A definição da magnitude da violência e do crime é de fundamental importância para a compreensão desses fenômenos. O homicídio não é o único indicador da criminalidade violenta, mas por ser tido como a espécie taxonômica de maior gravidade entre os crimes, é utilizado mundialmente para demonstrar os níveis de violência de uma determinada região, ou ainda, compará-la com outras regiões. Para a maioria dos autores, o homicídio tende a ser refletido com maior precisão nas estatísticas correspondentes à criminalidade violenta. Afinal, não é fácil subtrair a materialidade dele, o que implica em, pelo menos, ocultar permanentemente um cadáver... O Relatório Mundial Sobre Violência e Saúde da Organização Mundial da Saúde (OMS), editado em 2002, dá conta que no ano 2.000 cerca de 1,6 milhões de pessoas no mundo morreram em decorrência de algum tipo de violência. Esta cifra correspondente a uma taxa geral ajustada de 28,8 por 100.000 habitantes, conforme demonstra a Tabela 1. Tabela 1 - Cifras estimadas de mortes decorrentes de violência no mundo, 2000. Tipo de Violência Quantidade Taxa por 100.000 habitantes 8,8 14,5 Homicídios 520.000 Suicídios 815.000 Mortes por conflitos 310.000 5,2 armados Total 1659.000 28,8 Fonte: Relatório Mundial sobre a Violência e a Saúde, OMS, 2002. Porcentagem do Total 31,3 49,1 18,6 100 Na América Latina e Caribe, segundo dados do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a taxa de homicídios é considerada significativamente alta quando comparada com a de países pertencentes ao resto do mundo. As taxas da América Latina e Caribe são menores apenas que as da região geográfica constituída pela África que bordeja a região do Saara. A taxa média de homicídios na América Latina em 1990 foi de 22,9 por 100 mil habitantes, mais que o dobro da média mundial (aproximadamente 10,7 por 100 mil habitantes) naquele mesmo ano. O caso brasileiro, examinado de forma particularizada e em relação a outros países, mostra números bastante significativos em termos de homicídios. Embora no ano de 1989 (Quadro 1) o Brasil tenha apresentado uma taxa média abaixo daquela identificada para os demais países da América Latina, em 1995, apenas em São Paulo e Rio de Janeiro, esta taxa alcançou uma média superior a 50 homicídios por 100 mil habitantes. Quadro 1 - Taxas brutas de mortalidade por homicídio. Fonte: Como se mede a violência? BID, 1999. É emblemático o fato de que o Brasil, de acordo com o Relatório Global sobre Crime e Justiça, editado em 1999 pela Organização das Nações Unidas, seja o país do mundo com a maior taxa de mortes causadas por armas de fogo (88,39 mortes por 100 mil habitantes em 1997). Além da taxa recorde de mortes causadas por armas de fogo no Brasil, a vitimização da população por outros crimes, além do homicídio, também é significativamente alta em nosso país. De acordo com o último Relatório de Desenvolvimento Humano (2004), cerca de 44% da população do Rio de Janeiro já foi vítima de algum tipo de crime. Tal porcentual coloca o Brasil ao lado de regiões e países como África e Colômbia em termos de vitimização. A tabela 2 apresenta os registros de crimes registrados em todo Brasil no período de 2001 a 2003. Não há variação significativa na taxa por 100 mil habitantes durante o período, o que parece apontar a ausência de medidas efetivas de controle da violência e da criminalidade. As taxas apresentadas, particularmente as relativas aos crimes que resultaram em morte, são consideradas altas quando comparadas com os dados globais disponíveis, no caso, as estimativas do ano 2.000 (OMS) apresentadas na tabela 1. Tabela 2 - Registros de Crimes no Brasil, 2001 a 2003. Totais e taxa por 100.000 habitantes. Delitos Total de Registros 2001 2002 2003 Taxa por 100.000 Habitantes 2001 2002 Crimes Violentos Letais 46.344 47.531 47.154 26,9 27,2 Intencionais Crimes Violentos não Letais 64.079 66.147 59.678 37,2 37,9 Contra Pessoa Crimes Violentos Contra o 712.877 765.398 856.272 413,5 438,3 Patrimônio Fonte: Ministério da Justiça, Secretaria Nacional de Segurança Pública, Brasil, 2005. 2003 26,7 33,7 484,1 Os dados da violência e da criminalidade, no período de 2001 a 2003, confirmam uma tendência de aumento, e sua manutenção em altos níveis, situação já evidenciada no período de 1991 a 2000 em estudo realizado em 2004 pelo Ministério da Saúde através da Universidade de São Paulo (USP), conforme aponta o gráfico 1, ratificando a idéia da ausência de políticas públicas efetivas de contenção da violência e da criminalidade. Gráfico 1 - Mortalidade por homicídios no Brasil. Taxa por 100.000 habitantes. Período 1991-2000. Fonte: Mortalidade por Armas de Fogo no Brasil. Ministério da Saúde, Brasil, 2004