ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO
PARECER N.º 15.042
1) CEDÊNCIA COM E SEM ÔNUS PARA A ORIGEM.
EFEITOS SOBRE A VIDA FUNCIONAL DO
SERVIDOR.
2) AVERBAÇÃO EM DUAS LINHAS FUNCIONAIS
DISTINTAS DE TEMPO DE SERVIÇO EXERCIDO
EM
UM
ÚNICO
CARGO
OU
FUNÇÃO:
IMPOSSIBILIDADE.
Vem para exame expediente administrativo no qual professora estadual
requereu, em 02 de setembro de 2005, a averbação do tempo de serviço correspondente
ao período de 01 de janeiro de 2001 a 31 de dezembro de 2004 - quando esteve cedida
para o Município de São Luiz Gonzaga - nas duas matrículas que detêm junto ao Estado
do Rio Grande do Sul. Juntou certidão de tempo de serviço expedida pelo Município, da
qual consta que a servidora sempre manteve vínculo com o Instituto de Previdência do
Estado do Rio Grande do Sul.
A 32ª Coordenadoria Regional de Educação encaminhou o expediente
para a Secretaria da Administração e dos Recursos Humanos - SARH para concessão
dos triênios, mas a Seção de Direitos e Vantagens suscitou dúvida acerca da
possibilidade de cômputo do tempo em ambas as matrículas e solicitou manifestação da
assessoria jurídica.
Esta, por sua vez, solicitou informações acerca das contribuições
previdenciárias do período, tendo o IPERGS informado que a servidora contribuiu em
ambas as matrículas durante o período de cedência, de acordo com as disposições da
Lei nº 7.672/82, e que não foram efetuados recolhimentos pelo Município de São Luiz
Gonzaga, enquanto a Secretaria da Fazenda informou que foi feito o recolhimento
parcelado da contribuição previdenciária suplementar do período de cedência, em ambas
as matrículas, a partir da folha de pagamento de janeiro/2005.
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Restituído o expediente à Seção de Direitos e Vantagens para
conhecimento, foi solicitado novo encaminhamento para a assessoria jurídica, uma vez
persistir a dúvida acerca da possibilidade de averbação do tempo de serviço exercido em
um único cargo municipal de 40 horas em dois cargos estaduais de 20 horas, com a
conseqüente concessão dúplice das vantagens.
E a assessoria jurídica, em manifestação acolhida pela Secretária de
Estado da Administração e dos Recursos Humanos, sugeriu encaminhamento do
expediente à Procuradoria-Geral do Estado para orientação, verbis:
1) acerca da necessidade de requerimento de averbação de tempo de
serviço prestado por servidor do Estado, colocado à disposição de
outro Órgão ou Ente Federado, tanto com ônus como sem ônus
para a origem;
2) acerca da possibilidade de ser computado o período em que a
servidora CLARI ELISETE DE MELO RAMBORGER esteve à
disposição do Município de São Luiz Gonzaga, período esse a ser
inserido em cada uma das matrículas que detêm no Estado,
computando-se esse tempo em ambas as posições funcionais.
Relatei.
A consulta contém dois questionamentos distintos, a merecer exame
individualizado.
E para o equacionamento do primeiro, necessário traçar a distinção
entre a cedência com ônus e a cedência sem ônus, no que respeita aos efeitos na vida
funcional do servidor.
Assim, enquanto na cedência com ônus para a origem configura-se
apenas uma forma extraordinária de exercício do cargo público – em órgão/ente diverso
daquele ao qual pertence o servidor, mas no interesse da Administração -, sem outras
alterações substanciais da relação funcional, na cedência sem ônus para a origem forma2
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se uma relação jurídica nova. E tratando-se de relação jurídica diversa da originária,
assume ela a roupagem própria do ente estatal de destino, ou seja, a relação funcional
sujeitar-se-á às mesmas regras aplicáveis aos demais servidores do cessionário e os
vencimentos são percebidos à conta deste.
Logo, o servidor estadual cedido sem ônus para a origem interrompe o
exercício das funções estaduais e, conseqüentemente, a fluência do tempo de serviço
estadual, uma vez que a expressão “sem ônus” alcança todas as obrigações do Estado
em relação ao servidor - salvo aquelas excetuadas em lei, como a possibilidade de
retornar ao cargo de origem -, e não apenas aquelas de caráter pecuniário (pagamento
de vencimento e vantagens).
Importa lembrar, como já assentado no Parecer 14.058/04, que
entendimento distinto ensejaria inconstitucionalidade, por violação da regra constitucional
proibitiva da acumulação remunerada de cargos, empregos e funções públicas (art. 37,
XVI e XVII). É que, colocado o servidor à disposição de outro ente público, sem ônus
para o Estado, somente se viabiliza a assunção de outro cargo ou emprego sem infração
da aludida regra constitucional se a relação funcional originária for tida como quiescente.
Assim, o exercício de outro cargo em comissão, sem ônus para a origem, ainda que não
tenha a qualidade de romper com a vinculação primeira, acarreta espécie de suspensão
do vínculo originário, a teor dos artigos 25 e 181 da Lei Complementar nº 10.098/94, e
estabelecimento de novo vínculo na entidade cessionária, sujeito às regras próprias
desta.
Não se há, porém, de confundir o vínculo jurídico com o vínculo
previdenciário. Então, muito embora na cedência sem ônus se verifique a interrupção do
exercício na órbita cedente (Estado), e passe o servidor a ter exercício na entidade
cessionária e a perceber a remuneração por conta desta, permanece vinculado ao regime
previdenciário de origem, em face do que dispõe o artigo 1º-A da Lei Federal nº 9.717/98,
na redação atribuída pela Medida Provisória 2-187/01, devendo sua contribuição ser
recolhida no percentual de 12% sobre o salário de contribuição (art. 8º c/c art. 7º da Lei nº
7.672/82), acrescida da contribuição previdenciária devida pelo ente cessionário,
equivalente ao dobro da contribuição devida pelo servidor (art. 2º da LC 12.065/04), como
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esclarecido no Parecer nº 14.135/04, e não no percentual de 11%, devido pelo servidor
quando cedido com ônus para a origem.
Do quanto até aqui exposto decorre que na cedência com ônus para a
origem, configurado apenas um deslocamento no âmbito do exercício das funções do
servidor (que passa a ser na e para a entidade de destino), sem modificações de outra
ordem, o tempo de serviço é tempo estadual e, assim, alcançado pelo artigo 64, V, da Lei
Complementar nº 10.098/94. Nessa condição, sequer deve deixar de ser computado
durante o período de cedência, do que decorre a desnecessidade de qualquer
requerimento objetivando sua averbação.
Contudo, na cedência sem ônus para a origem, porque estabelecida
uma nova relação jurídica com outro ente estatal (ainda que mediante autorização do
órgão cedente), o tempo de serviço é estranho ao Estado, do que decorre a necessidade
de examinar a possibilidade de que seja averbada para fins de concessão de vantagens
temporais (uma vez que o cômputo para efeitos de aposentadoria deriva do artigo 65, I,
da LC nº 10.098/94 e da manutenção das contribuições ao regime próprio de previdência
durante o período da cedência, determinada pela Lei Federal nº 9.717/98 e LC nº
12.065/04) e, caso viável, a partir de quando poderá repercutir na esfera patrimonial do
servidor.
Os artigos 99 e 116 da LC nº 10.098/94 e 37 da Constituição Estadual
facilmente solucionam a primeira questão, uma vez que expressamente admitem o
cômputo do tempo de serviço público federal, estadual e municipal prestado à
administração direta, autarquias e fundações públicas para efeito de concessão do
adicional por tempo de serviço e dos avanços trienais.
Não é computável, porém, o tempo de serviço prestado às sociedades
de economia mista e fundações de direito privado, instituídas e mantidas pelo Poder
Público, uma vez que, embora realizando atividades de interesse público e inseridas no
conceito de administração indireta, sua essência é de natureza privada; submetem-se ao
regime jurídico próprio das empresas privadas, ainda que temperadas pela submissão a
certas regras jurídicas de caráter administrativo, como assentado largamente pela
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jurisprudência administrativa (Pareceres 9.441/92, 12.347/98, 12.351/98, 12.854/00
13.699/03, 13.702/03, 13.766/03, 14.520/06, dentre outros).
Ainda, o período de cedência sem ônus para a origem não poderá ser
computado para efeito de concessão de licença-prêmio, uma vez que somente a
prestação de serviço ao Estado é aproveitável para esta finalidade, conforme artigo 33, §
4º, da Constituição do Estado.
Já no que respeita ao segundo aspecto, imperativo ter presente que, se
a lei confere a qualificação de público ao tempo de serviço prestado pelo servidor, no
momento em que ocorre o retorno ao exercício das funções do cargo titulado o
dispositivo legal incide sobre aquele tempo, qualificando-o, tendo esta qualificação do
tempo de serviço valor jurídico próprio, suscetível de produzir efeitos. Assim, após ter
incidido sobre o tempo de serviço, conferindo-lhe o atributo de público, tal qualificação
não mais poderá ser apagada, sequer por eventual revogação da lei que a admitia; a
incidência da lei, conferindo o "colorido" de público ao tempo de serviço, determina que
como tal seja considerado para todos os efeitos então legalmente admitidos.
O Estado, em realidade, fica obrigado a aplicar ao tempo de serviço
público estranho as conseqüências que lhe são atribuídas pelo seu ordenamento jurídicoadministrativo. Mas, importa lembrar, as gratificações por tempo de serviço não só
guardam íntima vinculação com a prestação de trabalho a determinada pessoa pública de
direito interno a qual se vincula o servidor, como constituem autêntico prêmio à
permanência no serviço, conforme assentado no Parecer nº 14.440/06. Logo, a contagem
de tempo de serviço estranho à órbita estadual para outros efeitos, que não os de
aposentadoria e disponibilidade, decorre da existência de regra estadual autorizativa
expressa e excepcional, regra esta que deverá ser, sempre, interpretada restritivamente.
Por esta razão, tratando-se de tempo de serviço público estranho, cujos
elementos estruturantes – jornada de trabalho, remuneração e principalmente efetividade
- não estão sob controle e supervisão direta do Estado, necessário se faz o auxílio da
parte interessada, mediante requerimento de averbação acompanhado da respectiva
certidão de tempo de serviço, o qual constituirá o termo inicial para pagamento das
vantagens temporais decorrentes.
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Com efeito, não pode o Estado tornar-se automaticamente devedor das
vantagens temporais enquanto ainda desconhece a efetividade do servidor no período da
cedência. Logo, ainda que no retorno ao exercício do cargo titulado nasça o direito à
qualificação do tempo como público, o direito à efetiva percepção das vantagens
pecuniárias - benefícios previstos no regramento jurídico do Estado e que pressupõem o
preenchimento de requisitos legais – nasce com a comprovação do tempo de serviço
mediante documento hábil.
Resta agora examinar o segundo questionamento, concernente à
possibilidade de cômputo do tempo de serviço correspondente à cedência nos dois
cargos detidos pela interessada no serviço público estadual.
E para que se obtenha a resposta, importa ter presente que a titulação
de dois cargos acarreta a existência de duas linhas funcionais absolutamente distintas, as
quais não guardam qualquer relação necessária entre si, sendo possível inclusive que o
servidor seja titular de determinados direitos numa das linhas funcionais e na outra não,
em decorrência, por exemplo, de mudanças constitucionais ou legais. E tanto é assim
que o artigo 117 da Lei Complementar nº 10.098/94 expressamente prevê que, na
acumulação remunerada, será considerado, para efeitos de concessão do adicional por
tempo de serviço, o tempo prestado a cada cargo isoladamente.
E na hipótese que se examina, durante o período de cedência a
servidora exerceu apenas o cargo de Secretária Municipal de Educação, isto é, titulou no
destino uma única posição funcional, sendo irrelevante, para efeitos de averbação do
tempo de serviço, a carga horária exercida. O que importa é que a servidora não exerceu
dois cargos ou funções públicas no período da cedência, de modo que somente poderá
averbar o tempo de serviço correspondente em uma das matrículas que detém no
Estado.
Consoante já asseverado no Parecer nº 11.998/97, o desdobramento de
horário ou alargamento de uma única jornada de trabalho não enseja a individualização
de tempo de serviço aproveitável concomitantemente para aposentadoria e concessão de
vantagens temporais em dois cargos distintos; o cômputo de tempo de serviço em ambos
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somente seria possível se no órgão de destino o servidor também titulasse duas posições
funcionais distintas.
E ao exame de situação similar – pretensão de averbação de tempo de
serviço privado correspondente ao exercício de uma única atividade em duas matrículas
de professor -, a jurisprudência tem reconhecido a impossibilidade do duplo
aproveitamento:
“Administrativo. Professora estadual, averbação de tempo de serviço.
Impossibilidade de utilização do mesmo período prestado à iniciativa privada
em dois cargos públicos. Faculdade de acumulação de dois cargos públicos
(CF, art. Inc. XVI, a) beneficia a duplicidade remuneratória, não o
aproveitamento do tempo privado, para fins de aposentadoria, de forma
dúplice. Embargos rejeitados” (EMI nº 597038488, 2º GC, TJRS, Relator. Des.
Luiz Ari Azambuja Ramos, j. 13.3.98).
“Professora estadual. Dois contratos. Averbação do tempo de serviço
privado. Aposentação em um cargo. Pretensão de contagem dúplice.
Descabimento. A existência de dois contratos e duas matrículas implica no
reconhecimento de dois cargos públicos, embora integrados na mesma
pessoa. Assim, a averbação do tempo privado em um dos cargos, o que
permitiu a aposentação nele, não enseja nova contagem para o outro, sob
pena de cômputo em dobro. Apelação desprovida.” (APC nº 5970130871,
Terceira Câmara Cível, TJRS, Relator: Des. José Carlos Teixeira Giorgis, j. em
09/10/1997).
É certo que, no caso concreto, em face da impossibilidade de
cumulação do cargo de Secretária Municipal com um cargo de magistério, por não se
tratar de hipótese de acumulação admitida pelo artigo 37, XVI, da Constituição Federal
(Pareceres nº 12.984/01, 12.593/99, 10.817/96, entre outros), a servidora foi colocada à
disposição em ambas as matrículas. Mas, precisamente porque exerceu no destino uma
única posição funcional, o tempo de serviço somente será aproveitável em uma delas,
consoante opção da servidora. Na outra matrícula, o vínculo permaneceu suspenso
durante o período de disposição (art. 25, I, c/c art. 181 da LC nº 10.098/94), não sendo o
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respectivo tempo computável para vantagens e inativação (a contribuição previdenciária
vertida no período destinava-se apenas a garantir benefícios previdenciários aos
dependentes da segurada, caso ocorresse, no período de afastamento, evento que lhes
desse causa).
Ainda, em decorrência da orientação ora exarada, impende seja
verificada a correção dos recolhimentos ao regime próprio de previdência no período de
duração da cedência (01.01.01 a 31.12.04): 12% a título de contribuição do servidor e 2%
da remuneração líquida a título de contribuição previdenciária suplementar, em ambas as
matrículas, no período que antecedeu a entrada em vigor das alíquotas estabelecidas
pela Lei Complementar nº 12.065/04, e, depois, 12% a título de contribuição
previdenciária do servidor acrescido de recolhimento do ente cessionário (equivalente ao
dobro da contribuição do servidor) na matrícula em que ocorreu a cedência e de
recolhimento do Estado (também equivalente ao dobro da contribuição do servidor) na
matrícula em que apenas suspenso o vínculo para elisão do acúmulo.
Sinteticamente então:
a) na cedência com ônus para a origem, configurado apenas um
deslocamento no âmbito do exercício das funções do servidor (que
passa a ser na e para a entidade de destino), sem modificações de
outra ordem, o tempo de serviço é tempo estadual e, nessa
condição, sequer deve deixar de ser computado durante o período
de cedência, do que decorre a desnecessidade de qualquer
requerimento objetivando sua averbação;
b) na cedência sem ônus para a origem, por se tratar de tempo de
serviço público estranho, cujos elementos estruturantes – jornada de
trabalho, remuneração e principalmente efetividade - não estão sob
controle e supervisão direta do Estado, necessário se faz o
requerimento de averbação, acompanhado da respectiva certidão
de tempo de serviço, o qual constituirá o termo inicial para
pagamento das vantagens temporais decorrentes;
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c) não é possível a averbação em duas posições funcionais distintas
de um mesmo tempo de serviço exercido em um único cargo ou
função;
d) no caso concreto, deve o tempo de serviço correspondente ao
período de disposição ser averbado em apenas uma matrícula,
mediante opção da servidora, com suspensão do vínculo na outra
matrícula para elidir a acumulação,
bem como ser verificada a
correção do recolhimento das contribuições previdenciárias, com
adoção das medidas necessárias caso constatado equívoco ou
insuficiência de recolhimentos.
e) recomendável, por fim, que o órgão consulente adote os
procedimentos administrativos necessários para o cumprimento das
orientações ora firmadas.
É o parecer.
Porto Alegre, 04 de novembro de 2008.
ADRIANA MARIA NEUMANN
PROCURADORA DO ESTADO
Processo no 0054883-1900/05-5
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Processo n.º 054883-19.00/05-5
Acolho as conclusões do PARECER n.º 15.042, da
Procuradoria de Pessoal, de autoria da Procuradora do Estado
Doutora ADRIANA MARIA NEUMANN.
Restitua-se o expediente à Secretaria da Administração e
dos Recursos Humanos.
Em 24 de julho de 2009.
Eliana Soledade Graeff Martins,
Procuradora-Geral do Estado.
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