Grupo de Trabalho IV: Estado, mercado, sociedade civil e garantia dos direitos humanos de meninos, meninas e adolescentes na América Latina Título do Trabalho: A visibilidade do direito à convivência familiar e comunitária – O trabalho de assessoria aos Promotores de Justiça da Infância e Juventude no Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro Apresentador: Márcia Nogueira da Silva- Doutoranda do Programa de PósGraduação em Serviço Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPGSS/UERJ). Assistente Social do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) Autores: Márcia Nogueira da Silva; Anália dos Santos Silva 1 e Saulo Oliveira dos Santos2 RESUMO: O trabalho tem como objetivo apresentar a experiência de assessoramento técnico prestado pela equipe que atua no Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Infância e Juventude do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (CAOPJIJ/MPRJ), com foco na criação e fortalecimento de políticas públicas voltadas para a garantia do direito à convivência familiar e comunitária no século XXI. ABTRACT: This paper aims to present the experience of technical advice of the team working at the Center for Operational Support of Prosecutor for Children and Youth of the Public Ministry of the State of Rio de Janeiro (CAOPJIJ/ MPRJ), focusing on creating and strengthening of facing the guarantee of the right to family and community life in the twenty-first century public policies. Desde os anos de 1980, o Brasil vem passando por importantes mudanças no que se refere ao reconhecimento de direitos sociais relevantes, que refletem importantes conquistas para diversos grupos sociais. O processo foi iniciado com a aprovação, no ano de 1988, de uma Constituição Federal de inclinação democrática, que foi, ao longo dos anos seguintes, regulamentada por meio de uma série de leis específicas. A título de exemplo encontramos, dentre os principais avanços legais, o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), a Lei Orgânica da Saúde (1990), a 1 Assistente Social do MPRJ Psicólogo do MPRJ. 2 1 Lei Orgânica da Assistência Social (1993) e o Estatuto do Idoso (2003), que contribuíram para a promoção de novas referências quanto ao delineamento de ações e políticas públicas voltadas à garantia de direitos da população usuária. A estas legislações, foi acrescida uma série de normativas expressas em planos e orientações técnicas aprovadas pelos Conselhos de Direitos e Políticas nos três níveis de governo, que representam um significativo esforço de materialização dos direitos reconhecidos ao longo das últimas décadas, conforme pode ser visualizado no quadro a seguir: ANO REFERÊNCIA CONTRIBUIÇÕES NORMATIVA 1988 1990 2002 Constituição da República Lei Federal N.º 8069/1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual InfantoJuvenil Reconhece o dever da família, da sociedade e do Estado na garantia, com prioridade absoluta, dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes. Ratifica os direitos apresentados na Constituição e na Convenção das Nações Unidas (1989), e prevê a consolidação de uma política de atendimento aos direitos de crianças e adolescentes. Apresenta o planejamento para criar, fortalecer e implementar um conjunto articulado de ações e metas fundamentais para assegurar a proteção integral à criança e ao adolescente em situação ou risco de violência sexual entre os anos de 2002 e 2011. Apresenta um plano destinado à promoção, proteção e defesa do direito de crianças e 2 Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária 2006 Resolução CONANDA N.º 113 – Sistema de Garantia dos Direitos Humanos da Criança e do Adolescente – SGDHCA Sistema Nacional Socioeducativo – SINASE (SEDH/CONANDA) 2009 Resolução Conjunta CONANDA/CNAS N.º 1 – Aprova o documento “Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes” Lei Federal N.º 12010/2009 – “Nova Lei de Adoção” 2011 Plano Decenal dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes adolescentes à convivência familiar e comunitária, com vistas à formulação e implementação de políticas de garantia de direitos de forma articulada e integrada aos demais programas de governo entre os anos de 2006 e 2015. Define e estabelece os parâmetros para a institucionalização e fortalecimento do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente – SGDHCA. Propõe uma política de atendimento socioeducativo nacional pautada nos direitos humanos e o alinhamento conceitual, estratégico e operacional estruturado em bases éticas e pedagógicas. Apresenta orientações para o funcionamento adequado dos serviços de acolhimento institucional e familiar para crianças e adolescentes. Dispõe sobre adoção e sobre a sistemática prevista para garantia do direito à convivência familiar a todas as crianças e adolescentes. Apresenta os eixos, diretrizes e objetivos estratégicos da Política Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente entre os anos de 2011 e 2020. 3 Não obstante, ao se fazer um balanço da efetividade das referências normativas, é possível observar que, infelizmente, pouco se logrou no sentido da execução de uma política genuinamente garantidora dos direitos humanos de adolescentes e jovens. Conforme destaca Netto Na contemporaneidade, a defesa dos direitos humanos não é factível se for autonomizada dos direitos sociais (...) a integridade humana não se viabiliza sem trabalho assegurado, sem garantia de alimentação, sem moradia adequada, sem educação formal, sem saúde assistida. E não existe liberdade sem essas condições (2009, pp. 8-9). Dados apresentados pelo CONANDA e pela Secretaria Especial de Direitos Humanos3 indicam que, apesar de ter sido alçado à condição de oitava economia mundial e segunda das Américas em 2010, o Brasil incrementou os investimentos públicos nas políticas sociais em menos de 3% entre os anos de 1990 e 2005. O país possui, ainda, mais de 50 milhões de pessoas em condições de pobreza, e, deste total, cerca de 20 milhões são extremamente pobres. Os dados mostram, também, que 25 milhões de crianças são consideradas pobres e, deste total, 19 milhões (70%) são afrodescendentes. Os dados apresentados indicam, além disso, que 84% dos adolescentes/jovens de 15 a 17 anos ainda frequentam a escola. Contudo, apenas 48% estão matriculados em nível de ensino apropriado à idade. No que se refere aos jovens de 18 anos, é fato que 75% não conseguem concluir o ensino médio, o que sugere severas dificuldades no que atine ao acesso e permanência dos jovens neste nível de escolarização formal. Pesquisa apresentada pelo Ministério da Justiça e mencionada em artigo de SILVA & SILVA (2009) indica que, dos quase 10 mil adolescentes que cumpriam medidas socioeducativas de internação e internação provisória no ano de 2004, cerca de 60% eram considerados “não brancos”, e, deste universo, 97% eram negros. Os dados mostram também que a maioria dos adolescentes era proveniente das classes mais pobres e não havia concluído o ensino fundamental, e, ainda, que 3 Documento Preliminar intitulado “Construindo a Política Nacional dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes e o Plano Decenal dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes 2011-2020”. 4 uma parcela significativa informava possuir histórico de rua, e, ou de uso/abuso de drogas. Especificamente quanto ao público jovem, dados de 20104 revelam que, no país, cerca de ¼ da população é formada por pessoas de 15 a 29 anos. 60% dos jovens se declararam como pardos (45%) e pretos (15%) e cerca de ¼ só havia cursado até o Ensino Fundamental, o que mostra que, apesar dos avanços normativos, muitos adolescentes e jovens ainda não têm garantido o direito fundamental à Educação Básica. Nesse contexto, os dados apresentados no Mapa da Violência de 2013 5 mostram uma realidade ainda mais aflitiva: a taxa de homicídios de jovens do país em 20116 duplica a taxa total encontrada no país no mesmo ano 7, mostrando que, apesar de haver um crescimento praticamente nulo de homicídios no decênio 200120118, os níveis identificados ao se analisar a população jovem podem ser considerados epidêmicos. O Mapa da Violência de 20149, por sua vez, mostra que as proporções epidêmicas identificadas no ano anterior já adquiriram caráter pandêmico, em função da constância dos valores percentuais relacionados ao homicídio de jovens no país. Os dados expostos na “Agenda Juventude Brasil” 10 também corroboram esta triste constatação, pois revelam que metade dos jovens menciona ter perdido “companheiros de geração” – amigos, tios ou irmãos – de forma violenta. É alarmante verificar, ainda, que cerca de ¼ dos jovens do país já teve um parente ou pessoa próxima que foi vítima de homicídio. O singelo conjunto de dados exposto até aqui revela que a incorporação daqueles princípios e diretrizes citados anteriormente é um desafio significativo a ser enfrentado pelas instituições que atuam na política para o adolescente e o jovem, já que o quadro atual aponta para a recorrente violação de direitos fundamentais. 4 Documento “Agenda Juventude Brasil – Pesquisa Nacional sobre perfil e opinião dos jovens brasileiros 2013”. 5 Op Cit. 6 53,4 por 100 mil jovens. 7 27,1 por 100 mil jovens. 8 1,7%. 9 Op. Cit. 10 Op. Cit. 5 O alarmante percentual de pobreza, a dificuldade de acesso e permanência no espaço e escolar e a recorrente tendência ao confinamento de adolescentes e jovens pobres que cometem atos infracionais demonstram, sem sombra de dúvida, que a agenda política delineada desde o final da década de 1980 ainda é um projeto a ser incrementado. Ao mesmo tempo, o fortalecimento dos processos de articulação interinstitucional e intersetorial, a superação do modelo assistencial centrado no indivíduo isolado e o aumento da capilaridade dos serviços vinculados às políticas públicas nos territórios açambarcados pela violência estrutural se colocam como pontos cardinais na pauta do dia. Deste modo, é possível deduzir que o contexto de execução das políticas voltadas para o público adolescente e jovem é marcado, na contemporaneidade, por uma relação aparentemente paradoxal. Isso se dá porque a institucionalização democrática ensejada nas últimas três décadas não foi acompanhada por uma transformação reformista da ordem econômico-social do país, o que mostra que a luta pelos direitos humanos de adolescentes e jovens - foco de interesse nesse artigo - também se trava em meio a contradições (Netto, 2009, p. 10) 11. Neste âmbito, a efetiva implantação de políticas comprometidas com as demandas e interesses dos usuários deve ser privilegiada nas pautas profissionais aliançadas com um projeto societário que defende a liberdade, os direitos humanos, a cidadania e a democracia em tempos tão adversos. Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo apresentar a experiência de assessoramento técnico prestado pela equipe que atua no Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Infância e Juventude do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (CAOPJIJ/MPRJ), com foco na criação e fortalecimento de políticas públicas voltadas para a garantia do direito à convivência familiar e comunitária no século XXI. Conforme o disposto na Carta Magna de 1988, o Ministério Público é uma instituição extremamente importante no processo supracitado, tendo em vista que a referida lei confere à instituição um lugar diferenciado em face de sua trajetória histórica, deprecando a este uma ação fiscalizatória e propositiva no que se refere à 11 Op. Cit. 6 plena observância e aplicação das leis (MAZZILLI, 1996). No que se refere ao Estado do Rio de Janeiro, o novo desenho da instituição derivou numa série de mudanças institucionais, que resultaram na incorporação de novas estratégias de atuação, de novos protocolos de trabalho e de novos quadros, que incluíram profissionais de várias áreas do conhecimento a partir de meados da década de 1990. Um dos maiores desafios dos profissionais que prestam assessoramento técnico ao longo de quase duas décadas de atuação no Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro é trazer à tona a complexidade dos processos sociais que envolvem a implantação e implementação de políticas públicas, no sentido de trazer à luz os óbices e as estratégias a serem mobilizadas para o atendimento apropriado aos direitos dos usuários. Neste âmbito, o processo de assessoramento técnico tem se voltado para o processo de fomento à articulação das políticas públicas sociais, com ênfase na plena adequação dos serviços a estas vinculados. No que diz respeito à área de infância e juventude, é possível indicar algumas alterações no desenho da política de atendimento nos últimos anos, em especial após a aprovação de importantes normativas12, dentre as quais se destacam a Lei 12010 – que dispõe sobre a sistemática para a garantia do direito à convivência familiar e comunitária e a Lei 12594/2012 – que institui o Sistema Nacional Socioeducativo. A estas leis, se somam diversas Resoluções aprovadas pelos Conselhos de Direitos e Políticas, a exemplo da Resolução Conjunta N.º 01/2009 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) e do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) – que aprova o documento que contém orientações técnicas para os serviços de acolhimento de crianças e adolescentes, e da Resolução N.º 109/2009 do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), que aprova a “Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais”. Além destas normas, vale destacar a aprovação, em abril de 2011, do Plano Decenal dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes, cujo objetivo é orientar os rumos das políticas direcionadas a este grupo populacional entre os anos de 2011 e 2020. 12 Ver quadro acima. 7 Dentre as modificações relevantes no desenho da política para a infância e juventude, possuem destaque aquelas que se voltam para a garantia do direito à convivência familiar e comunitária, consubstanciadas na tentativa de ofertar alternativas que contribuam para a manutenção de crianças e adolescentes em suas famílias e comunidades de origem. Neste contexto, é válido destacar que, nos últimos anos, as políticas de atendimento têm dado preferência às ações de caráter preventivo em seu referencial programático, com o intuito de fortalecer serviços e programas que facilitem o alcance do objetivo supraindicado. Entretanto, se as ações planejadas apontam para esse horizonte, é possível observar que sua materialização depende da execução de uma agenda política implexa e organicamente vinculada às demandas societárias próprias do momento presente. Assim, é válido indicar que, apesar dos avanços na legislação e nos aparatos institucionais, novas formas de violação de direitos marcadas por determinações coetâneas podem brotar, demandando a compreensão de que os direitos, e sua possível violação, se constituem enquanto devir, à medida que surgem “... na dialética social e no processo histórico” (LYRA FILHO, 2003, p. 81). A experiência da equipe de assessoramento técnico do CAOPJIJ/MPRJ tem demonstrado que, ao longo dos últimos cinco anos, a previsão e a criação de serviços e programas de caráter preventivo não tem correspondido, necessariamente, a uma diminuição significativa de situações de violação de direitos, tendo em vista que a complexidade do real não é acompanhada pela oferta de ações protetivas em variados níveis. A título de exemplo, é pertinente indicar que as situações de abuso e exploração sexual correspondem a mais de 60% dos casos em que se opta pelo acolhimento institucional de crianças e adolescentes no país 13. No caso do Rio de Janeiro, cerca de 5% das crianças e adolescentes foram acolhidas exclusivamente 13 Segundo dados do documento “Um olhar mais atento aos serviços de acolhimento de crianças e adolescentes no país - Relatório da Resolução 71/2011”, publicado pelo Conselho Nacional do Ministério Público no ano de 2013. Fonte: http://www.cnmp.mp.br/portal/images/stories/Destaques/Publicacoes/Res_71_VOLUME_1_WEB_.PD F. Consultado em 20 de agosto de 2013. 8 em função de tais situações, segundo os dados do 10º Censo da População InfantoJuvenil Acolhida no Estado do Rio de Janeiro14. Tais dados revelam que a violação do direito à integridade física, mental e sexual de crianças e adolescentes tem contribuído, também, para seu afastamento do convívio familiar e comunitário, o que demanda a mobilização de estratégias para evitar, sempre que possível, a institucionalização de crianças e adolescentes vitimizados pela violência em suas variadas formas. Dentre as estratégias engendradas pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro na área da infância e juventude, vale destacar o Projeto “Quem Cala Consente”, criado em maio de 2011 com o objetivo de dar visibilidade às situações de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes por meio de duas ações: a) Realização de campanha de divulgação de canais de denúncia de violações por meio de panfleto, cartazes e vídeo institucional, com foco no processo de mobilização e articulação da Sociedade Civil; b) Fomento à implementação de políticas públicas e fortalecimento e construção de fluxos locais que garantam o atendimento adequado de crianças e adolescentes em situação de abuso e exploração sexual nos municípios do Estado do Rio de Janeiro no sentido de prevenir a ocorrência de novas violações, nas quais se inclui o rompimento e a fragilização de vínculos familiares e comunitários. A equipe de assessoramento técnico do CAOPJIJ teve relevante participação nesse projeto, elaborando a cartilha intitulada “Abuso e Exploração Sexual Infanto-Juvenil: A atuação do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente (SGDA) na Política de Proteção”. O material tem como objetivo dar suporte à atuação proativa dos membros do Ministério Público durante a execução do projeto, mas foi, também, amplamente divulgado junto aos operadores do Sistema de Garantia de Direitos do Estado do Rio de Janeiro e outras regiões do país. Vale salientar, ainda, que o projeto “Quem Cala Consente” foi inscrito no Banco de Projetos do Conselho Nacional do Ministério 14 Fonte: http://mca.mp.rj.gov.br/wp-content/uploads/2013/01/ESTADUAL_11_01_2013_13_13_51.pdf . Consultado em 20 de agosto de 2013. 9 Público (CNMP) 15 , tendo obtido o 3º lugar na 1ª Edição do Prêmio CNMP em agosto de 2013, na categoria “Indução de Políticas Públicas” 16·. É pertinente destacar, também, que integrantes da equipe de Serviço Social do CAOPJIJ foram finalistas da 1ª Edição do prêmio supracitado, tendo apresentado o projeto “Monitoramento de Políticas Públicas: o uso de sistema de informação no processo de fiscalização ministerial” 17 , que ficou entre os 40 melhores projetos num universo de 414 propostas analisadas em nível nacional. O projeto mencionado tem como objetivo criar um sistema de dados informatizado sobre os serviços vinculados às políticas públicas, facilitando os processos de fiscalização e avaliação de sua qualidade18. Ainda no que se refere aos desdobramentos do trabalho desenvolvido junto ao projeto “Quem Cala Consente”, integrantes da equipe técnica do CAOPJIJ19 prestaram assessoramento à equipe do Núcleo de Estudos da Saúde do Adolescente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (NESA/UERJ) para a elaboração de um manual de orientações sobre o atendimento de adolescentes em situação de violência no segundo semestre do ano de 2012. Como resultado, foi publicado, em maio de 2013, o documento “Diretrizesações de Atenção Integral ao adolescente em Situação de Violência”, que objetiva orientar equipes multiprofissionais para a prestação de ações de cuidado integral. O documento, que foi amplamente divulgado em evento realizado em 16 de julho de 2013, apresenta os passos fundamentais para o atendimento dos adolescentes e suas famílias, indicando as estratégias de articulação interinstitucional com órgãos e serviços que integram o Sistema de Garantia de Direitos. É imprescindível sublinhar, também, que as situações de afastamento de adolescentes de suas famílias e comunidades em função de possibilidades 15 O Banco de Projetos do CNMP pode ser consultado em: http://bancodeprojetos.cnmp.gov.br/consulta.seam. 16 O projeto “Quem Cala Consente” pode ser encontrado na página: http://bancodeprojetos.cnmp.gov.br/visualizarPenProjeto.seam?cid=7508. 17 O projeto é de autoria das assistentes sociais Anália dos Santos Silva, Márcia Nogueira da Silva (CAOPJIJ/MPRJ) e Elisa Nolasco das Neves Franco, integrante do Grupo de Apoio Técnico Especializado do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (GATE/MPRJ). 18 O projeto pode ser encontrado na página: http://bancodeprojetos.cnmp.gov.br/visualizarPenProjeto.seam?cid=7526. 19 Assistente social Márcia Nogueira da Silva e psicólogo Saulo Oliveira dos Santos. 10 vinculadas à inserção no mundo esportivo, especialmente em times de futebol, têm sido um novo desafio na contemporaneidade. A vivência do sonho de profissionalização e atuação em grandes times nacionais e internacionais tem correspondido, em muitos casos, à migração e imigração de jovens atletas em condições desfavoráveis à garantia do direito à convivência familiar e comunitária. No caso do Estado do Rio de Janeiro, o Ministério Público tem realizado uma série de ações neste campo, tendo como eixo estruturante as estratégias voltadas para a garantia dos direitos fundamentais, com ênfase na convivência familiar e comunitária. Desde o ano de 2010, em atuação conjunta com o Ministério Público do Trabalho (MPT), os promotores de infância e juventude realizaram uma série de fiscalizações em clubes de futebol – com o assessoramento da Equipe Técnica do CAOPJIJ - para avaliar a situação em foco, constatando que, para além das questões trabalhistas, educacionais e de saúde, os atletas adolescentes deprecam a manutenção dos vínculos familiares e comunitários e a possibilidade de construção de projetos de vida que ampliem seus horizontes diante da extrema competitividade engendrada no mundo esportivo. Neste contexto, a atuação da equipe de assessoramento técnico tem contribuído para lançar luz aos desafios colocados para a garantia dos direitos fundamentais dos atletas adolescentes, num contexto onde a lógica do Capital tem sido determinante para a inserção cada vez mais precoce do adolescente na “indústria do esporte”, que tem experimentado um movimento de internacionalização organicamente integrado ao processo de mundialização do Capital (CHESNAIS, 1996). Esse movimento tem incluído o fortalecimento de redes de exploração que contam com diversos atores que se articulam para identificar potenciais atletas em diversas regiões do país, realizar testes de avaliação de caráter informal, agenciar a inserção dos adolescentes nas categorias de base de agremiações localizadas nas metrópoles e facilitar a permanência dos atletas longe do ambiente familiar e comunitário durante o processo de avaliação realizado pelos clubes20. 20 Sobre o assunto, Digiácomo (s/d) comenta a existência de alojamentos e repúblicas que, inclusive, realizam a cobrança de valores para alojar atletas adolescentes que estão afastados de suas cidades 11 Engloba, ainda, a média e longa permanência de atletas em centros de treinamento mantidos pelas agremiações, o que pode facilitar a ocorrência de violações diversas, que abrangem, em geral, a inobservância do direito à convivência familiar e comunitária. Atenta a esses processos, a equipe de assessoramento técnico do CAOPJIJ tem atuado no sentido de problematizar essas questões, visando sugerir estratégias que permitam a vivência do sonho dos atletas adolescentes em condições favoráveis à garantia de seus direitos de cidadania. Dentre as ações que permitiram a visibilidade desse trabalho, se incluem: a) Assessoramento aos promotores de justiça no processo de adequação do trabalho desenvolvido pelas equipes técnicas de grandes clubes de futebol da capital do Estado do Rio de Janeiro, visando à ênfase no trabalho de manutenção da convivência familiar e comunitária e plena inserção dos atletas em atividades de escolarização formal, atendimento integral à saúde, lazer e cultura; b) Participação de integrante da equipe técnica do CAOIPJIJ21 no Programa “MP Cidadão”, com o tema “A Situação de Atletas Adolescentes em Clubes de Futebol” 22 . O programa, veiculado nacionalmente pelo canal TV Justiça, teve como objetivo sensibilizar a sociedade em geral para o assunto, visando facilitar o acesso a informações que contribuam para a garantia dos direitos dos adolescentes, em especial no que se refere à convivência familiar e comunitária. c) Participação de integrante da equipe técnica do CAOIPJIJ23 como palestrante no 1º Seminário “Serviço Social no Mundo do Futebol: Repercussões no Desenvolvimento de Crianças e Adolescentes na Preparação do Atleta Profissional de Futebol”, promovido pelo Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviços Sociais (CBCISS). No evento, que contou com a presença de assistentes sociais que atuam em clubes de vários estados brasileiros, foi proferida palestra sobre o tema: “Direitos da Criança e do Adolescente no de origem durante os testes de avaliação promovidos pelos clubes de futebol. In: Adolescentes jogadores de futebol: da necessidade de coibir os abusos de que são vítimas. Fonte: http://www.crianca.caop.mp.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=1043. Consultado em: 21/08/2013. 21 Assistente social Márcia Nogueira da Silva. 22 O programa está disponível em: http://www.mprj.mp.br/sala-de-imprensa/programa-de-tv-mpcidadao/programa-280-a-situacao-de-atletas-adolescentes-em-clubes-de-futebol/. 23 Assistente social Anália dos Santos Silva. 12 Meio Futebolístico” com o objetivo de apresentar o trabalho desenvolvido pela equipe de assessoramento técnico do CAOPJIJ no sentido de garantir os direitos fundamentais de atletas adolescentes. Além das atividades supramencionadas, a visibilidade do trabalho desenvolvido pela equipe técnica do CAOPJIJ nesta seara se deu por meio de reportagem veiculada no “Jornal Extra” em 18 de julho de 201224, em que foi abordada a situação de atletas adolescentes alojados em uma pensão que recebia meninos de todo o país, localizada em um bairro da zona norte do Município do Rio de Janeiro. Apesar de não abordar diretamente o trabalho realizado pela equipe de assessoramento técnico do CAOPJIJ, a reportagem tem papel relevante na indicação das condições de vida a que são submetidos os adolescentes que estão em busca do sonho de profissionalização no meio futebolístico. Deste modo, a experiência profissional em curso demonstra que os desafios contemporâneos para garantir os direitos de crianças e adolescentes demandam profissionais de novo tipo (IAMAMOTO, 2003), que estejam sintonizados com o ritmo acelerado das transformações societárias. Revela, também, que os caminhos para a garantia do direito de crianças e adolescentes à convivência familiar e comunitária estão sendo construídos, mas sua consolidação depende, inexoravelmente, do compromisso ético-político de forjar estratégias que valorizem a vida e contribuam para a radicalização da democracia, da liberdade e da cidadania dos usuários. REFERÊNCIAS: CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã Editora, 1996. DIGIÁCOMO, M. J. Adolescentes jogadores de futebol: da necessidade de coibir os abusos de que são vítimas. Fonte: 24 A reportagem está disponível em: http://extra.globo.com/esporte/vasco/mp-flagra-condicaotemeraria-em-abrigo-onde-morou-garoto-wendel-morto-em-avaliacao-no-vasco-5504931.html. A página virtual contendo a reportagem pode ser visualizada, também, no CD de Dados em anexo. 13 http://www.crianca.caop.mp.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=10 43. Consultado em: 21/08/2013. IAMAMOTO, M. V. O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 6ª edição. São Paulo: Cortez Editora, 2003. LYRA FILHO, R. O que é direito. Coleção Primeiros Passos. 17ª edição. São Paulo: Editora Brasiliense, 1999. MARX, K. O capital: crítica da economia política. (Livro I, Vol. 1). 23ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006. MAZZILLI, H. N. Regime jurídico do ministério público. 3ª Edição. São Paulo: Saraiva, 1996. NETTO, J.P. Democracia e direitos humanos na América Latina: aportes necessários ao debate. In: Direitos humanos e questão social na América Latina. Silene de Morais Freire (org.). 1ª Edição. Rio de Janeiro: Gamma, 2009, pp. 3-12. SECRETARIA GERAL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. SECRETARIA NACIONAL DE JUVENTUDE. SECRETARIA DE POLÍTICAS DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE RACIAL. Homicídios e juventude no Brasil - Mapa da Violência 2013. (Autor: Julio Jacobo Waiselfisz). Brasília, 2013. SECRETARIA GERAL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. SECRETARIA NACIONAL DE JUVENTUDE. SECRETARIA DE POLÍTICAS DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE RACIAL. Homicídios e juventude no Brasil - Mapa da Violência 2014. (Autor: Julio Jacobo Waiselfisz). Brasília, 2014. SECRETARIA NACIONAL DE PROMOÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. CONANDA. Construindo a Política Nacional dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes e o Plano Decenal dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes 2011-2020. (Documento Preliminar para Consulta Pública). Brasília, outubro de 2010. SECRETARIA GERAL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. SECRETARIA NACIONAL DE JUVENTUDE. Agenda Juventude Brasil – Pesquisa Nacional sobre perfil e opinião dos jovens brasileiros 2013. Brasil, agosto de 2013. SILVA, J.S. SILVA, M.N. Adolescentes em conflito com a lei no Brasil: Direitos (Des) Humanos? In: Direitos humanos e questão social na América Latina. Silene de Morais Freire (org.). 1ª Edição. Rio de Janeiro: Gamma, 2009, pp. 129-144. 14