O DEPOIMENTO PESSOAL E A CONFISSÃO Rénan Kfuri Lopes SUMÁRIO: 1. A PROVA NO PROCESSO CIVIL 2. O INTERROGATÓRIO E O DEPOIMENTO PESSOAL DETERMINADOS DE OFÍCIO 3. DEPOIMENTO PESSOAL REQUERIDO PELAS PARTES 4. INTIMAÇÃO PESSOAL COM ADVERTÊNCIA 5. IMPOSSIBILIDADE DE COMPARECIMENTO 6. MEDIDA CAUTELAR DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DA PROVA 7. PROCEDIMENTO NA A.I.J. 8. FATOS NÃO OBRIGADOS A DEPOR 9. SILÊNCIO E RESPOSTAS EVASIVAS 10. A CONFISSÃO 10.1. ADMISSÃO DA VERDADE DO FATO 10.2. CONFISSÃO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL 10.3. DIREITOS INDISPONÍVEIS 10.4. AÇÃO ANULATÓRIA OU RESCISÓRIA 11. CONCLUSÃO 1. A PROVA NO PROCESSO CIVIL O devido processo legal consolida que as provas podem ser obtidas através de meios idôneos, sendo da substância do direito instrumental civil, fornecer os meandros as partes produzirem-nas em sua inteireza, com o propósito final de levar ao juiz os elementos mais seguros para o seu julgamento. No processo civil brasileiro, quando se trata de direitos disponíveis, rege o princípio nuclear de que juiz para proferir uma sentença, verificará no caderno processual as provas que as partes produziram no transcurso da fase de instrução --de conhecimento ou cognitiva, adequando-as à legislação aplicável: iudex secundum allegata et probata partium iudicare debet (CPC, art.131). Ao autor incumbirá demonstrar o fato constitutivo do seu direito; enquanto ao réu caberá mostrar em sua defesa fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito alegado na inicial (CPC, art.333),podendo utilizar de todos os meios legais e moralmente legítimos de prova (CPC, art.332). A decisão vai refletir aquilo que as partes trouxeram para o processo sem que o próprio julgador tenha tido a oportunidade de verificar outros fatos que eventualmente poderiam elucidar-lhe melhor os pontos controvertidos. Todavia, desnecessário provar fato 2 confessado ou não impugnado pela parte, pois incontroversos (CPC, art.334) 1. No âmbito probatório, evidente que o Magistrado não tem absoluta liberdade, pois sua atividade é judicante, não podendo confundi-la com a exercida pelas partes, senão estaríamos diante de um processo inquisitivo. Entretanto, no processo moderno o juiz não poderá ser um mero expectador, exigindo-lhe ombrear às partes para a busca do que se chama de “verdade real”, utilizando o processo como instrumento para realizar o direito na sua expressão maior. Destarte, tanto no ínterim como depois de finda a atividade postulatória, não se encontrando satisfeito e confortável para decidir, diante das circunstâncias do caso ou da precariedade da prova, o juiz poderá determinar a realização de novas provas para uma melhor instrução do processo (CPC, art.130) 2. Urge advertir que essa participação haverá de ser inteligente e objetiva, podendo aplicar as regras de experiência comum na interpretação jurídica do fato concreto sem regulamentação legal (CPC, art.335), tudo em prol 1 Preleciona GIUSEPPE CHIOVENDA que o objeto da prova se constitui de fatos que não sejam reconhecidos e notórios, porquanto os fatos que não se possam negar ‘sine tergiversatione’ dispensam a prova (Instituições de direito processual civil. Campinas: Bookseller, 1.998. p. 113). 2 Observa MOACYR AMARAL SANTOS que “ao juiz somente será lícito determinar, de ofício, diligências instrutórias naqueles casos em que se encontrar em dificuldade na formação de sua convicção quanto à verdade dos fatos cuja prova tenha sido dada pelas partes interessadas” (Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, ed. Saraiva, v. 2, 20ª.ed., p. 77). 3 de se gerar uma justiça de melhor qualidade sem perder de mira a celeridade tão necessária da prestação jurisdicional. Esse desempenho do Juiz, não lhe retira da condição de vassalo ao devido processo legal (CF, art.5º, LIV e LV), aos limites legais da atividade probatória, assegurando às partes igualdade de tratamento (CPC, art.125, I). 2. INTERROGATÓRIO E O DEPOIMENTO PESSOAL DETERMINADO DE OFÍCIO Para se atingir à verdade, ninguém se eximirá de colaborar com o Poder Judiciário (CPC, art.339), sendo impositivo para as partes, ex-vi art.14 da Lei Instrumental Civil. Em dispositivo específico consta a ius cogens que se trata dever da parte “comparecer em juízo, respondendo ao que lhe foi interrogado” (CPC, art.340,I). A presença pessoal da parte em juízo só se dará através em audiência, não existindo previsão legal para o encontro do juiz com a parte que não seja em data e horário previamente ajustado, com a intimação do advogado (CPC, art.336,I). Coadunando com a ratio essendi do art.130 do CPC, o juiz poderá de ofício, não apenas na audiência de instrução e julgamento 4 (quando a parte prestará seu “depoimento pessoal” - art.343 do CPC), mas em qualquer fase do processo, resolver “INTERROGAR” as partes sobre os fatos da causa, bastando designar audiência para esta finalidade, cabendo ao Estado o pagamento das custas processuais da diligência via mandado de intimação (CPC, art.342). O interrogatório, conquanto também seja um meio de prova, traz consigo a carga principal de mecanismo de que se vale o juiz para aclarar pontos do processo que ele repute importantes para a decisão da causa. Durante o interrogatório, pode sobrevir a confissão da parte, mas não é da essência do interrogatório, como o é do depoimento pessoal, a obtenção da confissão. Por causa disso, nada obsta que as partes, indistintamente, façam reperguntas aos interrogandos 3. O interrogatório das partes (CPC, art.342) não se confunde com o depoimento pessoal das mesmas (CPC, art.343). O “interrogatório” pode ser determinado, mais de uma vez, em qualquer fase do processo. Já o “depoimento pessoal” só ocorrerá de ofício uma única vez: quando da audiência de instrução e julgamento (CPC, art.343). 3 NELSON NERY E ROSA MARIA in CPC Comentado e Leg. Extravagante, ed. Rev. Trib., 9ª. ed., p.539. 5 3. DEPOIMENTO PESSOAL REQUERIDO PELAS PARTES No depoimento judicial, a confissão não é espontânea, é provocada; ela decorre das perguntas sobre os fatos, formulados pelo juiz ou pelo adversário. No depoimento, aparte é inquirida dos fatos sobre os quais versa a acuas, devendo expô-los segundo a ciência que tiver, reconhecendo-os, ou não verdadeiros. Trata-se de legítimo testemunho qualificado por ser prestado senão pela parte, daí o nome do instituto: depoimento pessoal. Se o juiz determinar de ofício a oitiva da parte em audiência, desnecessário que a parte adversa reitere pedido nesse sentido. Acaso silente o juiz, compete a cada parte requerer o depoimento pessoal da outra, a fim de interrogá-lo em “audiência de instrução e julgamento” (CPC, art.343 caput e § 1º). Infere-se, portanto, descabido à parte requerer o próprio depoimento pessoal 4; nem pode o litisconsorte pedir o depoimento pessoal do seu co-litigante do mesmo pólo litisconsorcial 5. Melhor será que nas ações sob o rito ordinário, o autor e o réu “requeiram” (não protestem) pela produção da prova do depoimento pessoal na inicial e contestação, respectivamente 6. Ficará melhor no aspecto técnico, pois se definirá de plano o acervo probatório pleiteado pelas partes, facilitando ao juiz a análise na 4 RT 722:238; RJTJESP 118:247. RTJ 107:729 e STF-RT 581:235. 6 No rito sumário o depoimento pessoal e o rol de testemunhas são formulados na inicial (CPC, art.276). 5 6 deliberação sobre as provas a serem produzidas, quando da fixação dos pontos controvertidos (CPC, art.331, § 2º). A rigor, a fase processual correta para as partes especificarem e justificarem as provas que pretendem produzir é na audiência “preliminar”, prevista no art.331 do CPC. Entretanto, para nossa infelicidade, essa norma é mal compreendida e pouco aplicada pela maioria dos juízes, que insistem no velho despacho para “especificar e justificar as provas”. Aí a parte tem de novamente “requerer” (jamais protestar) pelos meios de prova que entender necessárias para sua estratégia. A parte será intimada pessoalmente através de Oficial de Justiça, constando obrigatoriamente no mandado que se não comparecer ou, comparecendo, presumidos como confessados, se os recusar fatos a depor, alegados pela serão parte adversária. Essa conseqüência é chamada juridicamente como “pena de confissão” (CPC, art.343 §§ 1º e 2º). Insta pontuar que a parte só estará obrigada a prestar o seu depoimento pessoal se o mesmo for requerido na fase processual própria e se intimada pessoalmente por oficial de justiça. Residindo a parte noutra comarca que não aquela pela qual tramita o processo, seu depoimento pessoal será colhido através de carta precatória cumprida no local que reside, não estando obrigada a se deslocar para a outra comarca 7. 7 A parte, intimada a prestar depoimento pessoal, não está obrigada a comparecer ao Juízo diverso daquele em que reside (STJ, Resp 161.438, DJ 20.02.2006. No mesmo sentido: RT 669:14 e JTA 104 104:61). 7 4. INTIMAÇÃO PESSOAL COM ADVERTÊNCIA Constitui vero princípio legal a obrigatoriedade de que no mandado de intimação da parte para prestar seu depoimento pessoal, conste expressamente a advertência “que se presumirão confessados os fatos contra ela alegados, caso não compareça ou, comparecendo, se recuse a depor” (CPC, art.343 § 1º). Do mandado deverá constar expressamente a pena de confesso, mas, em palavras claras e leigas, porque a receptividade da parte intimada deve ser completa. simplesmente a Assim, expressão não “pena basta de constar confesso” do ou mandado “pena de confissão”. Destarte, se do mandado intimatório não constar a pena de confissão, esta não ocorre, quando a parte deixar de comparecer, inibindo o juiz de aplicar a penalidade. Único o repositório jurisprudencial: STJ, Resp 2.340/SP; RT 593:131; 659:165; RF 317:265; JTA 33:342; 34:331; 91:133). Interpretando com elastério, dando ênfase ao art.238 caput do CPC, Fábio Tabosa, ao comentar o artigo 343 do CPC, observa que "a intimação pessoal, é bem dever, não precisa necessariamente ser feita por oficial de justiça, podendo se dar também por via postal, desde que da carta intimatória constem as advertências devidas e que o recebimento seja em mão própria" 8. 8 Código de Processo Civil Interpretado, ed. Atlas, 2004, p.1.040. 8 A rigor, possibilidade do o art. 38 advogado do se CPC abre apresentar ensanhas munido de para a poderes expressos para confessar 9. Porém, a doutrina não coaduna com esse raciocínio, anotando Ernane Fidélis dos Santos que “o depoimento pessoal não pode ser prestado por procurador, pois que se trata de ato personalíssimo, em que a parte revela ciência própria sobre determinado fato. Neste caso, para que o depoimento pessoal fosse possível, mister se constassem da procuração as próprias respostas a possíveis perguntas do juiz ou da parte. Mas, aí, o esclarecimento se esgotava já no próprio mandato, dispensável, portanto, a formalização do ato de depoimento pessoal 10”. O festejado Prof. Cândido Rangel Dinamarco define depoimento pessoal como sendo “o meio de prova que tem por fonte as partes e destina-se a obter destas os informes que tiverem sobre os fatos relevantes para o julgamento da causa; as partes são fontes ativas dessa prova, da qual participam mediante um ato de vontade, que é a prestação do depoimento” 11. Vogando na esteira o ilustre jurista Arruda Alvim: “o depoimento, portanto, justamente porque pessoal, é, em regra, 9 CPC,art.38:”A procuração geral para o foro, conferida por instrumento público, ou particular......habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, salvo para...confessar..”. Mas se munido de poderes especiais, não há vedação para o advogado confessar em nome do seu constituinte. 10 Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, vol.III, 1.980, n.45, p.30). 11 Instituições de Direito Processual civil, Forense, vol.II., p.47. 9 insuscetível de ‘delegação’. E isto se deve à circunstância de ser o litigante- conhecedor dos fatos dos quais se pretende extrair uma conseqüência jurídica contra ele, ou, ainda, sabedor dos fatos que ele próprio alegou, contrapondo-se ao seu adversário. Sentido prático algum teria, na verdade, admitir-se que o litigante delegasse a outrem a tarefa de depor, pois: a) este alguém não poderia saber de tais fatos, como o litigante sabe; b) de outra parte, ainda poderia delegar tal tarefa a alguém altamente experimentado na vivência forense e, assim, frustrar-se-iam os objetivos em função dos quais se disciplina o depoimento pessoal” 12. O procurador, por mais instruído que esteja acerca da matéria a responder, não conhece os fatos pelo testemunho ocular e não os tem gravados na memória, porque os não presenciou, mas apenas ouviu sua narrativa. Aí não haveria esclarecimento próprio da parte, mas do advogado cuja atuação já se previa no próprio mandato, dispensável, portanto, a formalização do ato de depoimento pessoal. Daí erigido no colendo Superior Tribunal de Justiça que o depoimento pessoal de pessoa física é ato personalíssimo. E só mesmo a parte poderá prestá-lo, pois é ela quem tem ciência própria sobre determinados fatos, não se permitindo mandatário munido de poderes especiais para prestar depoimento pessoal no lugar da parte 13. 12 13 Manual de Direito Processual Civil, ed. Rev. Tribunais, vol.2, p.241). RSTJ 191:321, Resp 623.575; Resp 54.809/MG. 10 O depoimento pessoal de pessoa jurídica deve ser prestado por quem conste como seu representante no contrato social, administrador ou por preposto, esse autorizado especialmente para o ato 14. Indispensável que o preposto tenha conhecimento dos fatos abrangidos na demanda, vez que a vacuidade do depoimento pode ser considerada pelo juiz como verdadeira confissão em relação à perquirida matéria de fato 15. 5. IMPOSSIBILIDADE DE COMPARECIMENTO Se a parte, por enfermidade, ou por outro motivo relevante, estiver impossibilitada de comparecer ao fórum para realizar a audiência, o juiz verificará a circunstância do caso, e designará dia, hora e lugar para inquiri-la (CPC, art.336, § 1º c.c. art. 410 inc. III). A justificativa da ausência deve ser apresentada pelo advogado da parte, juntando atestado médico ou explanando verbalmente para o juiz o imprevisto que impossibilitou a presença da parte na audiência para prestar seu depoimento pessoal 16. 14 STJ, Resp 191.078: “A pessoa jurídica pode ser representada em juízo por preposto, ainda que este não seja seu diretor; basta a designação regular”. 15 RT 672:123. 16 STJ, Resp 62.357/ES: “O advogado tem que comprovar que justificaria o seu impedimento para comparecer à audiência previamente designada, sendo insuficientes meras alegações”. 11 Aplica-se também o dispositivo retro quando, por exemplo, a parte estiver doente ou em fase de convalescença, sem condições de se locomover até o fórum. O juiz poderá ir até a casa da testemunha ou marcar um local (hospital, por exemplo) para colher o depoimento pessoal da parte, acompanhado do escrivão e dos advogados das partes. 6. MEDIDA CAUTELAR DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DA PROVA A lei de ritos permite que a parte seja interrogada fora da data da audiência de instrução e julgamento quando demonstrado que: terá de se ausentar; por motivo de idade ou de moléstia grave (CPC, arts.846 e 847). O trilho legal para se colher o depoimento pessoal, constatada essa situação é a “medida cautelar antecipada de prova”. Poderá ser ajuizada de produção como medida preparatória, antes da propositura da ação, com o fito de preservar a prova, inquirindo-se de antemão a parte. E se porventura presentes as situações descritas nos incisos I e II do art.847 do CPC no transcurso da ação, antes da designação da audiência, por meio de uma medida cautelar incidental, cujo propósito único será o interrogatório da parte, com o intuito de produzir a prova ante a proximidade fática de perdê-la. 12 Não haverá contraditório nessa tramitação. Após colhido o depoimento da parte o juiz proferirá sentença homologando a prova produzida. Na sentença o juiz apenas apreciará a regularidade formal do procedimento, não ficando sujeito, quanto à fundamentação, às exigências do art. 458, vez que a sentença não se constituirá num título executivo judicial 17. Os autos permanecerão em cartório, sendo lícito aos interessados solicitar certidões que quiserem para instruir o feito matriz (CPC, art.851). 7. PROCEDIMENTO NA A.I.J. Aberta a audiência de instrução e julgamento serão tomados os depoimentos pessoais após colhidos os esclarecimentos do perito, quando solicitados na forma do art.435 do CPC. Quem primeiro depõe é o autor, depois o réu (CPC, art.452 incs. I e II). Quando autor e réu forem prestar seus depoimentos, um não poderá ouvir o depoimento do outro. Requerido o depoimento do autor, o réu terá de sair da sala da audiência, não podendo escutar ou ser informado do conteúdo das declarações em juízo do autor. Terminado o depoimento do autor, o réu ingressará na sala da audiência para prestar o seu depoimento. Nesse caso, desnecessário que o autor se retire, pois não há mais como alterar seu depoimento. A mesma situação do autor permanecer na sala da 17 RP 55:278; RSTJ 52:124 e 62:426; RT 604:61 e 659:94 e JTA 49:49). 13 audiência sucede quando apenas for tomado o depoimento pessoal do réu (CPC, art.344, parágrafo único). Pelo art.344 caput do CPC, a parte será interrogada na forma prescrita para a inquirição de testemunhas. Entretanto, não é bem assim. Somente se aplica o caput do art.414 do CPC quanto à qualificação da parte; e não incide o art.415 do CPC acerca do compromisso do depoente. Somente o juiz e o advogado da parte contrária é que podem formular perguntas ao depoente. Isso é mais que lógico, pois ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo e, as perguntas formuladas pelo advogado da própria parte não teriam outro sentido senão ratificar seu posicionamento na lide, uma desnecessária e inaproveitável redundância processual 18. Situação deveras interessante ocorre se o réu é advogado que litiga em causa própria e é intimado para depoimento pessoal, não podendo permanecer na sala enquanto inquirido o autor. Nessa moldura fática, pelo menos para esse ato, ele deverá ser substituído por outro profissional, que traga para lhe acompanhar ou nomeado pelo juiz. 8. FATOS NÃO OBRIGADOS A DEPOR A lei processual civil elenca no art.348 os fatos que a parte não está obrigada a depor: 18 RT 578:93 14 - os fatos criminosos ou torpes que lhe forem imputados. Justificase, pois a parte não está obrigada a produzir prova contra si.O direito de não se auto-incriminar é garantido em ao menos três incisos vizinhos no artigo 5º da Constituição Federal: direito à ampla defesa, da presunção da inocência e de permanecer calado. O princípio que impede a auto-incriminação não garante somente o direito ao silêncio. Sua amplitude abrange todos os atos do processo e, - os fatos protegidos por estado ou sigilo da profissão. Matérias relevantes de índole pessoal ou que a profissão da parte impede de se revelar a qualquer pessoa, inclusive ao judiciário, permite que a parte se dirija ao juiz, escusando-se com a clássica: “Excelência, permita-me não responder a essa pergunta, por se tratar de sigilo profissional”. 9. SILÊNCIO E RESPOSTAS EVASIVAS Poderá ocorrer que no depoimento pessoal, sem qualquer justificativa, a parte ao ser perguntada, deixe de responder ou utilize do artifício de responder com subterfúgio, de maneira evasiva. Esse cenário será avaliado pelo juiz na sentença, junto com as demais circunstâncias e elementos probatórios produzidos na instrução. 15 Mas na decisão do juiz que aplicar a confissão terá de aguçar os pontos do depoimento da parte que entendeu teve o designo de não depor. Ecoará negativamente o depoimento pessoal dessa maneira, considerado como recusa de depor (CPC, art.345). 10. A CONFISSÃO Merece ser realçado que a confissão é meio de prova, quer ela se apresente como uma penalidade imposta à parte pelo juiz ou trazida aos autos pela própria parte declarante. Ela faz prova exclusivamente contra quem confessa. Mas mesmo sendo uma prova, ela será analisada pelo juiz diante do contexto probatório colacionado nos autos, não implicando presunção absoluta de veracidade dos fatos 19. 10.1. ADMISSÃO DA VERDADE DO FATO Forma marcante como meio de prova se afigura quando a própria parte em seu depoimento pessoal admite a verdade de um fato, contrário ao seu interesse e favorável ao adversário (CPC, art.348). 19 STJ, Resp 54.809/MG. 16 Ocorrido essa situação, o fato confessado pela parte estará sacramentado como uma prova perfeita, não havendo mais necessidade da parte contrária se exaurir para demonstrá-la de outra forma, como anunciado no art. 334, inciso II do CPC: não dependem de prova os fatos afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária. 10.2. CONFISSÃO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL A confissão de fatos pode ocorrer de duas maneiras: judicial e extrajudicial (CPC, art.348 fine). A confissão “judicial” será espontânea ou provocada. Caracteriza-se a espontânea quando a parte vier a juízo por si ou por mandatário com poderes especiais e pretender confessar expressamente determinado fato, oportunidade que será lavrado termo nos autos nesse sentido. Já a provocada é a confissão de fatos que a parte declara no seu depoimento pessoal prestado em juízo (CPC, art.349). Por seu jaez personalíssimo, a confissão de uma parte não reflete na posição do seu litisconsorte. E em se tratando de cônjuges, a confissão de um cônjuge não valerá sem a anuência do outro quando versar sobre bens imóveis ou direitos sobre imóveis alheios (CPC, art.350). 17 10.3. DIREITOS INDISPONÍVEIS Não tem qualquer valia probatória a confissão que abranger fatos relativos a direitos indisponíveis, verbi gratia, aquelas abrangentes de estado de pessoa, como separação judicial, filiação, homossexualidade, etc. (CPC, art.351). Traça-se um paralelo com a dicção do art.841 do Código Civil, que só admite transações quanto a direitos patrimoniais de caráter privado. 10.4. AÇÃO ANULATÓRIA OU RESCISÓRIA A confissão pode ser atacada e revogada seu efeito quando emanar de erro (CC, arts. 138 20 a 144), dolo (CC, arts.145 21 a 150) ou coação (CC, arts.151 22 a 155), ex-vi art.352 caput do CPC. São 02 (dois) os procedimentos judiciais aptos para revocar a confissão: 20 CC, art.138:São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio. 21 CC, art.145:São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa. 22 CC, art.151:A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens. 18 - por ação anulatória (ação declaratória incidental, art.486 do CPC) se ainda pendente o processo principal que foi prestada a confissão e, - por ação rescisória (competência originária da instância ad quem, art.485, inciso VIII do CPC), depois de transitada em julgado a sentença, se o único fundamento do decisum rescindindo estiver fincado na confissão da parte guisada pelos vícios do art. 352 do CPC. 11. CONCLUSÃO A pena de confesso imposta pelo juiz ou a confissão da parte, em tese, produzem efeito semelhante à não impugnação de determinados fatos. A recusa em comparecer ou em responder equivale à “presunção” de que o alegado ou o impugnado pela parte contrária é verdadeiro. A confissão é um meio de prova produzido unilateralmente, tendo como elementos essenciais a capacidade da parte, a declaração da vontade e o objeto possível. Os efeitos irradiados pela confissão, em quaisquer de seus estilos, não podem ser absolutos, suficientes para afastar qualquer dúvida, como ocorre, por exemplo, no reconhecimento jurídico do pedido, levando à extinção com julgamento de mérito (CPC, art.269, inc. II). 19 A pena de confesso é um forte indício e sua interpretação não ocorre isoladamente, após a comprovação de não- comparecimento ou de recusa de depor. A confissão é uma presunção juris tantum, tendo o juiz liberdade para na busca da justiça e do perfeito delineamento dos fatos da causa, afastar essa presunção de veracidade dos fatos gerada com a confissão ficta, e de outra se convencer, diante da realidade dos autos 23. Assim, presunção de confissão mesmo declarada na sentença final, não poderá influenciar nem precipitar o julgamento de mérito 24, contrariando à verdade real, se há nos autos elementos que tornem o fato duvidoso, embora incida a pena de confesso. Insuficiente a confissão para dar guarida ao direito da parte confitente, o juiz haverá de retomar o raciocínio da dúvida contra quem tem o ônus de provar 25. abril de 2.008 -x- 23 STJ: “A ausência do autor à audiência em que deveria prestar depoimento pessoal, por si só, não importa em improcedência do pedido, devendo o juiz examinar as provas e formar o seu convencimento, tanto mais quando deficiente a contestação que deixa de impugnar os fatos deduzidos na inicial, que se tornam incontroversos” (Agr.Reg. no AG n. 43.984.4/RJ, DJ 28.03.1994). 24 STJ: “A pena de confissão não gera presunção absoluta, de forma a excluir a apreciação do Juiz acerca de outros elementos probatórios. Prematura, assim, a decisão do Magistrado que, declarada encerrada desde logo a instrução, dispensa a oitiva das testemunhas arroladas” (Resp n. 161.438/SP, DJ 20.02.2006). 25 TJMG, Apel. Civ. n. 2.0000.00.499199-3/000, DJ 08.12.2005. 20