1 CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO JOSÉ DE ITAPERUNA CURSO DE PSICOLOGIA VALDETE PEREIRA SILVA DOS SANTOS PSICODIÁGNÓSTICO INTERVENTIVO INFANTIL NA PERSPECTIVA FENOMENOLÓGICO-EXISTENCIAL Itaperuna Dezembro / 2012 2 VALDETE PEREIRA SILVA DOS SANTOS PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO INFANTIL NA PERSPECTIVA FENOMENOLÓGICO-EXISTENCIAL Artigo apresentado à Banca Examinadora do Curso de Psicologia do Centro Universitário São José de Itaperuna como requisito final para obtenção do título de Psicólogo. Orientador: Profª. Esp. Ieda Boechat. Itaperuna – RJ Dezembro/2012 Tinoco 3 VALDETE PEREIRA SILVA DOS SANTOS PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO INFANTIL NA PERSPECTIVA FENOMENOLÓGICO-EXISTENCIAL Artigo apresentado à Banca Examinadora do Curso de Psicologia do Centro Universitário São José de Itaperuna como requisito final para obtenção do título de Psicólogo. Orientador: Profª. Esp. Ieda Tinoco Boechat Itaperuna, 05 de dezembro de 2012. Banca Examinadora: ____________________________________ Profª. Esp. Ieda Tinoco Boechat (Orientador) UNIFSJ – Itaperuna ____________________________________ Prof. Esp. Paulo Roberto Novaes de Castro (Examinador 1) UNIFSJ – Itaperuna ____________________________________ Prof. Ignael Muniz Rosa (Examinador 2) UNIFSJ – Itaperuna 4 PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO INFANTIL NA PERSPECTIVA FENOMENOLÓGICO-EXISTENCIAL Valdete Pereira Silva dos Santos*1 Ieda Tinoco Boechat Resumo: o presente artigo consiste em uma pesquisa bibliográfica que busca versar sobre o Psicodiagnóstico Interventivo Infantil, entendido segundo os pressupostos filosóficos e teóricos, que norteiam o atendimento psicológico infantil de acordo com a Psicologia Fenomenológico-Existencial. Tem como objetivo principal discorrer sobre o Psicodiagnóstico Interventivo Infantil sob o enfoque fenomenológicoexistencial, descrever as etapas, bem como sua utilização. As intervenções e devolutivas vão possibilitar as mudanças necessárias, ampliação de autoconsciência e a compreensão de mundo do cliente, pois nessa perspectiva, o psicólogo não só avalia como também intervém ao longo do processo diagnóstico. Palavras-chave: Redução fenomenológica. Psicologia. Entrevistas interativas. Intervenções. Intencionalidade. Introdução O psicodiagnóstico infantil na abordagem fenomenológico-existencial apresenta-se como um tema pouco divulgado e com raras produções literárias; justifica-se, então, este trabalho por enfatizar os aspectos e fundamentos da referida abordagem no atendimento infantil, especificamente no diagnóstico, e contribuir para uma prática congruente com seus pressupostos teóricos. Traz, então, como questão problema: pode-se compreender o que aflige psicologicamente uma criança a partir da perspectiva dela própria, sem precisar recorrer a interpretações pré-definidas por explicações teóricas? Objetiva este estudo elucidar as características do psicodiagnóstico interventivo infantil segundo o que postula a Psicologia Fenomenológico-Existencial; ainda, enumerar e tecer apreciações a respeito das sessões que compõem esse primeiro momento do encontro do psicoterapeuta com seu cliente. * Graduanda do Curso de Psicologia do Centro Universitário São José de Itaperuna Psicóloga, Terapeuta de Família, Psicopedagoga, Professora do Curso de Psicologia do UNIFSJ e Professor-orientador do CEJA - Itaperuna 5 Assim, no decorrer desse trabalho serão descritas as sessões sugeridas para o Psicodiagnóstico Interventivo Infantil desde o primeiro contato com o cliente, incluindo as entrevistas iniciais com os pais; a entrevista de anamnese; a hora lúdica; os testes psicológicos e sua utilização nesse enfoque; as devolutivas ou entrevistas interativas, uma vez que os pais se envolvem e tornam-se participantes no processo; e as visitas domiciliar e escolar; por fim, a devolutiva final com os pais e a criança, para avaliar todo o processo. Para a revisão bibliográfica que embasou esta pesquisa, foram consultados autores como Débora Azevedo, Vanessa Maichin, Vânia Bruneli e Ana Maria Feijoo. 1. O Psicodiagnóstico Infantil Consoante Azevedo (2002, p. 96), os terapeutas atendem pessoas de variadas faixas etárias. Quando há uma ruptura na sua existência, as pessoas procuram ajuda terapêutica pelos mais variados motivos, seja por razões profissionais, intrapessoais, emocionais, sentimentais, corporais e outros, ou seja, elas já identificaram uma crise e recorrem ao atendimento psicológico, tendo para si de forma clara ou vaga, alguns significados que vão possibilitar as mudanças da situação problemática pela qual estão passando. Em se tratando da criança, que é levada à terapia por alguém que julga que ela precisa de atendimento, “a primeira questão que se coloca é de quem é a crise. Penso que a busca a essa resposta é o primeiro passo para iniciar um atendimento dito infantil”. (AZEVEDO, 2002, p.95). É preciso todo um cuidado para não se estigmatizar a criança como criançaproblema, colocando-a indevidamente no foco do tratamento. “Essa atitude preconceituosa acaba por bloquear uma análise global e não combina com a conduta fenomenológica que, através da suspensão, nos possibilita chegar ao fenômeno”. (AZEVEDO, 2002, p. 95). Não seria pertinente nesta abordagem colocar a criança como cliente do psicodiagnóstico nessa primeira fase, seria assumir de antemão que acriança precisa de ajuda de ajuda psicoterapêutica, antes mesmo de fazer uma análise da situação, diz Azevedo( 2002). 6 De acordo com Azevedo (2002), o psicodiagnóstico infantil vai responder à questão de quem é a crise, analisando as relações de todos os envolvidos; por isso, propõe que a expressão mais própria para esse momento da intervenção seja “análise situacional”, quando, então, a pergunta mais cabível seria: “[…] quem é o cliente do psicólogo no processo de psicodiagnóstico infantil? A rigor, essa questão deve ser colocada sempre que a pessoa que contrata o serviço psicológico não é a mesma que recebe o atendimento”. (TSU apud AZEVEDO, 2002, p. 97). O psicodiagnóstico infantil acontecerá de modos distintos, pois distintas são as formas de se perceber a pessoa humana. Cada abordagem teórica apresenta uma conformação específica e um modo próprio de fazer acontecer o psicodiagnóstico, em função do que postula o corpo teórico que a embasa. A fim de favorecer a compreensão, serão trazidas brevemente as colaborações da psicanálise e da psicoterapia cognitivo-comportamental. Segundo Arzeno (1995), o psicodiagnóstico tem a finalidade de diagnosticar, pois esta é a principal finalidade de um estudo diagnóstico. “O psicodiagnóstico é um estudo profundo da personalidade, do ponto de vista fundamentalmente clínico”. (Arzeno,1995, p.13). A autora descreve as etapas do psicodiagnóstico em passos. O primeiro passo acontece com o primeiro contato até o encontro pessoal com o profissional; após uma ou duas sessões iniciais com os pais ou com quem tenha solicitado a consulta, tenta-se esclarecer o motivo latente e o motivo manifesto da consulta. Atende-se a criança individualmente com objetivo de elaborar uma compreensão diagnóstica e, ao final do processo, chamam-se os pais para uma entrevista final, enquanto a criança aguardava psicoterapia, que inclusive, poderia ser feita por outro profissional, não necessariamente o que fez o psicodiagnóstico. Cunha (2000), também seguindo a orientação psicanalítica, define psicodiagnóstico, utilizando um modelo psicológico de natureza clínica. Psicodiagnóstico é um processo científico, limitado no tempo que utiliza técnica e testes psicodiagnóstico (input), em nível individual ou não, seja para entender problema a luz de pressupostos teóricos, identificar e avaliar aspectos específicos, seja para classificar o caso e prever seu curso possível, comunicando os resultados (output) na base dos quais são propostos soluções, se for o caso. (CUNHA, 2000, p. 26). 7 De acordo com Fortes (2011, p. 285), no modelo cognitivo-comportamental, inicia-se uma análise do caso procurando investigar quais as crenças centrais mais prementes, estabelecendo um padrão de funcionamento dessas crenças dentro de seu sistema de valores, classificando as emoções que a criança experimenta dessa interpretação e, finalmente, buscando o entendimento sobre a forma pela qual a integração desses fatores mantém os comportamentos disfuncionais em uma análise funcional completa do quadro. O trabalho desenvolvido por meio do olhar fenomenológico-existencial contribui já desde o seu início para o crescimento da criança. Esteja ela se expressando por meio da dramatização, da modelagem, dos jogos ou desenhos, o psicólogo não apenas avalia durante o psicodiagnóstico, mas também intervém ao longo do processo, buscando tornar esse primeiro momento da psicoterapia não apenas avaliativo, mas também terapêutico. Assim, […] a perspectiva fenomenológica vai influenciar a prática psicodiagnóstica e, consequentemente, a forma de leitura de um desenho infantil, em que o saber teórico e institucionalizado do psicólogo perde a primazia, equivalendo-se ao saber pessoal da criança e de seus pais e essa equivalência se efetua num trabalho conjunto e participativo entre profissional, cliente e grupo familiar. (AGUIAR, 2004, p. 20). A característica acima referida é o diferencial do psicodiagnóstico realizado sob a orientação fenomenológico-existencial, qual seja, a intervenção. 2. O Psicodiagnóstico Interventivo Infantil A abordagem fenomenológico-existencial lança mão do método fenomenológico, que segundo Erthal (2010), não é um método terapêutico, mas é usado para compreender uma pessoa como realmente ela é. É um modo de se aproximar do fenômeno – a experiência vivida – e buscar captá-lo como se apresenta, sem uma interpretação baseada em referenciais teóricos, em explicações ou deduções, mas na interpretação hermenêutica que, “no seu sentido mais próprio, 8 significa captar uma interpretação dada por alguém ou uma situação sem alterar-lhe o sentido”. ( FEIJOO, 2003, p.135). Para tanto, diz Feijoo (1997, p. 2), faz-se a redução fenomenológica, suspendendo-se os juízos, os valores e as teorias, para se chegar à essência, ao sentido do discurso do cliente e os significados que estão implicados nele; aí, escuta e fala se articulam, fundando o processo psicoterapêutico. O psicoterapeuta vai se orientar pelos princípios da captação intuitiva – o sentido é captado, porém não é elaborado no nível reflexivo – e da integração significativa – o conteúdo passado pelo cliente se refletirá na relação entre ambos. O Psicodiagnóstico Interventivo Infantil na abordagem fenomenológicoexistencial é um momento de intervenções e avaliações, pois durante todo o processo, o psicólogo não somente avalia como também intervém. Maichin (2011) faz o seguinte esclarecimento: o psicodiagnóstico interventivo de base fenomenológico-existencial trabalha conjuntamente com os pais e as crianças, fazendo com que estes se tornem participativos no processo, pois se baseia nos pressupostos husserlianos da intencionalidade da consciência – “a consciência é sempre consciência de um objeto e este, por sua vez, é sempre objeto para uma consciência. O homem e o objeto se constituem conjuntamente”. (MAICHIN, 2011, p. 198 ). A consciência intencional, diz Forghieri (2004), dirige-se a algo ou alguém conferindo-lhe significado e um sentido orientador. O psicodiagnóstico é entendido como sendo um tempo necessário para se fazer uma compreensão da criança como um ser no mundo, isto é, voltar o olhar a tudo que disser respeito à criança e o que for significativo para essa compreensão. Nesse processo de autoconhecimento, cada caso trará um novo caminho a ser trilhado; por isso, não se pode afirmar nem generalizar quanto tempo será preciso para se concluir um psicodiagnóstico, pois há a especificidade de cada caso, diz Maichin (2011). Na abordagem fenomenológico-existencial, o psicodiagnóstico se baseia no método fenomenológico e na hermenêutica como principal ferramenta de trabalho, pois “[…] a psicoterapia fenomenológica deseja saber como esta criança experimenta a sua situação, de maneira única, propriamente sua e de mais ninguém”. (AGUIAR, 2004, p. 12). 9 O psicodiagnóstico interventivo preocupa-se com a não rotulação do indivíduo. Nesta concepção, o indivíduo está em constante movimento; é um ser criativo que tem liberdade de se criar e portanto, por meio desse trabalho, busca-se possibilitar um maior autoconhecimento da criança após o processo de psicodiagnóstico, ajudando-a a compreender que ela pode usar suas habilidades e sentimento de maneira mais construtiva e se apropriar de si mesma, de sua existência singular. (BRUNELI, 2011, p.54) O profissional da psicologia e os pais buscarão entender melhor a criança para poder ajudá-la. Para melhor compreensão do processo terapêutico, a entrevista devolutiva não ocorrerá apenas ao final do processo mas, sim, no decorrer deste, pois, ao mesmo tempo em que se buscam informações, orientam-se os pais para resolverem eventuais conflitos. O psicólogo que trabalha nessa abordagem, diz Bruneli (2011), atua de forma mais livre sem seguir o rigor de um manual; importa dedicar-se ao fenômeno, ou seja, "[…] a pessoa como ela se apresenta. Será o próprio fenômeno que dará condições para desvendá-lo, possibilitando descrição, compreensão e análise dos fatos trazidos pela criança e por sua família”. (BRUNELI, 2011, p. 56). 3. As sessões do Psicodiagnóstico Interventivo Infantil Várias sessões compõem o Psicodiagnóstico Interventivo Infantil, uma vez que este inclui o primeiro contato com o cliente (que pode ser por telefone), além de entrevistas iniciais com os pais, a entrevista de anamnese, a hora lúdica, a entrevista devolutiva, os testes psicológicos, a visita escolar, a visita domiciliar e as devolutivas finais. Cada sessão é um encontro único, acontece com os pais e/ou a criança e tem objetivos específicos norteadores desses encontros a serem observados. O formato ora apresentado não pretende jamais representar um modelo rígido a ser reproduzido. 10 3.1 Entrevistas iniciais com os pais De acordo com Azevedo (2002, p. 96), nessa primeira fase, os pais são considerados os clientes. As perguntas ou intervenções devem seguir a experiência dos clientes e ser propostas a partir de suas falas, considerando o principal objetivo que é compreender como a crise mencionada insere-se na vida de todos aqueles envolvidos com a criança. Não se tratando de interpretações baseadas em explicações teóricas, mas de clarificações do fenômeno, diz Azevedo (2002), as entrevistas são feitas com base no método fenomenológico, pois têm como objetivo ajudar os pais a compreender melhor a própria experiência, prosseguir num caminho reflexivo e expor seus pensamentos e sentimentos. Ao final da entrevista inicial, deve-se fazer o contrato; neste, o terapeuta deve informar o tempo de cada sessão e como procede em relação a faltas. Juntamente com os pais, deve decidir o melhor dia da semana, o horário e honorários falar sobre questões éticas, como o sigilo profissional. Nessa orientação teórica, “[…] a primeira entrevista não é apenas uma investigação da queixa para identificação dos sintomas manifestos e latentes. Numa perspectiva existencial, não seria pertinente um enfoque deste gênero”. (AZEVEDO, 2002, p. 100). Tal entrevista caracteriza-se por ser um encontro que favorece a compreensão das relações interpessoais e os modos de relação que a família estabelece; favorece, ainda, o entendimento de como a situação trazida é vivida e interpretada pelos pais. 3.2 Entrevista de Anamnese A anamnese pode ser feita de modo bastante informal, num diálogo descontraído e o terapeuta vai tomando nota dos dados que solicita e daquilo que for relevante na fala dos pais. A importância de se fazer a anamnese, diz Monteiro (2009), reside no fato de ser ela um instrumento que permite a compreensão dos processos vitais do cliente e o contexto pessoal, familiar e profissional onde ele vive as suas questões e compartilha suas experiências. A anamnese pode ser estruturada, fechada em 11 questionário, ou aberta, constituindo-se aos poucos, na mediação da sessão ou das sessões. Uma das características principais do homem é a temporalidade, ou seja, a forma como ele vivencia sua história. Sob esta perspectiva. “[…] não é possível separar passado, presente e futuro. Sou hoje a minha história passada e farei meu futuro com o meu hoje, não no sentido de causa e efeito, mas como experiência”. (AZEVEDO, 2002, p.104). É importante que a família vivencie a relação com o filho. A entrevista de anamnese é uma oportunidade para relembrar essa história. 3.3 Hora lúdica Nesse primeiro contato individual com a criança, deve-se explicar o papel do profissional de psicologia, perguntar se ela sabe o motivo de estar ali. Caso não saiba, deve-se fazê-lo, mostrar-lhe a sala e falar sobre os encontros e o contrato. É importante trabalhar as possibilidades no espaço de ludo, diz Feijoo (1997), disponibilizando papel para desenhar, lápis de cor, água, areia, barro, tesoura, quadro negro (ou de pincel), jogos, livros infantis, fantoches, casa de bonecas, carrinhos, entre outros. “O princípio a ser trabalhado é o da liberdade. Não se escolhe pelo cliente; é ele quem vai escolher; desta forma vai exercer a sua possibilidade de escolha”. ( FEIJOO, 1997, p.4). Quando a criança tem muitas possibilidades e tem que fazer uma escolha, é inevitável que ela se sinta angustiada por ter que tomar uma decisão, é nesse momento que o terapeuta atua no sentido de incentivar a criança a fazer uma escolha, pois só assim haverá crescimento. Para Azevedo (2002, p. 109), o brinquedo deve ser apenas um meio de acesso à criança, ele não contém uma simbologia em si mesmo. Durante a hora lúdica, a criança revela seu modo de ser através da brincadeira, pois o lúdico deve ser entendido como ligação com o mundo ou como forma de estar no mundo. Para tanto, o terapeuta deve, durante a terapia, ir falando o que está pensando, pois assim favorecerá a ampliação da consciência da criança. Ao término da sessão, deve-se refletir se a criança que veio ao atendimento é a mesma da qual os pais falavam na entrevista inicial. 12 A hora lúdica é um momento em que terapeuta e cliente aprofundam laços afetivos e o cliente adquire confiança, que é fundamental no processo terapêutico. Nessas sessões, o cliente poderá expressar sentimentos de agressividade, de frustação, descobrir ou melhorar habilidades através dos jogos etc. O terapeuta deve manter um olhar a tudo, sem, no entanto julgar ou fazer qualquer juízo de valor, pois, assim ele captará o jeito de ser da criança. 3.4 Devolutivas Através dessas entrevistas realizadas com os pais pretende-se ajudá-los a ampliar a compreensão a respeito de seu filho e da própria experiência de serem pais, possibilitando reflexões ao exporem suas angústias, pensamentos e sentimentos, o que, a seu turno, favorece a ampliação do autoconhecimento da criança atendida. Na verdade, as entrevistas devolutivas com os pais, no processo descrito, talvez devessem ser denominadas entrevistas interativas, pois o objetivo não é apenas devolver, mas também favorecer a participação ativa dos pais no processo da terapia, a fim de que se reconheçam implicados nesse processo psicoterapêutico, tão quanto se precisam acha implicados nas vivências de seu filho. O psicodiagnóstico é um momento interventivo e, portanto, possibilitador de mudanças tanto para os pais como para a criança, promovendo, o seu autoconhecimento. Por isso, tornam-se imprescindíveis entrevistas com os pais entremeadas à terapia com a criança, o que vai tornando o mais tênue possível a tradicional demarcação entre psicodiagnóstico e tratamento, até porque, em atendimento infantil, a participação dos pais precisa ser mesmo uma constante. 3.5 Testes psicológicos As sessões em que são aplicados os testes psicológicos são realizadas com a criança. Diante da criança, o psicólogo deverá manter o foco na história que a criança está contando, suspender qualquer julgamento ou interpretações apriorísticas, pois a criança dá significado a sua história, não necessitando portanto de manual para sua interpretação. Deve-se respeitar a individualidade de cada criança, pois cada criança é única e está em constante mudança, não se pode 13 portanto, determinar sua existência, através de um manual de interpretação que foi elaborado com base em referenciais teóricos, “pois importa compreender o homem em toda sua historicidade e não como um ser que possui um mundo interno e outro externo”. (MAICHIN, 2011, p. 230). De acordo com Azevedo (2002, p. 113), os testes podem ser vistos como um meio de acesso à criança que pode ser muito útil para conhecê-la, tal qual o brinquedo, o desenho e a história são recursos do universo infantil. Os testes projetivos, padronizados como o HTP ou CAT, são ótimos como estímulos que remetem a situações vividas; o que se deve mudar é o olhar, “[…] já que o teste não determinará o diagnóstico e não será possível analisá-lo por uma simbologia predefinida. O teste não determina o diagnóstico, assim como nada determina o ser a priori”. (AZEVEDO, 2002, p. 113). Como propõe Oaklander (1980), a avaliação se dá num processo contínuo, em que terapeuta e criança experimentam um fluxo contínuo de mudança, ambos influenciados por fatos que mudam constantemente. Nessa relação, o terapeuta aprende sobre a criança como um ser no mundo. O psicólogo busca captar, a compreensão de mundo que o cliente é a partir dele mesmo. Ao propor uma atividade como, por exemplo, ao Pedir o desenho de uma árvore, o inquérito deve seguir o sentido que a criança dá. Se há um nódulo desenhado no tronco da árvore. É melhor não definirmos a priori que aquilo é um trauma, utilizamos a suspensão fenomenológica, voltamos às mesmas coisas e perguntemos à criança o que aquilo significa. A cada resposta que ela der, tiramos mais uma pergunta, segundo o modelo maiêutico para a compreensão do ser. (AZEVEDO, 2002 p. 114). Consoante Maichin (2011), é importante para o psicoterapeuta não cair em mera interpretação; deve-se ouvir o relato dos pais e o da criança que está contando seu modo de ser. Portanto, não precisa utilizar-se de teorias para interpretar a criança. O fenômeno dará as condições para a compreensão desta. Segundo Oaklander (1980, p. 189). “podemos descobrir o que se passa na vida da criança a partir da perspectiva dela própria, sem precisar recorrer a interpretações”. 14 A compreensão fenomenológica valoriza o fenômeno, tal qual ele se mostra em seu contexto cultural, histórico, e social, ou seja, só a criança poderá dizer o que está se passando com ela, pois ela é a autora de sua própria vida. 3.6 Visitas Escolares O psicólogo, deve, com autorização expressa dos pais e anuência da criança, entrar em contato com a escola para agendar uma visita . Segundo Maichin (2006, p. 58), a visita escolar vai ao encontro dos fundamentos do psicodiagnóstico interventivo de base fenomenológico-existencial, pois este se propõe a compreender o cliente em seu mundo. Para Azevedo (2002, p. 118), o objetivo da visita escolar é saber como está a criança na escola, em todos os sentidos, no seu desempenho, na sociabilidade, se está feliz ali etc. Pode-se alcançar esse objetivo por entrevista e por observação. O psicólogo, através das observações feitas no ambiente escolar, alcança uma compreensão mais ampla sobre como essa criança se coloca e se percebe no mundo. Ele deve estar atento para não revelar dados relativos à criança que não sejam pertinentes àquele. 3.7 Visita Domiciliar O psicólogo se propõe a conhecer o ambiente familiar de seu cliente. Lança a proposta aos pais e explica-lhes a razão de ser de tal visita. De acordo com Azevedo (2002 p. 118), é uma visita de aproximadamente cinquenta minutos. Como se estivesse realizando a sessão em outro lugar, o psicólogo atua com o objetivo de conhecer todas as pessoas que moram com a criança e que não vieram às sessões, pois muitas vezes apenas a mãe acompanha a criança. A família costuma mostrar o espaço da criança. Permitindo uma análise para além dela. Isso só acontece quando todos aceitam a proposta que, de modo algum, pode ser um movimento invasivo. Através desse encontro, “é possível entender o modo desta família estar-no-mundo. Aspectos essenciais de uma abordagem existencial podem assim ser analisados, como abertura, liberdade, responsabilidade e espacialidade”. (AZEVEDO, 2002, p.119). 15 De acordo com Forghieri (2004, p. 48 ), espacializar consiste no modo como vivenciamos o espaço em nossa existência. O espacializar, em seu sentido mais profundo e originário, se manifesta em nossa vivência cotidiana pré-reflexiva. No início, os pais poderão estranhar essa visita, mas depois se acostumam e participam, pois entenderão que faz parte da terapia e é mais um elemento a compor a análise situacional do cliente, buscar maior já que “[…] a visita domiciliar tem por objetivo entendimento das relações que se estabelecem na família, como também entrar em contato com o espaço da criança”. (MAICHIN, 2011, p. 209). Cabe salientar que, se os pais não concordarem com a proposta da visita domiciliar, tal decisão deve ser acolhida e, de forma alguma, inviabilizará a realização do Psicodiagnóstico Interventivo Infantil. 3.8 Devolutivas (Agora Finais) Essa entrevista acontece com os pais e a criança juntos. Após percorrer todo o processo, chega o momento “final” do psicodiagnóstico, considerando que, “o término da terapia não precisa necessariamente ter a finalidade implícita do nome. Término é simplesmente chegar a um lugar de parada, um final nesse momento”. (OAKLANDER, 1980, p, 226). A semelhança de um terminal rodoviário pode ser um ponto de partida, ou de chegada, ou de breve estada. O relatório final deve ser elaborado em uma linguagem acessível aos pais e à criança. Azevedo (2002) e Bruneli (2011) falam da elaboração de um livro que conta a história da criança. Trata-se de realizar a devolutiva final com as crianças através de livros infantis, os quais são confeccionados pelo próprio cliente, ou seja, faz-se um devolutiva com a criança e um relatório acompanhado de uma conversa com os pais esclarecendo os pontos principais, a que se chegou pela análise situacional. Bruneli (2011) conta sua experiência com livros para devolutivas confeccionados pela criança, enfatizando a relevância de ela própria descrever as etapas vivenciadas: “a cada página lida, a criança relembrava os encontros que tiveram e, ainda, corrigia, caso percebesse que tenha esquecido algum detalhe. (BRUNELI, 2011, p. 63). 16 De acordo com Azevedo (2002, p.120), “o psicodiagnóstico é entendido nessa abordagem, como um recorte de um momento de vida. Ele não é definitivo e nem um relatório final, não podendo de modo algum ser determinista”. É importante mostrar para a criança e os pais o progresso obtido ao longo das sessões de psicoterapia, para que a criança possa se sentir estimulada. a buscar sempre seus objetivos e a perceber o quanto é capaz. Ela precisa entender que está sendo assim naquele momento de sua vida, o que lhe permite ser diferente em outros momentos. Esse desfecho positivo também é significativo para os pais, para que eles também aprendam a confiar mais em seus filhos. (BRUNELI, 2011, p. 63). É importante preparar a criança para o término. Durante as sessões transcorridas ao longo do psicodiagnóstico, psicoterapeuta, pais e criança criam laços afetivos e agora chega o momento do último encontro. As sessões que antecedem o término podem preparar para este momento; deve-se conversar com a criança sobre todo o processo desde o motivo que a levou a terapia, falar sobre o progresso e o atual momento. Desta forma, a criança vai se apropriando da sua história de vida e percebendo que é capaz de ampliar a compreensão de si. Ao se despedir da criança, o psicoterapeuta deve se colocar à disposição da mesma dizendo que ela pode procurá-lo caso precise. Considerações Finais O psicodiagnóstico infantil pode ser entendido como um processo que se desenvolve a partir de levantamento de dados do cliente, para classificar, identificar e avaliar, levando a posterior tomada de decisão. No Psicodiagnóstico Interventivo Infantil, realizado sob a perspectiva fenomenológica-existencial, as intervenções acerca do modo de ser do cliente, acontecem durante todo o processo, através das devolutivas ou entrevistas interativas, pois esta é sua principal característica. Neste processo, novos significados para vivências de cliente serão trazidos através das clarificações e pontuações que o terapeuta faz. Desta forma, o cliente vai se apropriando de si, tendo favorecido o seu autoconhecimento. O diferencial mais 17 expressivo está, portanto, nas intervenções e devolutivas ao longo de todo o processo terapêutico, o que tornar esse momento significativo para pais, crianças e terapeuta. Durante as sessões, a integração e participação ativa dos pais são valiosas, pois além de trazerem informações acerca do andamento da terapia, também possibilitam a estes compartilharem suas angústias, anseios e preocupações como pais, e de estarem empenhados e com alguma certeza de buscarem resultados positivos, pois as pontuações feitas pelo psicológo permitem aos pais, buscarem novos significados para suas vivências e resignificar suas experiências anteriores. Estas entrevistas são entremeadas à hora lúdica e aos testes psicológicos com a criança, em que o psicólogo vai observando e interagindo pelo processo escuta-efala, e a criança vai revelando seu modo de ser e estar no mundo, ampliando sua consciência de si e do mundo. Na abordagem fenomenológico-existencial, todos os valores, teorias e pressupostos são colocados em suspenso, o terapeuta trabalhará no sentido de criar condições para que os sentimentos sejam aflorados e desta forma a compreensão se dará no contexto em que a revelação do fenômeno se evidencia. A Interpretação hermenêutica permite captar a interpretação de mundo do cliente sem, no entanto, modificar-lhe o sentido. As queixas que os clientes trazem são investigadas e trabalhas a partir da forma como o fenômeno se mostra, tal qual se mostra por si mesmo, sem interpretações pautadas em explicações teóricas previamente elaboradas. Assim, cliente e terapeuta constroem juntos possíveis caminhos de compreensão. 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