Estatuto da Cidade Professora Marli Deon Sette – 2010.2 e-mail [email protected] Web: www.marli.ladesom.com.br Obs: Este Material não substitui a bibliografia recomendada 1. Competências urbanísticas 2. Aspectos constitucionais 3. O Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001) e suas diretrizes gerais 4. Instrumentos de política urbana 5. Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios da Propriedade Urbana 6. Instrumentos Tributários para a Implementação da Política Urbana 7. Desapropriação como instrumento de política urbana 8. Usucapião especial 9. Concessão de uso especial no Estatuto da Cidade 10. Direito de superfície 11. Direito de preempção 12. Outorga onerosa do Direito de construir 13. Transferência do direito de construir 14. Operação urbana consorciada 15. Estudo de impacto de vizinhança 16. Plano Diretor 17. Gestão Democrática da Cidade 18. Improbidade Administrativa Marli Deon Sette - 2010 3 1. Competências urbanísticas Art. 3º do EC. Marli Deon Sette - 2010 4 a) b) c) d) e) A Constituição Federal de 1988 tornou exigência a formação de um sistema de normas de direito urbanístico, que deve ser composto por: normas constitucionais referentes à política urbana; lei federal de desenvolvimento urbano; conjunto de normas sobre a política urbana estabelecidas nas Constituições dos Estados; lei estadual de política urbana e a legislação estadual urbanística; e conjunto de normas municipais referentes à política urbana estabelecidas nas Leis Orgânicas dos Municípios, no Plano Diretor e na legislação municipal urbanística. Marli Deon Sette - 2010 5 Para tanto, na esfera federal, compete a União (competência exclusiva) instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico, transporte urbano, bem como elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social (art. 21, IX e XX da CF). Com base no artigo 24, inciso I, a União, no âmbito da competência concorrente sobre direito urbanístico, tem como atribuição estabelecer as normas gerais de direito urbanístico por meio da lei federal de desenvolvimento urbano. Marli Deon Sette - 2010 6 Essa lei deve conter as diretrizes de desenvolvimento urbano, os objetivos da política urbana nacional, a regulamentação dos artigos 182 e 183 da Constituição e instituir os instrumentos urbanísticos e o sistema de gestão desta política. No entanto, a competência da União limita-se a instituir normas gerais, não podendo imiscuir-se em peculiaridades de modo a violar a autonomia dos estados e municípios. Para disciplinar o adequado parcelamento urbano a união criou o Estatuto da Cidade, Lei 10.257/2001 e a Lei 6.766/1979 (parcelamento do solo urbano). Marli Deon Sette - 2010 7 Uma das competências dos estados que relacionase com a urbanização, é a competência para criar, incorporar fundir e desmembrar municípios, após consulta às populações, por plebiscito realização de estudo de viabilidade (art. 18, § 4º, CF). Ademais, aos Estados compete, concorrentemente com a União, editar lei estadual de política urbana na ausência de lei federal. Os Estados podem editar lei estadual de política urbana, de modo a aplicar essas políticas de forma integrada com seus Municípios. Marli Deon Sette - 2010 8 Compete aos estados instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum (25, § 3º, CF). Também é dado aos Estados instituir um sistema de política urbana metropolitana com organismos e instrumentos próprios, cuja política deve ser destinada em especial para as áreas metropolitanas. Marli Deon Sette - 2010 9 Com relação ao Município, a Constituição atribui a competência privativa para legislar sobre assuntos de interesse local, suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, e promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, parcelamento e da ocupação do solo urbano, de acordo com o artigo 30, incisos I, II, e VIII. Marli Deon Sette - 2010 10 O Município, com base no artigo 182 e no princípio da preponderância do interesse, é o principal ente federativo responsável em promover a política urbana de modo a: 1. ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade; 2. garantir o bem-estar de seus habitantes; e 3. garantir que a propriedade urbana cumpra sua função social, de acordo com os critérios e instrumentos estabelecidos no Plano Diretor, definido constitucionalmente como o instrumento básico da política urbana. Marli Deon Sette - 2010 11 É oportuno frisar que os Estados e os Municípios jamais poderão legislar de modo a oferecer menos proteção à pessoa humana em face do meio ambiente artificial do que a União, na medida em que compete a esta fixar as diretrizes gerais. Marli Deon Sette - 2010 12 2. Aspectos constitucionais (Artigos 182, 183 e 225 da CF/88) Marli Deon Sette - 2010 13 Considerações iniciais Marli Deon Sette - 2010 14 A Constituição Federal, dispõe em seu preâmbulo, que a constituinte visa a instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias. Marli Deon Sette - 2010 15 E, em seus artigos 1º, 2º e 6º trata, entre outros, de princípios como dignidade da pessoa humana e cidadania tendo como objetivos fundamentais construir uma sociedade livre, justa e solidária; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos, além de dispor sobre bens que considera vitais para as pessoas, tais como educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, etc. Referidas disposições têm ligação direta com a necessidade de que os cidadão possam ter um ambiente saudável para viver. Marli Deon Sette - 2010 16 a) b) Assim, é mister que se tenha um ambiente urbano saudável. Nesse sentido, a CF/88, em seus artigos 182 e 183 inovou em relação ao tratamento dado à tutela do ambiente urbano, com vistas a: Garantir a função social da propriedade; e, Garantir o bem estar dos habitantes. Destarte, dispôs que: “Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus Marli Deon Sette - 2010 17 habitantes”. Para Garantir a efetividade do disposto no caput do art. 182, os parágrafos do referido artigo colocam como obrigatória para cidades com mais de 20.000 habitantes a existência de um plano diretor, sendo este o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana a garantir a ordenação da cidade com vistas ao bem-estar social. Marli Deon Sette - 2010 18 A CF/88, também garante ao Poder Público: a) O direito à desapropriação de imóveis urbanos que não se adeqüe às exigências legais; b) O uso de vários instrumentos, mediante Lei específica, aptos a incentivar o adequamento do uso do solo urbano, tais como impostos, parcelamento, edificação compulsória, etc. Marli Deon Sette - 2010 19 Por sua vez, o art. 183/CF prevê o usucapião especial urbano, que se traduz na possibilidade de alguém adquirir o domínio de propriedade de área urbana de até 250 m², quando preenchidos alguns requisitos, quais sejam: a) posse sem oposição; b) utilização para sua moradia ou de sua família; e c) não ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Marli Deon Sette - 2010 20 Para Regulamentar os art. 182 e 183 da CF e estabelecer diretrizes gerais da política urbana, foi criado o Estatuto da Cidade – Lei 10.257/2001. Com tantos cuidados constitucionais, pergunta-se: Sabendo que a tutela constitucional é dada àqueles bens essenciais e fundamentais, porquê a preocupação tão específica com o desenvolvimento urbano? Marli Deon Sette - 2010 21 Antes de respondermos à esta pergunta, vamos conhecer um pouco daquilo que chamamos “meio ambiente”. A CF/88, em seu art. 225, incisos e parágrafos, dedicouse exclusivamente ao tratamento dos bens ambientais, tratando de regras principiológicas, direitos, obrigações, instrumentos de defesa, etc, senão vejamos: “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.” Marli Deon Sette - 2010 22 Mas, o que é meio ambiente? De acordo com a melhor definição dada pela Lei 6.938/81, in verbis: “Art 3º, inciso I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. Deste conceito extrai-se os elementos que compõem o meio ambiente, o que resulta na seguinte classificação: Marli Deon Sette - 2010 23 Classificação do meio ambiente Marli Deon Sette - 2010 24 Classificação do Meio Ambiente a) Natural ou Físico: Constituído pelo solo, a água, o ar atmosférico, a flora, a fauna .Proteção constitucional art. 225 “ caput” forma mediata de proteção, e no e § 1º Incisos I e VII, forma imediata de proteção. Marli Deon Sette - 2010 25 b) Meio Ambiente Cultural: São os bens que traduzem a história de um povo, sua formação, cultura, enfim os elementos que identificam sua cidadania, sua forma de vida. Art. 225, caput,CF/88 – mediata; e, Art. 215 e 216 e incisos da CF/88 – imediata. Definição de patrimônio Cultural. Marli Deon Sette - 2010 26 c) Meio Ambiente do Trabalho: É o lugar onde o ser humano exerce o seu labuto, independente de ser num prédio ou em local aberto, como os garis. Procura-se salvaguardar a saúde, a segurança e o bem-estar do trabalhador no seu ambiente de trabalho. Art.200, VII – (imediata); e Art. 200, VIII e Art. 7º , XXII e XXXIII (mediata). Marli Deon Sette - 2010 27 d) Meio Ambiente Artificial: Constituído pelo espaço urbano. Consubstanciado no conjunto de edificações e dos equipamentos públicos. Art. 225, caput; art. 182 “ caput” e art. 21, XX (tratam da política urbana); e Art. 5⁰, XXIII (função social) entre outros da CF/88 Marli Deon Sette - 2010 28 Logo, é fácil perceber que o espaço urbano é tratado como meio ambiente, mais especificamente como meio ambiente artificial – que é um ambiente construído pelo homem, que, gradativamente ocupa os espaços naturais, transformando-os em espaços urbanos artificiais - e, como tal, possui características peculiares e princípios distintos dos que regem os outros bens privados ou públicos. Marli Deon Sette - 2010 29 Características e princípios ambientais Marli Deon Sette - 2010 30 Entre as principais características podemos citar: a) Transidividualidade/metaindividualidade – art. 225 da CF/88; b) Essencialidade; c) Indivisibilidade; d) Quando ocorrem danos são, na maioria das vezes, irreversíveis ou de difícil reparação; e) A poluição tem efeitos cumulativos e sinergéticos, gerando conseqüências imprevisíveis - ex. gases de efeito estufa provocam alteração de temperatura; f) Os efeitos não respeitam fronteiras; g) Suas vítimas não são individualizáveis. Marli Deon Sette - 2010 31 Por tudo isso, os bens ambientais são chamados de bens difusos, regidos mormente pelos seguintes princípios: a) Princípio do direito humano fundamental ( arts. 5°, 6 ° e 225 caput, da CF e 2° da lei 6938/81): todos têm o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Decorre do primeiro princípio da Declaração de Estocolmo – reafirmado pela RIO 92: “Os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva em harmonia com o meio ambiente”. Marli Deon Sette - 2010 32 b) Princípio da ubiqüidade: “onipresente”. As questões ambientais devem ser examinadas em todas as atividades e políticas. Ex. ordem econômica, urbana, etc. c) Princípio do Poluidor pagador ( PPP): Imputa a obrigação de arcar com o custo da poluição. Ex. art.. 225, § 3º CF/88 e art. 14 da Lei 6938/81. Tem cunho preventivo e/ou repressivo. d)Princípio do usuário pagador: Cobrança pelo uso do recurso natural (ex. Lei 9433/97, art. 1º, I e II – PNRH). Ambos c e d, partem do principio que o uso gratuito causa enriquecimento ilegítimo, onerando a sociedade. Marli Deon Sette - 2010 33 e) Princípio da prevenção: obrigação de evitar o dano ambiental, utilizando medidas mitigadoras e preventivas ( Art. 225, caput e § 1º, IV – EIA/RIMA. => Risco - medidas mitigatórias. f) Princípio da Precaução: Não havendo conhecimento suficiente sobre os danos causado pela atividade, então evita-se exercê- la. g) Desenvolvimento Sustentável: harmonizar a dicotomia “crescimento e meio ambiente” com trade-off eficiente. Marli Deon Sette - 2010 34 h) Princípio democrático: Assegura aos cidadãos a possibilidade de participar das políticas públicas ambientais nas mais diversas esferas: legislativa ex. plebiscito, referendo(art. 14 da CF/88); administrativa - ex. direito ao estudo prévio de impacto ambiental (art. 5°, XXXIII, XXXIV e art. 225, IV, CF/88) e processual - ex. ação popular, ação civil pública, mandado de segurança coletivo. (art. 129, III, art. 5°, LXX, LXXI, LXXIII; art. 37, § 4° e art. 103 da CF/88). No caso do EC, os artigos 43 a 45 tratam da gestão democrática das cidades, com vistas ao exercício da democracia, cidadania e dignidade da pessoa humana. Marli Deon Sette - 2010 35 i) Princípio da Participação: informação ambiental (art. 225, § 1 inc. IV VI) e educação ambiental (Art. 225,§1ª, VI ). j) Princípio do equilíbrio e do limite: devese ter em conta o resultado global, orientado por parâmetros ditados pela administracao pública. (art. 225, § 1°, V, CF/88). Marli Deon Sette - 2010 36 Após conhecermos a classificação, as características e os princípios norteadores dos bens ambientais, voltamos à pergunta: porquê a preocupação tão específica com o desenvolvimento urbano? Porque o desenvolvimento urbano ocorre nas áreas que chamamos de cidade, as quais se inserem como tuteladas pelo direito ambiental, bem de uso comum do povo, mas especificamente meio ambiente artificial. Mas, o que é cidade? Marli Deon Sette - 2010 37 Para Benevolo (1997), a cidade se forma quando as indústrias e os serviços já não são executados pelas pessoas que cultivam a terra, mas por outras que não têm esta obrigação, e que são mantidas pelas primeiras com o excedente do produto total. A cidade, desde a pré-história, é formada fundamentalmente pelos produtos e serviços que são oferecidos em determinado território por meio do trabalho de pessoas humanas mantidas por outras. Marli Deon Sette - 2010 38 Qual é o motivo que ensejou ao ordenamento urbano tratamento especial? A imensa e rápida urbanização pelas quais passou a sociedade brasileira foi uma das principais questões sociais experimentadas no país no século XX. Em 1960, a população urbana representava 44,7% da população total – contra 55,3% de população rural. Dez anos depois essa relação se invertera, com números quase idênticos: 55,9% de população urbana e 44,1% de população rural. No ano 2000, 81,2% da população brasileira vivia em cidades (Fiorillo, 2006). Marli Deon Sette - 2010 39 A urbanização vertiginosa, coincidindo com o fim de um período de acelerada expansão da economia brasileira, introduziu no território das cidades um novo e dramático significado: mais do que evocar progresso ou desenvolvimento, elas passam a retratar – e reproduzir – de forma paradigmática as injustiças e desigualdades da sociedade. Noutros países do mundo, as cidades se desenvolvem com a mesma velocidade ou ainda mais depressa, levando sempre a paralelos muito diferentes, com desigualdades Marli Deon Sette - 2010 40 enormes. As injustiças e desigualdades se apresentam no território das cidades sob várias morfologias, todas elas bastante conhecidas: a) nas imensas diferenças entre as áreas centrais e as periféricas das regiões metropolitanas; b) na ocupação precária do mangue em contraposição à alta qualidade dos bairros da orla nas cidades de estuário; c) na eterna linha divisória entre o morro e o asfalto; Marli Deon Sette - 2010 41 d) Nos edifícios projetados, planos urbanísticos, serviços públicos, ruas, parques, etc, de um lado e estabelecimentos irregulares, sem projetos, sem título, sem serviços básicos pré- instalados, etc. do outro lado; e e) Em muitas outras variantes dessa cisão, presentes em cidades de diferentes tamanhos, diferentes perfis econômicos e regiões diversas. Marli Deon Sette - 2010 42 Hodiernamente, os estabelecimentos irregulares (marginais), crescem com muito maior velocidade do que os regulares, e abriga em muitos países a maior parte da população. Essa também é a realidade do Brasil, marcado pela necessidade de acomodar 176.000.000 de seres humanos, sendo que em algumas capitais do país existe mais de 1 milhão de pessoas (Fiorillo, 2006, p. 21 e 23). Marli Deon Sette - 2010 43 O crescimento da urbanização e a concentração das populações em grandes centros urbanos, leva a conflitos com o meio ambiente, principalmente ao se considerar as condições de vida das gerações futuras. Um dos fatores determinantes para o crescimento de conflitos é o fato de que o crescimento populacional ocorre de forma geométrica. Marli Deon Sette - 2010 44 Nessas concentrações urbanas, algumas necessidades são iminentes e essenciais, tais como água, saneamento básico, transporte, etc., razão porque se faz necessária a implantação de políticas de desenvolvimento urbano visando o pleno desenvolvimento das funções sociais e econômicas das cidades e a garantia do bem-estar de seus habitantes. Marli Deon Sette - 2010 45 Isso obriga o Brasil a considerar uma realidade no campo jurídico que tenha origem em regramento constitucional com vistas a superar as discriminações sociais, de forma a garantir a brasileiros e estrangeiros que aqui residem uma cidade que corresponda aos benéficos de um meio ambiente artificial cientificamente concebido. Marli Deon Sette - 2010 46 Não é mais aceitável a idéia originária do direito público e privado em que as cidades programadas são reservadas para a minoria e, ao mesmo tempo imposta como modelo inalcançável à maioria. Com o regramento constitucional, a cidade e suas duas realidades – estabelecimentos regulares e irregulares – passa a ter natureza jurídica ambiental, deixando de ser observada sob o enfoque de bem privado ou público e passa a ser estruturada a partir da disciplina jurídica do bem ambiental, com todos os benefícios e encargos a ele inerentes. Marli Deon Sette - 2010 47 Portanto, a partir de 1988, a cidade passa a obedecer ao comando constitucional no contexto dos parâmetros jurídicos adaptado ao final do século XX e início do XXI, obedecendo à denominada ordem urbanística. As bases constitucionais são ditadas de forma mediata pelo art. 225 da CF/88 e, De forma imediata pelos art. 182 e 183 da CF/88, retromencionados. Marli Deon Sette - 2010 48 a) b) c) O regramento atual vê as cidades não só em função de seu território, mas também em face de sua: estrutura econômica (produtos e serviços que criam destinados a satisfazer as necessidades de consumo interno e externo); relações de consumo; e relações sociais que fundamentam juridicamente o piso vital mínimo disposto no art. 6o da CF/88 – in verbis, “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”, destacando-se as relações laborais. Marli Deon Sette - 2010 49 É nesse contexto jurídico constitucional do que significa uma cidade, com o conceito de ordem urbanística, associado à ordem econômica e social, que nasce o Estatuto da Cidade – Lei 10.257/2001. Com ele inverte-se a lógica tradicional de “adaptar o homem ao território e a cidade” passando a “condicionar o território e a cidade à dignidade da pessoa humana”. Marli Deon Sette - 2010 50 3. O Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001) e suas diretrizes gerais o o Artigos 1 e 2 do EC Marli Deon Sette - 2010 51 O Estatuto da Cidade, Lei 10.257, de 10 de julho de 2001, é uma lei inovadora que abre possibilidades para o desenvolvimento de uma política urbana com a aplicação de instrumentos de reforma urbana voltados a promover a inclusão social e territorial nas cidades brasileiras, considerando os aspectos urbanos, sociais e políticos de nossas cidades. Marli Deon Sette - 2010 52 É uma Lei madura, resultado de experiências e de participação popular em diversas cidades brasileiras. As normas ditadas pelo Estatuto da Cidade são de ordem pública, de maneira que o magistrado deve apreciar de ofício qualquer questão relativa às relações jurídicas disciplinadas pela Lei. Também não ocorre a preclusão, e as questões que dela surgem podem ser decididas a qualquer tempo. Marli Deon Sette - 2010 53 O Estatuto da Cidade é a primeira lei federal destinada especificamente à regulamentação do Capítulo da Política Urbana da Constituição. Nele, o plano diretor é tratado como tema central, ao contrário das leis anteriores, em que ele era assunto periférico, regulado apenas na sua interface com outros temas. Seguindo o modelo já adotado pela Constituição no § 4° do art. 182, o Estatuto condiciona a aplicação de qualquer instrumento urbanístico à existência prévia do plano diretor e de lei municipal específica. Marli Deon Sette - 2010 54 O EC dispõe que a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto: a) à qualidade de vida; b) à justiça social; e c) ao desenvolvimento das atividades econômicas. Marli Deon Sette - 2010 55 Para tanto, o Estatuto define quais são as ferramentas que o Poder Público, especialmente o Município, deve utilizar para enfrentar os problemas de desigualdade social e territorial nas cidades, traçando diretrizes e instrumentos a serem norteadores e instrumentalizadores da política urbana. Marli Deon Sette - 2010 56 Cabe, principalmente ao Município a aplicação das diretrizes gerais, adequando-as às realidades locais – Aplica-se a regra da prevalência do interesse e as particularidades de um determinada região. No entanto, Para a adequação à realidade local é necessário a instituição de uma ordem legal própria e específica, tendo como instrumentos fundamentais as Lei Orgânica do Município e o Plano Diretor. Marli Deon Sette - 2010 57 Diretrizes fixadas pelo Estatuto da Cidade Art. 2º do EC Marli Deon Sette - 2010 58 As diretrizes gerais são regras gerais do direito urbanístico – linhas mestras direcionadas a atuação da União, Estados e Municípios, sendo que, nos termos do art. 21, XX CF/88, é competência exclusiva da União instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos. Marli Deon Sette - 2010 59 Entre as diretrizes gerais previstas no artigo 2° do Estatuto da Cidade, cabe destacar as seguintes: 1. a) • As que garantem o exercício da democracia direta: A gestão orçamentária participativa – exige que o poder público garanta a participação dos cidadão na gestão pública, para poder legitimar-se como fiscalizador (§ 3 º, art. 4º do EC, fundada na CF/88, arts. 4º, III, f e art. 74, § 2º do EC). § 3º do artigo 4º do EC dispõe que: “ Os instrumentos previstos neste artigo, que demandam dispêndio de recursos por parte do Poder Público municipal, devem ser objeto de controle social, com a garantia da participação de comunidades, movimentos e entidades da sociedade civil." Marli Deon Sette - 2010 60 b) Gestão democrática da cidade – dispõe sobre a exigência da realização de audiências e debates públicos de forma a garantir a participação popular como requisito obrigatório para a aprovação de peças orçamentárias (art. 43 a 45 do EC). Art. 49 do EC “No âmbito municipal, a gestão orçamentária participativa de que trata a alínea ‘f’ do inciso III do art. 4º desta lei incluirá a realização de debates, audiências e consultas públicas sobre as propostas do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e do orçamento anual, como condição obrigatória para sua aprovação pela Câmara Municipal". Marli Deon Sette - 2010 61 2. As que garantem a todos os cidadãos o direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito para as presentes e futuras gerações daquilo que chamamos de Piso Vital Mínimo (art. 6 da CF/88), ou seja: a) à terra urbana: fundamental, na medida que é a partir do território que todos os demais direitos são exercidos; b) à moradia: Garantia decorrente da CF/88, é o local destinado a garantir direitos fundamentais como direito à casa, à vida privada, a organização da família, ou seja, espaço destinado ao conforto e a intimidade. Marli Deon Sette - 2010 62 c) ao saneamento ambiental: direito ao uso de água, a esgoto sanitário, ao ar atmosférico e sua circulação (dir. antena) e ao descarte de resíduos; d) à infra-estrutura urbana: garantia de instalações que garantam o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidades como rede de esgoto, energia elétrica, telefone, televisão, calçadas, praças, aeroportos, avenidas, ruas, integração com o Código Nacional de Trânsito (Lei 9.503/97); Marli Deon Sette - 2010 63 e) ao transporte: meios necessários para o exercício da livre circulação – pessoas, veículos, animais, etc. - e operação de carga e descarga. O trânsito, como direito de todos passou a ter tratamento de direito difuso, com a prerrogativa da responsabilidade objetiva dos órgão responsáveis. Qualquer obra que possa perturbar o trânsito deve ser precedida de permissão prévia da entidade de trânsito (é quase um EIA); Marli Deon Sette - 2010 64 f) aos serviços públicos: garantia de serviços eficientes, adequados e seguros de abastecimento de água, gás canalizado, energia, etc., tudo em conformidade com o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), colocando o Estado como responsável na cadeia de consumo; g) ao trabalho: planejamento de atividades econômicas no município de forma a propiciar o acesso a todos. h) ao lazer: salas de cinema, praças, estádios, piscinas recreativas – meio ambiente cultural. Marli Deon Sette - 2010 65 i) A segurança: O art. 144 da CF/88 dispõe que a segurança pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, sendo exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio e, o § 8º, do referido artigo da aos municípios a faculdade de instituir guardas municipais destinados a proteção de seus bens, serviços e instalações. Marli Deon Sette - 2010 66 3. As que dispõem sobre ordenação e a) b) c) d) e) controle do uso do solo, de forma a evitar: a utilização inadequada dos imóveis urbanos; o parcelamento do solo, a edificação ou os usos excessivos ou inadequados em relação à infra-estrutura urbana; a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização; a deterioração das áreas urbanizadas; Marli Deon Sette - 2010 67 4. As que dispõem sobre a Justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização, bem como sobre a recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha resultado a valorização de imóveis urbanos. 5. As que tratam da regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de: urbanização, uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da população; e as normas ambientais; a) b) c) Marli Deon Sette - 2010 68 O Poder Público somente estará respeitando o Estatuto da Cidade, quando os instrumentos nele previstos forem aplicados com a finalidade de atender às diretrizes gerais previstas na lei. Marli Deon Sette - 2010 69 4. Instrumentos de política urbana Art. 4o do EC Marli Deon Sette - 2010 70 O art. 182, § 4º da CF/88 da ao Poder Público Municipal a faculdade de utilizar-se de determinados instrumentos para fazer com que o proprietário do imóvel urbano promova o seu adequado aproveitamento, assim estabelecendo: “...§ 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: Marli Deon Sette - 2010 71 I - parcelamento ou edificação compulsórios; II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais”. Marli Deon Sette - 2010 72 Os instrumentos adotados pelo texto constitucional têm por característica obrigar o proprietário a um comportamento positivo de promover uma destinação concreta para a sua propriedade. São mecanismos que têm por meta impedir e inibir o processo de especulação imobiliária nas cidades, conferindo aos imóveis urbanos ociosos uma destinação voltada a beneficiar a coletividade. Por meio deles, o poder público pode interferir na propriedade toda vez que o proprietário não lhe garantir a função social. Marli Deon Sette - 2010 73 a) b) c) Para que o proprietário fique sujeito a aplicação dos referidos instrumentos, é necessário que estejam preenchidos os seguintes requisitos (Saulo, 2006): Que a propriedade urbana que não atende a função social seja integrante de área definida no Plano Diretor como sujeita à aplicação dos instrumentos; Que seja instituído o plano urbanístico local (lei municipal específica) dispondo sobre as exigências concretas para a propriedade urbana atender sua função social, bem como sobre o procedimento e o prazo para o cumprimento das exigências; Que haja lei federal (lei federal de desenvolvimento urbano) dispondo sobre a regulamentação dos referidos instrumentos . Marli Deon Sette - 2010 74 O Estatuto da Cidade, instituído como a lei federal prevista no parágrafo 4º do artigo 182, estabelece as normas que devem ser observadas para aplicar os instrumentos quando a propriedade não cumprir a sua função social. Assim, em seu art. 4º relaciona um rol de instrumentos destinados a assegurar a efetividade das diretrizes retromencionadas e estabelece normas que devem ser observadas para o uso dos referidos instrumentos, os quais separamos didaticamente da seguinte forma: Marli Deon Sette - 2010 75 1. a) b) c) d) e) f) Instrumentos destinados a garantir que a propriedade urbana atenda a sua função social são: o Plano Diretor; o parcelamento e edificação compulsória de áreas e imóveis urbanos; imposto sobre a propriedade urbana (IPTU) progressivo no tempo; a desapropriação para fins de reforma urbana; o direito de preempção; a outorga onerosa do direito de construir (solo criado). Marli Deon Sette - 2010 76 2. Os Instrumentos de regularização fundiária são: a) o usucapião urbano; b) a concessão de direito real de uso; c) as zonas especiais de interesse social (é um produto da luta dos assentamentos irregulares pela não remoção, pela melhoria das condições urbanísticas e pela regularização fundiária. A concepção básica do instrumento das ZEIS é incluir, no zoneamento da cidade, uma categoria que permita, mediante um plano específico de urbanização, o estabelecimento de um padrão urbanístico próprio para o assentamento). Marli Deon Sette - 2010 77 3. E, os Instrumentos de gestão democrática da cidade são: a) conselhos de política urbana; b) conferências da cidade; c) orçamento participativo; d) audiências públicas; e) iniciativa popular de projetos de lei; e f) Referendo popular e plebiscito (art. 1 da CF/88). Marli Deon Sette - 2010 78 Instrumentos que visam a garantir a integridade dos atributos ambientais: a) Planejamento: a.1. Plano diretor, a.2. parcelamento e uso do solo, a.3. o zoneamento ambiental, a.4. tombamento de imóveis ou de mobiliário urbano, a.5. Instituição de Unidades de Conservação. 4. b) c) Estudo Prévio de Impacto Ambiental – EIA e Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança - EIV. Passaremos agora aMarli analisar alguns destes instrumentos. Deon Sette - 2010 79 5. Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios da Propriedade Urbana arts. 5º e 6º do EC Marli Deon Sette - 2010 80 Parcelamento ou Edificação Compulsórios são instrumentos urbanísticos a serem utilizados pelo Poder Público municipal, como forma de obrigar os proprietários de imóveis urbanos a utilizar socialmente esses imóveis, de acordo com o disciplinado no Plano Diretor do Município. É instrumento da utilização compulsória de áreas que não cumprem a função social. Por meio dele o Poder Público municipal condiciona o proprietário a um comportamento positivo, de utilizar, de construir, de parcelar, de eliminar a subutilização, de forma a assegurar o uso social da propriedade. Marli Deon Sette - 2010 81 Esta obrigação pode ser: a) o parcelamento de uma área urbana subutilizada (quando o aproveitamento é inferior ao mínimo definido no Plano Diretor para a propriedade urbana atender a sua função social) ou não utilizada, com a qual o proprietário está se beneficiando do processo de especulação imobiliária; ou a) a edificação de uma área urbana não edificada, visando o uso máximo do potencial construtivo e de uso da propriedade, provocando uma destinação social que beneficie a coletividade. Marli Deon Sette - 2010 82 O Estatuto da Cidade, atendendo ao disposto no § 4º do artigo 182 da CF/88, exige Lei específica - plano urbanístico – para determinar o parcelamento para área incluída no Plano Diretor, atribuindo à lei municipal a competência para definir as condições para o uso do instrumento, in verbis: “Art. 5° - Lei municipal específica para área incluída no Plano Diretor poderá determinar o parcelamento, a edificação ou a utilização compulsórios do solo urbano não edificado ou não utilizado, devendo fixar as condições e os prazos para implementação da referida obrigação”. Marli Deon Sette - 2010 83 a) b) c) d) Referida lei deve fixar: a delimitação das áreas urbanas onde poderá ser aplicado o parcelamento, edificação ou utilização compulsória, considerando a existência de infraestrutura e de demanda para utilização na forma do art. 5° e 6°; as exigências concretas para a propriedade urbana atender sua função social, estabelecendo um critério geral para identificar se uma propriedade urbana se enquadra na categoria de propriedade subutilizada, não utilizada, não edificada. o procedimento; e o prazo para o cumprimento da obrigação de parcelar edificar ou utilizar. Marli Deon Sette - 2010 84 Requisitos para a Aplicação do Instrumento: Para o Poder Público municipal aplicar o parcelamento, edificação ou utilização compulsória, é necessário que o plano urbanístico local tenha especificado: a) quais formas de uso, de ocupação; e b) quais atividades a área urbana delimitada no Plano Diretor deve conter para atender os objetivos da política urbana, do pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade, de garantir condições dignas para seus habitantes e do cumprimento da função social da propriedade. Ex. em uma determinada área em que tem um galpão fechado, bastaria o Poder Público determinar que fosse utilizado como centro comunitário. Marli Deon Sette - 2010 85 Prazos - A lei municipal específica - plano urbanístico local - deve fixar os prazos para o cumprimento da obrigação, sendo: a) Nunca inferior a 1 ano para protocolo do projeto no órgão competente; b) Nunca inferir a 2 anos, a partir da aprovação do projeto, para iniciar as obras do empreendimento. c) Quando se tratar de subutilizaçao, a Lei municipal fixa o prazo livremente. Marli Deon Sette - 2010 86 Esses prazos devem ser contados a partir da data da notificação feita pelo poder público ao proprietário, a qual deve ser averbada no Registro de Imóveis para garantir efeito erga omnes. Em caso de transferência do imóvel por ato inter vivos ou causa mortis, posterior à data da notificação, transferem-se as obrigações de parcelamento, edificação ou utilização, sem interrupção de quaisquer prazos. Depois de 3 tentativas frustradas de notificação, é possível citar por edital. No caso de descumprimento destes prazos o Município poderá aplicar o IPTU progressivo no tempo. Marli Deon Sette - 2010 87 As obrigações decorrentes do art. 5o do EC, podem ser realizadas por meio de consórcio imobiliário, que é uma forma de viabilização de planos de urbanização ou edificação por meio da qual o proprietário transfere ao Poder Público municipal seu imóvel e, após a realização das obras, recebe, como pagamento, unidades imobiliárias devidamente urbanizadas ou edificadas, num valor correspondente ao valor do imóvel antes da execução da obra. Objetivo: forma de viabilização financeira do aproveitamento do imóvel. Esta faculdade do Poder Público poderá ser exercida mediante requerimento da parte interessada. Marli Deon Sette - 2010 88 6. Instrumentos Tributários para a Implementação da Política Urbana art. 7º do EC Marli Deon Sette - 2010 89 O art. 7º, institui o tributo ambiental, criado com a finalidade de ser destinado a viabilização real das funções sociais das cidades. “Art. 7o Em caso de descumprimento das condições e dos prazos previstos na forma do caput do art. 5o desta Lei, ou não sendo cumpridas as etapas previstas no § 5o do art. 5o desta Lei, o Município procederá à aplicação do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no tempo, mediante a majoração da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos”. Marli Deon Sette - 2010 90 O IPTU progressivo no tempo poderá ser aplicado como medida coercitiva à observância das regras urbanísticas, bastando para sua incidência, por exemplo, o mau uso do imóvel. Não se entenda aqui coerção como sanção. Na verdade o IPTU progressivo, como tributo ambiental que é, tem objetivo claro no sentido de incentivar à mudança de comportamento dos agentes econômicos, mas a estes cabe a decisão de pagar o tributo ou adaptarse às regras urbanísticas. Se fosse sanção não daria essa flexibilidade, e, sim, viria em forma de proibição sujeita à multa ou outra pena. Marli Deon Sette - 2010 91 A majoração da alíquota poderá ser aplicada pelo prazo de cinco anos consecutivos. O Valor da alíquota a ser aplicada a cada ano será fixado em Lei Municipal específica, não podendo exceder a duas vezes o valor do ano anterior. A alíquota máxima que poderá ser aplicada é de 15% do valor do lançamento fiscal do imóvel, até que o proprietário cumpra com a obrigação. Marli Deon Sette - 2010 92 A progressividade do imposto predial territorial urbano pode ser: Fiscal: CF/88, artigos 145, § 1º; 150, II e 156, § 1º, em que sua aplicação é independente da ocorrência dos pressupostos estabelecidos no art. 182, § 4º. Extrafiscal: O IPTU progressivo no tempo, como instrumento coercitivo, pressupõe que o proprietário de imóvel urbano não cumpra o prazo da obrigação, de parcelar ou edificar nos termos do plano urbanístico local. Este relaciona-se com o art. Marli Deon Sette - 2010 93 A finalidade do poder público municipal na utilização do IPTU progressivo no tempo não é a arrecadação fiscal, mas sim a de induzir o proprietário do imóvel urbano a cumprir com a obrigação estabelecida no plano urbanístico local, de parcelar ou edificar, ou seja, de utilizar a propriedade urbana de forma a atender sua função social – mudar o comportamento do agente econômico. Marli Deon Sette - 2010 94 No caso de a obrigação de parcelar, edificar ou utilizar não ser atendida em cinco anos, o Município manterá a cobrança pela alíquota máxima, até que se cumpra a referida obrigação, ficando garantida, alternativamente, a prerrogativa de desapropriar o imóvel para fins de reforma urbana. É proibida a concessão de isenções ou de anistia relativas à tributação progressiva para os proprietários dos imóveis que não estão cumprindo com a obrigação de dar uma destinação social Marli à propriedade urbana. Deon Sette - 2010 95 7. Desapropriação como instrumento de política urbana art. 8º do EC (e § 4º do artigo 182 da CF/88) Marli Deon Sette - 2010 96 O poder público municipal poderá efetuar essa desapropriação no caso do proprietário deixar de cumprir com a obrigação de conferir uma destinação social à sua propriedade urbana, nos termos e prazos estabelecidos no plano urbanístico local, após o término do prazo máximo de 5 anos da aplicação do IPTU progressivo no tempo. O pagamento da indenização será efetuado por meio de títulos da dívida pública, resgatados no prazo de até dez anos, em prestações anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais de seis por cento ao ano. Marli Deon Sette - 2010 97 Os títulos dados em pagamento, não podem ser utilizados para pagamento de tributos e tarifas públicas. Essa forma de pagamento contraria o disposto no art. 5º, inciso XXIV – prévia e justa indenização em dinheiro. Porém, por se tratar instrumento aplicado como sanção por descumprimento da finalidade de dar destinação social ao imóvel, entende-se que merece tratamento Marli Deon Sette - 2010 98 diferenciado. Cálculo do valor: é a base de cálculo do IPTU, descontado o montante incorporado em função de obras realizadas pelo poder público. Isso nem sempre coincide com o valor imobiliário de mercado. Defende-se que isso permite que se trate com isonomia os proprietários de imóveis que dão destinação social e os que não dão, além de promover a justa distribuição de benefícios e ônus da atividade urbanística e recuperar para a coletividade a valorização que se originou pela ação do poder público. Marli Deon Sette - 2010 99 No entanto, o Poder Público municipal, fica obrigado a proceder ao adequado aproveitamento do imóvel no prazo máximo de 5 anos, contado a partir da sua incorporação ao patrimônio público, de forma a concretizar a destinação social prevista. Isso pode ser feito diretamente ou por meio de alienação ou concessão a terceiros, respeitado o processo licitatório. Aquele que adquirir imóvel nessas condições passa a ter a obrigação anteriormente imposta pelo Poder Público. Marli Deon Sette - 2010 100 8. Usucapião especial Art. 9º ao 14 do EC e 183 CF/88. Marli Deon Sette - 2010 101 O usucapião urbano também chamado usucapião ambiental - instrumento de regularização fundiária de áreas urbanas privadas, adotado na Constituição Federal pelo artigo 183 é objeto de regulamentação do Estatuto da Cidade que reconhece o direito ao domínio àquele que possuir como sua área ou edificação urbana de até 250 m², por 5 anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para a sua moradia ou de sua família desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. O título pode ser concedido a homem, mulher ou a ambos, independentemente o estado civil. Marli Deon Sette - 2010 102 a) b) c) d) e) Requisitos para que seja reconhecido o direito ao domínio: tratar-se de área urbana privada; possuir como sua área ou edificação urbana de até 250 m²; por 5 anos ininterruptamente e sem oposição; utilizando-a para a sua moradia ou de sua família; não ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural. É vedado o reconhecimento deste direito a mesma pessoa mais de uma vez. Marli Deon Sette - 2010 103 É possível reconhecer o direito do usucapião urbano coletivamente, mediante sentença judicial que servirá de título para o registro no Cartório de Imóveis. Na sentença, o juiz atribuirá fração ideal de terreno para cada possuidor, independentemente da dimensão do terreno que cada um ocupe, salvo acordo escrito entre os condôminos, dispondo diversamente. O condomínio especial coletivo é indivisível, não sendo passível de extinção salvo deliberação favorável tomada por no mínimo 2/3 dos condôminos no caso de execução de urbanização posterior à constituição do condomínio. Marli Deon Sette - 2010 104 a) b) São legitimados para promover ação coletiva de usucapião urbano: Os possuidores, individualmente, em litisconsorte ou em estado de composse (posse comum ou coletiva); e A associação de moradores da comunidade, regularmente constituída com personalidade jurídica. O possuidor pode, para o fim de contagem de prazo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas. O legitimado passivo é o proprietário privado, ficando sobrestada qualquer outra ação petitória ou possessória na pendência de decisão em ação de usucapião especial urbana. O público não é passível de ser usucapido (art. 183, § 3º e Marli Deon Sette - 2010 105 191 CF/88). Esse direito coletivo, trata-se de tutela de direito individual homogêneo, decorrentes de origem comum, em que o MP atua obrigatoriamente como custus legis, além de ser legitimado para propor a ação ambiental metaindividual. O registro das sentenças do usucapião urbano altera o artigo 167, inciso I, da lei n° 6.015/73 que dispõe sobre os registros públicos, possibilitando o registro independente do parcelamento e da edificação estar regularizada (artigo 55 do EC). Marli Deon Sette - 2010 106 Sucessão: é possível, desde que o herdeiro já resida no imóvel por ocasião da abertura da sucessão. Todas essas benesses têm como objetivo assegurar o domínio de áreas urbanas àqueles que habitam os denominados “estabelecimentos irregulares”, transformando os bairros espontâneos em realidades jurídicas. Marli Deon Sette - 2010 107 9. Concessão de uso especial no Estatuto da Cidade (CF/88, art. 183, § 1º e Medida Provisória 2.220/2001) Marli Deon Sette - 2010 108 Garantido pela CF/88 - art. 183, § 1º - o direito à concessão de uso especial foi vetado em sua redação original, artigos 15 a 20 do EC, pelos motivos empossados na Mensagem nº 730/2001. Para tratar do assunto foi editada a MP 2.220/2001, antes da vigência da EC nº 32, que editou novas regras a respeito das MPs, restringindo seu uso. Marli Deon Sette - 2010 109 Na medida em que é vetada a aquisição do domínio pleno sobre as terras públicas por meio de usucapião, art. 183, § 3º da CF/88, a concessão de direito especial de uso para fins de moradia é o instrumento hábil para a regularização fundiária das terras públicas informalmente ocupadas pela população de baixa-renda. Marli Deon Sette - 2010 110 Pela redação da MP 2.220/2001 ficou instituído que aquele que, até 30 de junho de 2001, possuiu como seu, por 5 anos, ininterruptamente e sem oposição, até 250 m² de imóvel público situado em área urbana, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, tem o direito à concessão de uso especial para fins de moradia em relação ao bem objeto da posse, desde que não seja proprietário ou concessionário, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural. Referido direito é conferido ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. Marli Deon Sette - 2010 111 a) b) c) d) Requisitos para ter direito ao uso especial: Ter possuído como seu, até 30 de junho de 2001, por 5 anos, ininterruptamente e sem oposição; até 250 m² de imóvel público situado em área urbana; utilizar para sua moradia ou de sua família; não ser proprietário ou concessionário, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural. É vedado o reconhecimento deste direito a mesma pessoa mais de uma vez. O possuidor pode, para o fim de contagem de prazo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas. Marli Deon Sette - 2010 112 É possível a concessão de uso especial para fins de moradia de forma coletiva, quando os imóveis sejam maiores do que 250 m² por população de baixa renda, em que não é possível identificar os terrenos ocupados por possuidor, preenchidos os demais requisitos. A fração máxima de cada possuidor será de 250 m². Será atribuída igual fração ideal de terreno a cada possuidor, salvo hipótese de acordo escrito dispondo diversamente. Marli Deon Sette - 2010 113 O Poder Público garantirá ao possuidor o exercício do direito de uso especial em outro local quando a ocupação acarretar risco à vida ou à saúde dos ocupantes. a) b) c) d) e) Ao Poder Público é facultado assegurar o exercício do direito de uso especial em outro local na hipótese de ocupação de imóvel: de uso comum do povo; destinado a projeto de urbanização; de interesse da defesa nacional, da preservação ambiental e da proteção dos ecossistemas naturais; reservado à construção de represas e obras congêneres; situado em via de comunicação. Marli Deon Sette - 2010 114 Obtenção do título - pode dar-se de duas formas, a saber: a) por via administrativa (no prazo máximo de 1 ano) e, b) em caso de recusa ou omissão deste, pela via judicial, mediante sentença. O título, obtido tanto por via administrativa, quanto judicial, serve para efeito de registro no cartório de registro de imóveis, podendo ser transferido por ato inter vivos ou causa mortis, além de ser um direito real, podendo gerar ações. Marli Deon Sette - 2010 115 Para obtenção o interessado deve protocolar um requerimento no órgão detentor do imóvel. Quando o bem imóvel for da União ou dos Estados, o requerente deve juntar ao pedido de concessão de uso especial para fins de moradia uma certidão expedida pelo Poder Público municipal, atestando a localização do imóvel em área urbana e a sua destinação para moradia do ocupante ou de sua família. Marli Deon Sette - 2010 116 A concessão de direito de uso não produz o efeito de gerar uma propriedade imobiliária separada, como direito real autônomo. O morador não será dono do imóvel. O título de propriedade continua em poder da administração pública, que concede ao ocupante o direito de usar o bem. Marli Deon Sette - 2010 117 Nos casos de programas e projetos habitacionais de interesse social, desenvolvidos por órgãos ou entidades da Administração Pública com atuação específica nessa área, os contratos de concessão de direito real de uso de imóveis públicos: a) terão caráter de escritura pública, não se aplicando o disposto no inciso II do art. 134 do Código Civil, e b) constituirão título de aceitação obrigatória em garantia de contratos de financiamentos habitacionais. Marli Deon Sette - 2010 118 O direito à concessão de uso especial para fins de moradia extingue-se, devendo ser averbada no cartório de registro de imóveis, por meio de declaração do Poder Público concedente, no caso de: I - o concessionário dar ao imóvel destinação diversa da moradia para si ou para sua família; ou II - o concessionário adquirir a propriedade ou a concessão de uso de outro imóvel urbano ou rural. Marli Deon Sette - 2010 119 Destinação comercial: é novidade inserida pela MP 2.220/2201 que faculta ao poder público, preenchidos os mesmos requisitos retromencionados para moradia, dar autorização de uso especial para uso com finalidade comercial, sendo a autorização conferida de forma gratuita. Sucessão: é possível tanto no uso para moradia, quanto no uso para comércio , desde que o herdeiro já resida no imóvel por ocasião da abertura da sucessão. Marli Deon Sette - 2010 120 A MP 2.220/2201, além de completar o EC, também contribuiu com a criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano – CNDU – órgão deliberativo e consultivo, integrante da estrutura da Presidência da República com competência para, entre outros, propor instrumentos, avaliar a implementação de políticas, propor edição de normas, etc, sempre ligadas ao direito urbanístico. Também cabe ao CNDU promover a cooperação entre os entes federados entre si e com a sociedade civil. Marli Deon Sette - 2010 121 10. Direito de superfície (art. 21 a 24 do EC e 1.369 a 1.377 do CC) Marli Deon Sette - 2010 122 Abolido, no Brasil desde 1.864, o direito de superfície retorna agora por meio do EC, que dispõe que “o proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, por tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de imóveis”. Segundo o Professor Ricardo Pereira Lira trata-se o direito de superfície de um " direito real autônomo, temporário ou perpétuo, de fazer e manter construção ou plantação sobre ou sob o solo alheio; é a propriedade - separada do solo - dessa construção ou plantação, bem como é a propriedade decorrente da aquisição feita ao dono do solo de construção ou plantação já existente". Marli Deon Sette - 2010 123 O sentido jurídico tradicional, proveniente do direito romano, denota que superfície não é o solo que está em contato com o espaço atmosférico, mas sim, o que emerge dele – abrangendo o direito de se utilizar do solo, subsolo e espaço aéreo. Por meio do direito de superfície, nascem dois direitos reais distintos e autônomos: a construção (edilícia) ou plantação (rústica, agrária, agrícola ou vegetal) do superficiário e o solo do proprietário. Por meio dele, é atribuído ao superficiário o domínio útil, ficando o dono do solo com o domínio direto. Marli Deon Sette - 2010 124 Ou seja, o direito de superfície é um instituto que permite que o proprietário de um imóvel urbano possa transferir para outras pessoas o direito de superficie de seu terreno. Isto permite ao morador (particular ou poder público)usufruir do solo, subsolo, espaço aéreo de uma determinada área, sem que seja transferida a propriedade do terreno. Aquilo que for construído pelo superficiário torna-se sua propriedade. Mas, isto não significa que ele tenha direito ao solo, e, sim, que tem direito apenas àquilo que for construído por ele. Marli Deon Sette - 2010 125 Ex: Tício tem o domínio de um terreno e decide concede a Caio o direito de superfície para que construa ali uma edificação. O terreno continua de Tício e, A edificação será de Caio. É utilizado em várias situações, por ex.: a) Para fins de cancelamento de débitos tributários; b) Conceder à Prefeitura para fins de construção de habitação recebendo em troca transferência do direito de construir; etc. Marli Deon Sette - 2010 126 a) b) c) d) Espécies de direito de superfície: Direito de superfície simples/puro: é aquele desprovido de qualquer peculiaridade que o individualize. Direito de superfície social: aquele destinado a solucionar o problema de escassez de moradia das classes menos favorecidas. É o mais relevante para os objetivos visados pelo EC. Direito de superfície "ad aedificandum" e " ad plantandum": é o direito de superfície constituído com finalidade específica de construir ou plantar préestabelecida. Direito de superfície por cisão: é aquele que incide sobre terreno já edificado ou plantado. Marli Deon Sette - 2010 127 a) b) c) d) e) Características da concessão da propriedade superficiária: Pode ser gratuito ou oneroso; Por tempo determinado ou indeterminado; É um direito transferível a terceiros, nos termos do contrato original; Transmite-se aos herdeiros; É um direito resolúvel, já que, uma vez cessada a concessão, o titular do domínio pleno adquire a res superficiaria, independentemente de indenização se não foi convencionado diferentemente. Marli Deon Sette - 2010 128 O superficiário responde integralmente pelos encargos e tributos que incidirem sobre a propriedade superficiária, arcando, ainda, proporcionalmente à sua parcela de ocupação efetiva, com os encargos e tributos sobre a área objeto da concessão do direito de superfície, salvo disposição em contrário do contrato respectivo. Em caso de alienação do terreno, ou do direito de superfície, o superficiário e o proprietário, respectivamente, terão direito de preferência, em igualdade de condições à oferta de terceiros. Marli Deon Sette - 2010 129 O direito de superfície se extingue: a) pelo advento do termo; b) pelo descumprimento das obrigações contratuais assumidas pelo superficiário. c) Também pode se extinguir antes do advento do termo se o superficiário der ao terreno destinação diversa daquela para a qual foi concedida. Marli Deon Sette - 2010 130 O Direito de superfície está de acordo com as novas exigências sociais, e como tal pode servir como importante instrumento de transformação da propriedade. Ou seja, pode servir como ferramenta eficaz para atenuar a crise habitacional que se instala nos grandes centros urbanos do nosso país, possibilitando às autoridades a imediata aplicação de uma política urbana eficaz, tendo em vista a desnecessidade da aplicação de recursos financeiros diretos por parte da esfera pública. Marli Deon Sette - 2010 131 a) b) Além dos benefícios diretos alcançados, como moradia com direito real, existem ainda os indiretos, tais como: o fomento de novos empregos na área de construção e posteriormente no setor de serviços e comércio, influenciar no crescimento ordenado da cidade, com os efeitos colaterais da diminuição da miséria e violência, na construção de uma sociedade mais justa. Ou seja, é uma nova política social da propriedade, que visa a atender sobremaneira o princípio da dignidade humana aplicando o princípio da função social da propriedade em atendimento ao interesse social. Marli Deon Sette - 2010 132 Existe o chamado direito de Sobrelevação? (figura do Direito de Laje, nas favelas do Rio de Janeiro). Na Itália e no direito Suíço existe esta possibilidade, pois a superfície passa a ser de propriedade do superficiário e este pode conceder outro direito de superfície sobre seu direito de superfície. Em nossa doutrina relativa à propriedade horizontal, afirma-se que não se pode admitir propriedades distintas superpostas sem a propriedade indivisa do solo por parte de todos os proprietários distintos. No entanto, é uma realidade presente em muitos locais, como, por ex. nas favelas do Rio De Janeiro. Marli Deon Sette - 2010 133 11. Direito de preempção art. 26 a 27 do EC Marli Deon Sette - 2010 134 O direito de preempção confere ao Poder Público municipal preferência para aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares. Referido direito é exercido em áreas delimitadas por meio de Lei municipal,baseada no plano diretor por prazo não superior a 5 anos, renovável após o decurso do primeiro ano de vigência. A área deverá ser enquadrada numa das finalidades relacionadas como passíveis do exercício do direito de preferência. Marli Deon Sette - 2010 135 a) b) c) d) e) f) g) h) O direito de preempção será exercido sempre que o Poder Público necessitar de áreas para: regularização fundiária; execução de programas e projetos habitacionais de interesse social; constituição de reserva fundiária; ordenamento e direcionamento da expansão urbana; implantação de equipamentos urbanos e comunitários; criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes; criação de unidades de conservação ou proteção de outras áreas de interesse ambiental; proteção de áreas de interesse histórico, cultural ou paisagístico. Marli Deon Sette - 2010 136 O proprietário deverá notificar sua intenção de alienar o imóvel, anexando proposta da compra por terceiro interessado na aquisição do imóvel (preço, prazo e validade) para que o Município, no prazo máximo de 30 dias, manifeste por escrito seu interesse em comprá-lo. A notificação e a intenção de compra deverão ser publicadas. Marli Deon Sette - 2010 137 Se o município silenciar, o proprietário poderá realizar a venda ao terceiro. No entanto, esta fica vinculada à proposta apresentada ao Poder Público, sendo nula de pleno direito se feita de forma diversa. Em ocorrendo a nulidade, o Poder Público poderá adquirir o imóvel pelo valor de base de cálculo do IPTU ou da proposta apresentada (pagamento em dinheiro). Marli Deon Sette - 2010 138 12. Outorga onerosa do Direito de construir Art. 28 a 31 do EC Marli Deon Sette - 2010 139 A outorga onerosa do direito de construir, é instrumento que amplia o direito de construir, que poderá ser exercido acima do coeficiente de aproveitamento básico adotado, bem como permite a alteração do uso do solo, sempre mediante contrapartida. Coeficiente (relação entre área edificável e área de terreno): Pode ser igual em toda a área urbana ou distinta conforme as especificidades da zona urbana. Marli Deon Sette - 2010 140 O plano diretor definirá os limites máximos a serem atingidos pelos coeficientes de aproveitamento, considerando: a) a proporcionalidade entre a infra- estrutura existente; e b) o aumento de densidade esperada em cada área. Marli Deon Sette - 2010 141 Lei municipal específica estabelecerá as condições a serem observadas para a outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso, determinando: a) a fórmula de cálculo para a cobrança; b)os casos passíveis de isenção do pagamento da outorga; c) a contrapartida do beneficiário. Marli Deon Sette - 2010 142 Os valores arrecadados com a outorga onerosa do direito de construir e com a permissão de alteração do uso do solo devem ser utilizados para dar efetividade aos diferentes objetivos descritos nos incisos I a VIII do art. 26 do EC, em decorrência do direito de preempção. Marli Deon Sette - 2010 143 13. Transferência do direito de construir Art. 35 do EC Marli Deon Sette - 2010 144 a) b) c) Lei municipal, baseada no plano diretor, poderá autorizar o proprietário de imóvel urbano, privado ou público, a exercer em outro local, ou alienar, mediante escritura pública, o direito de construir previsto no plano diretor ou em legislação urbanística dele decorrente, quando o referido imóvel for considerado necessário para fins de: implantação de equipamentos urbanos e comunitários; preservação, quando o imóvel for considerado de interesse histórico, ambiental, paisagístico, social ou cultural; servir a programas de regularização fundiária, urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda e habitação de interesse social. Marli Deon Sette - 2010 145 Objetivo: viabilizar a preservação de imóveis ou áreas de importante valor histórico ou ambiental. A idéia é permitir que os proprietários de imóveis a serem preservados sejam compensados pelo fato de que em seus imóveis o coeficiente ou densidade básicos estabelecidos para o território urbano não pode ser atingido sob pena de comprometer o objetivo da preservação de imóveis de interesse histórico, paisagístico ou ambiental ou então por serem necessários para regularização fundiária e programas de habitação de interesse social. Marli Deon Sette - 2010 146 Com o uso do instrumento, o proprietário de um imóvel sobre o qual incide um interesse público de preservação (ambiental, patrimônio histórico, cultural, paisagístico e arquitetônico) ou ainda um imóvel que esteja ocupado por uma favela que se quer urbanizar, pode utilizar em outro imóvel, ou vender, a diferença entre a área construída do imóvel preservado e o total de área construída atribuída ao terreno pelo coeficiente de aproveitamento básico. a) b) Verifica-se que o proprietário pode: exercer o direito de construir em outro território, ou Alienar referido direito de construir a terceiros. Marli Deon Sette - 2010 147 A transferência somente será permitida se o proprietário participar de algum programa de preservação elaborado em conjunto com o poder público ou elaborado pelo setor privado e aprovado pelo ente técnico responsável. Também poderá se utilizar do instrumento o proprietário que doar ao poder públicos imóvel, ou parte dele, para as finalidades previstas neste tópico. Marli Deon Sette - 2010 148 a) b) c) d) e) f) Cabe ao Poder Público: Definir claramente as condições de transferência; Ter uma listagem ou cadastro dos imóveis com potencial para aplicação do instrumento; Estabelecer critérios de transferência (preço, etc.); Mediar as negociações dos particulares; Formular planos de preservação para que as metas sejam executadas; Acompanhar e monitorar os imóveis preservados. Marli Deon Sette - 2010 149 Um aspecto interessante sobre este instrumento refere-se à concorrência dele com a venda do solo criado (outorga onerosa) . Observa-se que nos casos onde ambos convivem, há clara preferência do mercado pelo solo criado, que possibilita mudanças de uso e não apenas potencial construtivo. Além disso, a concorrência se torna mais desleal se considerarmos que, no caso do solo criado, vende-se o potencial declaradamente abaixo da sua avaliação no mercado imobiliário, para atrair os empreendedores. Uma estratégia proposta para enfrentar essa questão seria a promoção de uma associação entre os dois instrumentos, introduzindo a preservação do imóvel como uma das destinações da contrapartida do solo criado. Marli Deon Sette - 2010 150 14. Operação urbana consorciada Art. 32 a 34 Marli Deon Sette - 2010 151 O EC dispõe que Lei municipal poderá autorizar áreas para aplicação de operações consorciadas, que se entende como um conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental. As operações urbanas consorciadas constituem um tipo especial de intervenção urbanística voltada para a transformação estrutural de um setor da cidade. Marli Deon Sette - 2010 152 As operações urbanas consorciadas são definições específicas para um certa área da cidade que se quer transformar, que prevêem o uso e ocupação distintas das regras gerais que incidem sobre a cidade e que podem ser implantadas com a participação dos proprietários, moradores, usuários e investidores privados, onde se poderá: a) modificar índices e características de parcelamento, uso e ocupação do solo e subsolo e alterar normas edilícias, considerado o impacto ambiental delas decorrente; b) Proceder a regularização de construções, reformas ou ampliações executadas em desacordo com a legislação vigente. Marli Deon Sette - 2010 153 Em suma, as operações urbanas articulam um conjunto de intervenções, coordenadas pela prefeitura e definidas em lei municipal, em que se recortam da ordenação geral do uso e ocupação do solo um conjunto de quadras e se definem para estas um projeto de estrutura fundiária, potencial imobiliário, formas de ocupação do solo e distribuição de usos distintas da situação presente deste setor e das regras gerais de uso e ocupação do solo vigentes para este. As intervenções podem se dar por meio de obras públicas e/ou privadas. Marli Deon Sette - 2010 154 a) b) c) d) e) f) g) O plano que dispõe sobre as operações deverá conter, no mínimo: definição da área a ser atingida; programa básico de ocupação da área; programa de atendimento econômico e social para a população diretamente afetada pela operação; finalidades da operação; estudo prévio de impacto de vizinhança; contrapartida a ser exigida dos proprietários, usuários permanentes e investidores privados. forma de controle da operação, obrigatoriamente compartilhado com representação da sociedade civil. Marli Deon Sette - 2010 155 Essas medidas visam a evitar que operações sejam usadas somente para “liberações de índices” ou para valorização imobiliária, que implique em expulsão de moradores de menor renda. A Lei especifica que tratar do assunto, poderá prever a emissão de certificados de potencial adicional – CEPAC - de construção a serem alienados em leilão ou utilizados como pagamento nas obras da própria operação. Referidos certificados são conversíveis em direito de construir apenas na área delimitada pela operação, servindo como pagamento de construção que supere os padrões vigentes antes da lei especifica que estabeleceu novos padrões na área consorciada. Marli Deon Sette - 2010 156 Os CEPAC se configuram em instrumentos ligados a ordem econômica constitucional (art. 170, VI – principio ambiental da ordem econômica) com nítida função ambiental. Os recursos advindos da contrapartida são vinculados à própria operação consorciada. Qualquer licença ou autorização concedida pelo Poder Público em desacordo com o definido na operação consorciada será nula. Marli Deon Sette - 2010 157 15. Estudo de impacto de vizinhança Art. 36 a 38 do EC Marli Deon Sette - 2010 158 O Estudo de impacto de vizinhança – EIV é um estudo prévio necessário para obtenção de licenças ou autorizações de construção ampliação ou funcionamento, cabendo ao poder público a sua exigência. Trata-se de um conjunto de estudos preliminares sócio-econômico-ambiental, que apresenta relatório, planos de recuperação, projeto de controle, diagnóstico ambiental, análise preliminar de risco, etc. Marli Deon Sette - 2010 159 Exigência: Embora o EC diga que lei municipal definirá os empreendimentos que dele necessitam, aplica-se, na verdade, a regra do EIA (Estudo de Impacto Ambiental - Art. 225, §1º, IV da CF/88 e Lei 6938/81, PNMA, art. 10) em que se exige para todos os empreendimentos que potencialmente podem causar significativo impacto ambiental (= dano = alteração adversa dos atributos do meio ambiente + degradação da qualidade ambiental). Objetivo: tutela da qualidade de vida da população residente na área e no seu entorno. Marli Deon Sette - 2010 160 Trata-se de instrumento preventivo, que contempla os efeitos positivo e negativos, diretos e indiretos referentes a determinado empreendimento. Por meio dele se apura as possíveis condições em que o ambiente ficará, caso o empreendimentos seja realizado e se propõe medidas mitigadoras. A todos os documentos integrantes do EIV deve ser dado publicidade, além do que, devem ficar a disposição de interessados. Marli Deon Sette - 2010 161 a) b) c) d) e) f) g) O EIV não substituí o EIA, e, naquele se analisam, no mínimo: adensamento populacional; equipamentos urbanos e comunitários; uso e ocupação do solo; valorização imobiliária; geração de tráfego e demanda por transporte público; ventilação e iluminação; paisagem urbana e patrimônio natural e cultural. Os custos do EIV são suportados pelo empreendedor. Marli Deon Sette - 2010 162 16. Plano Diretor Art. 39 a 42 do EC Marli Deon Sette - 2010 163 A política de desenvolvimento urbano é traçada pelo plano diretor, que é criado por lei municipal e dispõe sobre diretrizes e estratégias para o desenvolvimento urbano e econômico das cidades e orienta os investimentos públicos. O plano diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana. Marli Deon Sette - 2010 164 O conceito de plano diretor adotado pela Constituição é o de um plano urbanístico auto-aplicável. A ele é reservada a definição da função social da propriedade e a delimitação das áreas subutilizadas, sujeitas a parcelamento e edificação compulsórios, utilização extrafiscal do IPTU e desapropriação com pagamento em títulos da dívida pública (§§ 2º e 4º do art. 182). Marli Deon Sette - 2010 165 Por meio dele é criado um sistema de planejamento e gestão da cidade, que engloba o município como um todo, determinando quais serão as políticas públicas a serem desenvolvidas nos próximos 10 anos (prazo em que ele deve ser revisto) em todas as áreas da administração pública. É o Plano diretor quem delimita critérios de zoneamentos de áreas industriais, comerciais e residenciais com vistas a integrar as necessidades de todas as camadas da população. Marli Deon Sette - 2010 166 A participação popular deve ser garantida pela administração no processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua implementação, em que devem ser promovidas: a) audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade; b) publicidade quanto aos documentos e informações produzidos; c) acesso de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos. Marli Deon Sette - 2010 167 a) b) c) d) e) Nos termos do EC, o plano diretor é obrigatório para cidades: com mais de 20.000 habitantes (182, § 1º CF/88); integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos constitucionalmente, quais sejam: o parcelamento ou edificação compulsórios; IPTU progressivo e a desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública; integrantes de áreas de especial interesse turístico; inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional. Marli Deon Sette - 2010 168 O plano diretor deverá conter no mínimo: a) a delimitação das áreas urbanas onde poderá ser aplicado o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, considerando a existência de infraestrutura e de demanda para sua utilização, nos termos do EC; b) sistema de acompanhamento e controle. Marli Deon Sette - 2010 169 c) Também deverá conter disposições sobre: 1. Direito de preempção; 2. Fixação de áreas com coeficiente superior ao de aproveitamento básico – outorga onerosa do direito de construir; 3. Fixar áreas nas quais poderá ser permitida alteração de uso de solo, mediante contrapartida do beneficiário; 4. Delimitar áreas para aplicação de operações consorciadas; 5. Prever disposições concernentes à transferência do direito de construir. Marli Deon Sette - 2010 170 a) b) c) d) Para que o plano diretor cumpra sua função constitucional, deve harmonizar as diferentes regras jurídicas de meio ambiente: cultural; artificial; do trabalho; e Natural, de forma a assegurar a brasileiros e estrangeiros que aqui residam o trinômio vida-trabalhoconsumo, com dignidade. Marli Deon Sette - 2010 171 Prazos: Os municípios com mais de 20.000 habitantes ou integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas tiveram um prazo de 05 anos para a implementação do plano diretor, que venceu em 10/10/2006. No caso de cidades com mais de 500.000 habitantes, deve ser elaborado um plano de transporte urbano integrado, compatível com o plano diretor ou nele inserido. Marli Deon Sette - 2010 172 Aplicam-se ao Distrito Federal e ao Governador do Distrito Federal as disposições do EC relativas, respectivamente, a Município e a Prefeito. Marli Deon Sette - 2010 173 17. Gestão Democrática da Cidade Art. 43 a 45 Marli Deon Sette - 2010 174 O Estatuto da cidade incorpora a gestão democrática como uma diretriz geral da política urbana, por meio do inciso II do artigo 2° e estabelece um capítulo específico (artigos 43 a 45). A idéia é que para reverter o quadro da desigualdade social, o controle da Administração Pública, da gestão das políticas públicas, da destinação e utilização dos recursos públicos, de medidas que priorizem investimentos na área social, deve ser efetuado pelas instituições que representam o cidadão, com base no sistema da democracia representativa, ou de forma direta com base no sistema da democracia participativa ou direta. Marli Deon Sette - 2010 175 Assim, a tendência autoritária da Administração Pública, em sobrepor os seus atos ao consentimento do cidadão, é substituída por novos modelos de gestão do interesse público, em que o papel do cidadão é valorizado como colaborador, cogestor, prestador e fiscalizador das atividades da Administração Pública. Marli Deon Sette - 2010 176 Essa exigência do EC rompe com a superada visão administrativa de disciplinar as cidades a partir do regramento imposto tão-somente pelo poder público. Funda-se nos princípios da dignidade da pessoa humana, bem como no principio da cidadania, proporcionando, diretamente, o exercício da cidadania. Marli Deon Sette - 2010 177 a) b) c) d) Com vistas a garantir a gestão democrática, o EC dispõe que devem ser utilizados os seguintes instrumentos: órgãos colegiados de política urbana, nos níveis nacional, estadual e municipal ( pode ser composto pelo Poder Público, proprietários, moradores, usuários e os investidores privados e o MP); debates, audiências e consultas públicas; conferências sobre assuntos de interesse urbano, nos níveis nacional, estadual e municipal; iniciativa popular de projeto de lei e de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano. Marli Deon Sette - 2010 178 No âmbito municipal, a gestão orçamentária participativa inclui a realização de debates, audiências e consultas públicas sobre as propostas do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e do orçamento anual, como condição obrigatória para sua aprovação pela Câmara Municipal. O fundamento para a instituição deste instrumento é o de controle das finanças públicas. A não realização de audiências e consultas públicas no processo de aprovação da lei do orçamento municipal resulta na inconstitucionalidade da lei. Marli Deon Sette - 2010 179 18. Improbidade administrativa – art. 52 do EC Marli Deon Sette - 2010 180 Sem prejuízo da punição de outros agentes públicos envolvidos e da aplicação de outras sanções cabíveis, o Prefeito incorre em improbidade administrativa, nos termos da Lei 8.429/92, quando: a) deixar de proceder, no prazo de cinco anos, o adequado aproveitamento do imóvel incorporado ao patrimônio público, conforme o disposto no § 4o do art. 8o do EC; b) utilizar áreas obtidas por meio do direito de preempção em desacordo com o disposto no art. 26 desta Lei; Marli Deon Sette - 2010 181 c) d) e) f) g) aplicar os recursos auferidos com a outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso fora dos casos do exercício da preempção; aplicar os recursos auferidos com operações consorciadas em outros locais que não o do consórcio; impedir ou deixar de garantir a participação popular e a publicidade; deixar de tomar as providências necessárias para garantir a observância do disposto no § 3o do art. 40 (EIV) e no art. 50 (implementar PD) do EC; adquirir imóvel objeto de direito de preempção, pelo valor da proposta apresentada, se este for, comprovadamente, superior ao de mercado. Marli Deon Sette - 2010 182 Também foi acrescido ao art. 1º e 4º da Lei 7.347/85, o direito ao uso da Ação Civil Púclica em caso de dano que cause prejuízo à ordem urbanística, bem como o uso da ação cautelar para evitar o dano ao meio ambiente, consumidor, ordem urbanística, etc. A idéia é responsabilizar os agentes públicos e privados responsáveis pelo uso indevido dos instrumentos de política urbana que acarrete lesão as funções sociais da cidade e ao direito às cidades sustentáveis. Marli Deon Sette - 2010 183 No entanto, há outro instrumento que pode ser utilizado para evitar a aplicações de sanções, servindo para reparar o dano de forma voluntária e extrajudicial, trata do TAC – termo de ajustamento de conduta. O TAC visa a colocar um plano de ajustamento da conduta danosa, bem como à correção dos danos já causados, podendo ser obtido preliminarmente a qualquer demanda, por iniciativa do infrator, ou durante o inquérito civil, que é o momento em que o MP faz as investigações para obter provas para a propositura da ACP. Marli Deon Sette - 2010 184 Além disso existem diretrizes, na Lei 9.605/98, para responsabilizar os sujeitos – pessoas físicas ou jurídicas, publicas ou privadas - que cometam infração administrativa (art. 70 a 76) ou crime ambiental (demais artigos), muitos deles diretamente relacionados à ordem urbanística. Ex. art. 15, f (agravante), Art. 42 (fogo por balões), art. 54, § 2º, I (poluição), art. 62 a 65 (crimes contra o ordenamento urbano). Marli Deon Sette - 2010 185 Considerações Finais Marli Deon Sette - 2010 186 a) b) Em face do que foi exposto, segundo Victor Carvalho Pinto, podemos chegar ao conceito de propriedade urbanística, cujas características principais são as seguintes: a propriedade tradicional traduzia-se simplesmente no plano horizontal. Daí a necessidade de se precisar com clareza os confrontantes na hora da transmissão dos respectivos títulos. A propriedade urbanística atual apresenta uma terceira dimensão. É uma propriedade que poderíamos dizer cúbica, ou seja, o proprietário só pode construir acima e abaixo do solo de acordo com o plano urbanístico. Assim: Marli Deon Sette - 2010 187 1. A altura e a profundidade passam a constituir valores intrínsecos dessa propriedade. 2. a propriedade urbanística é teleológica, quer dizer, o plano determina o uso que se pode dar ao terreno – residencial, comercial, etc. – ou ainda o número de habitações que podem ser construídas. 3. a propriedade urbanística possui, também um caráter temporal. Isto significa que o seu conteúdo é dado pelo plano e, como o plano é mutável, segue-se que também ela é mutável. Marli Deon Sette - 2010 188 4. a propriedade urbanística implica também em obrigações de fazer, podendo, inclusive, constranger o proprietário a edificar, sob pena de ser expropriado pelo Poder Público; 5. A propriedade urbanística é uma propriedade formal, isto é, recebe a sua forma do Plano de Desenvolvimento Urbano. Assim, é indispensável que o título de propriedade caracterize também as determinações que o plano estabelece para a zona em que se localiza e, finalmente; 6. a propriedade urbanística está intimamente vinculada aos serviços públicos, que a servem, de tal forma que o seu proprietário é obrigado a custeá-los, ainda que deles não se utilize, como por exemplo a caixa-d’água” . Marli Deon Sette - 2010 189 Pesquisas no Capítulo 10 – Seção 10.1 do livro: DEON SETTE, MARLI T. Direito ambiental. Coordenadores: Marcelo Magalhães Peixoto e Sérgio Augusto Zampol Pavani. Coleção Didática jurídica, São Paulo: MP Ed., 2009, p. 2122. ISBN 978-85-97898-023-8. Marli Deon Sette - 2010 190