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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
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A LEI DOS CRIMES HEDIONDOS E SUA PROBLEMÁTICA
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Por: Paulo Cezar Arruda
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Orientador
Prof. Dra. Waleska Rodrigues
Rio de Janeiro
2007
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
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A LEI DOS CRIMES HEDIONDOS E SUA PROBLEMÁTICA
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Apresentação
Candido
de
Mendes
monografia
como
à
requisito
Universidade
parcial
para
obtenção do grau de especialista em Direito Penal e
Processual Penal.
Por: . Paulo Cezar Arruda
3
AGRADECIMENTOS
....a todos aqueles que de alguma
forma foram vítimas da violência.
4
DEDICATÓRIA
.....à minha esposa, meus filhos e meu
neto
que
caminhar.
sempre
me
inspiraram
a
5
RESUMO
A presente monografia trata da Lei dos Crimes Hediondos (Lei
8.072/90), lei esta combatida por inúmeros juristas que a definem como uma lei
abjeta e inconseqüente, muitos deles chegando a denominá-la de hedionda
por apresentar algumas impropriedades, apontando a maior delas como sendo
o agravamento da pena nos crimes assim considerados, argumentando que o
aumento da pena não enseja a diminuição da criminalidade e que a certeza da
punibilidade e a prática de políticas sociais adequadas são os únicos
instrumentos capazes de conter a crescente violência e criminalidade no país.
Sem razão, a meu ver, o argumento dos nobres juristas que caminham
na contra-mão da opinião pública que entendem ser a lei penal brasileira
paternalista no trato da criminalidade, pois a impunidade tornou-se tema
comum em discussão na sociedade, justamente pela brandura da Lei que em
pouco tempo devolve ao convívio social indivíduos beneficiados por institutos
como a liberdade condicional, apesar da maioria deles voltar a delinqüir,
demonstrando inequivocamente não serem merecedores daquele benefício.
O descontrole da criminalidade existente no momento exige medidas
enérgicas por parte do poder público, sendo uma obrigação do Estado
implementar medidas capazes de assegurar o bem comum e a segurança
pública, não somente com políticas sócio-educativas como muitos querem
fazer crer, que são mais focadas no aspecto preventivo, mais com medidas
repressivas, aumentando a severidade da lei para desestimular o ânimo dos
que se aventuram em desestabilizar a paz pública.
6
METODOLOGIA
Os métodos utilizados na discussão do tema são uma abordagem da
Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), sob os aspectos normativo e
interpretativo da doutrina e da jurisprudência, confrontando com o aspecto
argumentativo ou estudo crítico do autor da monografia. Sendo abordada a
opinião de diversos doutrinadores que compartilham de idéias semelhantes,
contrapondo-se a opinião do autor da monografia que apresenta fatos reais e
estatísticas que corroboram seu raciocínio.
7
SUMÁRIO
1 - INTRODUÇÃO
2 – CONCEITO DE CRIME HEDIONDO
3 – A LEI Nº 8.072/90
3.1 – MOVIMENTO DA LEI E DA ORDEM
3.2 – INTERVENÇÃO MÍNIMA
3.3 – ABOLICIONISMO
3.4 – CRIMES HEDIONDOS – O IDEAL E O RASOÁVEL
3.5 – A INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ART. 2º DA LEI 8072/90
4 – RECENTES MODIFICAÇÕES
4.1 – LIBERDADE PROVISÓRIA
4.2 – REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA
5 – PALAVRAS DO MESTRE
6 – CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE
6.1 – OPINIÃO
7 – CONCLUSÃO
8
1 - INTRODUÇÃO
A Constituição Brasileira de 1988, em seu artigo 5º, Inciso XLIII
estabeleceu que “A Lei considerará crimes Inafiançáveis e insuscetíveis de
Graça ou Anistia, dentre outros, os definidos como crimes hediondos.”
O aumento crescente da criminalidade ensejou que o constituinte de
1988 lançasse as bases da Lei dos Crimes Hediondos. Desta forma, a edição
da Lei 8.072, de 25 de julho de 1990, era um imperativo constitucional previsto
no referido artigo.
Alguns acontecimentos históricos aceleraram a tramitação da Lei dos
Crimes Hediondos. Devemos entender o momento de pânico que atingia
alguns setores da sociedade brasileira, sobretudo por causa da onda se
seqüestros no Rio de Janeiro, culminando com o do Empresário Roberto
Medina, irmão do Deputado Federal pelo Estado do Rio de Janeiro, Rubens
Medina, considerado a gota d’água para a edição da lei.
O clima emocional para o surgimento de dispositivos duros que
combatessem os chamados Crimes Hediondos estava assim criado. A
sociedade exigia uma providência drástica para pôr fim ao ambiente de
insegurança vivido no país. O governo precisava dar ao povo a sensação de
segurança.
Esse momento histórico do surgimento da Lei dos Crimes Hediondos
no ano de 1990 pode ser considerado como de dias felizes se comparado ao
cenário dos dias atuais. Se naquela época os seqüestros eram a grande
preocupação de todos, hoje em dia a violência aumentou como uma erva
daninha que se alastra por todos os cantos, os noticiários policiais são
alarmantes, os crimes brutais contra inocentes causam comoção social nunca
visto. As Facções Criminosas comandando suas quadrilhas de dentro dos
presídios demonstram a completa falência do Sistema Carcerário. O
envolvimento cada vez maior de policiais com a criminalidade evidenciam uma
9
crise institucional sem precedentes. O aumento considerável do número de
menores envolvidos com crimes graves indicam a ineficácia das Políticas
Sociais do Estado.
2 – CONCEITO DE CRIME HEDIONDO
O termo Hediondo significa “repelente, repulsivo, horrendo”, conforme
definição pelo Dicionário Aurélio (15ª Impressão, pág. 715). Assim sendo,
Crimes Hediondos são os delitos considerados repugnantes, repulsivos,
horrorosos. Entretanto, ser horrendo, repulsivo ou repelente exige uma
valoração subjetiva, tornando o conceito muito elástico, sendo que o legislador
não definiu o que seja hediondez do crime, possibilitando assim a taxação de
hediondos os crimes assim relacionados em um rol que pode ser ampliado ou
diminuído pelo legislador ordinário, de acordo com os interesses dominantes.
Apesar do legislador não ter definido o que é hediondo, a população
brasileira considera hediondo o crime que é cometido de forme brutal, horrível,
repugnante e que causa indignação às pessoas. Pode-se então chamar de
hediondas todas as condutas delituosas de excepcional gravidade, seja quanto
a sua execução, seja quanto à natureza do bem jurídico ofendido, bem como a
especial condição da vítima, que causam reprovação e repulsão.
A definição de crime Hediondo poderia ter ficado a cargo do sistema
judicial, mediante análise de cada caso concreto, más o legislador preferiu a
definição legal, enumerando de forma taxativa os tipos considerados
hediondos, sem qualquer critério científico.
3 – A LEI 8.072/90
A Lei dos Crimes Hediondos sofreu duras críticas após ser editada,
apresentando inúmeras questões controvertidas, como a proibição da
progressão de regime prisional. A referida Lei foi alterada pela de nº 8.930/94,
de 06 de setembro de 1994 que deu nova redação ao Art. 1º para incluir o
10
homicídio como Crime Hediondo. A inclusão do homicídio entre os crime
hediondos, de alguma forma, veio ao encontro de algumas posições
doutrinárias que não se conformavam com a sua não inclusão já na versão
inicial da Lei. Não se justificava a ausência do homicídio qualificado, sobretudo
se praticado com requintes de hediondez. Atende, sobretudo, aos anseios
populares, já que o projeto de Lei que deu origem à Lei 8.930 de 06 de
setembro de 1994, foi incentivado por mais de um milhão de assinaturas,
campanha liderada pela Escritora Glória Perez, mãe de atriz Daniela Perez,
assassinada de forma brutal no dia 28/12/92 e por Jocélia Brandão, mãe da
menina Miriam, seqüestrada e morta por dois rapazes em Belo Horizonte no
início de 1993. Nessa época o Movimento da Lei e da Ordem (Law and Order)
encontrava-se em expansão.
3.1 – DO MOVIMENTO DA LEI E DA ORDEM
o Movimento da Lei e da Ordem, com pressupostos ideológicos
conservadores, defende maior atuação do Estado na área penal, com penas
mais gravosas e leis mais severas para substituir as leis benignas.
Marisya Souza e Silva, em seu livro Crimes Hediondos & Progressão
de Regime Prisional, Edição 2007, pág. 43, afirma: O neoliberalismo inspirou o
Movimento da Lei e da Ordem, sob o manto de que é preciso reduzir a
crescente criminalidade violenta, camuflando ideologia repressiva e autoritária.
Maurício Antônio Ribeiro Lopes (2000, p. 484), citando Júnior Araújo,
relata que, a partir da guerra do Vietnã, o mundo vem assistindo a um
progressivo aumento da criminalidade e, que, nesse contexto, as autoridades
se aproveitaram para apresentar fórmula mágica contra a onda criminosa, qual
seja, o endurecimento do velho regime punitivo retributivo que agora dita uma
política criminal em que: a) a pena se justifica como castigo e retribuição; b) os
crimes atrozes sejam punidos com penas severas; c) as penas privativas de
liberdade por crimes praticados com violências sejam executadas em
estabelecimentos de segurança máxima; d) a prisão temporária tenha o seu
âmbito ampliado; e) as garantias processuais sejam minimizadas; f)haja
diminuição dos poderes de individualização do juiz e menor controle judicial na
execução penal.
11
Não resta a menor dúvida de que os efeitos de tal ideologia já se
fizeram sentir na esfera legislativa brasileira, especialmente com a edição da
chamada Lei dos Crimes Hediondos, que proibiu a liberdade provisória e a
progressão de regime prisional para todos os acusados ou autores de crimes
hediondos ou equiparados.
Inaceitável que em pleno Estado Democrático de Direito tenhamos que
conviver com um retrocesso que representa essa ideologia, pois defende um
direito penal autoritário, suprimindo garantias recentemente incorporadas à
vida do cidadão brasileiro. Os meios de comunicação trabalham na difusão do
pânico na sociedade, e os julgadores devem estar atentos para não serem
induzidos pelas leis inconstitucionais e pela opinião pública, pois é preciso
defender a democracia, a liberdade e os direitos e garantias constitucionais.
Inadmissível tamanho retrocesso, mesmo porque a lei penal e a processual
penal existem não só para assegurar ao Estado o direito de punir, mas também
para assegurar ao acusado o direito de não ser punido, a menos que seja
comprovado por prova inconteste ser o autor da conduta ilícita.
Zaffaroni, citado por Alberto Silva Franco (2000, p.98-99), dá a receita
autoritária do Movimento da Lei e da Ordem, afirmando: “Cria-se (inventa-se no
plano real) ou exalta-se um perigo social existente; extrai-se tal perigo do
contexto e se transforma em penal; torna-se total a luta ou a guerra contra
esse perigo e se subordina tudo a essa guerra. Com o tempo, o caráter
absoluto desmorona-se, na perspectiva histórica; a falsidade do discurso fica
na evidência, mas os poderes em jogo procuram um novo inimigo e os inimigos
do direito penal liberal retomam os velhos procedimentos, dentro do novo
discurso de guerra.”
A ideologia do movimento tem transferido para o juiz criminal a função
de policial, de guarda da segurança pública, mas essa função não lhe é
própria. No Estado Democrático de Direito, a missão do juiz criminal é zelar
pela aplicação das leis penais, mas com respeito à garantia da ampla defesa,
do contraditório e da isonomia, bem como, dos princípios constitucionais,
garantindo o respeito à dignidade da pessoa humana e a legalidade do
processo.
12
No Brasil, a Lei 8.072/90 é a prova de que lei severa e pena elevada
não reduzem a criminalidade. O efeito intimidativo da certeza da punição e da
sua rápida aplicação certamente é mais eficaz.
Modernamente a teoria da Lei Penal nos apresenta o Movimento da
Lei e da Ordem, Intervenção Mínima e o Abolicionismo.
3.2 – INTERVENÇÃO MÍNIMA
Assim como existe o Movimento da Lei e da Ordem de legitimação do
sistema penal, existem também os de deslegitimação do sistema penal, como
o da intervenção mínima ou minimalismo, que, na verdade, constitui etapa da
evolução do projeto de abolicionismo penal, embora defenda apenas a
redução do direito penal a um mínimo necessário, ou seja, que ele deve aterse apenas àquelas condutas particularmente danosas.
Em síntese, como afirma Mauricio Antônio Ribeiro Lopes (2000,
p.477),”Pode parecer razoável afirmar que o direito penal é um mal, mas um
mal necessário, inevitável, que se impõe racionalizar e minimizar”.
Portanto, os minimalistas entendem, contrariamente ao movimento
abolicionista, que o sistema penal não deve ser abolido, mas ter reduzido o
seu âmbito de atuação ao absolutamente necessário, retirando do sistema
punitivo condutas que ofendem bens jurídicos menos valiosos para a
convivência humana.
Inegável que o caminho é a progressiva restrição do direito penal, para
que cada dia seja menor sua incidência, com respeito aos direitos humanos e
utilização predominante de mecanismos preventivos, e não repressivos, para a
solução dos conflitos sociais, pois os direitos fundamentais devem ser
protegidos, mas em ultima hipótese, por meio do direito penal que, aliás, não
consegue resolver os conflitos que lhe são propostos para solução.
3.3 – ABOLICIONISMO
O anseio por liberdade sempre foi o sentimento que serviu como
combustível para os grandes movimentos sociais em todos os tempos e como
diz Louk Houlsman “Nós devemos querer nos livrar das prisões assim como
um dia quisemos nos livrar da escravidão”.
13
A aplicação de uma pena será sempre um sofrimento para o seu
receptor e deve ser evitada a todo custo, devendo o Estado lançar mão de
outros mecanismos para satisfação da ordem jurídica maculada.
Sob esse prisma floresceu a teoria do abolicionismo do direito penal,
sendo evidente que o modelo ideal de direito penal é aquele onde a aplicação
de uma sanção ao individuo não seja necessária.
O ideal seria vivermos em uma sociedade onde os conflitos de
natureza penal não existissem, onde as pessoas se respeitassem de tal forma
que a segregação do individuo fosse desnecessária.
A idéia de abolicionismo no direito penal tem um respaldo maior ou
menor de acordo com o índice de desenvolvimento humano (IDH) de uma
determinada sociedade. Assim sendo, se fossemos evoluídos o bastante, o
abolicionismo seria viável em sua plenitude e gradativamente diminuída a sua
aplicabilidade a medida que o nosso índice de desenvolvimento humano
decrescesse.
Um exemplo prático melhor esclarece o tema: Se numa dada
sociedade instala-se uma banca de jornais do tipo “pegue e pague”, onde o
individuo, sem fiscalização, deve retirar o seu jornal da banca e depositar uma
moeda correspondente ao seu valor em uma caixinha, e se no final do dia
verifica-se que os jornais foram adquiridos e pagos integralmente, tal fato é
indicativo de que aquela sociedade está apta a receptividade do abolicionismo.
Por outro lado, se numa outra sociedade, onde a mesma banca de jornais fora
instalada, verifica-se ao final do dia que todos os jornais foram subtraídos,
inclusive a caixinha e a própria banca, é improvável que tal sociedade fosse
receptiva ao abolicionismo.
Assim sendo, o abolicionismo do direito penal tem sua aplicabilidade
indicada para sociedade mais evoluídas, como por exemplo a Suíça, o Norte
da Europa, o Canadá, sendo que em sociedades como a nossa,
principalmente se considerarmos as cidades mais violentas como o Rio de
Janeiro, o abolicionismo torna-se de aplicabilidade problemática.
Há que se distinguir, entretanto, que mesmo no Brasil, apesar da
violência, a receptividade do abolicionismo é viável em determinados crimes
14
como o do colarinho branco, principalmente no que se refere aos desvios de
recursos públicos, falta de recolhimento de tributos e outros tantos que não
envolvam a violência, mesmo porque o poder público dispõe de meios
coercitivos de restabelecer a ordem jurídica, principalmente se ele atingir o
recalcitrante no que ele mais venera, o dinheiro, os bens, enfim, o patrimônio
daquele que enveredou-se por caminhos errados. Ora!, se o individuo deixou
de recolher os tributos devidos, talvez não seja necessário responder por crime
de estelionato, pois o direito civil ou o direito administrativo pode dar a resposta
necessária com o pedido de ressarcimento, a perda de bens e outros
instrumentos que não represente a segregação do individuo e a perda de sua
liberdade ambulatorial.
O que realmente preocupa atualmente na nossa sociedade é o
crescente aumento da violência que vai na contra mão do abolicionismo penal.
Numa sociedade onde despontam figuras abomináveis como: “Elias Maluco,
Fernandinho Beira-Mar, Marcola” e outros tantos que chegam ao descalabro
de afrontarem o poder público com atitudes que exigem uma resposta eficaz.
Alguns argumentam que as prisões têm a finalidade de recuperar o
individuo, ressocializá-lo e torná-lo apto a viver novamente em sociedade, não
tendo a pena o caráter retributivo ou de expiação, não tendo a natureza da Lei
de Talião “olho por olho, dente por dente.”, mas um mal necessário. Outros
tantos argumentam que as prisões não recuperam, antes, viciam e degradam o
individuo e no Brasil são vistas como verdadeiras escolas do crime onde uma
população carcerária vive amontoada em espaços exíguos, promíscuos e
fétidos que agridem a dignidade humana.
Evidentemente tais argumentos são absolutamente verdadeiros, mas
enquanto não se corrige o sistema carcerário brasileiro não vemos como deixar
de segregar naqueles estabelecimentos os criminosos violentos contumazes e
de recuperação improvável ou mesmo que sejam receptivos ao abolicionismo
penal.
3.4 – CRIMES HEDIONDOS: O IDEAL E O RAZOÁVEL
O Professor Paulo Sergio de Oliveira, Advogado Criminalista, publicou
matéria no IBCCRIM – ano 13 – nº 161 – ABRIL - 2006 que aborda o tema
15
com a seguinte opinião: Há muito que as pessoas comprometidas com a
Constituição Federal combatem a hedionda Lei nº 8.072/90. Inúmeras são as
criticas à norma. Uma que ganhou destaque nos últimos tempos se refere a
proibição de progressão de regime. Pois bem, no julgamento do Hábeas
Corpus nº 82.959, o pleno do Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos,
declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei
nº 8.072, de 25 de julho de 1990, nos termos do voto do relator. E ainda por
votação
unânime,
“explicitou
que
a
declaração
incidental
de
inconstitucionalidade do preceito legal em questão não gerará conseqüências
jurídicas com relação às penas já extintas nesta data, pois esta decisão
plenária envolve, unicamente, o afastamento do óbice representado pela
norma ora declarada inconstitucional, sem prejuízo da apreciação, caso a
caso, pelo magistrado competente, dos demais requisitos pertinentes ao
reconhecimento da possibilidade de progressão”.
Cumpre afirmar que parte dos senhores ministros que compõe a
Suprema Corte já vinham concedendo liminares autorizadoras de progressão
de regime em diversos hábeas corpus. Alegavam que a matéria estava em
discussão pelo pleno da Corte e que enquanto se aguardava a decisão,
concediam-se as liminares e sobrestavam-se os autos até o julgamento do
hábeas corpus acima mencionado.
Pois bem, instalou-se, nacionalmente, nova discussão: alguns,
fomentados pelo Movimento da Lei e da Ordem (Law and Order), defendem
que se crie (ou modifique) lei, vindo, então, novos dispositivos que proíbam
progressão de regime, que se elevem as penas, que se aumente o rol dos
chamados crimes hediondos, e por aí vai.
De outro lado, há quem defenda a extinção total da lei, idéia esta que
nos parece mais lúcida, já que ela, por si só, tem natureza hedionda.
Sobram críticas à famigerada lei, entre as quais podemos citar a falta
de definição do termo “hediondo”. Alberto Silva Franco afirma que esta é a
inconstitucionalidade central da lei, pois o legislador, ao invés de empreender a
tarefa definidora, apresentou um cardápio; o mesmo doutrinador aponta ainda
outras inconstitucionalidades: deformidade tipológica, decorrente da não
16
definição do conceito hediondo; “tumulto no sistema de cominação punitiva,
possibilitando punições desproporcionadas, incoerentes, absurdas”; “a inclusão
do indulto na lei infraconstitucional (art. 2º, nº 1 da Lei nº 8.072/90)”; “a delação
premiada”; “a aplicação, em algumas hipóteses (157 § 3º, 158 § 2º, 159 § 3º e
224 do CP) da causa de aumento do art. 9º da Lei nº 8.072/90”;
“inaplicabilidade da lei nº 8.072/90 aos crimes militares” e ainda “a proibição da
liberdade provisória”.
Contudo, ainda que a revogação da Lei nº 8.072/90 seja o nosso
sonho, nós,, que remamos contra a maré do Movimento da Lei e Ordem, temos
de ter os pés no chão para darmos passo a passo, milimetricamente, de forma
estratégica e calculada. Ainda estamos longe desta conquista, mas demos um
passo à frente nessa nossa utopia e precisamos cuidar muito para não
sofrermos um revés.
Usando palavras de Amilton Bueno de Carvalho, vivemos sob o signo
do
Movimento
da
Lei
e
da
Ordem.
A
mídia
de
massa
trabalha
ininterruptamente para fazer as pessoas acreditarem que leis solucionarão o
problema da violência. A dramatização da violência gera o estado policialesco.
Ou seja, fomentados por esse movimento, o povo acredita que mais leis – e
estas mais severas – podem acabar com a criminalidade. E pior, as garantias
dos cidadãos podem ser suprimidas em nome deste estado policialesco –
surgem, então, os “terroristas do direito penal”. Este, sem dúvida, é o nosso
momento!
Traduzindo: a declaração de inconstitucionalidade da proibição de
progressão de regime contida na hedionda lei é trabalhada como um ato de
insanidade do Supremo Tribunal Federal. Vende-se, à população, a imagem de
que abriram as portas de todas as cadeias e liberaram todos os estupradores,
seqüestradores, homicidas, etc.
A partir daí, alguns setores desta sociedade já se mobilizaram para
exigir do Congresso Nacional uma resposta rápida e firme para o “caos
anunciado”. Mais uma vez, a marca do Movimento da Lei e da Ordem:
esquizofrenia legislativa; separação do mundo entre bons e maus; busca-se a
destruição do outro. Partindo desse quadro fático, antes de continuarmos
17
nossa luta para alcançarmos o ideal de revogação da lei, temos uma briga
enorme para conseguirmos manter o estado atual. Briga esta, ao que nos
parece, em vão. Explica-se: a pressão no (e do) Legislativo se mostra tão forte,
que haverá uma resposta legislativa ao decisum do Excelso Pretório.
Como bons estrategistas, seria razoável darmos um pequeno passo
para trás para não sofrermos tamanha derrota. Esse passo nada mais seria do
que trabalhar para que se crie uma progressão de regime mais demorada do
que a forma existente para os demais tipos penais, aqueles que não
receberam a “etiqueta de hediondo”.
A idéia é defendida por Silva Franco. Sugeriu o ilustre doutrinador que
os condenados por crimes hediondos tivessem a progressão de regime após o
cumprimento de um terço da pena.
Esta idéia nos parece razoável devido a todos os fatores que
descrevemos acima. E, entre o ideal e o razoável, o momento nos força a
defender o razoável.
Mas
não
podemos
deixar
nosso
sonho
esquecido.
Apenas
aguardemos o momento oportuno para garantirmos novas conquistas. “Focos
de resistência” que somos, devemos acreditar sempre na utopia, que como já
escreveu Eduardo Galeano citando o cineasta argentino Fernando Birri: “La
utopia está em el horizonte. Camino dos pasos, ella se aleja dos pasos.
Camino diez pasos y el horizonte se corre diez pasos más Allá. Entonces
para que sirve la utopia? Para eso, sirve para caminar”.
3.5 – A INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º, DO ART.2º DA LEI
8.072.
É necessário que a elaboração da lei penal seja um ato de serena
reflexão e extrema cautela, não podendo ser produto de estados emocionais
individuais ou coletivos, provocados por fatos que suscitem maior reprovação e
reações pessoais instintivas de caráter vingativo.
Merecem a maior consideração e respeito os sentimentos e a justa
revolta de todos quantos tenhamos vítimas da impiedosa violência, que elimina
18
a vida de pessoas absolutamente inocentes. Contudo, a lei penal não pode ser
feita em função de abaixo-assinados, por mais respeitáveis que sejam os
sentimentos que os inspirem. Deve-se lembrar que o rigor da Lei 8.072, obtido,
anteriormente, por via de abaixo assinado, não evitou a ocorrência de crimes,
previstos naquela lei, os quais se repetiram, causando a dor e a saudade dos
que, agora, reeditam o recurso do abaixo assinado.
O que poderia reduzir o crime e a violência seria a mobilização da
sociedade, não para exigir leis mais severas, que já existem, mas sim, para
exigir vontade política a fim de retirar da rua os menores, órfãos de tudo, que
não têm, no presente, nem terão, no futuro, qualquer motivo para respeitar as
pessoas e seus bens; bem como, para evitar o desespero dos pais, que não
podem dar de comer a seus filhos, em razão do desemprego. Imediatamente,
urge evitar a impunidade, não mediante episódicas forças-tarefas, mas
sempre, pela efetiva aplicação e execução das penas, observadas as normas
constitucionais.
Jair Leonardo Lopes, Professor titular de Direito Penal aposentado da
Faculdade de Direito da UFMG, publicou o seguinte artigo no Boletim IBCCRIM
– ano 13 – nº 161 – abril – 2006: “Como é sabido, a nossa ordem jurídica
funda-se sobre o primado da Constituição, significa isso que o Congresso
Nacional não pode fazer lei com qualquer disposição que contrarie a
Constituição. Quando tal contrariedade ocorre, o Poder Judiciário não só pode
como deve declarar a lei ou parte dela inconstitucional e, a partir de tal
declaração,
a
lei
ou
parte
dela
deixa
de
ser
aplicável.
Havendo
incompatibilidade entre a Constituição e a lei ou parte dela, esta é que deve
perder a sua eficácia.
É certo que a constituição, também, pode ser modificada, mas, para
modificá-la são necessários três quintos dos votos dos membros da Câmara e
do Senado (art. 60, § 2º, da própria Constituição). Contudo, há normas
constitucionais consideradas tão importantes que não se alteram nem mesmo
pela unanimidade dos votos de todos os membros do Congresso Nacional.
Elas formam um conjunto especial, agrupado em um capítulo denominado “Dos
Direitos e Garantias Individuais” e o art. 60 § 4º, da própria Constituição, diz
19
que “não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir
os direitos e garantias individuais”. Somente por uma Assembléia Nacional
Constituinte, cujos membros tivessem sido eleitos para elaborar outra
Constituição, seria possível, em tese, desde que se tratasse da implantação de
uma ditadura, surgir alguma disposição contrária aos direitos e garantias
individuais.
Isto posto, a disposição constitucional que institui a “individualização da
pena” está situada entre as garantias individuais e, como tal, só pode ser
alterada por uma Assembléia Nacional Constituinte. Daí, a razão pela qual as
normas dos direitos e garantias individuais são qualificadas como “pétreas”,
porque, em princípio, são imutáveis pelo legislador não investido de poderes
constituintes e cuja competência se restringe às suas atribuições legislativas
comuns (arts. 48 e 49, da CF).
Ao Supremo Tribunal Federal, composto de onze ministros de notável
saber jurídico e reputação ilibada (art. 101, da CF), compete, precipuamente, a
Guarda
da
Constituição,
incumbindo-lhe
fazer
respeitar
as
normas
constitucionais e, conseqüentemente, negar validade àquelas que as
contrariem, declarando-as inconstitucionais.
No pleno e regular exercício desta competência, o Supremo Tribunal
Federal houve por bem declarar a inconstitucionalidade do § 1º, do art. 2º, da
Lei nº 8.072. A decisão não fora tomada na primeira vez que os senhores
ministros assentaram-se para examinar a espécie, pois os votos só foram
proferidos depois de “pedidos de vista”, o que quer dizer que se suspendeu o
julgamento, sucessivamente, para que o ministro pudesse ter em suas mãos o
processo, para exame mais acurado e prudente formação de seu
convencimento.
Depois de muita discussão e demorada reflexão, os ministros
concluíram pela inconstitucionalidade daquele texto legal, porque se chocava
com o art. 5º, inciso XLVI, da Constituição, que consagra o princípio da
individualização da pena.
Não é exato, também, que tenham os senhores ministros, por esta só
decisão, escancarado as portas dos presídios e das cadeias públicas, pondo
20
na rua todos os condenados por crimes hediondos, como alguns parecem
supor. Em primeiro lugar, o Supremo Tribunal Federal não mandou soltar
qualquer condenado. Limita-se a Excelsa Corte, por seus ilustres membros, a
declarar inconstitucional a proibição de progressão no regime de cumprimento
da pena privativa de liberdade. Porém, a progressão é, apenas, um dos
requisitos legais para que o condenado possa ser transferido de um regime de
cumprimento de pena mais rigoroso para outro menos rigoroso.
Compete, agora, aos juízes da execução, em cada caso, verificar se o
condenado reúne os demais requisitos para obter a progressão. O bom
comportamento carcerário é um destes requisitos, o qual não se “inventa’, de
um momento para o outro, porque deve ter sido demonstrado durante o
cumprimento de ao menos um sexto da pena. Note-se que, exigindo a lei, ao
menos um sexto de cumprimento da pena, nada impede que o juiz, para formar
sua convicção sobre o comportamento do condenado, possa, se julgar
necessário, exigir dele maior tempo de permanência no regime anterior, para
julgar o pedido de progressão (art. 112, da Lei de Execução). Além disso, o
magistrado pode não se convencer da conveniência de conceder a
progressão, considerando a personalidade do agente, sua motivação para o
crime cometido, enfim, o grau de reprovação da conduta e o merecimento do
condenado. A sua decisão, concessiva, ou não, será sempre motivada e
precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor (art. 112 § 1º
da Lei de Execução).
Concedida a progressão para o regime semi-aberto, ao contrário do
que se fez constar, o condenado não fica “durante o dia fora da penitenciaria e
retorna a noite”. Isso pode acontecer quando o condenado cumpre pena em
regime aberto e não em semi-aberto. No regime semi-aberto, são de fato,
admitidos alguns benefícios com o objetivo de tentar a readaptação social do
condenado, tais como saídas temporárias, para visita a família, freqüência a
cursos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior, porém,
tais benefícios dependerão de comportamento adequado, cumprimento mínimo
de um sexto da pena, se o condenado for primário e um quarto, se reincidente,
e compatibilidade do benefício com os objetivos da pena. Para a freqüência a
21
curso, o tempo de saída será o necessário para o cumprimento das atividades
discentes e, se o condenado for punido por falta grave, desatender as
condições impostas na autorização ou revelar baixo grau de aproveitamento do
curso, o benefício será automaticamente revogado (art. 124, parágrafo único e
125, ambos da Lei de Execução).
Se o condenado por um crime hediondo chegar ao regime aberto, não
é verdade, também, que vá cumprir a pena em regime domiciliar, como se
afirma alhures. O recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência
particular somente se admitirá quando se tratar de: I – Condenado maior de
setenta anos; II – condenado acometido de doença grave; III – condenada com
filho menor ou deficiente físico ou mental; IV – condenada gestante” (art. 117,
da Lei de Execução).
Alguns juízes e tribunais têm admitido, excepcionalmente, onde não
exista a casa de albergado ou estabelecimento adequado, o recolhimento em
residência particular do condenado sujeito ao cumprimento da pena em regime
aberto. Mas, o condenado por crime hediondo jamais se enquadra nesta
situação, pela razão muito simples de que não teria sido condenado a cumprir
pena em regime aberto, mas, sim, em regime fechado.
Está, pois, bem claro que o Supremo Tribunal Federal, ao admitir a
progressão, cumpriu o seu dever precípuo, que é o de eliminar as normas que
se choquem com o texto constitucional, especialmente com as do capítulo dos
direitos e garantias individuais, tal como aquela do § 1º do art. 2º da Lei 8.072,
que afrontava a garantia da individualização da pena, porque impunha ao juiz
indicar, para todos os condenados por crime hediondo, o mesmo regime
fechado de cumprimento da pena, qualquer que fosse o grau de sua
culpabilidade, seus antecedentes, sua conduta social, sua personalidade, seu
motivo, e as demais circunstâncias e conseqüências do crime, bem como o
comportamento da vítima, com o que se ignoravam, também, os critérios
estabelecidos para determinar o regime inicial de cumprimento de pena,
previsto no § 3º do art. 33, do Código Penal.
22
4 – RECENTES MODIFICAÇÕES
Recentemente foi sancionada a Lei nº 11.464, de 28/03/2007, que deu
nova redação ao Art. 2º da Lei 8.072
de 25/07/90, com as seguintes
modificações:
O Art. 2º estabelecia que os crimes hediondos, a prática de tortura, o
tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis
de anistia, graça, indulto, fiança e liberdade provisória.
A recente Lei 11.464, retirou a liberdade provisória do inciso II e assim
sendo, concedeu o direito ao benefício da liberdade provisória ao acusado por
aqueles crimes.
Estabeleceu ainda a Lei 11.464 que a pena por crime previsto neste
artigo será cumprida inicialmente em regime fechado. Como se vê, o § 1º
anteriormente determinava que a pena seria cumprida integralmente em
regime fechado.
No § 2º a nova redação estabelece que a progressão de regime, no
caso dos condenados aos crimes previstos neste artigo, dar-se-a após o
cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5
(três quintos), se reincidente.
Como se vê, a nova lei concede ao condenado o direito a progressão
de regime que anteriormente era proibido e que tanta discussão causou,
reinserindo o direito a individualização que anteriormente negado, deu causa a
taxação de inconstitucional
4.1 – LIBERDADE PROVISÓRIA
Com relação as recentes modificações podemos afirmar que a
liberdade provisória, bem como a fiança, visa retirar o acusado da prisão,
quando ela não se apresenta necessária para o bom andamento do processo,
e também quando se quer evitar que o acusado receba punição antes da
condenação. Mas com o advento da lei dos Crimes Hediondos, tal direito
subjetivo foi negado ao acusado desses crimes.
Ocorre que a Constituição Federal, em seu Artigo 5º, inciso LXVI,
dispõe que “Ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei
23
admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”. A prisão é exceção, a regra
é a liberdade, condição natural do ser humano e direito fundamental
assegurado constitucionalmente.
A Lei dos Crimes Hediondos vedou expressamente a liberdade
provisória para os referidos delitos e os a eles equiparados. Os Tribunais
Superiores têm decidido, de forma majoritária, que a prisão cautelar não fere
os incs. LXVI e LVII do art. 5º da Constituição Federal e garantia da presunção
de inocência.
Hábeas Corpus. Prisão cautelar decorrente de pronúncia. Crime
hediondo. Liberdade provisória. Impossibilidade. Paciente com bons
antecedentes e residência fixa. Irrelevância. O art. 2º, inc. II, da Lei
8.072/90, veda a concessão da liberdade provisória ao réu pronunciado por
crime hediondo como é o caso do homicídio qualificado, mesmo na forma
tentada. As circunstâncias pessoais do agente, como bons antecedentes,
residência fixa e ocupação lícita, não garantem ao acusado a benesse de
responder ao processo em liberdade se outros elementos constantes nos
autos certificam sua periculosidade para com a sociedade. Ordem denegada.
(HC 28.967/SP – 6ª T. – Rel. Min. Paulo Medina – DJ 10.11.2003, p. 217).
A prisão provisória em crimes denominados hediondos é necessária?
Sim, mas somente quando presentes os elementos autorizadores da prisão
preventiva, prevista no art. 312 do Código de Processo Penal. Na verdade, tal
medida impositiva da lei é arbitraria, porque trata os desiguais de forma igual,
afrontando o princípio da dignidade da pessoa humana e do devido processo
legal, segundo o qual ninguém será privado de sua liberdade sem o devido
processo legal, ampla defesa e contraditório (CF/88, art. 5º, inc. LIV).
A prisão provisória nos crimes hediondos acaba sendo uma
antecipação do cumprimento de eventual pena a ser aplicada, o que não é
justo, porque, se o acusado for absolvido, que é que vai lhe devolver o direito
de ter emprego, casa, amigos e uma vida digna? O Estado.
24
De fato, a proibição do gozo de tal benefício tem por objetivo dizer à
sociedade que os acusados pela prática de crimes graves não serão liberados,
deixando cair por terra o chavão comum de que a polícia prende e o Judiciário
libera, além de servir de exemplo e resposta ao clamor popular pela redução
da criminalidade.
Assim como na vedação da progressão de regime, há divergências
sobre a interpretação quanto à constitucionalidade ou inconstitucionalidade do
art. 2º, Inc. II, da Lei 8.072/90, que vedou a liberdade provisória aos autores de
crimes hediondos.
Sobre a inconstitucionalidade, veja-se a decisão do Superior Tribunal
de Justiça:
“Não foi dado ao legislador ordinário legitimidade constitucional para
vedar, de forma absoluta, a liberdade provisória quando em apuração crime
hediondo e assemelhado. Inconstitucionalidade do art. 2º, II, da Lei 8.072/90. A
manutenção da prisão em flagrante deve, necessariamente, ser citado em um
dos motivos constantes do art. 312 do Código de Processo Penal e, por força
dos arts. 5º, XLI e 93, IX, da Constituição da República, o magistrado, ao negar
a liberdade provisória, está obrigado a apontar os elementos concretos
mantenedores da medida. (RHC 15.478/MG – 6ª T. – Rel. Min. Paulo Medina –
j. em 06.04.2004 – DJU 10.05.2004, p. 347).
Como se vê dos julgados acima, a negação da liberdade provisória já
era considerada inconstitucional e a recente modificação da lei concedendo o
benefício veio sanar o problema.
4.2 – REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA
A Constituição Federal garante aos condenados a individualização da
pena (art. 5º, inc. XLVI), individualização esta que se opera tanto no plano
legislativo (elaboração e aprovação da lei), quanto no de sua aplicação
25
(individualização – art. 59 do CP) d no de sua execução (individualização
executória).
O inc. XLVIII do art. 5º da Constituição Federal dispõe que a pena
deverá ser cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza
do delito, idade e sexo do apenado. Ora, não resta a menor dúvida de que o
legislador aqui reafirmou que a individualização da pena alcança sua
execução.
Maria Lucia Karam (1991, p. 190) observa que a determinação do
regime inicial do cumprimento da pena é um dos aspectos do princípio da
individualização da pena, e que também a exposição de motivos da parte geral
do Código Penal esclarece que “Cabe ao juiz fixar o regime inicial de
cumprimento da pena privativa de liberdade, fator indispensável da
individualização que se completará no curso do procedimento executório”.
A progressão de regime, além de constituir um direito do apenado,
representa também um compromisso com o princípio da humanidade, que
deve reger a execução penal. Constitui hoje medida de segurança pública,
porque, se o condenado não tem assegurado esse direito, somente lhe restam
rebeliões e fuga, pois os estabelecimentos penitenciários não oferecem sequer
condições mínimas de higiene e sobrevivência. Os políticos passam a idéia de
que a situação se encontra sobre controle, mas a verdade não é essa.
O § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, ao proibir a progressão de regime de
cumprimento das penas por crimes hediondos ou assemelhados, ofende o
princípío da individualização da pena. Ademais, a regra é injusta, porque
obriga o juiz a deixar de examinar os fatores subjetivos que levaram o autor a
cometer o delito, tratando de forma diferente os condenados por crimes
hediondos, uma vez que subtrai deles o direito de terem esperança de retorno
ao convívio social.
O direito à individualização da pena encontra-se entre os direitos e
garantias fundamentais do cidadão; é um imperativo constitucional que deve
ser observado sempre, não devendo ser suprimido por lei infraconstitucional,
como ocorreu com o advento da Lei dos Crimes Hediondos.
Sobre a matéria, assim leciona Nelson Messias Morais (2000):
26
“Não pode, assim, o legislador ordinário romper com o sistema da
progressão do regime de cumprimento da pena, sendo inconstitucional o §1º
do art. 2º da hedionda Lei 8.072/90, devendo por isso, ser eliminado do mundo
jurídico, uma vez que viola todo um sistema. Ressalta-se, ainda, que um dos
maiores incentivos que o condenado tem para a sua correção de conduta é a
progressão de regime, o que o leva a ater um bom comportamento, visando à
oportunidade de se reinserir no meio social. É incongruente não dar a
progressão de regime, ao final da pena, reintroduzir o condenado na sociedade
sem a sua preparação, quando da concessão do livramento condicional após o
cumprimento de 2/3 da pena.
Paralelamente à constitucionalidade ou não, da norma, vê-se a
contradição estabelecida pelo legislador ao negar a progressão de regime e,
ao mesmo tempo, autorizar o livramento condicional, esquecendo-se de que
ele, na verdade, é a última etapa do sistema progressivo de cumprimento da
pena privativa de liberdade.
Logo, se a intenção era negar a progressão, por coerência também
deveria ter sido suprimido o direito ao livramento condicional, em qualquer
hipótese, para os crimes hediondos. Por outro lado, pode ser que o legislador
não tinha a intenção de prever o regime integralmente fechado, e sim, o
inicialmente fechado, razão pela qual estabeleceu o livramento condicional
para os crimes hediondos, o que poderia refletir uma
coerente política
criminal.
Marco Aurélio de Melo, em artigo publicado no IBCCRIM 8 (1994, p.
100) afirma que:
A principal razão de ser da progressividade no cumprimento da
pena não é em si a minimização desta, ou o benefício indevido, porque
contrário ao que inicialmente sentenciado, daquele que acabou perdendo
o bem maior que é a liberdade. Está, isto sim, no interesse da
preservação do ambiente social, da sociedade, que, “dia menos dia”
receberá de volta aquele que inobservou a norma penal e, com isto, deu
margem à movimentação do aparelho punitivo do Estado.
27
Observa-se ainda que as restrições impostas aos crimes hediondos e
assemelhados foram contempladas pela própria Constituição Federal, não
cabendo ao legislador infraconstitucional ampliar tal rol, principalmente quando
afronta
direitos
e
garantias
fundamentais
do
cidadão
e
princípios
constitucionais como o da individualização, o da humanidade e o da
proporcionalidade da pena.
Alberto Silva Franco (2000, p. 164-165) afirma que três são os
objetivos da execução da pena: diminuição gradativa do tônus da pena; o
estímulo à boa conduta e a obtenção paulatina da reforma moral do recluso e
sua conseqüente preparação para a vida em liberdade, e que o sistema
progressivo deve ser sempre observado na fase da execução para
proporcionar a passagem de uma fase mais rigorosa para outra menos severa.
Afigura-se mais coerente o entendimento de que o legislador ordinário
não pode dispensar tratamento diverso à execução da pena do crime de
tortura que não seja extensiva aos crimes hediondos e assemelhados,
porquanto receberam igual tratamento constitucional e foram equiparados.
Assim, seja com fundamento na inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º,
da Lei 8.072/90, seja na ofensa ao princípio da igualdade com o advento da Lei
de Tortura, o melhor caminho, isto é, aquele que observa os princípios e
garantias asseguradas na Constituição é que o Juiz de Direito, no caso
concreto, reconheça e aplique a progressão de regime de cumprimento da
pena aos delitos hediondos e assemelhados. Essa tem sido a posição adotada
por alguns magistrados, embora a grande maioria acompanhe entendimento
dos Tribunais Superiores pela não progressão de regime.
Como se vê, a nova mudança promovida pela Lei 11.464 de
28/03/2007, determinando no art. 2º, § 1º, que a pena por crime previsto neste
artigo será cumprida inicialmente em regime fechado, permitindo, portanto, a
progressão de regime, veio de encontro a inúmeros julgados que já acolhiam
tal entendimento.
28
5 – PALAVRAS DO MESTRE
O professor Antonio Lopes Monteiro, comentava em seu livro “Crimes
Hediondos – Textos, Comentários e Aspectos Polêmicos” da Editora Saraiva –
3ª Edição, páginas 4 e 5: “Ainda é cedo para se saber se a lei dos crimes
hediondos atingiu o objetivo de diminuir a criminalidade e criar um clima
de maior segurança na população. Não é o simples aumento da pena que
vai resolver o problema, embora, talvez, momentaneamente, nos dê a
sensação de amenizá-lo. Até que a certeza da impunidade continue
arraigada na mente do criminoso, até que a demora na persecução
criminal e o medo das vítimas reconhecerem seus algozes levem ao
fracasso a ação penal em grande números de casos; em suma, até que
não haja uma profunda reforma no trato da questão criminal, começando
pelo inquérito policial, até ao sistema penitenciário, reforma essa que
traga uma confiável investigação policial e uma certeza da imediata
condenação e real cumprimento da pena, continuaremos a assistir a
edição de leis como a de nº 8.072/90, de muita polêmica e pouca eficácia”.
Essas palavras do professor Antonio Lopes, constam na 3ª edição do
seu livro – 1995, época em que ele julgava ser cedo para saber se a Lei dos
Crimes Hediondos alcançaria o seu objetivo como instrumento de combate ao
crime e consequente diminuição da criminalidade.
A grande maioria dos estudiosos e doutores do direito não são
simpáticos a Lei dos Crimes Hediondos, alguns já publicaram verdadeiros
libélolos acusatórios contra ela, como já verificamos nesse trabalho, muitas
críticas se seguiram desde a edição da referida lei e todas elas sempre
caminhavam numa direção comum, que é o argumento de que o aumento do
rigor da lei não conseguirá diminuir a criminalidade. A professora Marisya
Souza e Silva, no seu livro sobre o tema – Edição 2007 – pág. 166, faz sua
crítica nos seguintes termos:
“A Lei dos Crimes Hediondos confirma tendência da última década de
adoção de política criminal mais repressiva do Estado com o fim de demonstrar
29
sua eficiência e capacidade de oferecer segurança à população, por seu poder
de punir. E, também, a força da mídia no nosso meio, tanto que, quando uma
intensa campanha foi feita, com o apoio da mídia, a proposta de inclusão do
homicídio qualificado no rol dos crimes hediondos foi votada e aprovada, com a
edição e promulgação da Lei 8.930 de 06.09.1994.
A política criminal adotada nos dias atuais é a do Movimento da Lei e
da Ordem, sustentando que as leis penais de extrema severidade são a
solução para todos os males da sociedade, numa tentativa infrutífera de
compensar a falta de política social e econômica justa, limitando-se a tentar
combater os efeitos de problemas sociais, sem buscar e atacar suas causas.
Essa lei foi promulgada sob forte clamor e pressão, e padece de
inúmeros defeitos de forma e conteúdo, a maioria já mencionada, alguns
originários do próprio texto constitucional.
O Estado, atualmente, tem diminuído suas áreas de atuação, mas, por
outro lado, tem ampliado sua atuação no campo da repressão penal, com o
aumento da produção de normas penais, cada vez mais amplas e rígidas, a fim
de transmitir uma falsa sensação de segurança. As normas penais não
possuem, entretanto, capacidade de transformar a realidade social do país,
que, devido à pobreza e às desigualdades sociais, tem sofrido crescente
aumento da violência e da criminalidade.
Hoje, podemos responder ao Professor Antonio Lopes Monteiro que
em 1995 tinha dúvidas se a lei dos crimes hediondos atingiria o objetivo de
diminuir a criminalidade. Hoje, com certeza, passados doze anos, podemos
afirmar que houve um aumento substancial da criminalidade.
Não concordo com aqueles que acham que o aumento da pena não
implica na diminuição da criminalidade, pois é ponto pacífico de que o que
inibe o homem a prática de um determinado ato é a reprovação pela lei e a
infligência de uma pena.
O Jornal “O Globo”, de 28 de fevereiro de 2007, página 03, publica um
quadro sobre a evolução da violência, demonstrando que no período
compreendido na década de 1994 a 2004, verificaram-se as seguintes
alterações:
30
1994
2004
VARIAÇÃO
Homicídios na população total
32.603
48.374
+ 48,4 %
Jovens de 15 a 24 anos
11.330
18.599
+ 64,2 %
Como se vê, houve um aumento significativo da violência, isso
entretanto não significa, a meu ver, que a lei de crimes hediondos não tenha
alcançado seu objetivo, muito pelo contrário, sem ela provavelmente o quadro
acima seria bem pior, pois o aumento da pena, se não serviu para inibir a
prática do crime, seu cumprimento, com certeza irá segregar por mais tempo,
no cárcere, o criminoso, retirando-o das ruas por mais tempo, o que
incontestavelmente dificulta-o a praticar novos crimes.
Evidentemente que a segregação do preso deveria ocorrer de forma
humana e adequada para que ele pudesse retornar ao convívio da sociedade
recuperado.
O coronel Manuel Montesinos e Molina, percursor na Espanha do
tratamento digno, foi um dos maiores e mais competentes crítico do sistema
prisional convencional, defendendo com empenho um tratamento penal
humanitário. Em 1835 foi nomeado Governador do Presídio de Valença e, com
sua força de vontade e capacidade de influenciar, aliadas a sua autoridade
moral, conseguiu reduzir para percentual irrisório, ou quase desaparecer, a
reincidência que era alta.
Montesinos defendeu o sentido reeducativo e ressocializador da pena,
criando um sistema de trabalho em que o preso era remunerado e não
explorado, e suprimiu os castigos corporais, estabelecendo apenas regras
disciplinares severas, mas humanas. Ele rejeitava o regime celular, admitia a
autorização de licença para saídas do presídio, estimulava a separaçãode
presos por grupos. Difundiu idéias que deram origem ao regime aberto.
31
Em seu trabalho prático Montesinos conseguiu despertar a consciência
de disciplina do preso, mediante incentivo de desenvolvimento das relações
com os reclusos, fundada no sentimento comum de confiança e estímulo.
Acreditava na possibilidade de reorientar o próximo e de reeducá-lo
moralmente, por isso defendeu na prática o respeito pela pessoa do preso e
sua dignidade (princípio da dignidade), razão pela qual nenhuma das sanções
disciplinares podia ter caráter de infâmia ou desonra. Defendeu a necessidade
de se criar um código interno disciplinar dos presídios, a fim de que até para a
mais leve falta fosse estabelecida a disciplina correspondente. Neste aspecto
seus argumentos são ainda atuais, visto que o poder de punir deve reger-se
pelo princípio da legalidade, ou seja, deve ser fixada previamente a pena ou
sanção para a conduta combatida.
O Coronel Montesinos e Molina acreditava que a prisão devia tentar
recuperar o preso, procurando devolver à sociedade um homem honrado e
trabalhador, embora naquela época, e ainda hoje, a maioria da população
defenda a idéia de que a prisão deve proporcionar sofrimento, isolamento e
muito trabalho ao delinqüente.
Montesinos defendia a idéia, que ainda se mantém viva, de que o
trabalho é o melhor instrumento reabilitador do preso, mas que deve ser
remunerado para despertar o interesse do recluso pela atividade produtiva.
Ele, além de teórico, executou suas idéias, e elas funcionaram tão bem que
incomodaram os trabalhadores livres, artesões e fabricantes, em razão da
competição comercial, da excelente qualidade dos produtos fabricados no
presídio e da menor carga de impostos das industrias prisionais. Pressionado,
o Governo atendendo aos clamores dos seguimentos sociais insatisfeitos,
enfraqueceu o trabalho prisional, diminuindo a matéria-prima e a qualidade,
tornando-o ineficiente e improdutivo, numa clara demonstração de que a
sociedade quer apenas o delinqüente isolado do convívio social e não, a sua
recuperação e reinserção na sociedade. Assim, após brilhante trajetória e
grandes feitos para o sistema prisional mundial, Montesinos sofreu inúmeras
contrariedades, sendo a primeira, a falência do sistema produtivo no presídio
de Valencia, levando-o a pedir demissão do cargo no ano de 1854.
32
Montesinos foi pioneiro a abominar o sistema celular, num período em
que ele gozava de grande prestígio e era amplamente aplicado. Considerava
que o isolamento do recluso em uma cela apenas propiciava a desmoralização
dele e muitas das vezes o levava à loucura ou ao suicídio, nunca, a
ressocialização. Foi o primeiro a admitir a concessão de saídas aos reclusos
do presídio pelos mais variados motivos e entendeu positiva a integração de
grupos semelhantes, mas sem esquecer que os grupos não são totalmente
homogêneos, e podem ser perigosos e não perigosos, tanto que incentivou a
interação entre “bons” e “maus”, com o fim de estimular o crescimento e
melhora dos considerados piores.
A prática penitenciária executada dentro do presídio de Valença, sem
fechaduras e mecanismos de segurança constitui um importante antecedente
da prisão aberta, pois nela a segurança era garantida pelos hábitos de
subordinação e moralidade adquiridos pelos reclusos, que raramente se
evadiam do presídio. Montesinos introduziu também no presídio de Valença o
sistema de redução do período da condenação (terça parte), como
recompensa pela boa conduta, com base no art. 303 da Ordenação Geral dos
Presídios do Reino, de 1834 (BITENCOURT, 1993, p. 92).
A experiência de Montesinos foi excepcionalmente importante para o
atual sistema penitenciário, uma vez que, além do sistema progressivo em
etapas, deixou o exemplo do trabalho eficiente e produtivo como meio de
ressocialização, com resultados práticos e a idéia de que o preso deve ser
respeitado e tratado com humanidade e dignidade, embora com disciplina
severa.
6 – CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE
Marisya Souza e Silva (2007 – pág. 171) afirma: “Vários são os
princípios constitucionais aplicados aos direito penal e processual penal,
especialmente os que regem a aplicação da pena. A Carta Magna de 1988 tem
cunho garantista, uma vez que enumera direitos e garantias fundamentais da
pessoa humana e essenciais ao convívio social.
33
Dentre eles, merece destaque o princípio da dignidade da pessoa
humana que constitui verdadeira matriz informadora de todos os direitos e
garantias individuais assegurados à pessoa no nosso ordenamento jurídico,
pois o ser humano deve ser a prioridade na tutela estatal, inclusive no direito
penal, em que a pena privativa da liberdade não pode também privar o
custodiado de sua dignidade. O Estado e a sociedade devem promover a
dignidade humana e respeitá-la como princípio orientador da ordem jurídica.
Com a evolução da vida em sociedade, o direito à dignidade se
solidificou com o exercício pelo ser humano de seus direitos e garantias, mas a
pessoa humana juridicamente protegida em sua dignidade pode violar a
dignidade alheia, razão pela qual é essencial a função jurisdicional para dirimir
possíveis conflitos advindos de violação à dignidade da pessoa humana, seja
por parte do poder público, seja por parte do próprio particular em suas
relações sociais.
O princípio da dignidade da pessoa humana tem sido difundido no
Brasil nos últimos anos, visto que durante a ditadura militar direitos humanos
não eram observados. O Estado Democrático de Direito deve construir um
sistema penal fundado na dignidade da pessoa humana como valor máximo
buscando sempre observá-lo como vetor no exercício do jus puniendi, além da
atenção aos direitos humanos como mecanismo de limitação do poder punitivo
estatal. Trata-se de equívoco a afirmação de que a dignidade humana e aos
direitos humanos constitui contrapontos a um sistema penal eficiente, uma vez
que é a certeza de punição isonômica que freia a criminalidade e não, o
desrespeito à pessoa humana e a seus direitos.
A proibição da progressão de regime estabelecida no Art 2º, § 1º da
Lei 8.072/90 afrontou diretamente o princípio da dignidade da pessoa humana,
pois estabeleceu pena cruel ao sentenciado, tratando-o como sujeito que
merece o pior dos castigos, qual seja, ser mantido recluso nas dependências
físicas do presídio durante todo o período da reprimenda. As condições
extremamente precárias e desumanas, mormente pela insuficiência de número
de vagas no regime prisional, tornam questionável a vedação da progressão de
34
regime prisional. A superlotação das celas gera um sentimento de injustiça e
abandono por parte dos presos, causando, muitas vezes violência e morte.
A vedação da progressão de regime prisional não tem observado
também o princípio da proporcionalidade. Na esteira do entendimento de Luigi
Ferrajoli (2002, p. 246), o princípio da proporcionalidade deve ser observado
em três momentos distintos: 1) no da elaboração da norma penal que deve
cominar sanções proporcionais à gravidade do delito; 2) no da aplicação da
pena quando o julgador deve, com fundamento no art. 59 do Código Penal,
estabelecer pena necessária e suficiente à reprovação do delito: e , por fim, 3)
na fase da execução da pena, o juiz da execução, atentando para
circunstâncias objetivas e subjetivas que determinam a duração da pena, ou
seja, analisando individualmente cada caso, deve aplicar a progressão ou
regressão do regime prisional.
O princípio da proporcionalidade, além de orientar o legislador, deve
também
nortear
o
julgador,
que,
fundado
nos
direitos
e
garantias
fundamentais, deve decidir com justiça e coibir arbítrios dos agentes públicos.
Leis editadas contrariando os postulados constitucionais carecem de
constitucionalidade, e por isso devem ser extirpadas do ordenamento jurídico.
O princípio da proporcionalidade não é absoluto, isto é, não possibilita ao
julgador
criar
leis
ao
interpretá-las,
mas
orienta
o
controle
de
constitucionalidade das normas, pois existe uma lógica constitucional que deve
ser observada, e deve nortear a elaboração das leis penais e sua aplicação.
Luiz Roberto Barroso (2003, p. 315-316) defende a utilização do
princípio da proporcionalidade como instrumento hábil a direcionar o intérprete
a aferir qual a norma adequada ao caso concreto, permitindo que gradue o
peso da norma para que se faça justiça, utilizando o controle difuso de
constitucionalidade. Na verdade, o princípio da proporcionalidade constitui um
dos principais instrumentos do julgador para, sopesando a norma ante os
princípios e regras constitucionais, aplicá-la ou não, ao caso concreto,
permitindo, assim, a efetiva aplicação da justiça, mesmo porque nem sempre
uma norma em vigor é válida.
35
Assim, o princípio da proporcionalidade permite ao Poder Judiciário,
via controle difuso e também concentrado de constitucionalidade, invalidar atos
legislativos ou administrativos e deixar de aplicar a norma que regula a matéria
porque confronta com princípios e regras constitucionais. Isso ocorre,
especialmente na área penal, campo do direito até hoje imune à vinculação
constitucional, como se não estivesse obrigado a estar em perfeita sintonia
com a Constituição Federal.
A Lei dos Crimes Hediondos violou o princípio da razoabilidade ou
proporcionalidade ao estabelecer regime prisional cruel para todos os
condenados
pela
prática
de
crimes
hediondos
e
equiparados,
independentemente de qualquer circunstância particular, ou seja, considerou
todos indistintamente perigosos e sem possibilidade de por méritos próprios
exercer o direito à progressão de regime prisional. Na verdade, a referida lei
denominou criminosos perigosos os autores, independentemente de o serem
ou não. É a força da lei que prevalece e não a da realidade concreta do caso,
que pode merecer tratamento mais rigoroso ou não, pois não é porque o
atentado violento ao pudor foi considerado hediondo que todos os atos
praticados o são. Por certo muitos deles dispensam pena tão elevada, que
deve ser cumprida em regime integralmente fechado.
Com o Movimento da Lei e da Ordem e o endurecimento das penas e
modo de cumprimento delas, está se retornando ao tempo em que a pena era
vista como um mal necessário contra o crime, mal que podia levar a loucura, à
morte e até, ao completo desequilíbrio físico e psíquico, que é o que ocorre
com o condenado por crime hediondo que cumpre a pena em regime
integralmente fechado, por período que pode chegar até o máximo de 30 anos
de reclusão.
Primordial, a humanização das penas privativas de liberdade no Brasil.
A Constituição Federal de 1988 consagrou em inúmeros dispositivos o
princípio da humanidade da pena. No inc. XLIX do art. 5º dispõe que é
“assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”; no inciso
seguinte assegura que as presidiárias terão o direito a permanecer com seus
filhos durante o período de amamentação, e, no inc. XLVII veda as penas de
36
morte, salvo em caso de guerra, de caráter perpétuo, de trabalhos forçados e
cruéis.
Na mesma direção, a Lei de Execuções Penais assegura aos
condenados tratamento humanitário e respeito ao princípio da dignidade da
pessoa humana, mas inúmeras são as normas infraconstitucionais que não
respeitam o princípio da humanidade das penas como a Lei dos Crimes
Hediondos que proíbe a progressão de regime prisional.
As penas privativas de liberdade excessivamente longas não exercem,
por si sós, seu papel de sanção readaptadora, pois o que falta é a certeza da
efetiva punição e investimentos públicos nas penitenciárias. A ressocialização
mínima deve ser buscada com escola e trabalho para os reeducando e apoio
ao egresso, via patronato previsto na LEP. Neste contexto desanimador, é
preciso que o juiz criminal, ao individualizar a pena, faça-o sempre imbuído do
respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana, princípio que também
deve nortear todo o processo da execução da pena.
O sistema progressivo de cumprimento da pena constitui garantia ao
preso de que, preenchidos os requisitos legais, passará, do regime mais
rigoroso para o menos gravoso até alcançar a liberdade. O princípio da
humanidade da pena acolhe e ampara o sistema progressivo que possibilita ao
preso, por meio de etapas, alcançar a liberdade. Mas a Lei dos Crimes
Hediondos excluía o sistema progressivo para esses crimes, contrariando os
princípios da dignidade da pessoa humana, da humanidade da pena e da
individualização da pena na fase da execução, uma vez que a legislação trata
todos os condenados como “objetos” idênticos, desprovidos de características
pessoais diversas.
Um dos mais importantes princípios desrespeitados pela lei 8.072/90
foi o da individualização da pena, fundado no sistema garantista, que se refere
à individualização da pena no momento da cominação, aplicação e execução,
com sua adequação à realidade do condenado, às suas condições pessoais, à
necessidade da medida e aos fins de sua aplicação.
Individualizar a pena na sua execução determina o ajustamento da
pena ao individuo, preservando sua dignidade . Isto possibilita a redução ou
37
ampliação do prazo de cumprimento da pena, do regime, do modo de
execução, de acordo com as características pessoais de cada reeducando e
com base nos princípios norteadores do Estado Democrático de Direito.
Ao individualizar a pena, o julgador deve verificar a sua real
necessidade, a realidade do infrator, após processo desgastante e toda coação
estatal e social sofrida. Para que ocorra a menor dessocialização possível do
agente, a individualização deve ser operada não só na fixação da pena, mas
também na sua execução. A ressocialização do condenado exige condições
dignas para o cumprimento da pena privativa da liberdade, o que somente é
possível com igualdade, liberdade e respeito à dignidade da pessoa humana.
A vedação da progressão de regime prisional aos crimes hediondos e
assemelhados feria especialmente os princípios constitucionais da dignidade
da pessoa humana, da proporcionalidade e da individualização da pena.
Neste
contexto,
o
controle
de
constitucionalidade
dá-se pelo
reconhecimento da superioridade da norma constitucional em frente à lei
ordinária. No sistema brasileiro, via de regra, para resguardar a ordem jurídica,
cabe ao Poder Judiciário, de forma concentrada e difusa, quando provocado,
realizar o controle de constitucionalidade das leis e dos atos normativos.
O meio de controle que interessa é o difuso ou via defesa, no qual a
alegação de inconstitucionalidade surge por incidente em um processo judicial,
podendo ser invocado no curso da ação e cuja apreciação é condição para a
decisão da lide, produzindo efeitos somente para as partes litigantes do
processo, ou seja, faz coisa julgadas apenas inter partes.
Na via de exceção, a apreciação da inconstitucionalidade é essencial
para decidir o caso concreto, ou seja, quando questionada a validade de uma
lei em face à Constituição, a contestação deve ser apreciada para que o
julgador decida o objeto da ação. A apreciação pode dar-se por qualquer órgão
do poder judiciário, individual ou coletivo, comum ou especial, e em qualquer
nível, mas limitando-se ao caso em litígio. A norma continua para os demais
casos como válida, obrigatória, produzindo efeito, salvo para o caso concreto
decidido, em que a lei não terá eficácia disciplinar o direito entre as partes.
38
O controle difuso torna-se importante porque possibilita às partes
pleitear a não aplicação no caso concreto de uma norma infraconstitucional
que contrarie princípios e regras constitucionais.
No caso, o que se questiona não é a constitucionalidade em si da
proibição da progressão de regime para os crimes hediondos e assemelhados,
por exemplo, mas a aplicação ou não, da Lei dos Crimes Hediondos ao caso
concreto, cuja validade é contestada ante a Constituição.
A questão constitucional pode ser levada pelas partes nas ações
constitutivas, declaratórias ou condenatórias, no processo de execução e
também via ações constitucionais, como hábeas corpus e mandado de
segurança. Será competente para decidir a questão o juiz singular ou tribunal
competente para julgar a causa.
Sobre os efeitos do reconhecimento da inconstitucionalidade no
controle difuso, José Afonso da Silva, citado por Regina M.M.Nery Ferrari
(2004, p. 185 – 186), diz que a declaração fulmina a relação jurídica fundada
na lei inconstitucional desde o seu nascimento, ou seja, retroage para o caso
concreto, porém continua em vigor. Ferrari entende que a decisão opera
retroativamente em relação ao caso concreto, mas somente em relação a este,
destruindo os efeitos da lei inconstitucional nos limites da litis principal.
No
sistema
jurídico
brasileiro,
a
declaração
incidental
de
inconstitucionalidade da Lei dos Crimes Hediondos, por exemplo, não extirpa a
norma viciada; ela continua em vigor e a produzir efeitos em relação a outras
situações concretas, ou seja, seu efeito não é erga omnes. Oswaldo Luiz Palu
(2001, p. 232-233), citando Konrad Hesse, diz que, embora o Supremo
Tribunal Federal fique vinculado a suas decisões anteriores, não está impedido
de rever a matéria em outro processo objetivo, e que sempre haverá a
possibilidade
de
nova
compreensão
e
alargamento
dos
princípios
constitucionais de acordo com o novo contexto social e também porque a coisa
julgada tem, sempre, a cláusula rebus sic stantibus.
Logo, no controle difuso da constitucionalidade, depois de julgada uma
matéria, nada impede que em outro processo seja reexaminado o tema
anteriormente decidido. Não vigora, no caso concreto, o efeito vinculante, mas
39
o Senado Federal pode suspender, atribuição exclusiva, a execução, no todo
ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do
Supremo Tribunal Federal (CF, art. 52, inc. X), produzindo depois da
suspensão do efeito erga omnes.
Sobre o controle difuso, assim leciona Canotilho (1991, p. 1.057):
Uma norma em desconformidade material, formal ou procedimental
com a Constituição é nula, devendo o juiz, antes de decidir qualquer caso
concreto de acordo com esta norma, examinar (direito de exame, direito de
fiscalização) se ela viola as normas e princípios da constituição. Desta forma,
os juízes têm acesso direito à Constituição, aplicando ou desaplicando normas
cuja inconstitucionalidade foi impugnada.
7 – CONCLUSÃO
A Constituição Federal de 1988 refletiu o momento histórico de uma
nação, ainda traumatizada por ditaduras militares, perseguições políticas,
execuções sumárias de militantes políticos e atos institucionais arbitrários.
Pessoas haviam sido cassadas, exiladas, presas e assassinadas e o anseio
por liberdades e garantias haveria de refletir sobre o constituinte de 1988.
Nunca antes, nesse país, os direitos e garantias foram assegurados de
forma tão sensível como na Constituição Federal de 1988. Talvez a ânsea por
assegurar direitos e garantias seja tanta que o legislador ultrapassa barreiras
onde deveria se deter; talvez fosse mais prudente deixar que muitas matérias
abordadas na Constituição fosse regulada pela legislação infraconstitucional,
principalmente no que se refere às cláusulas pétreas. Isso porque o
Constituição, como qualquer outra lei, sempre haverá de refletir o momento
histórico de uma nação, passível de evoluções e progressos inevitáveis. Talvez
apenas princípios inafastáveis devessem ser protegidos pelas cláusulas
pétreas,
o
que
permitiria
infraconstitucional sem
inconstitucional.
que
uma
ela
maior
fosse
mobilidade
taxada
a
cada
da
legislação
momento
de
40
A Lei 8.072/90, por exemplo, no seu § 1º, art. 2º que proibia a
progressão de regime no cumprimento da pena dos crimes hediondos, foi
declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Entretanto, esse
entendimento somente agora ficou pacificado, isso após 16 anos da existência
da lei, o que demonstra a sutileza da questão, sendo o referido parágrafo
julgado inconstitucional quando confrontado com o Inc. XLVI do art. 5º da CF
determinando que a lei regulará a individualização da pena.
Como se vê, a própria Constituição dá e tira, pois quando ela
vislumbrou a necessidade de uma lei mais severa, lançou as bases para a
criação da Lei dos Crimes Hediondos que criada foi posteriormente amputada
por ter dispositivo julgado inconstitucional, o que vem a torná-la inócua.
7.1 – OPINIÃO
Apesar das inúmeras críticas que a Lei dos Crimes Hediondos sofreu,
como restou demonstrado neste singelo trabalho, sou forçado a discordar da
maioria delas, isso porque o momento em que vivemos retrata verdadeira
histeria coletiva causada por um aumento da violência sem precedentes,
jamais imaginada pelo constituinte de 1988 e pelos legisladores do Código
Penal Brasileiro. Não vejo necessidade de fazer um exaustivo relato da
violência que impera no país, pois sua evidência é sentida por todos nós. A
insegurança que sentimos em nossos lares ou quando saímos às ruas é quase
que paranóica. A legislação penal não acompanhou a criminalidade. Os
direitos e garantias tem um foco destorcido, pois apesar de proteger a todos,
evidentemente, tem sido muito mais utilizado pelos criminosos. Sempre que
observo a bandeira dos direitos e garantias sendo agitada por alguns, não é
em defesa de injustiçados, na maioria das vezes e para beneficiar criminosos.
Por exemplo:
O
sigilo
bancário
é um direito assegurado
a todos
indistintamente, entretanto sabemos que a imensa maioria de nossa população
é composta de trabalhadores assalariados, aposentados, desempregados e
quase todos endividados. Essa grande maioria de endividados não têm nada a
esconder e provavelmente pouco se importarão se algum juiz autorizar a
41
quebra de seu sigilo bancário. Por outro lado, autoridades públicas
responsáveis por gerir cofres públicos quando se vêm apanhadas em alguma
situação suspeita, recorrem até as últimas instâncias para assegurar a sua
garantia do sigilo bancário. Recentemente tivemos dois casos que ilustram
bem a matéria. Uma certa autoridade pública, presidente de uma Estatal foi
acusado de pagar despesas do Presidente da República, acusação a meu ver
gravíssima, considerando tratar-se de um gestor de dinheiro público que
deveria ter suas contas verificadas até para comprovar sua lisura. O que se
verificou no caso é que o sigilo bancário foi mantido e a bandeira dos direitos e
garantias tremulou em berço explêndido. Por outro lado, um certo caseiro, no
Estado de São Paulo, se viu envolvido como testemunha num rumoroso caso
envolvendo um Ministro da Fazenda. Em questão de minutos o Ministro
conseguiu, por telefone, ter acesso ao sigilo bancário do caseiro, sem qualquer
constrangimento, o que demonstra que os direitos e garantias, na prática,
protege mais a uns e menos a outros.
Se a Lei dos Crimes Hediondos não conseguiu diminuir a criminalidade
como restou demonstrado, não quer dizer que ela seja ineficaz. É ponto
pacífico para qualquer pessoa de bom senso de que se uma determinada
conduta proibida por lei, é punida com uma pena grave, o instinto humano
aconselha a evitá-la, e quanto mais grave for a pena, maior temor de sofrê-la
sensibilizará o homem médio.
Se a criminalidade aumentou após a edição da Lei dos Crimes
Hediondos, é porque outros fatores influenciaram o índice, como por exemplo:
O crescimento populacional, o aumento do desemprego, as crises econômicas,
o descaso do poder público e uma série de fatores que devem ser avaliados
conjuntamente. Entretanto, alguns estudiosos do direito simplesmente alegam
que a lei é ineficaz e deveria ser revogada, apresentando os argumentos de
sempre: De que o Estado tem que combater a criminalidade com políticas
sociais, com maior presença nas comunidades carentes, com programas
sociais e etc. Também concordo com isso tudo, entretanto, praticado o crime,
não há mais que se questionar esses aspectos para justificar a conduta
criminosa, pois em todos os lugares existem pessoas pobres, desempregadas
42
e desamparadas, mas elas não saem praticando crimes por causa disso, muito
pelo contrário, a imensa maioria dos desamparados socialmente vivem
honestamente com suas dificuldades.
Assim sendo, com o aumento avassalador da violência, não vejo como
não se aprimorar os mecanismos repressivos do Estado. Se o criminoso está
dentro de uma área geográfica praticando crimes, retirá-lo desse convívio e
segregá-lo no cárcere é a única forma de assegurara a paz social daquela
comunidade.
É evidente que não podemos vislumbrar apenas o aspecto retributivo
da pena, mas é o único aspecto que funciona, infelizmente. O argumento
exaustivamente explorado de que o cárcere deveria servir para ressocializar o
preso é apenas uma utopia, pois, na prática, o cárcere é a faculdade do crime.
Nossa legislação penal é eficiente no que se refere a execução penal em seu
aspecto normativo, o problema é em seu aspecto prático, onde as distorções
são evidentes, principalmente no que se refere à progressão de regime, pois
como não existe um trabalho de ressocialização e a avaliação meritória do
preso é feita de forma improvisada, face as carências conhecidas do nosso
sistema penitenciário, o que assistimos são presos perigosos alcançando a
liberdade após cumprimento de parte da pena e reingressarem em seus
antigos redutos, voltando a delinqüir, favorecidos pela liberdade condicional.
Em setembro do ano passado (2006), a Secretaria Estadual de
Administração Penitenciária reconheceu não ter informação de pelo menos
65% dos presidiários com direito a liberdade condicional, o equivalente a vinte
e cinco mil detentos dos trinta e sete mil e oitocentos beneficiados pela
medida. Cerca de 50% desses presos libertados voltam para a cadeia como
reincidentes. (Jornal “O Globo” de 19/05/07 – pág. 19).
Entendo que a Lei dos Crimes Hediondos na verdade é branda, a
nossa legislação penal é paternalista, os menores-infratores são super
protegidos quando na verdade deveriam ser punidos severamente quando
praticassem crimes graves, como ocorre em outros países, como nos Estados
Unidos; atualmente encontra-se em discussão o projeto de lei para diminuição
da maioridade penal.
43
O garantismo excessivo impede ou dificulta que medidas necessárias
sejam implementadas para contensão da criminalidade, e o paternalismo de
nossa legislação penal está colocando de volta às ruas, através da liberdade
condicional, diversos facínoras, criminosos sanguinários conhecidos que
mantém o controle da atividade criminosa e não se sabe como, são
contemplados com o direito a progressão de regime sob o manto dos direitos e
garantias, quando na verdade jamais poderiam retornar ao convívio na
sociedade. Como as amplas garantias asseguradas aos criminosos são
protegidas por cláusulas pétreas, e as mudanças necessárias são muito
tímidas comparadas às organizações criminosas, não vislumbro, a médio ou
curto prazo, possibilidade de diminuição da criminalidade.
Algumas providências precisam ser tomadas para maior repressão à
criminalidade, dentre elas podemos citar a diminuição da maioridade penal. É
preciso que os menores de 18 anos envolvidos em crimes graves sejam
devidamente responsabilizados como nos Estados Unidos. Se lá que não
existe um quadro tão preocupante quanto o nosso é assim, porque aqui tem
que ser diferente. Outra medida necessárias que existe nos Estados Unidos e
em outros países e não existe no Brasil é a pena de morte. Esta entretanto
jamais poderá ser implantada face as cláusulas pétreas. Sei que a pena de
morte é tema bastante polêmico e descartada pela grande maioria dos
estudiosos do direito, alguns, sem razão, afirmam que se ela existisse no
Brasil, alcançaria somente os pobres, deixando de enfrentar com seriedade a
questão. A pena de morte poderia existir com uma remota possibilidade de ser
aplicada. Apenas para aqueles que mesmo presos continuassem a insistir na
prática de crimes, como aconteceu recentemente quando um detento, chefe de
uma facção criminosa paulista conhecido por “Marcola”, mesmo preso,
conseguiu insuflar uma legião de bandidos a cometer assassinatos naquele
Estado, ocasião em que policiais, bombeiros e civis passaram a ser mortos
numa onda de ataques jamais visto no país, e quando autoridades foram ao
presídio “negociar” com o criminoso ficou claro que o detento não estava se
importando com os acontecimentos, pois ele tinha uma certeza, já estava
preso e o Estado havia esgotado o poder de coação de que dispunha, ou seja,
44
nada mais o Estado poderia fazer contra ele que estava cumprindo pena em
estabelecimento de segurança máxima. Não podemos nos esquecer também
de um trágico episódio ocorrido no Presídio de Bangu, no Rio de Janeiro,
quando um criminoso conhecido como “Fernandinho Beira-Mar” protagonizou
uma chacina de rivais dentro do presídio, ocasião em que vários detentos
foram
brutalmente
assassinados.
Fatos
como
esses
demonstram
a
necessidade de medidas que causem algum temor, capaz de inibir tais crimes,
e somente a pena de morte, se existisse,seria capaz de arrefecer os ânimos de
criminosos irrecuperáveis. Evidentemente a pena de morte não seria aplicada
a “ladrões de galinha e pobres” como muitos querem fazer crer, mas serviria
como uma possibilidade de ser aplicada em casos extremos. Assim sendo,
somente
com
medidas
enérgicas
podemos
combater
eficazmente
a
criminalidade. È como combater o veneno da serpente, quanto mais forte for o
veneno, mais forte precisa ser o antídoto.
45
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
Crimes Hediondos – Textos, comentários e aspectos polêmicos – Editora
Saraiva – 3ª Edição – 1995 – Autor: Antonio Lopes Monteiro.
Crimes Hediondos: O ideal e o razoável – Auto: Paulo Sergio de Oliveira –
Boletim IBCCRIM – ano 13 nº 161 Abr/2006.
As reações à decisão do STF sobre a progressão nos crimes hediondos –
Autor: Jair Leonardo Lopes – Boletim IBCCRIM - ano 13 nº 161 Abr/2006.
Crimes Hediondos & Progressão de Regime Prisional
Editora Juruá – 2007.
Autora Marisma Souza e Silva.
Jornal “O Globo”
A evolução da violencia
Data: 28 fev 2007.
Jornal “O Globo”
As propostas que esperam votação no Congresso
Data: 01 mar 2007.
46
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO
2
AGRADECIMENTO
3
DEDICATÓRIA
4
RESUMO
5
METODOLOGIA
6
SUMÁRIO
7
INTRODUÇÃO
8
2 – CONCEITO DE CRIME HEDIONDO
9
3 - A LEI Nº 8.072/90
9
3.1 – MOVIMENTO DA LEI E DA ORDEM
10
3.2 – INTERVENÇÃO MÍNIMA
12
3.3 – ABOLICIONISMO
12
3.4 – CRIMES HEDIONDOS – O IDEAL E O RAZOÁVEL
14
3.5 – A INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI 8.072/90
17
4 – RECENTES MODIFICAÇÕES
22
4.1 – LIBERDADE PROVISÓRIA
22
4.2 – REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA
24
5 – PALAVRAS DO MESTRE
28
6 – CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE
36
7 – CONCLUSÃO
39
7.1 – OPINIÃO
40
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
45
ÍNDICE
46
47
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
Título da Monografia: A LEI DOS CRIMES HEDIONDOS E SUA
PROBLEMÁTICA
Autor: PAULO CEZAR ARRUDA
Data da entrega: 30/07/2007
Avaliado por:
Conceito:
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universidade candido mendes pós-graduação “lato sensu” projeto a