O DEPOIMENTO PESSOAL E A CONFISSÃO
Rénan Kfuri Lopes
SUMÁRIO:
1. A PROVA NO PROCESSO CIVIL
2. O INTERROGATÓRIO E O DEPOIMENTO PESSOAL
DETERMINADOS DE OFÍCIO
3. DEPOIMENTO PESSOAL REQUERIDO PELAS PARTES
4. INTIMAÇÃO PESSOAL COM ADVERTÊNCIA
5. IMPOSSIBILIDADE DE COMPARECIMENTO
6. MEDIDA CAUTELAR DE PRODUÇÃO ANTECIPADA
DA PROVA
7. PROCEDIMENTO NA A.I.J.
8. FATOS NÃO OBRIGADOS A DEPOR
9. SILÊNCIO E RESPOSTAS EVASIVAS
10.
A CONFISSÃO
10.1. ADMISSÃO DA VERDADE DO FATO
10.2. CONFISSÃO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL
10.3. DIREITOS INDISPONÍVEIS
10.4. AÇÃO ANULATÓRIA OU RESCISÓRIA
11. CONCLUSÃO
1. A PROVA NO PROCESSO CIVIL
O devido processo legal consolida que as provas podem ser
obtidas através de meios idôneos, sendo da substância do direito
instrumental civil, fornecer os meandros as partes produzirem-nas
em sua inteireza, com o propósito final de levar ao juiz os elementos
mais seguros para o seu julgamento.
No processo civil brasileiro, quando se trata de direitos
disponíveis, rege o princípio nuclear de que juiz para proferir uma
sentença, verificará no caderno processual as provas que as partes
produziram no transcurso da fase de instrução --de conhecimento ou
cognitiva, adequando-as à legislação aplicável: iudex secundum
allegata et probata partium iudicare debet (CPC, art.131). Ao autor
incumbirá demonstrar o fato constitutivo do seu direito; enquanto ao
réu caberá mostrar em sua defesa fato impeditivo, modificativo ou
extintivo do direito alegado na inicial (CPC, art.333),podendo utilizar
de todos os meios legais e moralmente legítimos de prova (CPC,
art.332).
A decisão vai refletir aquilo que as partes trouxeram para o
processo sem que o próprio julgador tenha tido a oportunidade de
verificar outros fatos que eventualmente poderiam elucidar-lhe
melhor os pontos controvertidos. Todavia, desnecessário provar fato
2
confessado ou não impugnado pela parte, pois incontroversos (CPC,
art.334) 1.
No âmbito probatório, evidente que o Magistrado não tem
absoluta liberdade, pois sua atividade é judicante, não podendo
confundi-la com a exercida pelas partes, senão estaríamos diante de
um processo inquisitivo.
Entretanto, no processo moderno o juiz não poderá ser um
mero expectador, exigindo-lhe ombrear às partes para a busca do
que se chama de “verdade real”, utilizando o processo como
instrumento para realizar o direito na sua expressão maior.
Destarte, tanto no ínterim como depois de finda a atividade
postulatória, não se encontrando satisfeito e confortável para decidir,
diante das circunstâncias do caso ou da precariedade da prova, o
juiz poderá determinar a realização de novas provas para uma
melhor instrução do processo (CPC, art.130) 2. Urge advertir que
essa participação haverá de ser inteligente e objetiva, podendo
aplicar as regras de experiência comum na interpretação jurídica do
fato concreto sem regulamentação legal (CPC, art.335), tudo em prol
1
Preleciona GIUSEPPE CHIOVENDA que o objeto da prova se constitui de
fatos que não sejam reconhecidos e notórios, porquanto os fatos que não se
possam negar ‘sine tergiversatione’ dispensam a prova (Instituições de direito
processual civil. Campinas: Bookseller, 1.998. p. 113).
2
Observa MOACYR AMARAL SANTOS que “ao juiz somente será lícito
determinar, de ofício, diligências instrutórias naqueles casos em que se
encontrar em dificuldade na formação de sua convicção quanto à verdade dos
fatos cuja prova tenha sido dada pelas partes interessadas” (Primeiras Linhas
de Direito Processual Civil, ed. Saraiva, v. 2, 20ª.ed., p. 77).
3
de se gerar uma justiça de melhor qualidade sem perder de mira a
celeridade tão necessária da prestação jurisdicional.
Esse desempenho do Juiz, não lhe retira da condição de
vassalo ao devido processo legal (CF, art.5º, LIV e LV), aos limites
legais da atividade probatória, assegurando às partes igualdade de
tratamento (CPC, art.125, I).
2. INTERROGATÓRIO
E
O
DEPOIMENTO
PESSOAL
DETERMINADO DE OFÍCIO
Para se atingir à verdade, ninguém se eximirá de colaborar
com o Poder Judiciário (CPC, art.339), sendo impositivo para as
partes, ex-vi art.14 da Lei Instrumental Civil.
Em dispositivo específico consta a ius cogens que se trata
dever da parte “comparecer em juízo, respondendo ao que lhe foi
interrogado” (CPC, art.340,I). A presença pessoal da parte em juízo
só se dará através em audiência, não existindo previsão legal para o
encontro do juiz com a parte que não seja em data e horário
previamente
ajustado,
com
a
intimação
do
advogado
(CPC,
art.336,I).
Coadunando com a ratio essendi do art.130 do CPC, o juiz
poderá de ofício, não apenas na audiência de instrução e julgamento
4
(quando a parte prestará seu “depoimento pessoal” - art.343 do
CPC), mas em qualquer fase do processo, resolver “INTERROGAR”
as partes sobre os fatos da causa, bastando designar audiência para
esta finalidade, cabendo ao Estado
o pagamento das custas
processuais da diligência via mandado de intimação (CPC, art.342).
O interrogatório, conquanto também seja um meio de prova,
traz consigo a carga principal de mecanismo de que se vale o juiz
para aclarar pontos do processo que ele repute importantes para a
decisão da causa.
Durante o interrogatório, pode sobrevir a confissão da parte,
mas não é da essência do interrogatório, como o é do depoimento
pessoal, a obtenção da confissão. Por causa disso, nada obsta que
as partes, indistintamente, façam reperguntas aos interrogandos 3.
O interrogatório das partes (CPC, art.342) não se confunde
com
o
depoimento
pessoal
das
mesmas
(CPC,
art.343).
O
“interrogatório” pode ser determinado, mais de uma vez, em qualquer
fase do processo. Já o “depoimento pessoal” só ocorrerá de ofício
uma única vez: quando da audiência de instrução e julgamento
(CPC, art.343).
3
NELSON NERY E ROSA MARIA in CPC Comentado e Leg. Extravagante, ed. Rev.
Trib., 9ª. ed., p.539.
5
3. DEPOIMENTO PESSOAL REQUERIDO PELAS PARTES
No depoimento judicial, a confissão não é espontânea,
é provocada; ela decorre das perguntas sobre os fatos, formulados
pelo juiz ou pelo adversário. No depoimento, aparte é inquirida dos
fatos sobre os quais versa a acuas, devendo expô-los segundo a
ciência que tiver, reconhecendo-os, ou não verdadeiros. Trata-se de
legítimo testemunho qualificado por ser prestado senão pela parte,
daí o nome do instituto: depoimento pessoal.
Se o juiz determinar de ofício a oitiva da parte em audiência,
desnecessário que a parte adversa reitere pedido nesse sentido.
Acaso silente o juiz, compete a cada parte requerer o depoimento
pessoal da outra, a fim de interrogá-lo em “audiência de instrução e
julgamento” (CPC, art.343 caput e § 1º).
Infere-se, portanto, descabido à parte requerer o próprio
depoimento pessoal 4; nem pode o litisconsorte pedir o depoimento
pessoal do seu co-litigante do mesmo pólo litisconsorcial 5.
Melhor será que nas ações sob o rito ordinário, o autor e o
réu
“requeiram”
(não
protestem)
pela
produção
da
prova
do
depoimento pessoal na inicial e contestação, respectivamente 6.
Ficará melhor no aspecto técnico, pois se definirá de plano o acervo
probatório pleiteado pelas partes, facilitando ao juiz a análise na
4
RT 722:238; RJTJESP 118:247.
RTJ 107:729 e STF-RT 581:235.
6
No rito sumário o depoimento pessoal e o rol de testemunhas são formulados na
inicial (CPC, art.276).
5
6
deliberação sobre as provas a serem produzidas, quando da fixação
dos pontos controvertidos (CPC, art.331, § 2º).
A
rigor,
a
fase
processual
correta
para
as
partes
especificarem e justificarem as provas que pretendem produzir é na
audiência “preliminar”, prevista no art.331 do CPC. Entretanto, para
nossa infelicidade, essa norma é mal compreendida e pouco
aplicada pela maioria dos juízes, que insistem no velho despacho
para “especificar e justificar as provas”. Aí a parte tem de novamente
“requerer” (jamais protestar) pelos meios de prova que entender
necessárias para sua estratégia.
A parte será intimada pessoalmente através de Oficial de
Justiça, constando obrigatoriamente no mandado que se não
comparecer
ou,
comparecendo,
presumidos
como
confessados,
se
os
recusar
fatos
a
depor,
alegados
pela
serão
parte
adversária. Essa conseqüência é chamada juridicamente como “pena
de confissão” (CPC, art.343 §§ 1º e 2º).
Insta pontuar que a parte só estará obrigada a prestar o seu
depoimento pessoal se o mesmo for requerido na fase processual
própria e se intimada pessoalmente por oficial de justiça. Residindo
a parte noutra comarca que não aquela pela qual tramita o processo,
seu depoimento pessoal será colhido através de carta precatória
cumprida no local que reside, não estando obrigada a se deslocar
para a outra comarca 7.
7
A parte, intimada a prestar depoimento pessoal, não está obrigada a comparecer ao
Juízo diverso daquele em que reside (STJ, Resp 161.438, DJ 20.02.2006. No mesmo
sentido: RT 669:14 e JTA 104 104:61).
7
4. INTIMAÇÃO PESSOAL COM ADVERTÊNCIA
Constitui vero princípio legal a obrigatoriedade de que no
mandado de intimação da parte para prestar seu depoimento
pessoal, conste expressamente a advertência “que se presumirão
confessados os fatos contra ela alegados, caso não compareça ou,
comparecendo, se recuse a depor” (CPC, art.343 § 1º). Do mandado
deverá constar expressamente a pena de confesso, mas, em
palavras claras e leigas, porque a receptividade da parte intimada
deve
ser
completa.
simplesmente
a
Assim,
expressão
não
“pena
basta
de
constar
confesso”
do
ou
mandado
“pena
de
confissão”.
Destarte, se do mandado intimatório não constar a pena de
confissão, esta não ocorre, quando a parte deixar de comparecer,
inibindo
o
juiz
de
aplicar
a
penalidade.
Único
o
repositório
jurisprudencial: STJ, Resp 2.340/SP; RT 593:131; 659:165; RF
317:265; JTA 33:342; 34:331; 91:133).
Interpretando com elastério, dando ênfase ao art.238 caput
do CPC, Fábio Tabosa, ao comentar o artigo 343 do CPC, observa
que "a intimação pessoal, é bem dever, não precisa necessariamente
ser feita por oficial de justiça, podendo se dar também por via postal,
desde que da carta intimatória constem as advertências devidas e
que o recebimento seja em mão própria" 8.
8
Código de Processo Civil Interpretado, ed. Atlas, 2004, p.1.040.
8
A
rigor,
possibilidade
do
o
art.
38
advogado
do
se
CPC
abre
apresentar
ensanhas
munido
de
para
a
poderes
expressos para confessar 9.
Porém, a doutrina não coaduna com esse raciocínio,
anotando Ernane Fidélis dos Santos que “o depoimento pessoal não
pode ser prestado por procurador, pois que se trata de ato
personalíssimo, em que a parte revela ciência própria sobre
determinado fato. Neste caso, para que o depoimento pessoal fosse
possível, mister se constassem da procuração as próprias respostas
a possíveis perguntas do juiz ou da parte. Mas, aí, o esclarecimento
se esgotava já no próprio mandato, dispensável, portanto, a
formalização do ato de depoimento pessoal 10”.
O
festejado
Prof.
Cândido
Rangel
Dinamarco
define
depoimento pessoal como sendo “o meio de prova que tem por fonte
as partes e destina-se a obter destas os informes que tiverem sobre
os fatos relevantes para o julgamento da causa; as partes são fontes
ativas dessa prova, da qual participam mediante um ato de vontade,
que é a prestação do depoimento” 11.
Vogando na esteira o ilustre jurista Arruda Alvim: “o
depoimento, portanto, justamente porque pessoal, é, em regra,
9
CPC,art.38:”A procuração geral para o foro, conferida por instrumento público, ou
particular......habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, salvo
para...confessar..”. Mas se munido de poderes especiais, não há vedação para o
advogado confessar em nome do seu constituinte.
10
Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, vol.III, 1.980, n.45, p.30).
11
Instituições de Direito Processual civil, Forense, vol.II., p.47.
9
insuscetível de ‘delegação’. E isto se deve à circunstância de ser o
litigante- conhecedor dos fatos dos quais se pretende extrair uma
conseqüência jurídica contra ele, ou, ainda, sabedor dos fatos que
ele próprio alegou, contrapondo-se ao seu adversário. Sentido
prático algum teria, na verdade, admitir-se que o litigante delegasse
a outrem a tarefa de depor, pois: a) este alguém não poderia saber
de tais fatos, como o litigante sabe; b) de outra parte, ainda poderia
delegar tal tarefa a alguém altamente experimentado na vivência
forense e, assim, frustrar-se-iam os objetivos em função dos quais
se disciplina o depoimento pessoal” 12.
O procurador, por mais instruído que esteja acerca da
matéria a responder, não conhece os fatos pelo testemunho ocular e
não os tem gravados na memória, porque os não presenciou, mas
apenas ouviu sua narrativa. Aí não haveria esclarecimento próprio
da parte, mas do advogado cuja atuação já se previa no próprio
mandato,
dispensável,
portanto,
a
formalização
do
ato
de
depoimento pessoal.
Daí erigido no colendo Superior Tribunal de Justiça que o
depoimento pessoal de pessoa física é ato personalíssimo. E só
mesmo a parte poderá prestá-lo, pois é ela quem tem ciência própria
sobre determinados fatos, não se permitindo mandatário munido de
poderes especiais para prestar depoimento pessoal no lugar da
parte 13.
12
13
Manual de Direito Processual Civil, ed. Rev. Tribunais, vol.2, p.241).
RSTJ 191:321, Resp 623.575; Resp 54.809/MG.
10
O depoimento pessoal de pessoa jurídica deve ser prestado
por quem conste como seu representante no contrato social,
administrador ou por preposto, esse autorizado especialmente para o
ato 14. Indispensável que o preposto tenha conhecimento dos fatos
abrangidos na demanda, vez que a vacuidade do depoimento pode
ser considerada pelo juiz como verdadeira confissão em relação à
perquirida matéria de fato 15.
5. IMPOSSIBILIDADE DE COMPARECIMENTO
Se a parte, por enfermidade, ou por outro motivo relevante,
estiver impossibilitada de comparecer ao fórum para realizar a
audiência, o juiz verificará a circunstância do caso, e designará dia,
hora e lugar para inquiri-la (CPC, art.336, § 1º c.c. art. 410 inc. III).
A justificativa da ausência deve ser apresentada pelo
advogado da parte, juntando atestado médico ou explanando
verbalmente para o juiz o imprevisto que impossibilitou a presença
da parte na audiência para prestar seu depoimento pessoal 16.
14
STJ, Resp 191.078: “A pessoa jurídica pode ser representada em juízo por preposto,
ainda que este não seja seu diretor; basta a designação regular”.
15
RT 672:123.
16
STJ, Resp 62.357/ES: “O advogado tem que comprovar que justificaria o seu
impedimento para comparecer à audiência previamente designada, sendo insuficientes
meras alegações”.
11
Aplica-se também o dispositivo retro quando, por exemplo, a
parte estiver doente ou em fase de convalescença, sem condições
de se locomover até o fórum. O juiz poderá ir até a casa da
testemunha ou marcar um local (hospital, por exemplo) para colher o
depoimento pessoal da parte, acompanhado do escrivão e dos
advogados das partes.
6. MEDIDA CAUTELAR DE PRODUÇÃO ANTECIPADA
DA PROVA
A lei de ritos permite que a parte seja interrogada fora da
data da audiência de instrução e julgamento quando demonstrado
que: terá de se ausentar; por motivo de idade ou de moléstia grave
(CPC, arts.846 e 847).
O
trilho legal
para se colher
o
depoimento pessoal,
constatada essa situação é a “medida cautelar
antecipada
de
prova”.
Poderá
ser
ajuizada
de produção
como
medida
preparatória, antes da propositura da ação, com o fito de preservar a
prova, inquirindo-se de antemão a parte. E se porventura presentes
as situações descritas nos incisos I e II do art.847 do CPC no
transcurso da ação, antes da designação da audiência, por meio de
uma
medida
cautelar
incidental, cujo
propósito
único
será
o
interrogatório da parte, com o intuito de produzir a prova ante a
proximidade fática de perdê-la.
12
Não haverá contraditório nessa tramitação. Após colhido o
depoimento da parte o juiz proferirá sentença homologando a prova
produzida. Na sentença o juiz apenas apreciará a regularidade
formal
do
procedimento,
não
ficando
sujeito,
quanto
à
fundamentação, às exigências do art. 458, vez que a sentença não
se constituirá num título executivo judicial 17. Os autos permanecerão
em cartório, sendo lícito aos interessados solicitar certidões que
quiserem para instruir o feito matriz (CPC, art.851).
7. PROCEDIMENTO NA A.I.J.
Aberta a audiência de instrução e julgamento serão tomados
os depoimentos pessoais após colhidos os esclarecimentos do
perito, quando solicitados na forma do art.435 do CPC. Quem
primeiro depõe é o autor, depois o réu (CPC, art.452 incs. I e II).
Quando autor e réu forem prestar seus depoimentos, um
não poderá ouvir o depoimento do outro. Requerido o depoimento do
autor, o réu terá de sair da sala da audiência, não podendo escutar
ou ser informado do conteúdo das declarações em juízo do autor.
Terminado o depoimento do autor, o réu ingressará na sala da
audiência
para
prestar
o
seu
depoimento.
Nesse
caso,
desnecessário que o autor se retire, pois não há mais como alterar
seu depoimento. A mesma situação do autor permanecer na sala da
17
RP 55:278; RSTJ 52:124 e 62:426; RT 604:61 e 659:94 e JTA 49:49).
13
audiência sucede quando apenas for tomado o depoimento pessoal
do réu (CPC, art.344, parágrafo único).
Pelo art.344 caput do CPC, a parte será interrogada na
forma prescrita para a inquirição de testemunhas. Entretanto, não é
bem assim. Somente se aplica o caput do art.414 do CPC quanto à
qualificação da parte; e não incide o art.415 do CPC acerca do
compromisso do depoente. Somente o juiz e o advogado da parte
contrária é que podem formular perguntas ao depoente. Isso é mais
que lógico, pois ninguém é obrigado a produzir prova contra si
mesmo e, as perguntas formuladas pelo advogado da própria parte
não teriam outro sentido senão ratificar seu posicionamento na lide,
uma desnecessária e inaproveitável redundância processual 18.
Situação deveras interessante ocorre se o réu é advogado
que litiga em causa própria e é intimado para depoimento pessoal,
não podendo permanecer na sala enquanto inquirido o autor. Nessa
moldura fática, pelo menos para esse ato, ele deverá ser substituído
por outro profissional, que traga para lhe acompanhar ou nomeado
pelo juiz.
8. FATOS NÃO OBRIGADOS A DEPOR
A lei processual civil elenca no art.348 os fatos que a parte
não está obrigada a depor:
18
RT 578:93
14
-
os fatos criminosos ou torpes que lhe forem imputados. Justificase, pois a parte não está obrigada a produzir prova contra si.O
direito de não se auto-incriminar é garantido em ao menos três
incisos vizinhos no artigo 5º da Constituição Federal: direito
à
ampla defesa, da presunção da inocência e de permanecer
calado. O princípio que impede a auto-incriminação não garante
somente o direito ao silêncio. Sua amplitude abrange todos
os
atos do processo e,
-
os fatos protegidos por estado ou sigilo da profissão. Matérias
relevantes de índole pessoal ou que a profissão da parte impede
de se revelar a qualquer pessoa, inclusive ao judiciário, permite
que a parte se dirija ao juiz, escusando-se com a clássica:
“Excelência, permita-me não responder a essa pergunta, por se
tratar de sigilo profissional”.
9. SILÊNCIO E RESPOSTAS EVASIVAS
Poderá ocorrer que no depoimento pessoal, sem qualquer
justificativa, a parte ao ser perguntada, deixe de responder ou utilize
do artifício de responder com subterfúgio, de maneira evasiva. Esse
cenário será avaliado pelo juiz na sentença, junto com as demais
circunstâncias e elementos probatórios produzidos na instrução.
15
Mas na decisão do juiz que aplicar a confissão terá de
aguçar os pontos do depoimento da parte que entendeu teve o
designo de não depor. Ecoará negativamente o depoimento pessoal
dessa maneira, considerado como recusa de depor (CPC, art.345).
10.
A CONFISSÃO
Merece ser realçado que a confissão é meio de prova, quer
ela se apresente como uma penalidade imposta à parte pelo juiz ou
trazida aos autos pela própria parte declarante. Ela faz prova
exclusivamente contra quem confessa.
Mas mesmo sendo uma prova, ela será analisada pelo juiz
diante do contexto probatório colacionado nos autos, não implicando
presunção absoluta de veracidade dos fatos 19.
10.1. ADMISSÃO DA VERDADE DO FATO
Forma marcante como meio de prova se afigura quando a
própria parte em seu depoimento pessoal admite a verdade de um
fato, contrário ao seu interesse e favorável ao adversário (CPC,
art.348).
19
STJ, Resp 54.809/MG.
16
Ocorrido essa situação, o fato confessado pela parte estará
sacramentado
como
uma
prova
perfeita,
não
havendo
mais
necessidade da parte contrária se exaurir para demonstrá-la de outra
forma, como anunciado no art. 334, inciso II do CPC: não dependem
de prova os fatos afirmados por uma parte e confessados pela parte
contrária.
10.2. CONFISSÃO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL
A confissão de fatos pode ocorrer de duas maneiras: judicial
e extrajudicial (CPC, art.348 fine).
A
confissão
“judicial”
será
espontânea
ou
provocada.
Caracteriza-se a espontânea quando a parte vier a juízo por si ou
por mandatário com poderes especiais e pretender confessar
expressamente determinado fato, oportunidade que será lavrado
termo nos autos nesse sentido.
Já a provocada é a confissão de
fatos que a parte declara no seu depoimento pessoal prestado em
juízo (CPC, art.349).
Por seu jaez personalíssimo, a confissão de uma parte não
reflete na posição do seu litisconsorte. E em se tratando de
cônjuges, a confissão de um cônjuge não valerá sem a anuência do
outro quando versar sobre bens imóveis ou direitos sobre imóveis
alheios (CPC, art.350).
17
10.3. DIREITOS INDISPONÍVEIS
Não tem qualquer valia probatória a confissão que abranger
fatos
relativos
a
direitos
indisponíveis,
verbi
gratia,
aquelas
abrangentes de estado de pessoa, como separação judicial, filiação,
homossexualidade, etc. (CPC, art.351).
Traça-se um paralelo com a dicção do art.841 do Código
Civil, que só admite transações quanto a direitos patrimoniais de
caráter privado.
10.4. AÇÃO ANULATÓRIA OU RESCISÓRIA
A confissão pode ser atacada e revogada seu efeito quando
emanar de erro (CC, arts. 138 20 a 144), dolo (CC, arts.145 21 a 150)
ou coação (CC, arts.151 22 a 155), ex-vi art.352 caput do CPC.
São 02 (dois) os procedimentos judiciais aptos para revocar
a confissão:
20
CC, art.138:São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade
emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência
normal, em face das circunstâncias do negócio.
21
CC, art.145:São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua
causa.
22
CC, art.151:A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta
ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua
família, ou aos seus bens.
18
-
por ação anulatória (ação declaratória incidental, art.486 do CPC)
se
ainda pendente o processo principal que foi prestada a
confissão e,
-
por ação rescisória (competência originária da instância ad quem,
art.485, inciso VIII do CPC), depois de transitada em julgado a
sentença, se o único fundamento do decisum rescindindo estiver
fincado na confissão da parte guisada pelos vícios do art. 352 do
CPC.
11. CONCLUSÃO
A pena de confesso imposta pelo juiz ou a confissão da
parte, em tese, produzem efeito semelhante à não impugnação de
determinados fatos. A recusa em comparecer ou em responder
equivale à “presunção” de que o alegado ou o impugnado pela parte
contrária é verdadeiro. A confissão é um meio de prova produzido
unilateralmente, tendo como elementos essenciais a capacidade da
parte, a declaração da vontade e o objeto possível. Os efeitos
irradiados pela confissão, em quaisquer de seus estilos, não podem
ser absolutos, suficientes para afastar qualquer dúvida, como ocorre,
por exemplo, no reconhecimento jurídico do pedido, levando à
extinção com julgamento de mérito (CPC, art.269, inc. II).
19
A pena de confesso é um forte indício e sua interpretação
não
ocorre
isoladamente,
após
a
comprovação
de
não-
comparecimento ou de recusa de depor. A confissão é uma
presunção juris tantum, tendo o juiz liberdade para na busca da
justiça e do perfeito delineamento dos fatos da causa, afastar essa
presunção de veracidade dos fatos gerada com a confissão ficta, e
de outra se convencer, diante da realidade dos autos 23.
Assim,
presunção
de
confissão
mesmo
declarada
na
sentença final, não poderá influenciar nem precipitar o julgamento de
mérito 24, contrariando à verdade real, se há nos autos elementos que
tornem o fato duvidoso, embora incida a pena de confesso.
Insuficiente a confissão para dar guarida ao direito da parte
confitente, o juiz haverá de retomar o raciocínio da dúvida contra
quem tem o ônus de provar 25.
abril de 2.008
-x-
23
STJ: “A ausência do autor à audiência em que deveria prestar depoimento pessoal,
por si só, não importa em improcedência do pedido, devendo o juiz examinar as provas
e formar o seu convencimento, tanto mais quando deficiente a contestação que deixa
de impugnar os fatos deduzidos na inicial, que se tornam incontroversos” (Agr.Reg. no
AG n. 43.984.4/RJ, DJ 28.03.1994).
24
STJ: “A pena de confissão não gera presunção absoluta, de forma a excluir a
apreciação do Juiz acerca de outros elementos probatórios. Prematura, assim, a
decisão do Magistrado que, declarada encerrada desde logo a instrução, dispensa a
oitiva das testemunhas arroladas” (Resp n. 161.438/SP, DJ 20.02.2006).
25
TJMG, Apel. Civ. n. 2.0000.00.499199-3/000, DJ 08.12.2005.
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O DEPOIMENTO PESSOAL E A CONFISSÃO