“O papel dos consultores de gestão no processo de adoção do Balanced Scorecard no setor
público”
Vera Borges, [email protected]
Patrícia Gomes, [email protected]
Maria José Fernandes, [email protected]
Área temática: Contabilidade Pública
Metodologia de investigação usada: empirical
Palavras-Chave: Balanced Scorecard, consultores de gestão, contabilidade de gestão, New
Public Management
O papel dos consultores de gestão no processo de adoção do Balanced Scorecard no setor
público
Resumo
Este artigo pretende contribuir para o conhecimento sobre o papel dos consultores de
gestão acerca da implementação do Balanced Scorecard (BSC) no setor público, bem como a
sua perspetiva em relação às motivações para implementar esta ferramenta no setor público e
as principais dificuldades sentidas neste processo. Mais em concreto, com este artigo
pretende-se analisar a perspetiva dos consultores de gestão em relação às seguintes questões:
1) qual o papel dos consultores de gestão na implementação do BSC no setor público; 2) quais
as motivações e benefícios para a adoção do BSC no setor público; e 3) quais as
dificuldades/barreiras sentidas na adoção e continuidade do BSC no setor público. Esta
abordagem permite contribuir para o aumento da eficácia na adoção e continuidade do BSC
nos organismos públicos, assim como conhecer os benefícios do recurso aos consultores de
gestão.
Para a concretização dos objetivos definidos recorreu-se ao método de investigação
qualitativa com base em entrevistas. Os entrevistados são os consultores de gestão com
experiência em consultoria no setor público, nomeadamente na construção e na
implementação do BSC. Foram realizadas entrevistas a 7 consultores de gestão pertencentes a
empresas de consultoria em Portugal. As entrevistas foram efetuadas entre Fevereiro e Março
de 2013. Os resultados obtidos permitiram concluir que o recurso a consultores externos pode
ser útil na adoção do BSC uma vez que estes trazem experiências de outras organizações que
podem ser aproveitadas para introduzir melhorias na organização onde se inserem. Por outro
lado, os consultores de gestão adotam uma posição de isenção o que tende a facilitar as
discussões de propostas e pontos de vista que, internamente, poderiam ficar bloqueados. Os
resultados mostram ainda que existem algumas dificuldades na construção e continuidade do
BSC no setor público. As condições facilitadoras sugeridas pelos consultores de gestão
podem ajudar a ultrapassar estas limitações.
1. Introdução
As mudanças na sociedade e a complexidade crescente que envolve as organizações da
Administração Pública, têm levado ao aumento do conhecimento e expectativas dos cidadãos
em relação aos serviços públicos, uma vez que estes exigem melhores serviços com maior
qualidade, eficiência, disponibilidade e acessibilidade. Como forma de responder a este nível
de exigência, os serviços públicos têm sofrido uma elevada pressão para melhorar a eficiência
na utilização dos recursos públicos e, simultaneamente, não aumentar a despesa pública.
O paradigma da New Public Management (NPM) marca o ponto de partida de um
conjunto de reformas que têm sido introduzidas na Administração Pública (Hood, 1991 e
1995), nomeadamente a adoção de modelos de gestão por objetivos e a quantificação de
resultados. Estas iniciativas têm conduzido à necessidade da adoção de ferramentas de
contabilidade de gestão estratégica, desenvolvidas e utilizadas primeiramente na esfera
privada, como é o caso do BSC.
Para melhor compreender este processo de mudança no contexto do setor público,
vários estudos têm focado o papel dos consultores de gestão como verdadeiros agentes de
mudança (Lapsley and Oldfield, 2001, Lapsley, 2009). Segundo Lapsley (2009) a presença de
atividade de consultoria de gestão no setor público é anterior à chegada da NPM. No entanto,
a NPM deu um novo impulso para as atividades de consultoria de gestão. Num estudo
realizado pelo Comitê de Contas Públicas do Reino Unido (Lapsley, 2009), sobre o uso dos
consultores de gestão nos serviços públicos, foi possível concluir que cerca de 40 % das
organizações recorreram a consultores de gestão sem terem necessidade, sendo este aspeto
justificado pelo facto de o uso de consultores de gestão por agências governamentais é
defendido como uma espécie de escudo de defesa caso o desempenho do projeto seja inferior
do que o pretendido.
Apesar da importância crescente do papel dos consultores de gestão como agentes de
mudança do setor público, tal como se pode verificar pelo aumento das despesas públicas com
estudos e projetos de consultoria (Lapsley e Oldfield, 2001), existe ainda pouca investigação
desenvolvida nesta área. No contexto português este será mesmo o primeiro trabalho a estudar
este fenómeno. Assim, este artigo pretende contribuir para o conhecimento sobre o papel dos
consultores de gestão no processo de implementação do BSC no setor público, a sua
perspetiva em relação às motivações para implementar esta ferramenta no setor público e as
principais dificuldades na sua implementação. Mais em concreto, com este artigo pretende-se:
(1) compreender a importância/contributo dos consultores de gestão na adoção do BSC no
setor público; (2) compreender as principais motivações/razões para a adoção do BSC no
setor público; (3) compreender as dificuldades/barreiras sentidas na adoção e continuidade do
BSC no setor público.
Para a concretização dos objetivos deste artigo recorreu-se ao método de investigação
qualitativa baseada em entrevistas realizadas a consultores de gestão com experiência no setor
público, nomeadamente na construção e na implementação do BSC. Os resultados obtidos
permitiram concluir que o recurso a consultores externos pode ser útil na adoção do BSC uma
vez que estes trazem experiências de outras organizações que podem ser aproveitadas para
introduzir melhorias na organização onde se inserem. Por outro lado, os consultores de gestão
adotam uma posição de isenção o que tende a facilitar as discussões de propostas e pontos de
vista que, internamente, poderiam ficar bloqueados. Os resultados mostram ainda que existem
algumas dificuldades na construção e continuidade do BSC no setor público, onde os
consultores de gestão assumem o papel de agentes de mudança.
O artigo encontra-se estruturado em cinco secções. Inicialmente expõem-se os aspetos
teóricos que justificam a adoção do BSC no setor público e o contributo dos consultores de
gestão neste processo de mudança. De seguida, a terceira secção desenvolve a metodologia de
investigação usada no estudo. Na secção quatro apresentam-se os principais resultados
obtidos. Por fim, apresentam-se as principais conclusões e limitações do estudo, bem como as
sugestões para investigações futuras.
2. Revisão da Literatura
2.1 A New Public Management e a Teoria Institucional
O fenómeno da NPM surge a partir da década de 80 como um dos modelos propostos
para a reforma da Administração Pública, que foi introduzido pelos governos de vários países
da OCDE (Hood, 1995). Este modelo de reforma tem motivado a aplicação em instituições
públicas de conceitos e ferramentas de gestão, desenvolvidas anteriormente e utilizadas na
esfera privada.
A introdução da contabilidade de gestão no setor público é uma consequência das
reformas que se pretendem implementar no modelo de gestão pública. Neste contexto, a
evolução da contabilidade de gestão no setor público constitui uma das áreas de investigação
que mais interesse tem suscitado nos investigadores da contabilidade e gestão pública (ter
Bogt, 2008; van Helden e Northcott, 2010).
Esta mudança no sistema de informação contabilística revela-se fundamental para o
processo de tomada de decisões estratégicas, para o desenvolvimento de uma gestão mais
eficiente e produtiva, para uma maior responsabilização pelos resultados alcançados e para a
introdução do conceito do value for money (Osborne e Gaebler 1993, Lapsley, 1999). Na
perspetiva de Hood (1995), representam alguns dos princípios básicos da NPM a redução das
diferenças entre os modelos de gestão do setor público e do setor privado e um maior foco na
responsabilidade baseada nos resultados, em vez da preocupação com os inputs e os
processos.
Para Gomes (2010), a cultura das organizações do setor público tem mudado
gradualmente desde as reformas da NPM, notando-se uma melhoria das estruturas de
accountability e na forma de prestar o serviço ao cliente. Assim, surge um novo conceito de
responsabilidade e uma linguagem de racionalidade económica, onde os métodos de gestão
privada assumem um papel importante. Nos últimos anos, a Contabilidade Pública em
Portugal sofreu profundas alterações, resultantes da Reforma Administrativa e Financeira do
Estado (RAFE) e da implementação do Plano Oficial de Contabilidade Pública (POCP) e
planos setoriais públicos, tendo em vista uma maior normalização e harmonização
contabilística. No seguimento destes acontecimentos verifica-se um aumento da autonomia
dos serviços públicos e a introdução de mudanças no sistema de informação contabilística, de
forma a aumentar o rigor e a transparência das contas públicas, o que proporcionou uma
melhoria nos índices de eficiência, eficácia e economia. Assim, com o desenvolvimento da
contabilidade de gestão e sua aplicação ao setor público, novos sistemas de controlo de gestão
surgiram no setor público como o Benchmarking, o Activity-Based Costing, a Total Quality
Management e o BSC.
Após o reconhecimento da importância do meio envolvente para as organizações, a
teoria institucional ganhou um papel de extrema importância para a compreensão dos
fenómenos existentes na vida das organizações e explicação das mudanças contabilísticas nas
organizações do setor público (Major e Vieira, 2009 e Gomes, 2010). Os autores Burns e
Scapens (2000) destacam três diferentes vertentes desta teoria que podem ser observados na
literatura sobre a contabilidade de gestão:
a) Nova Economia Institucional (New Institutional Economics – NIE);
b) Velha Economia Institucional (Old Institutional Economics – OIE) e
c) Nova Sociologia Institucional (New Institutional Sociology – NIS)
A OIE concentra-se nas pressões existentes dentro da organização, enquanto que a
NIE se concentra nas pressões externas de natureza económica e a NIS nas pressões externas
de natureza institucional. De acordo com a revisão de literatura efetuada a corrente mais
utilizada no estudo da adoção do BSC nas organizações do setor público é a vertente teórica
da Nova Sociologia Institucional. Segundo Moll, Burns e Major (2006), para a corrente NIS
as estruturas e procedimentos desenvolvidos pelas organizações, incluindo as práticas da
contabilidade e controlo de gestão, são influenciadas por fatores externos e não tanto por
critérios racionais ou técnicos, como a minimização de custos ou a eficiência. Assim, as
organizações ao adotarem os comportamentos apercebidos pela sociedade como sendo certos,
procuram conferir legitimidade às suas ações. Por outras palavras, para ganhar aceitação, as
organizações adotam posições, políticas, programas e procedimentos, que estão
institucionalizados na sociedade e que são entendidos como apropriados, adequados e
racionais (Burns e Scapens, 2000).
De acordo com Rossetto e Rossetto (2005), as organizações respondem de maneira
similar a outras organizações, porque consideram que é uma autodefesa para evitarem
problemas que não conseguiriam combater com ideias próprias. Deste modo, passam a
incrementar métodos idênticos aos observados em outras organizações e a fim de facilitar as
suas relações, de forma a favorecer o seu funcionamento através da utilização de regras
socialmente aceites.
Decorrente do exposto, a corrente que melhor explica o processo da adoção e uso do
BSC é o isomorfismo. Existem dois tipos diferentes de isomorfismo: o isomorfismo
competitivo e o isomorfismo institucional (DiMaggio e Powell, 1983). O isomorfismo
competitivo é aquele que se rege pela concorrência livre do mercado. Por sua vez, o
isomorfismo institucional tem em conta fatores como as relações sociais, culturais e
regulamentares a que uma organização se encontra sujeita. Nas organizações do setor público
o isomorfismo institucional ganha maior importância, uma vez que estas não se regem pelas
leis do mercado e do lucro, mas pelas regras da eficiência, eficácia e economia.
Segundo os autores DiMaggio e Powell (1983), o isomorfismo institucional pode ser
classificado de três formas, designadamente:
a) Isomorfismo coercivo – consiste na pressão exercida por autoridades externas,
grupos políticos e outros grupos de interesse bem como a publicação de legislação que, de
forma impositiva, conduz à decisão de adotar uma determinada prática;
b) Isomorfismo mimético – ocorre quando uma organização, por razões diversas,
adota os procedimentos e práticas que já foram desenvolvidos e experimentados em outras
organizações que pertencem ao seu ambiente específico. Assemelha-se, em certa medida, à
prática do benchmarking;
c) Isomorfismo normativo – consiste na influência da legislação, regulamentação e
recomendações de organizações profissionais que tendem a influenciar comportamentos.
De acordo com Simões e Rodrigues (2011), para a NIS a adoção do BSC é o meio
através do qual as organizações se conformam às exigências e expectativas das instituições
externas e, assim, asseguram a sua sobrevivência. Deste modo, pode acontecer que o BSC
seja adotado e usado por motivos de legitimidade e suporte externo, visando apenas dar uma
imagem externa de racionalidade (Carruthers, 1995). Isto acontece especialmente nas
organizações públicas que necessitam de obter suporte das autoridades superiores estatais para
sobreviverem. Assim, a Teoria Institucional tem assumido um papel preponderante no estudo
das mudanças do sistema de contabilidade pública, uma vez que as pressões miméticas,
coercivas e normativas podem influenciar a predisposição para a adoção de novas ferramentas
de gestão.
2.2 - O Balanced Scorecard e a sua aplicação no setor público
O BSC é uma ferramenta estratégica de medição e gestão do desempenho,
desenvolvida essencialmente no início dos anos 90. A sua filosofia e linguagem foram
apresentadas em 1992 pelo professor Robert Kaplan, da Universidade de Harvard, e David
Norton, consultor da zona de Boston, através da publicação na revista norte-americana
Harvard Business Review (Janeiro-Fevereiro) do artigo “The Balanced Scorecard –
Measeures That Drive Performance”.
Sendo um modelo idealizado para o setor privado, este teve de sofrer ajustamentos
para poder ser utilizado no setor público (Silva, 2009). Uma vez que não é possível tentar
enquadrar o BSC em normas, este deve ser construído e pensado de acordo com as
especificidades e características distintas de cada entidade. Assim, o BSC não deve ser
copiado mas deve de ser adaptado á organização e não o inverso (Kaplan e Norton, 1993;
Lewy e Du Mee, 1998; Ramos, 2002; Pedro, 2004; Gomes, 2006; Caldeira, 2009).
A migração do BSC do setor privado para o setor público ocorre a partir da segunda
metade dos anos 90 (Pinto, 2007). Pode-se identificar três fatores que justificam o uso do
BSC, designadamente (Kaplan e Norton, 1996a; Rodrigues & Sousa, 2002; Gomes, 2006;
Pinto, 2007; Cruz, 2009):
a) a alteração do ambiente operacional das organizações;
b) a crescente importância dos valores intangíveis face aos tangíveis e
c) a utilização exclusiva dos indicadores financeiros para a medição do desempenho.
É neste contexto, e com o objetivo de resolver estas dificuldades, que surge o BSC.
O estudo da utilidade e da implementação do BSC tem crescido significativamente nos
últimos anos, existindo já várias investigações sobre a sua aplicação ao setor público (Ho e
Chan, 2002; Kaplan 2001; Aidemark, 2001; Johnsen 2001; Carmona e Grönlund, 2003; Niven
2003; Askim, 2004; Greatbanks e Tapp, 2007). Em Portugal existem vários estudos sobre a
aplicação do BSC no setor público, designadamente, em Municípios, Institutos Politécnicos,
Universidades, Segurança Social, Polícia e Hospitais.
Desde a sua introdução, o conceito do BSC esteve em constante evolução, devido à
aprendizagem e aos novos conhecimentos adquiridos da sua implementação nas mais diversas
organizações. As quatro perspetivas do modelo inicial desenvolvido por Kaplan e Norton,
como a financeira, os clientes, os processos internos e a aprendizagem/crescimento,
continuam a ser a base do BSC aplicado ao setor público, havendo algumas adaptações
introduzidas. Assim, o BSC não é um conceito fechado e por isso admite adaptações a outras
realidades e necessidades. Como por exemplo, a perspetiva ambiental, a perspetiva social, a
perspetiva do utilizador final, a perspetiva da sustentabilidade. No entanto, o importante é que
represente corretamente a realidade da organização.
O BSC fixa os objetivos para cada perspetiva, mas assume que as pessoas definem as
ações necessárias para os atingir. Os seus objetivos e indicadores permitem clarificar a visão,
de forma a mobilizar e concentrar os esforços de toda a organização na concretização da
estratégia global, possibilitando, deste modo, que os indivíduos nos diversos setores da
organização compreendam como as peças se encaixam e como o seu papel influencia o papel
de outras pessoas (Kaplan e Norton, 1996b).
Ao combinar as quatro perspetivas, o BSC permite compreender muitas inter-relações,
que podem ajudar os gestores na tomada de decisões e na resolução de problemas. Apesar de
o BSC ser caracterizado como um importante sistema de gestão estratégica, a análise custobenefício da sua implementação é um fator a ponderar quando se decide pela sua adoção,
dado que a implementação de qualquer modelo numa organização origina mudanças, pelo que
será normal a existência de algumas restrições e dificuldades na implementação do BSC.
Assim, como qualquer outro sistema, o BSC também tem limitações, pondo em causa, muitas
vezes, a sua implementação com sucesso. Deste modo, vários pesquisadores têm investigado
as dificuldades e os fatores críticos sobre sua implementação e uso no setor público, pelo que
essas limitações devem ser tidas em conta no processo de decisão de implementação do BSC .
De um modo geral, as dificuldades na implementação do BSC no setor público
residem essencialmente, na falta de recursos, na ausência de apoio dos executivos, na
reduzida participação dos cidadãos, na necessidade de um sistema de informação
desenvolvido, na resistência à mudança, na falta de iniciativa política, na falta de tempo para
o seu desenvolvimento e acompanhamento, na ausência de recompensas associadas ao
desempenho dos trabalhadores e na necessidade de formação dos recursos humanos (Gomes
et al., 2007; Quesado, Guzmán e Rodrigues, 2012).
Antes de se tomar a decisão de implementar o BSC os executivos devem ser capazes
de saber a que problema o BSC irá responder (Niven, 2003), sendo crucial que não se comece
a sua implementação sem que se saiba o que se pretende alcançar (Lewy e Du Mee, 1998).
Deste modo, implementar o BSC significa usá-lo no dia a dia, no processo de tomada de
decisão. Assim, o ambiente organizacional deve estar pronto ou aberto a mudanças para
atender a este pré-requisito para o sucesso (Del Carpio e Rocha-Pinto, 2011). Por outro lado,
para proceder à adoção do BSC as organizações necessitam de dispor dos recursos técnicos e
humanos necessários. Neste sentido, no ponto seguinte deste trabalho abordamos o papel dos
consultores de gestão como agentes de mudança das entidades públicas.
2.3 - O papel dos consultores de gestão na adoção do BSC no setor público
Devido às restrições na contratação de novos profissionais para os quadros de pessoal,
impostas pela necessidade de redução da despesa pública e equilíbrio da contas públicas, as
organizações têm optado pela contratação de empresas de consultoria para poderem usufruir
de um consultor de gestão com um alto nível de formação e experiência, sem ter de aumentar
os custos fixos com pessoal (Lapsley, 2009; Lapsley e Oldfield, 2001).
Kaplan e Norton (1996b) defendem que o uso de consultores externos parece ser uma
prática comum entre as organizações que adaptam o BSC. Na visão de Pedro (2004:15) “o
BSC é uma construção interativa feita pelos gestores da própria organização orientados por
consultores externos experientes”. Segundo Lapsley (2009) e Lapsley e Oldfield (2001) a
presença de atividade de consultoria no setor público é anterior à chegada da NPM. No
entanto, a NPM deu um novo impulso para as atividades de consultoria de gestão.
Para melhor compreender este processo de mudança no contexto do setor público,
vários estudos têm focado o papel dos consultores de gestão como verdadeiros agentes de
mudança (Lapsley e Oldfield, 2001, Lapsley, 2009). De acordo com Hirschle e Siqueira
(2006) e Del Carpio e Rocha-Pinto (2007) é possível dizer que os consultores assumem
diferentes papéis, designadamente:
a) árbitros - por serem contratados pela sua independência;
b) psicólogos - no sentido de estarem abertos a escutar as necessidades dos seus
clientes;
c) facilitadores - na medida em que auxiliam a ação dos colaboradores internos e
facilitam a mudança;
d) observadores - porque procuram entender o ambiente organizacional;
e) educadores - na medida em que promovem o know how e os conhecimentos
escassos internamente;
f) psicanalistas - pois estabelecem um contrato com o cliente, semelhante ao
terapêutico, no qual o cliente solicita ajuda e assume o compromisso de cooperar e,
g) eternos aprendizes - no âmbito da experiência em novos projetos.
Por outro lado, no estudo de Del Carpio (2011: 322), que teve como principal objetivo
de pesquisa identificar os fatores críticos de sucesso para a implantação do BSC a partir da
perspetiva de consultores, concluíram que “o mais expressivo papel do consultor é ser um
agente de mudança, e é em função desse papel que os consultores podem ser considerados
como um fator crítico para o sucesso.” Também Crocco e Guttmann (2005) referem um
conjunto de vantagens em contratar um consultor externo à organização para apoiar na
implementação das mudanças, devido a:
a) maior experiência e conhecimento diversificado, porque pode realizar o mesmo tipo
de trabalho em diferentes ramos de atividade e em várias empresas;
b) poder correr riscos diferentes;
c) ter um maior acesso a diferentes pessoas e níveis hierárquicos da empresa, uma vez
que não faz parte do seu quadro funcional e
d) maior imparcialidade e possibilidade de crítica, dado que não está envolvido na
rotina do cliente.
Lapsley (2009) refere que as organizações tendem a recorrer a consultores de gestão
devido à falta de conhecimento dentro da organização e para ultrapassar este obstáculo, estas
recorrem à experiência dos consultores, uma vez que estes têm conhecimento do setor privado
e do público. Outro motivo, está relacionado com a insegurança da gestão, pelo que os
consultores fornecem a confiança e o sentido de organização que os gestores públicos
precisam. O autor referiu, ainda, que o recurso a consultores pode estar relacionado com a
perspetiva de mimetismo, ou seja, a administração acredita que é o procedimento certo,
porque os concorrentes também estão a recorrer a consultores externos.
Segundo Hirschle e Siqueira (2006), aquando da contratação dos serviços de uma
consultora, a experiência do consultor de gestão é um aspeto bastante valorizado, uma vez que
os consultores mais experientes tendem a ter mais conhecimentos, mais maturidade
profissional e uma visão mais ampla de mercado. Ainda na opinião de Rodrigues (2002), o
processo de contratação dos consultores de gestão tem em conta a experiência na área, as
indicações de pessoas internas ou que tenham sido referenciados em trabalhos, artigos, livros
publicados, apresentações pessoais, cursos, apresentações públicas ou por outros meios, as
competências técnicas e o preço. Deste modo, é natural que os gestores procurem
profissionais capacitados, como é o caso dos consultores de gestão, quando decidem adotar o
BSC.
No estudo de Prieto et al. (2006) os consultores destacaram algumas situações que
podem comprometer o sucesso na implementação do BSC, tais como:
a) o BSC ser visto como um único evento e não como um processo contínuo;
b) a falta de divisão de funções e responsabilidades;
c) a falta de compromisso da alta administração;
d) as discussões não claras e pouco frequentes;
e) as quatro perspetivas não balanceadas;
Os autores Kaplan e Norton (2001), referem como possíveis falhas para o sucesso na
implementação do BSC os seguintes aspetos:
a) a falta de compromisso da alta administração;
b) o envolvimento de poucas pessoas;
c) a manutenção do scorecard no topo;
d) os processos de desenvolvimento muito longos,
e) o BSC como projeto de medição única;
f) o tratamento do BSC como projeto da área de sistemas;
g) a contratação de consultores inexperientes e;
h) a implementação do BSC apenas para fins de compensação.
Em suma, para a adoção do BSC é importante que a organização esteja disposta a
colaborar com o trabalho do consultor e esteja aberta às suas sugestões de melhoria. Para isso
é preciso que esta relação de trabalho seja marcada pela confiança mútua e transparência
(Hirschle e Siqueira, 2006). Deste modo, o consultor e a organização devem estar cientes de
que o trabalho só terá sucesso se existir a soma de informações e compromisso de ambas as
partes. Apesar da importância crescente do papel dos consultores de gestão como agentes de
mudança do setor público, este estudo permite contribuir para o conhecimento nesta área dada
a pouca investigação desenvolvida até agora.
3. Metodologia
3.1 Método de investigação qualitativa com base em entrevistas
Com base na revisão de literatura efetuada e nas entrevistas realizadas aos consultores
de gestão de empresas de consultoria que operam em Portugal, pretende-se dar respostas às 3
perguntas investigação formuladas: 1) qual a importância dos consultores de gestão na adoção
do BSC no setor público; 2) quais as motivações e benefícios da adoção do BSC no setor
público; e 3) quais as dificuldades/barreiras sentidas na adoção e continuidade do BSC no
setor público. Pretende-se investigar a perspetiva dos consultores de gestão em relação a estas
questões.
Para se compreender a importância do papel do consultor de gestão e as suas
perspetivas relativamente à adoção do BSC no setor público, escolheu-se o método de
investigação qualitativa com base em entrevista. O recurso à entrevista, nomeadamente a
entrevista semiestruturada, enquanto técnica qualitativa de recolha de dados, deveu-se ao
facto de esta melhor se adaptar aos objetivos do estudo, na medida em que permite obter
informação, sobretudo relativamente às perceções dos consultores sobre a implementação do
BSC no setor público. A entrevista semiestruturada, com perguntas abertas e fechadas,
permitiu uma organização flexível e o desenvolvimento de questões à medida que os
consultores foram respondendo.
Esta escolha foi uma mais-valia para a investigação, pelo facto de os entrevistados
poderem exprimir sobre as suas experiências com elevado grau de profundidade e
autenticidade, dado que ao longo das entrevistas foi surgindo a oportunidade destes
acrescentarem informações relevantes, que não estavam presentes no guião.
Para a seleção da amostra de consultores a entrevistar foi feita uma pesquisa via
internet, a fim de obter informação sobre empresas que implementam o BSC no setor público.
No decorrer da pesquisa foram consultadas 20 empresas de consultoria, das quais 4 não
tinham experiência no setor público, 5 não tinham disponibilidade, no curto-prazo, para
colaborar no estudo e 4 não responderam o nosso pedidos. Deste modo, obtemos resposta de 7
empresas de consultoria com experiência de aplicação do BSC no setor público.
Para Rosa e Arnoldi (2008), na pesquisa qualitativa não é relevante a quantidade de
sujeitos que irão prestar informação, mas, sim, a capacidade que os sujeitos têm para
responder ao que se procura com a pesquisa. Numa primeira fase efetuou-se um contacto com
cada uma destas empresas, via telefone, a fim de obter informação sobre a experiência no
setor público. Pretende-se, desta forma, assegurar que os consultores dispõem de informação
e experiência suficientes, tendo em conta que o grande objetivo é conhecer as suas opiniões
acerca da construção e implementação do BSC no setor público. Posteriormente, enviou-se
um e-mail com o objetivo do estudo, a fim de a empresa analisar a sua disponibilidade em
colaborar. A todos os consultores disponíveis em colaborar no estudo, foi disponibilizado, via
e-mail, o guião da entrevista. A Tabela I apresenta o guião das entrevistas utilizado neste
estudo que está estruturado de acordo com os objetivos formulados para este estudo..
Tabela I: Guião das entrevistas
Objetivos
Questões
Quais os motivos para as empresas de consultoria apostarem no setor
público?
1 – Importância dos
consultores de
gestão na adoção do
BSC no setor
público
2 - Motivações e
benefícios na
adoção do BSC no
setor público
Que tipo de pessoa é um consultor de gestão no setor público?
São os consultores de gestão que se deslocam aos organismos para
incentivar o uso de novas ferramentas de gestão, ou são os organismos que
procuram a resposta às suas necessidades?
Quais são os motivos para as entidades públicas recorrerem aos serviços
dos consultores de gestão?
Quais são os critérios de seleção dos consultores de gestão pelas entidades
públicas?
Qual é o papel dos consultores de gestão na adoção do BSC nas entidades
Públicas?
Quais são os motivos que estão na base da adoção do BSC no setor público?
Quais os benefícios/vantagens da adoção do BSC no setor público?
Quais são os principais problemas que se deparam na implementação do
BSC no setor público e que não se verificam no setor privado?
3- Dificuldades na
adoção e
continuidade do
BSC no Setor
Público
Quais são as razões para a reduzida implementação do BSC no setor
público?
Quais são as condições facilitadoras que o setor público deve seguir para a
adoção do BSC?
Após o abandono do processo tem conhecimento do feedback da
continuidade do processo?
De acordo com a disponibilidade dos consultores, as entrevistas foram realizadas no
ambiente de trabalho dos entrevistados, via telemóvel ou no local exterior ao seu ambiente de
trabalho. Mediante a prévia autorização dos participantes, procedeu-se à realização das
entrevistas, gravadas em áudio, sendo que aos participantes foi assegurada a
confidencialidade e a não divulgação das gravações depois da sua transcrição. Todas as
entrevistas foram realizadas de 25 de Fevereiro a 27 de Março de 2013. Relativamente à
duração, não foi estipulado um limite de tempo, sendo que as entrevistas tiveram uma duração
entre 30 a 60 minutos. No total, a gravação das entrevistas teve uma duração de 4 horas e 10
minutos e a transcrição integral corresponde a 58 páginas.
3.2 Caracterização da Amostra
A amostra incidiu sobre sete empresas de consultoria que prestam serviços de
consultoria ao nível da construção/implementação do BSC no Setor Público.
A amostra é constituída por sete consultores, dos quais apenas um é do sexo feminino.
Todos os consultores da amostra possuem experiência em consultoria de gestão no setor
público há mais de 4 anos, sendo que dois consultores têm experiência no setor público e
privado há 25 anos. Apenas dois consultores possuem mais tempo de experiência no setor
privado comparativamente com o setor público. Da amostra, cinco dos consultores são os
próprios administradores da empresa de consultoria e os outros são consultores sugeridos pela
administração para colaborar no estudo. Quatro consultores são licenciados, um tem o grau de
mestre e dois têm o grau de doutor. Em geral todos os consultores têm formação na área da
gestão e/ou economia. A Tabela II apresenta a da caracterização da amostra, nomeadamente
as habilitações por consultor, assim como o tempo de experiência dedicado a esta atividade e
o distrito de localização da empresa de consultoria.
Tabela II: Caracterização da Amostra
Consultor/
Género
Habilitações
Função
Distrito da
Empresa
Tempo de prestação de serviços:
Empresa
Setor
Público
Setor
Privado
C1
Masc.
Licenciatura em Gestão
Consultor
Lisboa
13 anos
10 anos
13 anos
C2
Masc.
Licenciatura em Economia e
Mestrado em Ciências
Empresariais
Administrador
Lisboa
25 anos
25 anos
25 anos
C3
Masc.
Licenciatura em
Organização e Gestão de
Empresas
Administrador
Lisboa
20 anos
25 anos
25 anos
C4
Masc.
Engenheiro Químico, Mestre
em Matemática e Doutor em
Física
Consultor
independente
Lisboa
5 anos
5 anos
Masc.
Licenciatura em Economia,
Mestrado em Filosofia,
Doutoramento em Gestão e
MBA.
Administrador
Setúbal
8 anos
8 anos
18 anos
C6
Masc.
Licenciatura em Engenharia
Mecânica, Pós-graduação
em Engenharia da Soldadora
e Engenharia da Qualidade e
Especialização em Controlo
de Gestão
Administrador
Leiria
6 anos
12 anos
12 anos
C7
Fem.
Licenciatura em Gestão de
Recursos Humanos
Consultora
Porto
5 anos
4 anos
4 anos
C5
(não
aplicável)
4. Análise e discussão dos resultados
4.1 Importância dos Consultores de gestão na adoção do BSC
Na opinião dos entrevistados, a necessidade de as empresas de consultoria de gestão
apostarem na construção e implementação do BSC no setor público teve por base as
alterações do contexto das organizações públicas, a formação dos dirigentes em BSC e a
pedido das entidades públicas. As empresas de consultoria prestam diversos serviços nos setor
público, entre os quais a articulação do BSC com o Sistema Integrado de Avaliação de
Desempenho na Administração Pública - SIADAP.1
Para a adoção do BSC os organismos têm recorrido aos serviços dos consultores
externos, de forma a dar resposta à falta de recursos internos competentes e para procurarem
alguma legitimidade interna para a adoção do BSC, de forma a validar as decisões e o
cumprimento dos prazos. Neste sentido, para os entrevistados o consultor é visto como um
elemento neutro dentro da organização, o que permite facilitar a aceitação do BSC e atenua
eventuais problemas, uma vez que os consultores transmitem mais confiança, devido à sua
experiência e conhecimento do setor privado e público. Assim, as organizações vêm o
consultor como facilitador e dinamizador, uma vez que este proporciona o debate no sentido
de todos estarem envolvidos nas soluções e conclusões, e permite o cumprimento do
planeamento dos prazos.
Assim, os resultados obtidos mostram que os aspetos que motivam os gestores
públicos a recorrerem a consultores de gestão vão de encontro à literatura revista que
identifica a experiência e o conhecimento dos consultores de gestão como fatores facilitadores
para moderador conflitos e para aumentar a credibilidade (ver por exemplo, Ferreira, 2000;
Rodrigues,2002; Hirschle e Siqueira, 2006; Rosário, 2009; Crocco e Guttmann, 2005;
Lapsley, 2009).
Todavia, os consultores não referiram que o recurso aos seus serviços servia para
colmatar os custos com pessoal, ao contrário do que se verificou no estudo de Lapsley (2009)
que defende que o recurso a consultores de gestão é utilizado para suprimir os custos com o
recurso à contratação de novos profissionais, ou seja, para contornar os cortes da contração de
pessoal interno.
Os resultados mostram ainda que o conhecimento e a contratação dos serviços de BSC
das empresas de consultoria pelas organizações públicas têm por base (1) a experiência dos
1
O SIADAP foi introduzido no sector público Português pela Lei n.º 66-B/2007 de 28 de dezembro, alterada pelas Leis n.ºs 55-A/2010, de
31 de dezembro e 66-B/2012, de 31 de dezembro.
consultores, (2) o custo do serviço, (3) a indicação/referência de outras organizações, (4) a
participação de elementos da organização em ações de formação ou eventos realizados pela
empresa de consultoria, (5) o desenvolvimento de outros serviços dentro da organização e (6)
a iniciação da construção do BSC por um elemento da organização. Algumas consultoras
deslocam-se às organizações no sentido de dar a conhecer as potencialidades do BSC no setor
público.
Para a prestação de serviços no setor público, o consultor de gestão tem de ter o
conhecimento da realidade do setor e das suas especificidades legais e uma forte capacidade
de gerir os conflitos imprevistos e ambiguidades. Para tal é importante que tenha uma postura
de sobriedade, humildade, maturidade e que seja um bom comunicador e dinamizador, a fim
de poder concretizar os prazos estipulados inicialmente. Sobre este aspeto os resultados são
coerentes com o estudo de Lapsley e Oldfield (2001) que conclui que os consultores de gestão
têm as seguintes competências no setor público: objetividade, conhecimento, experiência,
contribuição com novas ideias, honesto, capacidade de gerar empatia, concentração e tem uma
visão comparativa do setor público e privado.
Por fim, para que haja um contributo efetivo do trabalho do consultor de gestão na
mudança da organização, é fundamental o compromisso dos dirigentes em todo o processo.
Por sua vez, é necessário ainda que o consultor transfira aos profissionais da organização o
seu know how e experiências das melhores práticas e procedimentos que estão a ser realizados
em outras organizações a fim de criar as condições necessárias para a continuidade do BSC,
sendo este contributo essencial para facilitar a mudança nas organizações públicas. Só deste
forma os consultores de gestão podem assumir o papel de facilitadores e dinamizadores da
mudança organizacional e da adoção do BSC.
4.2 - Motivações e benefícios na adoção do BSC
Na opinião dos entrevistados as motivações para a adoção do BSC no setor público
estão associadas à necessidade das organizações disporem de informação não financeira para
além da informação financeira, como é o caso da legalidade, legitimidade, transparência e a
igualdade de tratamento. Neste seguimento, o BSC é encarado como um meio de
comunicação da missão, visão e iniciativas a todos os membros da organização. Por sua vez, o
BSC é visto como um reforço à implementação do SIADAP e à construção dos objetivos do
Quadro de Avaliação e Responsabilização (QUAR), ou seja, tem como principal finalidade
dar cumprimento a uma obrigação legal e prestar um suporte externo. A opção pelo BSC
decorre ainda da recomendação efetuada pelas entidades formadoras, como é o caso do
Instituto Nacional de Administração (INA) e do Centro de Estudos de Formação Autárquica
(CEFA). Estas formações dirigidas especialmente aos dirigentes das organizações públicas
constituem, por sua vez, um fator importante na decisão da adoção do BSC.
De acordo com a revisão da literatura e a perspetiva dos consultores, é possível
associar a adoção do BSC nas organizações públicas à Teoria Institucional, designadamente
ao isomorfismo mimético, uma vez que os consultores defendem que muitas das organizações
optam pelo BSC porque outras organizações também o fizeram. Assim esta ferramenta não é
encarada como uma necessidade de gestão mas como um fator “moda”, o que pode
posteriormente por em causa a sua continuidade na organização.
As respostas dos consultores associadas ao isomorfismo mimético são consistentes
com as conclusões de vários autores. Assim, o estudo de Lapsley e Oldfield (2001) refere, que
no setor público tem havido uma tendência para copiar práticas do setor privado sem entender
as razões ou as implicações de fazê-lo. Del Carpio e Rocha-Pinto (2011) referem que quando
uma organização opta por adotar o BSC está a seguir essencialmente uma “moda” o que pode
contribuir para o isomorfismo mimético.
Em suma, a revisão de literatura e os resultados revelam que existem vários benefícios
e motivações para a adoção do BSC no setor público, essencialmente na comunicação da
missão e da visão e na medida dos resultados alcançados. Contudo, o efeito do isomorfismo
mimético e mesmo normativo (por força da obrigatoriedade da aplicação do SIADAP e do
QUAR) parecem ter um peso determinante na decisão de adotar e implementar o BSC o que
confirma a perspetiva dos institucionalistas em relação às razões de legitimidade e de
obtenção de suporte externo associadas a estas mudanças organizacionais.
4.3 - Dificuldades na adoção e continuidade do BSC no setor público
Para além dos benefícios na adoção do BSC há também algumas dificuldades que
complicam a sua adoção e a continuidade no setor público. A perspetiva dos consultores ajuda
a compreender as condições facilitadoras que podem conduzir ao sucesso na implementação
da ferramenta.
Os entrevistados apontaram como principais dificuldades na adoção do BSC a
alternância da gestão de topo e a burocratização do processo de tomada de decisão resultante
do excesso de intervenientes e da falta de autonomia da gestão. Estes constrangimentos
podem levar ao atraso da implementação do BSC nas organizações públicas. Foi possível
verificar uma dependência do BSC em relação ao SIADAP, dado que este tem caracter legal,
o que pode também dificultar a eficácia da sua implementação. À semelhança do que
concluíram Lapsley e Oldfield (2001), os resultados deste estudo mostram também que o
tempo que demora o processo de tomada de decisão dificulta seriamente o trabalho dos
consultores de gestão. Na opinião dos entrevistadores, este fator é um dos principais
causadores da ineficiência na administração Pública.
Outro aspeto que pode dificultar a continuidade do BSC reside em associá-lo a um
evento único, ou seja, pensar que depois de implementado o processo está terminado, o que
pode levar à falta de monitorização e ao abandono do processo porque a organização não vê
vantagem na sua continuidade. Neste sentido, põe-se em causa a essência do conceito do
BSC, sendo este um processo continuo e de constante monitorização. Uma outra dificuldade
reside no facto de algumas organizações comprarem um sistema informático e interpretarem
que ele é por si só o BSC.
Sendo a adoção do BSC na Administração Pública uma realidade recente é natural a
resistência das pessoas à mudança, a que acresce a falta de necessidade e o desconhecimento
da metodologia BSC, assim como a ausência de profissionais capacitados para sustentar esta
ferramenta. Por outro lado, no setor público verifica-se uma falta de cultura orientada para os
resultados o que dificulta a promoção da accountability. Contudo, verifica-se a existência de
poucos estudos na Administração Pública que sirvam de base ao desenvolvimento do modelo.
Estas constatações coincidem com o que se verificou na literatura, pelo que Lapsley e
Oldfield (2001) defendem que os profissionais e a gestão do setor público são mais resistentes
à mudança do que no setor privado.
Para colmatar eventuais problemas decorrentes da adoção e continuidade do BSC os
consultores referiram algumas condições facilitadoras, tais como:
a) A colaboração dos profissionais com o consultor. Só através desta colaboração é
possível a aquisição do know how pelas equipas internas, a fim de possibilitar a
continuidade do BSC após o abandono do consultor.
b) A vontade e o compromisso dos líderes e a manutenção dos gestores de topo. O
sucesso do BSC depende da vontade e compromisso dos líderes e do empenho da
gestão de topo e da equipa que lidera o processo, uma vez que o poder de tomada
de decisão está nas “mãos” dos gestores. Deste modo, os consultores sugerem que
a gestão de topo se mantenha mais 2 ou 3 anos, após a sua implementação e para
evitar a resistência na adoção do BSC.
c) A capacidade de comunicação dos elementos que constituem a equipa. Compete à
equipa que acompanha o desenvolvimento dos trabalhos comunicar e perceber os
receios dos profissionais, assim como garantir que todos os profissionais
obtenham a formação para que estejam envolvidos no processo. Esta comunicação
é essencial para que todos os níveis da hierarquia estejam envolvidos no processo
e compreendam os objetivos a adquirir.
d) A avaliação das políticas públicas. A obrigatoriedade da avaliação das políticas
públicas é essencial para se criarem as condições de adoção e continuidade do
BSC e começar a desenvolver uma cultura com vista à avaliação e melhoria
contínua.
Depois de terminarem o processo de implementação do BSC no terreno, os
consultores procuram tomar conhecimento da sua continuidade fazendo um acompanhamento
direto ou mesmo prestam outros serviços na mesma entidade. No entanto, os consultores estão
cientes de que quando abandonam a entidade pública o BSC deixará de ser monitorizado o
que leva à desistência da sua continuidade. É neste contexto que Lapsley e Oldfield (2001)
referem que os benefícios que os consultores de gestão trazem para o setor público são
transitórios, não produzindo os efeitos esperados.
CONCLUSÃO
O presente estudo demonstrou a importância do contributo dos consultores de gestão,
uma vez que estes são os únicos elementos que têm experiência na perspetiva de
implementação do BSC no setor privado e no setor público.
Na adoção do BSC no setor público os consultores de gestão podem contribuir na
transferência do conhecimento e experiência adquirida em outras organizações públicas e
privadas, o que permite transmitir as melhores práticas/ procedimentos na adoção do BSC e
ao mesmo tempo confiança, sendo este contributo essencial para impulsionar/facilitar a
mudança nas organizações públicas. Assim, os consultores atuam como facilitadores e
dinamizadores. No entanto, é crucial existir um empenho e vontade interna da organização
para que facilite essa mesma mudança e permita a continuidade do BSC na organização.
De acordo com a perspetiva dos consultores, e com a revisão da literatura efetuada, é
possível associar a adoção do BSC nas organizações públicas à Teoria Institucional,
designadamente ao isomorfismo mimético, dado que muitas das organizações optam pelo
BSC porque outras organizações também o fizeram.
A adoção do BSC em organismos públicos é vantajosa, o qual permite facilitar a tarefa
de responder às exigências legais decorrentes da legislação vigente no âmbito da avaliação
dos Organismos, designadamente na articulação do BSC com o SIADAP e o QUAR.
Apesar das vantagens na adoção do BSC foi possível identificar algumas dificuldades
com que os consultores não se deparam com regularidade no setor privado. De uma forma
geral os consultores indicaram que no setor público verifica-se uma menor autonomia da
gestão e alternância da mesma o que proporciona um processo de adoção do BSC mais lento.
Paralelamente a esta situação verifica-se a insuficiência do know how interno o que pode por
em causa a continuidade da ferramenta.
As dificuldades com as quais as organizações se deparam são comuns à grande
maioria. No entanto, não derivam apenas do modelo em si. Muitas vezes o próprio modelo de
organização e a estrutura constituem as principais barreiras no sucesso da implementação do
BSC, através da sua resistência à mudança, da cultura existente e da desconfiança do modelo.
Da análise das respostas dos consultores, tendo em conta a sua experiência e conhecimento,
conclui-se que os consultores estão conscientes dos principais problemas que levam algumas
organizações públicas a não dar continuidade ao BSC, após o apoio/colaboração dos
consultores.
Face às dificuldades na adoção e continuidade do BSC, os consultores de gestão
mencionaram algumas condições facilitadoras para a adoção do BSC que passa pelo
envolvimento, compromisso, motivação e a vontade dos líderes e da gestão de topo e dos
profissionais. Deste modo, é importante o conhecimento da necessidade do BSC e onde se
pretende chegar. Ou seja, saber a que problemas o BSC vem dar resposta. Estes aspetos são
importantes para garantir a monitorização do BSC e para que esta ferramenta possa fazer
parte da rotina da organização. Caso contrário o BSC será encarado como um projeto isolado
e como um fator “moda”, o que põe em causa a continuidade da ferramenta. Assim, se as
organizações públicas tiverem em atenção estas condições facilitadores pode ser o “caminho”
para o sucesso e continuidade do BSC nas organizações públicas.
Como conclusão final, o artigo pretendeu apresentar a perspetiva dos consultores de
gestão em relação ao seu papel no processo de mudança organizacional e de adoção do BSC
nas organizações públicas e às principais motivações e dificuldades no processo de
implementação. Contudo, o estudo apresenta algumas limitações que devem ser mencionadas.
Por um lado, o recurso ao método qualitativo com base em entrevistas não permite generalizar
os resultados numa área onde existe ainda uma elevada falta de investigação. Por outro lado, o
consumo de tempo na elaboração das entrevistas pode condicionar a disponibilidade em
participar no estudo.
Para futuras investigações seria interessante saber os motivos que levam as
organizações públicas a recorrer aos serviços dos consultores de gestão na adoção do BSC, de
acordo com a perspetiva dos gestores das organizações. Esta abordagem permitiria ter a
percepção do ponto de vista de quem procura e usa os serviços de consultoria. Por outro lado,
seria pertinente estudar os casos de insucesso na adoção do BSC no setor público e procurar
compreender os principais motivos.
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