AS CONCEPÇÕES DOS PROFESSORES E ALUNOS ACERCA DA
CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO MATEMÁTICO
Márcia Jussara Hepp Rehfeldt
Centro Universitário UNIVATES Lajeado/RS
[email protected]
Marli Teresinha Quartieri
Centro Universitário UNIVATES – Lajeado/RS
[email protected]
1. ALGUMAS REFLEXÕES TEÓRICAS SOBRE O APRENDER
Quando falamos em construção do conhecimento algumas idéias nos vêm até a
mente: construtivismo, inteligência, saber, aprender, conhecer ... Iniciaremos
examinando a questão da inteligência.
Na concepção dos aprioristas, a inteligência é inata, geneticamente herdada e
determinada a priori. Segundo esta visão, o professor não consegue desenvolvê-la, pois
o aluno ou “nasceu inteligente” ou “nasceu burro”, enfim, “nasceu assim”. Portanto, não
há o que fazer. Ao contrário dos aprioristas, os empiristas acreditam que o ser humano
nasce como uma “tábua rasa” marcada e moldada por meio do que aprende, ou seja,
nada tem ou sabe ao nascer. O meio, mediante estimulação ou coerção, irá promover a
inteligência. Para o ensino da matemática, sob essa concepção, basta a idéia de fazer ou
experienciar para aprender. Assim, a primeira teoria explica a inteligência como se
dando de dentro para fora enquanto a segunda como se dando de fora para dentro. No
primeiro caso, o meio não tem a menor importância na determinação da aprendizagem e
no segundo, a herança genética é um núcleo insignificante frente à pressão do meio.
Mas, tanto a concepção apriorista quanto a empirista não permitem bons resultados. Se
isso fosse verdade, aulas de laboratório ou listas de exercícios resolveriam os problemas
de aprendizagem.
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Apresentaremos, a seguir, algumas concepções a respeito da aprendizagem e
do conhecimento de alguns teóricos que, no nosso entender, julgamos serem relevantes.
1.1 Concepções de Piaget
Para Piaget (1975), a inteligência deve ser definida enquanto função e
estrutura. Como função, a inteligência é uma adaptação. O sujeito deve adaptar-se ao
meio e modificá-lo para adaptar-se melhor.
A inteligência é uma adaptação. Para apreendermos as suas relações com a
vida, em geral, é preciso, pois, definir que relações existem entre o organismo
e o meio ambiente. Com efeito, a vida é uma criação contínua de formas cada
vez mais complexas e o estabelecimento de um equilíbrio progressivo entre
essas formas e o meio. (PIAGET, 1975, p. 15)
Como estrutura, a inteligência é uma organização. O crescimento da
inteligência não se dá pelo acúmulo de informações, mas pela organização dessas
informações. Para Piaget (1957 apud BATTRO, 1978, p. 98), “[...] as estruturas lógicas
constituem não formas a priori, nem produtos da experiência dos objetos, nem das
convenções sociais, mas formas de equilíbrio para os quais tendem as coordenações
intelectuais do sujeito”.
Para aprender, o sujeito precisa, assimilar, acomodar e equilibrar informações.
Vejamos como isso acontece através da análise de alguns conceitos. Segundo Piaget
(1975), numa relação de assimilação “[...] o funcionamento do organismo não destrói,
mas conserva o ciclo de organização e coordena os dados do meio de modo a incorporálos nesse ciclo”.
Em outras palavras, Piaget quer dizer que, quando uma pessoa entra em contato
com algo do meio, retira deste informações para torná-las suas, ou seja, para conhecêlas.
Com relação à acomodação, Piaget (1975) diz que “[...] são as pressões
exercidas pelo meio[...]”.
Podemos entender acomodação como sendo as transformações, modificações
pelas quais o sujeito passa, ao reorganizar-se mentalmente.
A acomodação é determinada pelo objeto, enquanto a assimilação pelo
indivíduo. Então, assim como não há acomodação sem assimilação, já que é
sempre a acomodação de alguma coisa que é assimilada [...] de igual modo
não pode haver assimilação sem acomodação [...] Adaptação é o equilíbrio
entre a assimilação e a acomodação. Porque na adaptação você tem sempre
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dois pólos: você tem o pólo indivíduo – assimilação e o pólo objeto –
acomodação [...]. (BRINGUIER, 1978, p. 61-63)
Outro conceito abordado por Piaget é o de equilibração, que ocorre quando o
sujeito incorpora o mundo exterior ao seu mundo interior, ou seja, assimila e acomoda
suas novas experiências.
A equilibração constitui um processo muito geral [...] que, em grandes linhas,
vem a opor compensações ativas às perturbações exteriores; compensações
que variam, sem dúvida, segundo os níveis e os esquemas do sujeito, mas
consistem sempre em reagir às perturbações sofridas ou antecipadas.
(PIAGET, 1973, p. 37)
Segundo Piaget (1970), a aprendizagem exige objetos e ações que são
exercidas sobre esses objetos. Aí surgem, segundo menciona Becker (1999) baseado na
teoria de Piaget, dois novos conceitos: abstração empírica e abstração reflexionante. A
diferença com relação à conceituação é que a primeira está ligada ao objeto enquanto a
segunda refere-se à ação empregada sobre o objeto, ou seja, na abstração empírica o
sujeito retira as informações do objeto de conhecimento e, na abstração reflexionante, as
informações são retiradas da ação do sujeito sobre esse objeto. É lógico que a
construção do conhecimento se dá através da abstração empírica e da abstração
reflexionante, pois não há conhecimento sem objeto e ação sobre esse objeto.
1.2 Concepções de Ausubel
Ausubel, discípulo de Jean Piaget, apresenta uma abordagem diferente em
alguns aspectos e os elementos centrais de sua teoria são:
A primeira e mais fundamental condição a considerar para uma
•
aprendizagem significativa é o conhecimento que os alunos já trazem.
•
A assimilação de conhecimentos novos requer que sejam estabelecidas
relações significativas com a estrutura cognitiva do aluno. Para que um novo
conhecimento possa ser assimilado, é preciso que já existam no
conhecimento prévio dos alunos conceitos capazes de possibilitarem o
estabelecimento de relações com o novo conhecimento a ser apreendido. Esta
é a base para uma aprendizagem verbal significativa.
•
Denominam-se organizadores os materiais de maior nível de
generalidade e poder inclusivo que auxiliam na incorporação de novos
conhecimentos à estrutura cognitiva. Sua função é estabelecer a relação entre
o que o aluno já sabe e o que se propõe a conhecer.
•
Assimilação de um novo conhecimento na estrutura cognitiva do
aluno dá-se por meio da diferenciação progressiva e da reconciliação
integradora. Nesse processo desempenham papel essencial os organizadores.
(MORAES, 2000, p.112-113)
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1.3 Concepções de Vygotsky
Os elementos centrais das concepções sobre o aprender de Vygotsky são a
linguagem, o discurso e a cultura e podem ser melhor traduzidos da seguinte forma:
•
Todos estamos imersos num discurso cultural a partir do qual
construímos nossos conhecimentos.
•
A escola é fundamental na construção dos conceitos científicos.
Os conceitos podem ser tanto construídos de forma indutiva
•
(concepções espontâneas, do senso comum) quanto de forma dedutiva
(concepções científicas).
•
A mediação do adulto e, especialmente do professor, é essencial na
aquisição de novos conceitos dentro da zona de desenvolvimento potencial
dos alunos.
•
O desenvolvimento de novos conceitos provoca transformações no
significado dos conceitos já existentes, dando lugar a uma contínua
reestruturação cognitiva do aluno. (MORAES, 2000, p.113-114)
1.4 Multiplicidade de construtivismos
Segundo Carretero (1997), pode-se falar em multiplicidade de construtivismos,
ou seja, três concepções sobre como o aprender pode-se dar:
•
aprendizagem é uma atividade solitária;
•
sem amigos, não se pode aprender;
•
com amigos se aprende melhor.
A primeira concepção está mais ligada às idéias de Piaget e seus discípulos. A
segunda concepção é derivada das idéias de Vygotsky e dos que trabalharam com ele.
Esse tipo de construtivismo reconhece que a aprendizagem ocorre, essencialmente, no
meio cultural e lingüístico no qual estamos inseridos.
Ainda segundo Carretero (1997, p. 19),
Sem amigos, não se pode aprender. Esta seria a posição vygotskyana radical
que na atualidade tem conduzido a posições como a “cognição situada” (no
contexto social). A partir desta posição se mantém que o conhecimento não é
um produto individual mas social. Assim pois, quando o aluno está
adquirindo informação, o que está em jogo é um processo de negociação de
conteúdos estabelecidos arbitrariamente pela sociedade. Portanto, mesmo que
o aluno realiza também uma atividade individual, a ênfase deve colocar-se no
intercâmbio social. Como provavelmente resultará evidente para muitos
leitores, o perigo que pode ter um enfoque como este é o risco do
desaparecimento do aluno individual, isto é, dos processos individuais de
mudança.
A terceira concepção de construtivismo é uma espécie de equilíbrio entre as
duas anteriores: aceita que o aprender não é apenas um empreendimento individual, mas
valoriza o sujeito dentro do aprender. Assim, Carretero (1997, p. 19), menciona
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Com amigos se aprende melhor. Esta posição tem sido mantida por
investigadores construtivistas que podem considerar-se a meio caminho entre
as contribuições piagetianas e cognitivistas e as vygotskianas, por exemplo,
pelos que têm mantido que a interação social produz um favorecimento da
aprendizagem mediante a criação de conflitos cognitivos que causam uma
mudança conceitual. É dizer, o intercâmbio de informação entre
companheiros que têm diferentes níveis de conhecimento provoca uma
modificação dos esquemas do indivíduo e acaba produzindo aprendizagem,
além de melhorar as condições motivacionais da instrução. Em definitivo:
neste enfoque se estuda o efeito da interação e do contexto social sobre o
mecanismo de mudança e aprendizagem individual.
2. A PESQUISA
2. 1 Grupo de pesquisa
Este trabalho que está sendo relatado faz parte de um projeto de pesquisa
intitulado “Construção do conhecimento matemático” em desenvolvimento no Centro
Universitário UNIVATES, na cidade de Lajeado – Rio Grande do Sul. Integram essa
pesquisa duas professoras da Instituição, duas bolsistas de iniciação científica e,
aproximadamente, quarenta professores com diversas formações e que atuam desde as
séries iniciais do ensino fundamental até o terceiro ano do ensino médio.
O referido grupo vem até a Instituição, mensalmente, de forma voluntária, com
o intuito de trocar experiências, pesquisar sua prática pedagógica e buscar uma
formação continuada. Tem uma caminhada de mais de cinco anos. Durante esses anos,
houve mudanças tanto no grupo participante como no foco de pesquisa. Inicialmente o
interesse do grupo estava somente voltado à questões metodológicas, pois acreditavam
que isso era a solução para seus problemas de ensino-aprendizagem, ou seja, buscavam
“receitas prontas”. Mas, no decorrer dos anos, os interesses individuais passaram a ser
coletivos e as trocas de experiências intensificaram-se, bem como a procura por algum
referencial teórico que justificasse os problemas encontrados no processo.
Baseado nas discussões de anos anteriores e nas leituras de referenciais
teóricos, o grupo elaborou um instrumento de pesquisa – apresentado na próxima seção
- para investigar como o professor de matemática do Vale do Taquari escolhe seus
conteúdos, sua prática pedagógica e o que pensa a respeito de questões epistemológicas.
O referido instrumento foi aplicado em outros professores, colegas de trabalho, por
escrito. As bolsistas, participantes do projeto, também aplicaram o mesmo instrumento
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em colegas – alunas dos cursos de Licenciatura em Matemática, Licenciatura em
Ciências Exatas e Pedagogia – Séries Iniciais - as quais já atuam em sala de aula. Desta
vez, as respostas foram gravadas e posteriormente transcritas. Cabe salientar, ainda, que
este mesmo instrumento, com as devidas adaptações, foi aplicado em alunos destes
professores para verificar a coerência entre o discurso e a prática.
2.2 Instrumento de coleta de dados
Apresentamos, a seguir, o referido instrumento.
ROTEIRO DA ENTREVISTA PARA PROFESSORES
1
DADOS DE IDENTIFICAÇÃO
1.1 Há quanto tempo você leciona matemática?
1.2 Qual(is) a(s) série(s) que você já lecionou?
1.3 Qual(is) a(s) série(s) que está lecionando?
1.4 Qual a série que você mais gosta de lecionar? Por quê?
2 QUANTO AOS CONTEÚDOS
2.1 Em que você se baseia para escolher os conteúdos matemáticos?
2.2 Que conteúdos matemáticos você prefere trabalhar com seus alunos? Justifique sua
resposta.
2.3 Que conteúdos matemáticos você não gosta de trabalhar com seus alunos? Justifique
sua resposta.
2.4 Com relação aos conteúdos frações e números decimais:
a) Que conteúdo você prefere trabalhar com seus alunos? Por quê?
b) Na sua prática docente, o tempo utilizado para ensinar/aprender ambos os conteúdos
é o mesmo? Por quê?
c) Na sua opinião, qual dos dois conteúdos tem mais aplicação no dia-a-dia? Cite alguns
exemplos destas aplicações.
d) Qual dos dois conteúdos você considera mais importante? Por quê?
e) Qual dos conteúdos seus alunos aprendem com mais facilidade? Justifique.
2.5 Com relação aos conteúdos álgebra e geometria:
a) Que conteúdo você prefere trabalhar com seus alunos? Por quê?
b) Na sua prática docente, o tempo utilizado para ensinar/aprender ambos os conteúdos
é o mesmo? Por quê?
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c) Na sua opinião, qual dos dois conteúdos tem mais aplicação no dia-a-dia? Cite alguns
exemplos destas aplicações.
d) Qual dos dois conteúdos você considera mais importante? Por quê?
e) Qual dos conteúdos seus alunos aprendem com mais facilidade? Justifique.
3
QUANTO A PRÁTICA DOCENTE
3.1 Você investiga e utiliza as idéias prévias dos seus alunos? De que forma?
3.2 Como você costuma introduzir um assunto novo? Exemplifique.
3.3 Você adota livro texto com seus alunos? Por quê?
3.4 Quanto tempo, em média, você dedica para a preparação das suas aulas?
3.5 Tente pensar sobre uma aula que seus alunos gostaram:
a) Descreva como foi esta aula.
b) Que conteúdo você trabalhou?
c) Em que série ela ocorreu?
d) Tempo destinado ao preparo desta aula.
e) Que atitudes positivas seus alunos demonstraram?
3.6 Agora, tente pensar sobre uma aula que seus alunos não gostaram.
a) Descreva como foi esta aula.
b) Que conteúdo você trabalhou?
c) Em que série ela ocorreu?
d) Tempo destinado ao preparo desta aula.
e) Que atitudes negativas seus alunos demonstraram?
3.7 Posição em relação ao uso da calculadora:
a) Você permite seu uso? Por quê?
b) A partir de que série você permite o uso da calculadora?
c) Em que tipo de atividade você permite o uso da calculadora?
4
QUANTO
AOS
PROBLEMAS
DE
ENSINO-APRENDIZAGEM
DA
MATEMÁTICA
4.1 O que a sua Escola faz com os alunos que têm dificuldades de aprendizagem? De
que forma ela detecta essas dificuldades?
4.2 Na sua opinião, em que série os alunos têm mais dificuldades matemáticas?
Justifique sua opinião.
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4.3 Comparando 4a com 5a série, em qual delas você acredita que os alunos tem mais
dificuldades? Justifique.
4.4 Na sua opinião, como o aluno aprende matemática?
4.5 Qual a sua maior dificuldade no processo ensino-aprendizagem?
5
VOCÊ GOSTARIA DE DIZER ALGO QUE NÃO LHE FOI PERGUNTADO?
2.3 Síntese dos resultados obtidos
Os instrumentos de coleta de dados foram lidos e analisados por todos os
integrantes do projeto de pesquisa e alguns resultados serão apresentados a seguir.
Perguntados sobre a escolha dos conteúdos, preferência por geometria ou
álgebra, preferência por frações ou números decimais, tempo dedicado a estes
conteúdos, aplicabilidade e facilidade de aprendizagem por parte dos alunos, os
professores responderam:
•
os conteúdos são pré-estabelecidos pela escola;
•
há preferência por geometria;
•
não gostam de álgebra;
•
dedicam mais tempo para álgebra;
•
acreditam que números decimais e geometria têm mais aplicabilidade,
importância e são fáceis de aprender.
As respostas dos alunos para estas mesmas questões foram:
•
que não há uma preferência explícita com relação a um conteúdo ou
•
que estudaram mais tempo frações;
•
acreditam que números decimais e geometria têm maior aplicabilidade e
outro;
importância.
Nas questões que abordavam a prática docente tais como a utilização de idéias
prévias, introdução de novos conteúdos, tempo de preparação dos conteúdos, o uso do
livro texto, descrição de aulas “boas” e aulas “não-boas” e o uso da calculadora, os
professores responderam que:
•
investigam e utilizam idéias prévias dos alunos;
•
introduzem conteúdos novos através de conteúdos práticos, mas sentem
dificuldades;
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•
usam livro texto;
•
dedicam, em média, até uma hora diária de preparação;
•
aulas “boas” são as aulas práticas, nas quais é demonstrado interesse,
participação, envolvimento e planejamento;
•
aulas “não-boas” são as aulas teóricas com pouco planejamento, nas
quais os alunos ficam dispersos ou não entendem o conteúdo;
•
permitem o uso da calculadora em casos especiais.
As respostas dos alunos para estas mesmas questões foram:
•
o professor utiliza as idéias prévias dos alunos;
•
os conteúdos novos são introduzidos através de exemplos práticos;
•
a maioria adota livro texto;
•
gostam de aulas práticas, silenciosas, interativas, com explicações claras,
nas quais entendem o conteúdo;
•
não gostam de aulas com bagunça, chatas, com clima “pesado” e onde
não conseguem entender o conteúdo;
•
afirmam que nem sempre é permitido o uso da calculadora e que esta
impede o desenvolvimento do raciocínio lógico.
Com relação aos problemas ensino-aprendizagem, os professores dizem que:
•
dificuldades de aprendizagem são “tratadas” em oficinas ou laboratórios
de aprendizagem;
•
alunos apresentam dificuldades em todas as séries;
•
os alunos apresentam mais dificuldades na 5a série se comparados à 4a
•
o aluno aprende matemática vivenciando, praticando, desenvolvendo o
série;
interesse, estabelecendo relações;
•
as maiores dificuldades no processo ensino-aprendizagem são:
a)
por parte dos alunos – falta de participação, motivação e concentração;
desinteresse e indisciplina;
b)
por parte dos professores – excesso de carga horária, falta de visão sobre
a aplicabilidade de certos conteúdos e falta de conhecimento de novas tecnologias.
E os alunos responderam:
•
que os professores dão mais atenção aos alunos com mais dificuldades,
as quais são percebidas através de provas e trabalhos;
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•
a escola oferece recuperação paralela e reforço em outro turno;
•
tiveram mais dificuldades na 5a série em relação à 4a;
•
que aprendem matemática prestando atenção na explicação do professor
e fazendo exercícios;
•
as maiores dificuldades para aprender matemática são: bagunça, falta de
concentração e falta de objetividade nas explicações dos professores.
2.4 Algumas considerações
Analisando as respostas dadas pelos professores e alunos, algumas questões
parecem um tanto contraditórias. Por um lado, os professores dizem que números
decimais e geometria têm maior aplicabilidade e importância, no entanto, o tempo
dedicado a esses conteúdos é menor se comparado à álgebra e frações. Outra questão é a
qualidade das aulas. As aulas consideradas “boas” são as que exigem planejamento,
porém, os professores dedicam, no máximo, uma hora para essa atividade, por dia.
Um aspecto relevante nas respostas dadas pelos alunos foi a importância dada
por estes com relação ao ambiente de aprendizagem, reforçando a necessidade de
limites, ou seja, os alunos não gostam de aulas com bagunça, chatas e com “clima
pesado”.
Observamos, também, que as respostas dadas pelos alunos com relação ao uso
da calculadora refletem o pensamento dos professores.
Cabe, após esta análise, colocar alguns questionamentos. Até que ponto os
professores estão refletindo sobre sua prática? A que ponto são coerentes com aquilo
que acreditam? Por que ensinam tanta álgebra se não acham que ela seja tão importante?
Por que não dedicam mais tempo ao preparo das aulas se isso é fundamental para obter
sucesso? Por que não impõe mais limites se é por isso que os alunos clamam?
Talvez uma reflexão coletiva acerca desse tema possa contribuir na obtenção
de algumas respostas.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base nas considerações mencionadas anteriormente acerca das
concepções epistemológicas, juntamente com a análise das respostas dadas aos
questionamentos, pode-se tecer algumas considerações relevantes.
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Primeiramente, percebemos que um grupo significativo dos professores
entrevistados apresentou uma concepção interacionista de aprendizagem, ou seja,
acredita que o aluno aprende matemática, vivenciando, praticando, desenvolvendo o
interesse e estabelecendo relações. Por outro lado, nos alunos ficou evidente uma
concepção empirista, haja vista que acreditam que se aprende matemática prestando
atenção na explicação do professor e fazendo exercícios. Desse modo fica possível
inferir que há uma desconexão entre o discurso e a prática do professor.
Com relação ao processo ensino-aprendizagem, o professor acredita que tanto
ele quanto o aluno contribuem para o sucesso ou o insucesso deste. Refere-se ao aluno
como um sujeito desmotivado, desinteressado e indisciplinado, ao mesmo tempo sentese “culpado” porque têm um excesso de carga horária a cumprir, não consegue perceber
a aplicabilidade de certos conteúdos e não usa, por falta de conhecimento, as novas
tecnologias. Os alunos, numa concepção empirista de aprendizagem, afirmam que, para
minimizar as dificuldades de aprendizagem, necessitam de silêncio, concentração e
explicações claras e objetivas. Essas afirmações ressaltam o quanto o discurso do
professor está enraizado nas concepções do aluno.
E por fim, gostaríamos de ressaltar que, embora a leitura dos resultados da
pesquisa decline para concepções mais conservadoras, é oportuno destacar que esse
grupo de professores vem à busca de novas idéias e orientações e, ao mesmo tempo, traz
e compartilha suas experiências. Desta forma, sente-se comprometido com a melhoria
do processo ensino-aprendizagem.
Nossa expectativa, portanto, está fundamentada na tese de que esses encontros
e essas discussões fomentem, entre eles, a idéia de professor pesquisador de sua própria
prática pois, segundo Ramos (1998, p. 15), professor pesquisador é
[...]aquele que se propõe a pesquisar a sua prática em sala de aula, com seus
alunos, mediante reflexão sobre a ação. Esse professor tem um olhar
diferenciado sobre o próprio trabalho. É um professor que observa melhor
seus alunos, analisa mais demoradamente resultados de medidas de
aprendizagem, submete permanentemente a sua ação docente à avaliação
pelos alunos, não tem medo de transformar a sua sala de aula em
experimentação, tanto em termos de proposições, escolha de conteúdos,
seleção de procedimentos de avaliação, pois sabe que é assim que se aprende:
agindo e refletindo sobre a ação.
PALAVRAS-CHAVE: concepção, aprendizagem, matemática.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BATTRO, Antonio M. Dicionário terminológico de Jean Piaget. Porto Alegre:
Mediação, 1978.
BECKER, Fernando; FRANCO, Sérgio R. K. Revisitando Piaget. Porto Alegre:
Mediação, 1999.
BRINGUIER, Jean-Claude. Conversando com Piaget. Rio de Janeiro: Difel, 1978.
CARRETERO, Mario. Construtivismo e Educação. Tradução de Jussara Haubert
Rodrigues. Porto Alegre: Artmed, 1997.
MORAES, Roque (Org.). Construtivismo e ensino de ciências: reflexões
epistemológicas e metodológicas. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000.
PIAGET, Jean. Biologia e conhecimento. São Paulo: Vozes, 1973.
______. O nascimento da inteligência na criança. 2a ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.
______. Psicologia e Pedagogia. Rio de Janeiro: Forense, 1970.
RAMOS, Maurivan Güntzel. Os significados da pesquisa na ação docente e a qualidade
do ensino. Educação e Ciência e Questões Afins. Porto Alegre: EDIPUCRS, Ano
XXIII – No 40 – 2000.
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