INFORMATIVO Maio/2007 - nº13 Risco tributário: não pode haver erro Com a criação da Lei Sarbanes-Oxley, o risco tributário se estendeu também para os processos e controles internos Até pouco tempo atrás, quando se pensava em risco tributário logo vinha à mente a possibilidade de uma empresa ser questionada pelo Fisco por causa das informações registradas em suas demonstrações financeiras. Com a criação da Lei Sarbanes-Oxley (SOX), as empresas registradas nos EUA na Securities and Exchange Commission (SEC) identificaram outro tipo de risco tributário, aqueles relacionados a processos e controles internos. Hoje, os sistemas de controles estão difundidos mundialmente. Organizações registradas na SEC, mesmo que não sediadas nos Estados Unidos, estão sujeitas aos dispositivos estabelecidos no artigo 404 da SOX. A União Européia possui a Diretiva nº 8 e Canadá, Japão e outros países consideram a implantação ou já implantaram iniciativas semelhantes tendo em vista a observância das normas. Embora alguns sistemas de controles sejam bastante diferentes da abordagem adotada pelos Estados Unidos, uma lição aprendida com a SOX foi que muitas empresas não faziam sua escrituração contábil adequadamente. Dessa forma, é previsível que empresas de todo o mundo no futuro se vejam mais envolvidas com o risco tributário e os controles internos. O risco tributário não se restringe às situações tributárias incertas e a vulnerabilidades nos controles e nos relatórios contábeis de impostos. Ele inclui, na verdade, qualquer evento, ação ou falta de ação relacionada com estratégia fiscal, operações tributárias, emissão de relatórios contábeis de impostos ou conformidade fiscal que prejudique os objetivos ou os resultados tributários ou comerciais da empresa em um nível imprevisto ou inaceitável de exposição monetária, de demonstrações financeiras ou de imagem. Hoje muitas organizações já implantam processos e controles sistemáticos para prevenir ou detectar riscos tributários potenciais em todas as áreas da empresa e para mitigar esses riscos. 1 Como se forma uma grande tormenta Muitos dos problemas dos departamentos de impostos ocorrem devido à natureza de suas operações e ao tipo de informações de que necessitam. Avaliar essas situações, aprimorar e monitorar os processos de controle são os grandes desafios para as empresas. Confira alguns dos principais tipos de riscos associados à área tributária: executivos de impostos não concordam com os Tatiana da Ponte controles relacionados com imposto de renda que suas empresas adotam em jurisdições no exterior. É um desafio para as empresas conciliar conhecimentos relacionados com tributos locais e no exterior com conhecimentos de princípios contábeis geralmente aceitos nos Estados Unidos (US GAAP) ou de International Financial Reporting Standards (IFRS) ao registrar adequadamente impostos no exterior, impostos correntes e impostos diferidos. Falta de controle sobre dados lançados no sistema. Uma reclamação comum dos departamentos de impostos é que eles estão no final da “cadeia” dos dados e não possuem controle sobre muitos dos provedores de dados ou dos dados em si. Em decorrência disso, algumas vezes deixam de obter as informações de que necessitam em tempo hábil, de maneira precisa e pronta para ser usada. Falta de profissionais treinados para a contabilização de imposto de renda, controles internos e emissão de relatórios financeiros, especialmente no exterior. A falta de recursos treinados é a principal causa da ocorrência de pontos fracos significativos. Muitos Falta de processos e controles internos adequados em jurisdições no exterior. Freqüentemente há um grande desequilíbrio entre as receitas e os riscos fora da empresa de origem e o percentual de pessoas, tempo e esforço do departamento de impostos fora do país. Apoio na empresa de auditoria em jurisdições no exterior para assistência na contabilização de impostos. De forma geral, as empresas de auditoria não podem mais prestar esses serviços de atestação a clientes. Essa tarefa exige outro prestador externo ou então a adoção de mais responsabilidade internamente. Com análises sobre temas atuais e relevantes para as empresas, o Tax View pretende criar um amplo canal de debates, do qual você pode participar enviando e-mails para o endereço [email protected]. O Tax View Ernst & Young é uma publicação destinada a clientes e colaboradores da Ernst & Young que aborda assuntos e questões relevantes para as empresas nas áreas de legislação tributária e legal, jurisprudência, tendências e oportunidades da economia. As opiniões aqui expressas não devem ser utilizadas, de maneira isolada, para a tomada de decisões por parte das organizações. Isto porque existem particularidades atinentes a cada empresa que podem, eventualmente, alterar o enfoque transmitido na opinião. Recomendamos que antes de a decisão ser tomada, as empresas discutam esses pontos de vista com seus consultores. Estamos à disposição para discutir nossas opiniões e sua aplicação em cada caso concreto. Coordenação Editorial: Diretoria Nacional de Impostos Sócio Coordenador: José M. R. Silva Edição final, direção de arte e distribuição: Departamento de Comunicação e Gestão da Marca Foco em planejamento e conformidade fiscal Os objetivos do departamento de impostos raramente estiveram vinculados à emissão de balanços financeiros. Na verdade, esse departamento sempre se concentrou no planejamento e na conformidade fiscal. Assim, não causa surpresa o fato de haver uma defasagem de auditores de impostos experientes em muitas empresas. Planejamento estratégico Não considerar ou aplicar mal a legislação tributária no planejamento e na estruturação de uma transação deixando de considerar itens como exposição fiscal ao realizar uma due diligence, por exemplo, pode ser um fator de risco tributário. Também é preciso atenção na transferência de conhecimento ou na retenção de documentos durante a integração pós-aquisição. Pressões em conformidade fiscal Antes da promulgação da Lei Sarbanes-Oxley, a tendência da área tributária era se concentrar nas declarações de impostos que apresentavam os prazos mais curtos, e não na emissão de relatórios financeiros e muito menos nos testes de controle. Operações Nessa área, não deixar bem estabelecidas as considerações sobre impostos nos processos de negócios e usar preços de transferência inadequados são exemplos de ações que devem ser evitadas. Validação no exercício seguinte A validação da provisão para a declaração ocorre necessariamente após o fechamento financeiro. Se houver ajustes significativos, pode ser um reflexo na qualidade do processo de fechamento do final do exercício, ênfase nas deficiências de controle e pode constituir a correção de um erro que possivelmente acarrete uma atualização monetária ou ainda multa e juros. Compliance Não obter informações corretas devido à falta de dados, interpretação incorreta da legislação ou comunicação errônea é um fator de risco, bem como não reivindicar as posições tributárias mais vantajosas para a empresa por falta de treinamento ou pessoal competente. Financeira Análise do exercício anterior – conformidade com atraso Tradicionalmente, os departamentos de impostos usavam um “espelho retrovisor” em suas atividades, ou seja, voltavam-se para eventos já ocorridos. A Lei Sarbanes Oxley, juntamente com outras normativas, estabelece a existência de controles para manter a transparência e a confiabilidade das informações. Como tratar o risco tributário A organização do processo de gestão de risco tributário pode ser feita por meio da identificação de riscos em cada uma das principais áreas de negócios de uma empresa. Esses riscos podem surgir nas seguintes situações: Deve-se tomar cuidado ao divulgar informações sobre impostos. Também é preciso estimar corretamente provisões de contingência para posições tributárias incertas e fundamentar o cálculo dos impostos reportados nas demonstrações financeiras. Os riscos tributários cujo nível seja classificado como elevado nos critérios acima seriam os itens de alta prioridade. Nesses casos, a empresa deveria acompanhar esses riscos para verificar se os processos e controles existentes são eficazes para evitá-los ou ao menos detectá-los. Caso isso não aconteça, eles devem ser aprimorados. E se um risco específico for detectado no processo, devem ser tomadas providências para mitigá-lo. Além disso, se a empresa acredita que possui processos e controles adequados em vigor para prevenir ou detectar um risco tributário, eles devem ser monitorados para garantir sua eficiência. TAX VIEW Gestão de tributos no país está cada vez mais complexa João Carlos Sfreddo (*) Pesquisa realizada pela Ernst & Young em 14 países, mediante entrevista com 474 executivos da área de impostos, aponta que o risco tributário preocupa mais no Brasil do que nas demais nações. No Brasil, 92% dos entrevistados indicaram o risco tributário como fonte de apreensão significativa, enquanto a média mundial é de 54%. A complexidade da legislação tributária brasileira exige das empresas a manutenção de um complexo sistema de controle de tributos e contribuições sociais, determinando também a necessidade de empregar um número significativo de profissionais especializados em tributos e contribuições sociais na formação e no funcionamento de sua estrutura de controles. Até meados de 1996, a complexidade se dava em razão da velocidade com que a legislação tributária era alterada, muitas vezes mediante instrumentos inconstitucionais, o que provocou uma enxurrada de ações judiciais que visaram a recuperação de tributos pagos a maior ou mesmo o não-pagamento. Essa velocidade na alteração da legislação e os famosos pacotes de final de ano requeriam constante atualização dos profissionais da área de tributos, pois, caso contrário, as empresas incorriam em erros, possibilitando a imputação de multas pelo Fisco. Após a entrada em vigor das leis nº 10.833 e nº 10.637, que estabeleceram a não-cumulatividade nas contribuições ao PIS e à Cofins, uma infinidade de dificuldades de ordem prática surgiu para as empresas. A legislação, apesar de ter estabelecido o regime não cumulativo, não estendeu esse regime a todas as operações das empresas, restringindo o direito ao crédito de certos insumos que, na opinião do Fisco, não integram diretamente o processo produtivo. Como essas limitações não foram suficientemente esclarecidas pelas leis que instituíram a não-cumulatividade, nem pelas normas ditadas pela Receita Federal, surgiram infindáveis dificuldades na sua interpretação, gerando diversas 4 consultas ao órgão, cujas respostas, em muitos casos, apresentaram divergências de uma delegacia para outra. Em 25 de fevereiro de 2005, a Receita Federal divulgou a Instrução Normativa nº 517 e, em 28 de dezembro do mesmo ano, a Instrução Normativa nº 600. Nesses instrumentos consta a necessidade de o contribuinte submeter à Receita Federal um pedido de habilitação de todos os créditos decorrentes de ações judiciais transitadas em julgado a seu favor. O processo é submetido à análise de um funcionário, que tem o poder de habilitar ou não referido crédito. Durante a vigência dessa norma, créditos da mesma natureza e até de um mesmo processo foram submetidos ao processo de habilitação. Algumas delegacias habilitaram e outras negaram atendimento aos pedidos, indicando uma falta de harmonia entre as diversas delegacias da Receita Federal, em prejuízo flagrante e quase sempre muito significativo ao contribuinte. O excesso de normas tributárias e a ausência de uniformidade no tratamento dos assuntos de ordem tributária têm gerado prejuízos imensos ao contribuinte. Há casos em que empresas de capital aberto, tendo obtido decisão favorável, transitada em julgado, atendendo a boa norma contábil, efetuaram o registro do crédito tributário, mas tiveram negados os seus pedidos de habilitação dos créditos, ficando impossibilitadas de realizá-los. Além da perda financeira, o contribuinte fica na obrigação de justificar ao mercado as razões pelas quais efetuou o registro contábil dos créditos tributários. Nesses casos, as companhias atenderam a uma norma contábil e viram frustrada a realização pela interpretação equivocada de um funcionário do órgão oficial. Este é um caso típico no qual a burocracia excede os seus limites, não deixando nenhuma chance ao contribuinte senão buscar, novamente no poder judiciário, o seu direito à utilização do crédito tributário. Assim, se verifica que a legislação tributária brasileira, ao contrário de estar se dirigindo à simplificação, se torna cada vez mais complexa, ficando evidente que há necessidade de uma reforma tributária completa que resulte numa redução do número de tributos e numa simplificação na sua aplicação prática. Além disso, ao legislarem sobre questões tributárias, faz-se necessário que os textos legais tenham maior clareza, evitando deixar espaços generosos a interpretações diversas sobre um mesmo tema. Quando o Congresso Nacional iniciou a discusAo legislar pela introdução do regime da nãosão da reforma tributária, deparou com a quescumulatividade do PIS e da Cofins, deveriam têtão envolvendo os Estados, os quais se colocalo feito sem ressalvas, sem deixar margem a interram contrários por temerem ter a sua receita pretações. Qual é a razão de se permitir o direito tributária reduzida. ao crédito pela aquisição de uma matéria-prima e não permitir o direito ao crédito dos insumos com Nesses aproximadamente seis anos em que se comunicações, energia elétrica, materiais de madiscute de uma forma mais profunda a necessinutenção de equipamentos em supermercados, dade de uma reforma tributária, ninguém apreetc. A não-cumulatividade deve incluir todos os sentou um estudo que pudesse garantir aos Estacustos necessários para a criação de um produto dos que sua receita tributária não viria a ser final. Uma indústria não pode gerar um produto reduzida. É evidente que os Estados somente sem que ocorram dispêndios administrativos, concordarão com a reforma no momento em que comerciais e de manutenção. Uma empresa supertiverem a garantia de que sua arrecadação não mercadista também possui características própricairá, mas, até o momento, não foi apresentada as, essenciais ao desenvolvimento de suas atividauma fórmula que lhes garanta essa des. Assim, para ser possível coirredutibilidade. A idéia que está mercializar produtos perecíveis, é sendo discutida hoje é a da coÉ evidente que os necessário manter equipamentos e brança do tributo no destino, o Estados somente instalações que mantenham o proque, se adotada, deve eliminar duto até que chegue às mãos do concordarão com a apenas parte das desigualdades, consumidor. reforma no momento uma vez que o poder aquisitivo varia de Estado a Estado da em que tiverem a Isso é absolutamente essencial ao Federação. desenvolvimento das atividades. garantia de que sua Entretanto, o entendimento da Receiarrecadação não cairá Atualmente, tanto o governo federal ta é de que os insumos para manucomo os estaduais e os municipais tenção dos equipamentos num superpossuem uma infinidade de dados mercado não geram direito a crédito. Para o Fisco, econômicos, fornecidos mensalmente pelas empresomente insumos na manutenção de máquinas, sas, mediante diversos documentos arrecadatórios equipamentos e instalações industriais é que geram e informativos a que estão obrigadas, e que podem direito ao crédito. Ora, o legislador, ao escrever o se tornar a base do que se necessita para determitexto, jamais teve a intenção de limitar esse direito nar qual será o efeito, em cada Estado, das alteraàs indústrias, como se a atividade fosse o fator ções que podem vir a ser implementadas por uma determinante do direito ou não ao crédito. O que reforma tributaria. deveria determinar ou não o direito é o princípio da não-cumulatividade, a natureza do insumo, e não a Para se determinar os impactos em cada Estado, atividade da empresa. O legislador não deveria ter o governo poderia, com base nas informações deixado brechas para que a lei fosse interpretada da que lhe são prestadas periodicamente pelas forma como está sendo. A lei entrou em vigor em empresas, montar um sistema de análise dessas janeiro de 2004, e o contribuinte ainda está questioinformações e gerar simulações, que abrangerinando a Receita sobre o que gera e o que não gera am um período prospectivo de dois a três anos direito ao crédito. E o que é pior: o órgão oficial de todos os movimentos da economia entre os apresenta respostas que, em muitos casos, são Estados brasileiros. As informações ofereceriam divergentes. condições de se determinar quais as operações que deverão ser tributadas e suas respectivas alíquotas, se seriam tributadas na origem ou no destino, bem como as que podem vir a não ser tributadas, sem prejuízo da arrecadação de cada Estado. Isso desataria um dos principais nós que emperram a reforma tributária no Brasil. Será que não seria mais conveniente que os textos legais fossem mais elucidativos e proporcionassem menos interpretações? João Carlos Sfreddo é sócio responsável pelo escritório da Ernst & Young em Porto Alegre 5 TAX VIEW Veto à Emenda 3 é inócuo LUCIANA PIRES* O substituto ao veto à Emenda 3 na redação final da Lei nº 11.457, de 16/03/2007, que criou a Super-Receita, causou grande perplexidade na comunidade empresarial. A redação da Emenda 3 aprovada no Congresso Nacional inseria o parágrafo 4º ao artigo 6º da Lei 10.593/02, para lhe dar a seguinte forma: “Art. 6º – São atribuições dos ocupantes do cargo de auditor fiscal da Receita Federal do Brasil”; parágrafo 4º – “No exercício das atribuições da autoridade fiscal de que trata esta lei, a desconsideração da pessoa, ato ou negócio jurídico que implique reconhecimento de relação de trabalho, com ou sem vínculo empregatício, deverá sempre ser precedida de decisão judicial”. Percebe-se, portanto, que o objetivo da Emenda 3 era o de vedar às autoridades fiscais o poder de desconsiderar a personalidade jurídica de prestadores de serviço, a pretexto de reconhecer relação de emprego, sem prévia decisão judicial da Justiça do Trabalho. A Emenda 3, porém, não acrescentava nada de novo ao ordenamento jurídico, apenas confirmava o que já estava determinado no artigo 129 da Lei nº 11.196/05. Em síntese, o artigo 129 afirma que, para fins fiscais e previdenciários, a prestação de serviços intelectuais, inclusive os de natureza científica, artística ou cultural, em caráter personalíssimo ou não, quando prestados por pessoa jurídica, devem ser tributados conforme as regras aplicáveis às pessoas jurídicas, sem prejuízo do disposto no artigo 50 do Código Civil. O Poder Executivo, contudo, enviou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 357, de 16 de março de 2007, para regulamentar o artigo 116 do Código Tributário Nacional. E o debate travado pela sociedade para fazer valer a Constituição Federal no que se refere às limitações ao poder de tributar e ao princípio da estrita legalidade acabou por reverter-se contra o contribuinte. Isso porque o Projeto de Lei nº 357 é uma tentativa ainda mais infeliz do Poder Executivo de regulamentar a Lei Complementar nº 104, que alterou o artigo 116 do Código Tributário Nacional. Na verdade, a redação proposta pelo Poder Executivo é ainda pior do que a apresentada na Medida Provisória 66, de 2002. A Exposição de Motivos nº 35/MF encaminhada com o Projeto de Lei nº 357 ao Congresso Nacional expõe que os procedimentos a que estarão vinculadas as autoridades fiscais para a desconsideração de atos e negócios jurídica têm o objetivo de preservar o princípio do contraditório e da ampla defesa. Porém, a leitura atenta do Projeto de Lei nº 357 nos leva a concluir que a intenção das autoridades fiscais é reverter o ônus da prova. Ou seja, passamos da presunção de inocência à presunção da fraude, até que o contribuinte prove o contrário. Como se não bastasse, ao contrário da regulamentação proposta à época da edição da Medida Provisória nº 66, agora as autoridades fiscais não têm qualquer limitação quanto aos atos passíveis de desconsideração. Não é demais lembrar que o artigo 129 também só ratifica o que já é óbvio sob a ótica da legislação civil e processual civil brasileira. A pessoa jurídica e seus sócios têm personalidade jurídica própria e independente e a desconsideração da personalidade jurídica para alcançar a pessoa dos sócios somente pode ser aplicada em casos específicos e mediante o devido processo legal. Assim, pode-se concluir que o veto à Emenda 3 é inócuo e que hoje (como sempre) as autoridades fiscais somente poderão tributar o rendimento da pessoa jurídica como pessoa física em caso de determinação judicial. Na oportunidade, a legislação proposta definia que a desconsideração somente poderia ser aplicada se ocorresse falta de propósito negocial ou abuso de forma e ainda conceituava o que se entendia por falta de propósito negocial e abuso de forma . A falta de propósito negocial estaria configurada caso o contribuinte optasse pela forma mais complexa ou mais onerosa para realizar determinado ato ou negócio. Por sua vez, o abuso de forma equivaleria à prática de um ato ou negócio jurídico indireto que produzisse o mesmo resultado econômico do ato ou negócio jurídico simulado. 6 1 Vide artigo 14 da redação original da Medida Provisória no. 66/2002. A redação agora em discussão no Congresso Nacional é silente quanto aos critérios que deverão ser utilizados pelas autoridades fiscais para desconsiderar atos ou negócios jurídicos. Se à época da MP 66 muito já se argumentou quanto à inconstitucionalidade da redação proposta pelos artigos 13 a 19, agora ainda mais se deve questionar a constitucionalidade do Projeto de Lei nº 357, uma vez que as inconstitucionalidades apontadas por inúmeros juristas ainda permanecem neste projeto e com o agravante que agora se pretende sem qualquer limitação reverter-se o ônus da prova ao contribuinte. Enquanto em diversos países a minimização dos riscos fiscais incluiu, além da criação de regras sobre responsabilidade fiscal e regras antielisivas, a criação de códigos de defesa dos contri- buintes, no Brasil rumamos na contramão da história, em direção à concessão desmedida de poderes à fiscalização tributária em detrimento da legalidade tributária e da segurança jurídica. No Brasil temos de alcançar a maturidade e entender que o pêndulo não pode pender totalmente para a completa ilegalidade das teorias antielisivas nem tampouco para o entendimento de que todo e qualquer planejamento implantado pelos contribuintes é uma lesão ao erário. É preciso consolidar a posição de que o planejamento fiscal é forma legítima de economizar imposto, desde que não haja abuso de direito. Luciana Pires é gerente de Tax Advisory da Ernst & Young no Rio de Janeiro SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL DECLARA A INCONSTITUCIONALIDADE DO DEPÓSITO PRÉVIO EM RECURSO ADMINISTRATIVO O Plenário do STF declarou em 28/03/2007 ser inconstitucional a exigência de depósito prévio em recursos administrativos por entender que o depósito recursal prévio fere o direito à ampla defesa. Na ocasião, o STF julgou recursos extraordinários e uma Ação Direta de Inconstitucionalidade que tratavam da: a) exigência de depósito prévio no âmbito do INSS e da Secretaria da Receita Federal como condição de admissibilidade de recurso administrativo; b) inconstitucionalidade do arrolamento de bens para discussão administrativa de tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal. Na prática, as empresas poderão interpor recurso administrativo sem a necessidade do depósito antecipado. Quem já depositou também vai poder recorrer, inclusive na esfera administrativa, para ter o dinheiro de volta, corrigido pela taxa Selic. Na mesma sessão, foram apreciados outros recursos sobre o mesmo tema e, inclusive, uma ADI. O entendimento aplicado a todos os casos foi o mesmo: a inconstitucionalidade de garantia prévia para recurso administrativo. 1 A decisão foi proferida no julgamento conjunto dos Recursos Extraordinários 388.359, 389.383, 390.513. 7