como diretriz uma sequência básica, estruturante de uma proposta a ser constituída. Sensibilização: em que o sujeito estabelece contato com o trabalho que se está iniciando, e tem como objetivo seu contato com o mundo interno. O passo seguinte é a expressão livre, quando se podem explorar possíveis de concretizar, em um ir e vir de movimentos que surgem naturalmente. Como continuidade metodológica, pedimos ao sujeito para elaborar a expressão realizada até então, porém mantendo-se no nível não verbal e da arte. Essa elaboração pressupõe um redimensionamento do que foi feito até o momento. Na sequência das ações solicitamos a transposição da linguagem, ou seja, a passagem daqueles conteúdos para uma nova linguagem. Priorizamos o uso da palavra como elemento mediador da expressão, ou seja, pedimos ao sujeito que escreva o que viveu. Conclui-se com uma avaliação e com a recomposição das etapas processuais, o que permite que a aprendizagem produzida seja tomada consciente. “A oficina criativa funciona como instrumento facilitador, pois cada pessoa pode ser convidada a, efetivamente, descobrir e evocar seu projeto pessoal”. (ALESSANDRINI, 2007, p. 07). Selecionaram-se do grupo original, fragmentos observados, relevantes para apresentar aspectos que corroboram com a base teórica trabalhada nos capítulos anteriores. Para análise dos dados utilizou-se a metodologia reprodutiva, que propõe uma leitura construtivista do processo, conforme proposta por Garcia (2000). O autor propõe uma reflexão de todo o processo realizado, ou seja, a pesquisa parte das 33 etapas finais do processo e analisa retroativamente o desenvolvimento sucessivo das ações, em um ir e vir revelador. (GARCIA, 2002). 4.1 TÉCNICAS EXPRESSIVAS COLIGADAS AO TRABALHO CORPORAL As técnicas expressivas coligadas ao trabalho corporal é um conjunto de atividades que propõe investigar as marcas do corpo investigar as marcas do corpo bem como as memórias. (ARCURI, 2006, p. 61). Muitas vezes, por meio de um toque corporal, um relaxamento, “técnica respiratória”, aliadas com atividades artísticas, como desenhar pintar, modelar, ou seja, as técnicas expressivas coligadas ao trabalho corporal fazem com que as memórias corporais reapareçam trazendo muitas lembranças passadas. As técnicas expressivas possuem como diretriz uma sequência básica preparada de forma a garantir uma organização. Em primeira instância, há a sensibilização, realizada por meio de técnicas respiratórias. A respiração é uma das funções mais importantes do nosso organismo e está intimamente ligado ao estado emocional. Nascemos e a respiração foi nosso primeiro ato voluntário; podemos dizer, então, que nascemos com uma respiração, assim também como será a ultima coisa que faremos ao morrer. Ao modificar o ritmo respiratório, obtém-se uma modificação no estado emocional, há uma interiorização, uma introspecção, uma escuta de si mesmo. Em um segundo momento propomos uma intervenção por intermédio de relaxamento. As formas de relaxamento sempre são utilizadas no início das sessões; algumas vezes mediante instruções verbais com sugestões sobre imagens do próprio corpo, como indicação de relaxar o rosto, desfazendo a mímica facial, modificando, assim a expressão do rosto. Os meios de comunicação que o corpo oferece podem ser um fidedigno método de investigação terapêutica. O aspecto postural, gestual, sua forma ou suas deformações, as tensões inconscientes, as dores, tudo isso faz do corpo um conjunto de fragmentações em que se torna necessário uma centralização. O corpo que não “fala” está aprisionado em suas tensões que provocam deformações, e fica como a energia “estagnada”, pois esse processo geralmente é 34 inconsciente. É como se a alma ficasse prisioneira num corpo trancado, rígido e sua tentativa de libertação poderia ser chamada de “doenças. As doenças podem ser um símbolo do que precisamos transformar em nossas vidas. (ARCURI, 2002, p.15) Por meio do corpo, todo sintoma força o ser humano apesar de seus esforços em contrários, a manifestar alguns dos princípios que, deliberadamente, havia optado por não viver, isso estabelece o equilíbrio. (DETHLFSEN; DALKE apud ARCURI, 2006, p. 23). Segundo ARCURI (2006, p.22) “Ao trabalhar técnicas expressivas coligadas ao trabalho corporal é possível trazer um despertar para vida.” Acredita-se que o trabalho corporal na terceira idade pode contribuir para a aceitação da passagem dos anos, mesmos com todos os atributos que acompanham a velhice como a aparência cansada, um corpo com limitações enfim todo um processo de transformação corporal, é possível reverter a situação. 4.2 OFICINAS TERAPÊUTICAS REALIZADAS COM IDOSOS. “Viver a oficina é tocar o mundo mágico da criação.” ALLESSANDRINI Ao planejarmos a oficina criativa, pensamos em oferecer um momento de reflexão e transformação pessoal, trabalhando as sensações táteis e olfativas, através dos elementos (flores) que evocam o elemento terra e as sensações. A oficina iniciou-se com uma sensibilização corporal onde trabalhamos a respiração, em seguida, sugerimos caminhar ao som da música (movimento terra). 35 Observou-se uma interação de todos neste momento, se soltaram e relaxaram, era como se cada um se percebesse como parte integrante de grupo, ao comentarem a importância de estarem participando deste trabalho. Na continuação fomos para a expressão livre, onde oferecemos pétalas de flores, papeis colorido, cartolina, cola. Durante a expressão livre, eles conseguiram manter um diálogo. Percebemos um ar de felicidade e alegria em compartilhar deste trabalho. 36 Em seguida o momento elaboração individual, onde cada um entra em contato com sua obra, e depois a transposição da linguagem, onde sentaram em circulo e deixavam o espaço livre para quem quisesse compartilhar as sensações e sentimentos evocados. Chegamos à conclusão que o trabalho de respiração e movimentos corporais com atividades plásticas proporcionam prazer e alegria aos clientes, dando-lhes a oportunidade de criar e transformar a partir de elementos naturais. “A oficina criativa funciona como instrumento facilitar, pois cada pessoa pode ser convidada a, efetivamente (ALLESSANDRINI, 2004. p.87) descobrir e evocar seu projeto pessoal” 37 5 VIVÊNCIAS EXPERIÊNCIADAS COM UM GRUPO DE IDOSOS No trabalho arteterapêutico com os idosos percebemos a necessidade de trabalhar o corpo, pois eles gostavam de dançar. As atividades com toques corporais sempre eram bem aceitas. Durante as oficinas terapêuticas comentavam relembrar a infância, a juventude, sentiam-se mais leves e mais felizes. Era visível uma melhora na autoestima, na mudança de comportamento, não reclamavam de dores no corpo, sorriam bastante e realizavam movimentos corporais procurando superar seus limites,como é o caso do Sr. E O Sr. E. usava bengala e quando ia dançar dizia “não preciso da bengala”, pois conseguia manter o equilíbrio apenas dançando. E comentava: “Meu corpo estava com uma parte morta (esquecida), devido um acidente na juventude em uma vaquejada, fiquei imobilizado durante muito tempo ,aos poucos fui conseguindo me readaptar aos movimentos,mas um lado do corpo eu não senti,hoje depois de da arteterapia e os movimentos no corpo consigo me sentir vivo.” Ao analisarmos o depoimento do Sr. E, é possível percebermos que mesmo com o passar dos anos e o corpo envelhecendo gradualmente é possível haver renovação tanto no corpo quanto na mente, e o trabalho corporal pode ser uma via de acesso. Em uma outra oficina propusemos uma atividade onde trabalhamos a respiração e o movimento corporal ao som da música (Minueto) de Luigui Bacherini. Percebemos uma grande socialização entre os participantes:alguns dançavam com olhos fechados, outros de costas para o círculo, o movimento era característico de cada um de acordo com seus limites. Durante a dança DMC comenta: “Estou me sentindo livre, leve, rodopiando no salão, lembro-me da minha juventude. Não vir as sessões me faz muita falta, inclusive meu médico, disse que percebeu minha ansiedade estava mais controlada”. DR diz: “Me senti uma criança leve e solta, a valsa tocada é minha preferida. Quando danço percebo que libero as tensões do dia a dia”. 38 Usando uma música de Marcelo de Almeida, que direciona uma viagem imaginária sugerimos ao grupo sentar em uma posição confortável, trabalhando a respiração. Percebemos que uns demoravam a fechar os olhos, mas outros conseguiam se entregar ao relaxamento. Ao terminar a música, pedimos que se movimentassem e tocassem o corpo parte por parte, fazendo auto-massagem. Após a atividade DMC comenta: “Passei por um problema esta semana que quando acontecia algo semelhante, eu não conseguia dormir, então fiz a técnica da respiração, aliviou minha cabeça e relaxei o corpo, foi uma sensação muito agradáve,l dormi tranqüila. Estou vivendo um momento muito bom na minha vida pois nunca fiz atividades desse tipo na infância”. DR comenta: “Durante o relaxamento senti uma luz forte e uma energia percorrendo meu corpo, com uma sensação de bem-estar. Me senti uma criança hoje durante a sessão”. Com as vivências realizadas e os depoimentos coletados, percebe-se o quanto é importante o trabalho corporal na arteterapia, principalmente na terceira idade, onde a necessidade é maior em liberar as tensões e emoções bloqueadas no corpo. Durante as práticas das técnicas expressivas coligadas ao trabalho corporal, várias formas de relaxamento foram utilizadas sempre no início das sessões, algumas vezes mediante instruções verbais ou ao som das músicas, com sugestão de imagens. De todas as técnicas aplicadas no grupo, a dança foi a mais bem aceita, percebendo-se ser a via de acesso do grupo. 39 Segundo Arcuri (2006, p. 89), “no processo com a dança não há racionalização – é um fluir natural do ser, é como se toda a alegria de existir falasse mais alto; não que os sofrimentos deixassem de existir, mas a beleza fala mais alto”. A dança é uma arte na qual o homem expressa sua interioridade e amplia a experiência sensível de si mesmo e do mundo que o circunda. O movimento expressivo pode ser entendido como produção do mundo interior e constituindo-se de gestos que representam idéias, pensamentos, sensações e conteúdos inconscientes. (CASTRO apud ARCURI, 2006, p. 89). Além das danças, as atividades de recorte e colagem também se mostrou de interesse ao grupo, por ser recursos estruturantes e pelo valor simbólico dos gestos e dos efeitos que elas provocam: rasgar, cortar, colar, sobrepor. Nas vivências percebeu-se que a concentração, a socialização e as lembranças de infâncias, a juventude, a criação rígida dos pais, vinha à tona durante o momento em que dançavam, associavam as músicas com as emoções evocadas. Os ritmos vivenciados foram músicas infantis, cantigas de rodas, músicas clássicas e forró. A cliente DR tem 77 anos, é independente de cuidados, vive em sua própria casa na companhia de um neto de 30 anos. DR, ao iniciar seu processo terapêutico, demonstrou ser tímida, seus movimentos eram presos e tolhidos, demonstrava 40 insegurança e ansiedade, tinha sentimentos conflitantes no plano interno. Ao chegar aos encontros sempre, quieta reservada em seu espaço, aparentava baixa autoestima e tinha dificuldades de se integrar ao grupo, preferindo desenvolver atividades individuais. Reclamava das suas produções, mas sempre de forma sutil, sem exageros. No decorrer do processo observou-se que houve algumas transformações. Hoje DR demonstra uma expressão corporal mais leve, uma melhora na autoestima, começa sutilmente a compartilhar suas emoções evocadas, consegue ser mais segura nas suas atitudes e realiza as atividades em grupo demonstrando prazer e alegria. A cliente DMC tem 73 anos, é independente de cuidados, mora com seu esposo. Apresentou-se como alguém que carregava uma série de problemas físicos e corporais. As reclamações eram constantes, problemas de saúde com a mesma, problemas familiares e tudo isso gerava uma perturbação para a cliente. A cliente ao dar início ao seu processo pessoal demonstrava ser insegura, estar instável e atordoada e chorava com facilidade. Na continuação do processo percebemos que seu comportamento estava com algumas mudanças sutis, mas significativas para a mesma. DMC chegava a comentar seu bem-estar e a tranquilidade que os momentos lhe proporcionavam durante as sessões e como estava ajudando a lidar com seus conflitos emocionais e problemas do dia-a-dia. A mesma conseguia estabelecer relação agradável com o grupo e conseguia interagir com as ideias. A transformação pessoal de DR e DMC é percebida não só pelos familiares como também por elas próprias. Encontram-se mais seguras, mais tranquilas, com a ansiedade mais controlada, mais firmes em suas decisões, e continuam em busca de sua individuação. O trabalho arteterapêutico propôs atividades ou situações nunca vivenciadas por elas. A clientela teve uma infância restrita a poucas brincadeiras e contato com o própio corpo, estando bastante ligadas ao trabalho na roça, segundo depoimentos das próprias clientes pesquisadas. Elas encontraram na arteterapia momentos que levaram um encontro consigo mesmo de forma sutil, começando a desvelar caminhos ainda desconhecidos e indo em busca de suas transformações, contribuindo, consequentemente, para a melhoria da sua qualidade de vida. 41 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Partindo do princípio de conhecer e perceber aspectos que permeiam o mundo do idoso nos dias atuais, realizou-se uma pesquisa qualitativa em que a arteterapia foi o recurso terapêutico. Com as técnicas e os recursos oferecidos na arteterapia, percebeu-se que a expressão corporal na prática de arteterapia foi a via de acesso da clientela pesquisada, e que foi possível observar-se mudanças significativas no comportamento. Através da arteterapia foi possível encaminhar o indivíduo em direção ao autoconhecimento e assim descobrir novos caminhos. Chegou-se à conclusão de que a expressão corporal aliada à arteterapia é um ótimo recurso na terceira idade levando-o a se reconhecer no espaço onde vive, ao resgate e reintegração à sociedade, melhorando respectivamente a sua qualidade de vida. 42 REFERÊNCIAS ALESSANDRINI, Cristina Dias. Análise microgenética da oficina criativa: projeto de modelagem em argila. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004. (Coleção Arteterapia). ARCURI, Irene Gaeta. Memória corporal: o simbolismo do corpo na trajetória da vida. 2 ed. rev. São Paulo: Vetor, 2006. ________. Arteterapia e o corpo secreto: técnicas expressivas coligadas ao trabalho corporal. São Paulo: Vetor, 2006. AUGUSTINUS, Aurelius. Eu louvo a dança. In: REVISTA VIVA MELHOR. Danças circulares sagradas: Movimentos divinos da criação. São Paulo: Escala Educacional, 1993. BAPTISTA, Ana Luisa. Expressão corporal na prática da arteterapia. Disponível em: www.cebrafapo.com.br/artigo-expressao-corporal.htm. Acesso em: 19/04/2009. CHOPRA, Deepak. Corpo sem idade: Mente sem Fronteiras. Rio de janeiro: Rocco, 1997. ELIEZER, Joya. As técnicas e seus efeitos. In: Revista Viva Seda. Nº 08, set/nov, São Paulo, 2007. FABIETTI, Deolinda M. C. F. Arteterapia envelhecimento. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004. (Coleção Arteterapia). FERRETI, Vera. Arte que cura. In: Revista Viva Seda. nº 08, set/nov, São Paulo, 2007. FERGUSON, Marilyn. A conspiração Aquariana. 4 ed. Record. FRAIMAN, Ana. Coisas da idade. 4 ed. São Paulo: Editora Gente, 2006. MOMMENSOHN, Maria & PETRELLA; Paulo. Reflexões sobre Laban, o mestre do movimento. São Paulo: Summus, 2006. 43 MONTEIRO, Dulcinea da Mata Ribeiro. Metanóia e Meia idade: trevas e luz. São Paulo: Paulus, 2008. (Coleção Psicologia e Espiritualidade). OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. Petrópolis – RJ: Vozes, 1987, p.160. PHILIPPINI, Ângela. O arte terapeuta: um acompanhante especial. Rio de janeiro, Ed. Clinica Pomar, 2000. RODRIGUES, Cláudia & ROCHA, Tariana. 10 formas de ajudar os mais velhos. In: Seleções Reader’s Digest. Jun. 2008. URRUTIGARAY, Maria Cristina. Arteterapia: a transformação pessoal pelas imagens. Rio de Janeiro: WAK, 2003. WEIL, Pierre. O corpo fala: a linguagem da comunicação não-verbal, por Pierre Weil e Roland Tompakow. 62 ed. Petrópolis: Vozes, 2007.