Professora Me. Márcia Cristina Greco Ohuschi
Professora Me. Dalva Linda Vicentini
TEORIA E PRÁTICA NA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E
ADULTOS
GRADUAÇÃO
PEDAGOGIA
MARINGÁ-PR
2011
Reitor: Wilson de Matos Silva
Vice-Reitor: Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor de Administração: Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor de Pesquisa, Pós-Graduação e Extensão: Flávio Bortolozzi
NEAD - Núcleo de Educação a Distância
Diretoria do NEAD: Willian Victor Kendrick de Matos Silva
Coordenação de Ensino: Viviane Marques Goi
Coordenação de Curso: Silvio Silvestre Barczsz
Coordenação de Tecnologia: Fabrício Ricardo Lazilha
Coordenação Comercial: Juliano Mario da Silva
Coordenação de Pólos: Paulo Pardo
Capa e Editoração: Luiz Fernando Rokubuiti, Fernando Henrique Mendes e Ronei Guilherme Neves Chiarandi
Supervisão de Material: Nalva Aparecida da Rosa Moura
Revisão Textual e Normas: Cristiane de Oliveira Alves, Elaine Bandeira Campos e Janaína Bicudo Kikuchi
Av. Guedner, 1610 - Jd. Aclimação - (44) 3027-6360 - CEP 87050-390 - Maringá - Paraná - www.cesumar.br
NEAD - Núcleo de Educação a Distância - bl. 4 sl. 1 e 2 - (44) 3027-6363 - [email protected] - www.ead.cesumar.br
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central - CESUMAR
CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação
a distância:
C397
Teoria e prática na educação de jovens e adultos/ Márcia Cristina Greco Ohuschi, Dalva Linda Vicentini - Maringá - PR, 2011.
163 p.
“Curso de Graduação em Pedagogia - EaD”.
1. Alfabetização de jovens e adultos. 2. Educação - Adultos. 3. Educação - jovens. 4. EaD. I. Ohuschi, Márcia Cristina Greco. II. Vicentini, Dalva Linda. III. Título.
CDD - 22 ed. 374
CIP - NBR 12899 - AACR/2
“As imagens utilizadas nessa apostila foram obtidas a partir do site PHOTOS.COM”.
TEORIA E PRÁTICA NA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E
ADULTOS
Professora Me. Márcia Cristina Greco Ohuschi
Professora Me. Dalva Linda Vicentini
APRESENTAÇÃO
Viver e trabalhar em uma sociedade global é um grande desafio para
todos os cidadãos. A busca por tecnologia, informação, conhecimento de
qualidade, novas habilidades para liderança e solução de problemas com
eficiência tornou-se uma questão de sobrevivência no mundo do trabalho.
Cada um de nós tem uma grande responsabilidade: as escolhas que
fizermos por nós e pelos nossos fará grande diferença no futuro.
Com essa visão, o Cesumar – Centro Universitário de Maringá – assume o compromisso
de democratizar o conhecimento por meio de alta tecnologia e contribuir para o futuro dos
brasileiros.
No cumprimento de sua missão – “promover a educação de qualidade nas diferentes áreas
do conhecimento, formando profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento
de uma sociedade justa e solidária” –, o Cesumar busca a integração do ensino-pesquisaextensão com as demandas institucionais e sociais; a realização de uma prática acadêmica que
contribua para o desenvolvimento da consciência social e política e, por fim, a democratização
do conhecimento acadêmico com a articulação e a integração com a sociedade.
Diante disso, o Cesumar almeja ser reconhecido como uma instituição universitária de
referência regional e nacional pela qualidade e compromisso do corpo docente; aquisição
de competências institucionais para o desenvolvimento de linhas de pesquisa; consolidação
da extensão universitária; qualidade da oferta dos ensinos presencial e a distância; bemestar e satisfação da comunidade interna; qualidade da gestão acadêmica e administrativa;
compromisso social de inclusão; processos de cooperação e parceria com o mundo do
trabalho, como também pelo compromisso e relacionamento permanente com os egressos,
incentivando a educação continuada.
Prof. Wilson de Matos Silva
Reitor
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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Olá, querido aluno! Seja bem-vindo à leitura de nosso material didático do NEAD_ Núcleo de
Educação a distância do CESUMAR.
Primeiramente, estamos muito felizes em tê-lo como nosso aluno. Temos a perfeita convicção
que fizeste a escolha certa. Somos hoje, o maior Centro Universitário do Paraná e estamos
presentes na maioria dos estados brasileiros. Somos conhecidos nacionalmente pela nossa
qualidade de ensino em ambas modalidades: presencial e a distância.
Este material foi preparado com muito carinho e dedicação para que chegasse a você com a
maior clareza possível. Ele foi baseado nas diretrizes curriculares do curso em questão e está
em plena consonância com o Projeto Pedagógico do Curso.
Neste projeto Pedagógico estão as diretrizes que seu curso segue. Nele, você encontra os
objetivos gerais e específicos, o perfil do egresso, a metodologia, os critérios de avaliação,
o ementário, as bibliografias e tudo o que você precisa saber para estar bem informado e
aproveitar o curso com o máximo proveito possível. Ele está disponível pra você! O que acha
de tomar conhecimento dele? Tenho certeza que irá gostar. Tenho certeza que achará muito
interessante sua compreensão.
No AVA - Ambiente Virtual de Aprendizagem, constam gravações as quais os professores que
organizaram esse material gravaram alguns vídeos, que juntamente com sua leitura ajudará
você no processo de aprendizagem.
Como vivemos numa sociedade letrada, precisamos e devemos estar sempre atentos às
informações contidas nas leituras. Uma boa leitura para ter eficiência e atingir nossos objetivos
precisa ser muito bem interpretada, de modo que, tão logo seja feita, seja possível absorver
conceitos e conhecimentos antes não vistos e ou compreendidos.
Além de sua motivação para a absorção desse conteúdo, algumas dicas são bem-vindas:
esteja concentrado, enquanto lê. Leia lentamente, prestando atenção em cada detalhe. Esteja
sempre com um dicionário por perto, pois ele o ajudará a entender algumas palavras que por
ventura serão novas em seu vocabulário. Saiba que tipo de texto e o assunto este material lhe
trata. E claro, estude em um ambiente que lhe traga conforto e tranquilidade.
Um grande abraço com desejos de um excelente aproveitamento.
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Profª. Viviane Marques Goi
Coordenadora de Ensino do NEAD- CESUMAR
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
APRESENTAÇÃO
Livro: Teoria e Prática na Educação de Jovens e Adultos
Professora Me. Márcia Cristina Greco Ohuschi
Professora Me. Dalva Linda Vicentini
Prezados Alunos,
É com grande alegria que apresentamos a você o livro que fará parte da disciplina de Teoria
e Prática na Educação de Jovens e Adultos. Eu, professora Dalva, e professora Márcia o
escrevemos especialmente para você, graduando do curso de Pedagogia do Centro
Universitário de Maringá – CESUMAR.
No decorrer de nossos estudos, veremos que os jovens e adultos desejam ver a aplicação do
que estão aprendendo e, por isso, precisam ser estimulados para resgatarem a sua autoestima.
Por meio da educação escolar poderão desenvolver-se como cidadãos conscientes de seus
direitos, bem como ampliarem sua capacidade crítica e reflexiva, que lhes trará condições para
questionarem e, se necessário, modificar o ambiente em que os mesmos estiverem inseridos,
contribuindo, desta maneira, para a construção de um mundo melhor.
O objetivo desse material para a disciplina apresentada é reconhecer a importância da
modalidade da Educação de Jovens e Adultos na sociedade contemporânea, bem como
identificar o papel do educador como mediador no processo de construção dos conhecimentos.
Entendemos ser de fundamental importância na formação do Pedagogo esses espaços
de leituras e discussões sobre essa modalidade de ensino, identificando os avanços e as
principais dificuldades encontradas pelos mesmos em seu processo de escolarização, como
passíveis de mudança.
A Educação de Jovens e Adultos é de suma importância para a sociedade, pois visa preparar
cidadãos que não tiveram oportunidade e/ou condições de ampliar seu nível de escolaridade
no ensino regular. Assim, prepara-os para exercer sua cidadania com mais dignidade,
capacitando-os para realizar tarefas do dia a dia com maior facilidade.
Para os jovens e adultos, passar por um processo de escolarização é uma realização, pois
eles aprendem a ler, escrever e calcular, habilidades que outrora era desconhecida em seu
mundo como analfabetos. Dessa forma, ampliam sua autonomia, visto que se sentem mais
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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independentes, conseguindo melhor oportunidade na sua vida profissional e pessoal. A partir
de sua alfabetização, um novo mundo se abre com melhores e maiores expectativas.
Estando aptos para a realização de atividades que antes se tornava um obstáculo em sua vida;
com a alfabetização, os jovens e adultos vencem as barreiras que por muito tempo estavam
à sua frente.
A disciplina considera a Educação como um dos mecanismos da inclusão social, promovendo
o acesso aos direitos de cidadania e gerando conscientização dos indivíduos para a
compreensão de seus interesses, do meio social e da natureza que o cerca. O trabalho com os
Jovens e Adultos visa contribuir para a mudança de pensamento social em relação às pessoas
não alfabetizadas, incluindo-os na sociedade com práticas educativas peculiares.
Apresentamos como referências metodológicas desse livro, a pesquisa bibliográfica, pesquisa
na internet, a pesquisa empírica e documental. O desenvolvimento do trabalho consiste na
leitura de autores que realizaram pesquisas que perpassam a temática em estudo, entre eles:
Paulo Freire, Moacir Gadotti, Maria Clara di Pierro, Sergio Haddad entre outros.
Na primeira unidade, abordaremos o histórico da Educação de Jovens e Adultos, ou seja,
desde o começo no período do império e colônia, suas conquistas realizadas, até a atualidade,
bem como a contribuição de Paulo Freire para o desenvolvimento desta modalidade de ensino.
A segunda unidade discute as funções da EJA e o papel do educador frente a este trabalho.
A terceira unidade trata o jovem e o adulto na sociedade letrada, além de realizar algumas
reflexões sobre a questão curricular na Educação de Jovens e Adultos. Na quarta unidade,
aprofundaremos sobre o processo de avaliação, bem como a importância desta para o
desenvolvimento dos Jovens e Adultos. Na quinta unidade, trataremos da interdisciplinaridade
como princípio necessário para a construção do conhecimento numa visão sistêmica e não
fragmentada.
Esperamos, com nossas discussões acerca desses assuntos, trazer contribuições para sua
atuação docente nessa modalidade de ensino. Para tanto, será necessário também que você
se debruce sobre as leituras que encontrará daqui para frente.
Bom trabalho!
Professoras Dalva e Márcia
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
SUMÁRIO
UNIDADE I
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UM POUCO DE HISTÓRIA
O CONCEITO E A DEFINIÇÃO DOS TERMOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS....13
HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS..................................................................17
PAULO FREIRE E SUA PROPOSTA PARA A ALFABETIZAÇÃO DE ADULTOS.....................22
O MOBRAL............................................................................................................................................31
NOVOS RUMOS NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS.....................................................34
UNIDADE II
FUNÇÕES DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E O PAPEL DO EDUCADOR NESTA
MODALIDADE DE ENSINO
FUNÇÕES DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS................................................................58
O PAPEL DO EDUCADOR FRENTE À EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS......................67
UNIDADE III
O JOVEM E O ADULTO NA SOCIEDADE LETRADA: QUESTÕES CURRICULARES EM
FOCO
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO.................................................................................................83
O LETRAMENTO CRÍTICO................................................................................................................89
A FORMAÇÃO DO CIDADÃO LETRADO........................................................................................91
A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS FRENTE AOS DESAFIOS CURRICULARES.......94
LÍNGUA PORTUGUESA.....................................................................................................................98
MATEMÁTICA.....................................................................................................................................103
ESTUDOS DA SOCIEDADE E DA NATUREZA............................................................................107
UNIDADE IV
ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: O PROCESSO DE AVALIAÇÃO
OS SIGNIFICADOS DA ALFABETIZAÇÃO....................................................................................119
O ENSINO E A APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃODE JOVENS E ADULTOS.......................122
A AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS........................................................126
UNIDADE V
INTERDISCIPLINARIDADE NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
O PROJETO INTERDISCIPLINAR..................................................................................................139
UMA NOVA VISÃO DE MUNDO......................................................................................................145
CONCLUSÃO.........................................................................................................................158
REFERÊNCIAS......................................................................................................................160
UNIDADE I
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UM POUCO DE
HISTÓRIA
Professora Me. Márcia Cristina Greco Ohuschi
Professora Me. Dalva Linda Vicentini
Objetivos de Aprendizagem
• Conceituar e compreender alguns termos da Educação de Jovens e Adultos.
• Refletir sobre o percurso histórico da Educação de Jovens e Adultos, bem como sua
implicação nas práticas pedagógicas desenvolvidas atualmente.
• Reconhecer a importância do educador Paulo Freire na Educação de Jovens e
Adultos.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nessa unidade:
• O conceito e a definição dos termos da Educação de Jovens e Adultos
• A história da Educação de Jovens e Adultos
• Paulo Freire e sua proposta para a alfabetização de adultos
• Novos rumos para a Educação de Jovens e Adultos
• Considerações sobre a obra “Pedagogia do Oprimido”, de Paulo Freire
• Considerações sobre a obra “Pedagogia da Autonomia”, de Paulo Freire
• Considerações sobre o capítulo “Desafios da educação de adultos ante a
nova reestruturação tecnológica” da obra “Pedagogia da Indignação: cartas
pedagógicas e outros escritos”, de Paulo Freire
INTRODUÇÃO
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de ensino utilizado na rede pública
no Brasil para a inclusão de jovens e adultos na educação formal, com o objetivo de desenvolver
o ensino fundamental e médio com qualidade para aqueles que perderam a oportunidade de
se escolarizar na época própria. Ela é regulamentada pelo artigo 37, da lei nº. 9394, de 20 de
dezembro de 1996 (LDB).
Um dos principais passos para o trabalho com Educação de Jovens e Adultos é a valorização
do conhecimento prévio e o reconhecimento dos alunos como portadores de cultura e saberes.
São pessoas que estão voltando para a escola, muitas vezes, em busca da educação que o
mercado exige. Chegam cansados depois de um dia de trabalho, têm pouco tempo para se
dedicar aos estudos, mas chegam também com muitas histórias e vivências.
Dessa forma, esta disciplina tem como objetivo propiciar o estudo sobre a Educação de
Jovens e Adultos na realidade brasileira, bem como refletir sobre os processos de ensino e
aprendizagem que o envolvem, contribuindo para a construção da cidadania como elemento
da emancipação.
Assim, essa primeira unidade é dedicada ao conceito e a um breve histórico da Educação de
Jovens e Adultos, no Brasil, no qual se destacam soluções e impasses pedagógicos gerados
nessas práticas. Faz-se necessário conhecer toda a trajetória histórica dessa modalidade para
que você a compreenda melhor a atualidade.
O CONCEITO E A DEFINIÇÃO DOS TERMOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS
E ADULTOS
O que é Educação de Jovens e Adultos? Conforme as Diretrizes Nacionais (GADOTTI;
ROMÃO, 2001), a educação básica de jovens e adultos, na maioria das vezes, é considerada
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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Fonte: PHOTOS.COM
como aquela que possibilita ao aluno a leitura,
escrita, compreensão da língua nacional, o
domínio das operações matemáticas básicas,
dos conhecimentos das ciências sociais e
naturais, a cultura, o lazer, a arte, a comunicação
e o esporte. Porém, o documento afirma que o
conceito da Educação de Jovens e Adultos é
bem mais amplo, pois integra processos educativos desenvolvidos em múltiplas dimensões: “a
do conhecimento, das práticas sociais, do trabalho, do confronto de problemas coletivos e da
construção da cidadania” (GADOTTI e ROMÃO, 2001, p. 119).
A educação de jovens e adultos é uma modalidade do ensino fundamental e do ensino
médio, oferecendo oportunidade aos jovens e adultos para iniciar e/ou dar continuidade aos
seus estudos. A Constituição de 1988, em seu art. 208, inciso I, garante o acesso ao ensino
fundamental gratuito, inclusive àqueles que a ele não tiveram acesso na idade própria. Esse
dispositivo constitucional determina, portanto, o dever do Estado de promover a educação de
jovens e adultos.
A partir da Lei de Diretrizes e Bases 9394/96, a educação de jovens e adultos tem o papel
de atender aos interesses e às necessidades de indivíduos que já tinham uma determinada
experiência de vida e participam do mundo do trabalho. No entanto, necessitam de uma
formação bastante diferenciada das crianças e adolescentes aos quais se destina o ensino
regular. Por isso, a educação de jovens e adultos é também compreendida como educação
contínua e permanente.
A Resolução n.º 1, de 5 de julho de 2000, do Conselho Nacional de Educação (CNE) –
estabelece as diretrizes curriculares nacionais para a educação de jovens e adultos e afirma que
a oferta desta modalidade de ensino deve considerar as situações, os perfis dos estudantes,
as faixas etárias e se pautará pelos princípios de equidade, diferença e proporcionalidade na
apropriação e contextualização das diretrizes curriculares nacionais e na proposição de um
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
modelo pedagógico próprio, de modo a assegurar:
I. quanto à eqüidade, a distribuição específica dos componentes curriculares afim de
propiciar um patamar igualitário de formação e restabelecer a igualdade de direitos e de
oportunidades face ao direito à educação;
II. quanto à diferença, a identificação e o reconhecimento da alteridade própria e
inseparável dos jovens e dos adultos em seu processo formativo, da valorização do
mérito de cada qual e do desenvolvimento de seus conhecimentos e valores;
III. quanto à proporcionalidade, a disposição e alocação adequadas dos componentes
curriculares face às necessidades próprias da Educação de Jovens e Adultos com
espaços e tempos nos quais as práticas pedagógicas assegurem aos seus estudantes
identidade formativa comum aos demais participantes da escolarização básica (art. 5º).
De acordo com as Diretrizes, a EJA não se limita à sala de aula, mas desenvolve ações
em diversos movimentos sociais, como, por exemplo, nos sindicatos, associações de bairro,
comunidades etc., com o intuito de permitir a compreensão da vida moderna e o posicionamento
crítico dos educandos frente à sua realidade.
A procura dos jovens e adultos pela escolarização é grande e varia conforme a região, a
faixa etária, o sexo e a competitividade do mercado de trabalho. Dessa forma, é preciso que
o sistema educacional esteja preparado para corresponder com qualidade a essa demanda.
Em primeiro lugar, o documento afirma que é necessário levar em consideração o fato dos
alunos da EJA serem trabalhadores, o que os leva a chegarem cansados, a poderem ter
alternância de turnos no trabalho, dentre outros fatores. Além disso, é preciso considerar a
diversidade social, econômica, étnica, regional e os saberes que cada um carrega consigo, os
quais foram construídos em suas relações sociais.
Logo, para se evitar o desinteresse, a sensação de fracasso e a evasão, conforme as Diretrizes,
o contexto cultural do educando deve ser a ponte entre o seu saber e o que a escola pode lhe
oferecer. Por isso:
A EJA não deve ser uma reposição da escolaridade perdida, como normalmente se configuram
os cursos acelerados nos moldes de que tem sido e ensino supletivo. Deve, sim, construir uma
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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identidade própria, sem concessões à qualidade de ensino e propiciando uma terminalidade e
acesso a certificados equivalentes ao ensino regular (GADOTTI; ROMÃO, 2001, p. 121).
Enquanto modalidade de ensino, a educação de jovens e adultos está inserida nos mesmos
preceitos dos respectivos níveis de ensino aos quais está associada: o ensino fundamental
e o ensino médio. Apesar das diversidades existentes na educação brasileira, de uma forma
geral, a educação de jovens e adultos pode ser oferecida em instituições públicas ou privadas,
estabelecimentos estes que podem atuar:
• Exclusivamente nesta modalidade de ensino, oferecendo o ensino fundamental e/ou o ensino médio.
• Em um ou mais níveis de ensino, inclusive nesta modalidade.
As práticas pedagógicas da EJA não devem reproduzir o ensino regular, de maneira inadequada
e facilitadora, mas, conforme Gadotti e Romão (2001, p. 123), orientar-se “na perspectiva
epistemológica que toma o jovem e o adulto como construtores de conhecimento, interagindo
com a natureza e o mundo social, tendo como ponto fundamental o respeito à cultura dos
sujeitos.”
Quanto aos termos utilizados para definir a educação de jovens e adultos, Gadotti (2001) afirma
que, muitas vezes, são utilizados de forma equivocada. A expressão “educação não formal”,
por exemplo, denota algo inferior à educação formal, concebida como algo complementar,
supletiva, sem valor em si própria.
Assim, Gadotti (2001, p. 30) afirma que os termos “educação de adultos”, “educação popular”,
“educação não formal” não são sinônimos. O termo educação de adultos, popularizado,
principalmente, por organizações internacionais como a UNESCO, refere-se a uma área
especializada da educação. Já a educação não formal está vinculada às organizações não
governamentais, como igrejas, partidos políticos, empresas privadas, que se organizam, via
de regra, onde o Estado se omitiu e, muitas vezes, opõem-se à educação de adultos oficial.
A educação popular, normalmente, opõe-se à educação de adultos estatal. Tem como base o
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
profundo respeito pelo senso comum dos setores populares em sua prática cotidiana.
As políticas atuais de Educação de Jovens e Adultos, tanto de iniciativa de instituições no
âmbito do sistema público de ensino quanto as organizadas pelos movimentos sociais trazem,
em suas propostas pedagógicas, princípios norteadores fundamentados em uma maneira
de pensar a EJA situada no que se constituiu como sendo educação popular, que consiste
numa educação dirigida às populações adultas pensada como uma educação participante,
instrumento de desenvolvimento da consciência crítica popular, um dos instrumentos de
resignificação da própria realidade social na medida em que se constitui como uma situação
organizada do encontro de pessoas que se empenham coletivamente na tarefa de 'transformar
o mundo.
Neste contexto, a educação popular, referência para as propostas de EJA voltadas para
a cidadania, expressam modelos que visam um utilitário saber da pessoa educada para a
concorrência, para a competitividade. Carlos Rodrigues Brandão atualiza a educação popular
como sendo a educação cidadã, que promove formação humana e que é dirigida para pessoas
em nome do desenvolvimento humano, que aspira realizar em cada pessoa, quem quer que
seja, a sua plena parcela do direito inquestionável e intransferível a aspirar ser não menos do
que sábia, autônoma, harmoniosa e, se possível, feliz.
HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Traçaremos, a partir de agora, um breve panorama histórico da Educação de Jovens e Adultos
no Brasil. Entendemos ser de importância ímpar a compreensão da trajetória histórica desta
modalidade de ensino, uma vez que o conhecimento dessa trajetória nos possibilita uma
melhor compreensão dos entraves e dos avanços em nosso país.
Muito, ainda, faz-se necessário caminhar em direção à constituição de uma Educação de
Jovens e Adultos promotora de desenvolvimento humano. No entanto, para que possamos
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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abrir novos caminhos, é importante compreendermos os caminhos trilhados até então.
O Início de uma Caminhada
As atividades de leitura e escrita no Brasil iniciaram com os jesuítas; sua ação missionária,
com o intuito de difundir o evangelho, incluía estratégias educativas com crianças e adultos.
Primeiramente, para os índios e, posteriormente, para os negros escravos. Assim, no período
colonial, a educação para os religiosos eram administradas na sua maioria para os adultos;
era ensinado o evangelho, normas de comportamento e os ofícios necessários à economia
colonial aos indígenas e aos escravos.
No ano de 1824 firmou-se, pela Constituição Brasileira, uma instrução primária e gratuita para
os adultos. No período imperial, pouco foi feito, pois neste período os adultos só possuíam
cidadania, e a maioria deles eram da elite e alfabetizados. No final do império, 82 % da
população com idade superior a cinco anos ainda eram analfabetos.
A Proclamação da República em 1889 e a Constituição Federal de 1891 reforçaram a
concepção da atribuição da educação básica como tarefas dos estados e municípios, cabendo
à união o ensino secundário e superior. A persistência desse sistema garantiu a formação de
elites em detrimento de uma educação para as amplas camadas sociais marginalizadas, onde
a oferta do ensino elementar se submeteu a fragilidade financeira dos estados e municípios.
Essa constituição manteve a exclusão dos adultos analfabetos da participação política pelo
voto, criando o preconceito pelo analfabeto, visto neste momento como incapaz. Assim, na
primeira República, a nova Constituição excluiu os analfabetos para votação, sendo estes uma
grande maioria. Segundo Pierro (2000, p.109), “A nova Constituição Republicana estabeleceu
também a exclusão dos adultos da participação pelo voto, isto em um momento em que a
maioria da população adulta era iletra”. Trinta anos depois da Proclamação da República, 72%
da população acima de cinco anos era analfabeta.
Podemos observar os primórdios da educação de jovens e adultos, no Brasil, após a chegada
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
dos padres jesuítas em 1549. Obviamente, essa educação se voltava para a catequização de
nativos, mas ocorreu também com os colonizadores, diferenciando-se apenas pelos objetivos
que possuíam para cada grupo específico.
Entretanto, após a expulsão dos jesuítas pelo Marquês de Pombal, ocorreu uma desorganização
do ensino, que voltou a ser ordenado somente no Império. Ao saltarmos para o século XX,
segundo informações do IBGE, em 1910, “o direito a ler e escrever era negado a quase 11
milhões e meio de pessoas com mais de 15 anos”. Logo, alguns grupos sociais mobilizaram-se
para organizar campanhas de alfabetização chamadas de “Ligas”. De acordo com Ribeiro (1997), foi apenas a partir da década de 30, quando começou a se
consolidar um sistema público de educação elementar no país, que a educação básica de
adultos teve seu lugar inserido na história da educação brasileira.
A partir da Primeira Guerra Mundial e nas duas décadas seguintes, mudanças significativas
aconteceram no cenário educacional. O crescimento do processo de industrialização e
urbanização e a preocupação com questões sociais emergentes começaram a fazer da
educação escolar uma preocupação para as autoridades e a sociedade brasileira. Neste
contexto, criam-se condições favoráveis para o estabelecimento de políticas para a educação
de adultos e ampliam-se os serviços educacionais deste período como parte de uma política
de extensão de direitos.
A formação da identidade da educação de adultos no Brasil dá-se a partir da década de
1940, especificamente no ano de 1947, com a política de educação para as massas. Esta
passava a ser considerada uma condição necessária para que o Brasil se realizasse
como um país desenvolvido. Neste período, foi lançada a Campanha de Educação de
Adolescentes e Adultos, cujo objetivo era alfabetizar, em três meses, esta parcela da
população excluída da educação regular. Além dessa meta, havia ainda a pretensão de
se trabalhar a capacitação profissional e o desenvolvimento comunitário desses jovens
e adultos. Mesmo influenciada pela euforia nacionalista e pela industrialização vivida
no Brasil, à campanha não obteve sucesso, principalmente em zonas rurais, sendo
extinta antes do final da década de 1950. Sobreviveram, na época, apenas as escolas
supletivas nos estados e municípios (PEREIRA apud MACEDO, 2007, p.2).
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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No entanto, foi somente no final da década de quarenta que a Educação de Jovens e Adultos
firmou-se como tema de política educacional. Diversos fatores contribuíram para que isso
ocorresse, entre eles: a criação do Ministério da Educação e Saúde Pública, em 1930; a ideia
de um Plano Nacional de Educação a partir da Constituição de 1934 e a criação do Instituto
Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), em 1938.
Nessa época, devido às transformações pelas quais passava a sociedade brasileira,
associadas ao processo de industrialização, “a oferta de ensino básico gratuito estendia-se
consideravelmente, acolhendo setores sociais cada vez mais diversos” (RIBEIRO, 1997, p. 19).
Com o fim da ditadura de Vargas, em 1945, o Brasil vivia a política da redemocratização. A
Segunda Guerra Mundial recém terminara e a ONU (Organização das Nações Unidas) visava
integrar os povos, para alcançar paz e democracia. Assim, havia o interesse em aumentar as
bases eleitorais para a sustentação do governo central e em melhorar a produção.
No período de Vargas, em 1930, a revolução se tornou um marco na reformulação do papel
do Estado, no Brasil, de acordo com os aspectos educacionais. A nova Constituição Brasileira
apresentou um novo Plano Nacional de Educação (PNE) firmando de maneira óbvia as esferas
de capacidade da União, onde confirmou o direito de todas as pessoas do Estado para com
a educação.
O PNE responsabilizou-se pela Constituição de 1934, que inclui como obrigatório as normas
no ensino primário integral. O ensino primário se prolongaria para os adultos e tinha um
tratamento particular, sendo que no ano de 1938 o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa
(INEP) instituiu o fundo nacional do ensino primário que tinha o dever de promover programas
progressivos de ampliação na educação primária:
Passos decisivos para a colocação da educação de Adultos como problema nacional
foram dados na década de 1940 com a criação do Fundo Nacional do Ensino Primário
e sua regulamentação em 1945, que destinava 25% dos recursos do fundo para a
Educação de Adultos e adolescentes analfabetos, a criação do Serviço de Adultos em
1947 e com a aprovação de um Plano Nacional de Educação Supletiva, ainda em 1947
(CORREIA, pp. 21 e 22).
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Por meio dessa estrutura e desses recursos foram promovidas diversas Campanhas contra o
analfabetismo, destacando-se a Campanha de Educação de Adultos e Adolescentes em 1947
e a Campanha Nacional de Educação Rural em 1952.
Isso tudo fez com que houvesse uma maior preocupação com relação à educação dos adultos,
a qual, segundo Ribeiro (1997, p. 20) definiu sua identidade a partir de uma Campanha de
Educação de Adultos, lançada em 1947:
Pretendia-se, numa primeira etapa, uma ação extensiva que previa a alfabetização
em três meses, e mais a condensação do curso primário em dois períodos de sete
meses. Depois, seguiria uma etapa de “ação em profundidade”, voltada à capacitação
profissional e ao desenvolvimento comunitário.
No início, a campanha teve ótimos resultados, quando foram criadas diversas escolas supletivas.
Dela, também suscitaram discussões, no campo teórico-pedagógico, sobre o analfabetismo,
que era considerado como a causa do fracasso em que se encontrava a situação econômica,
social e cultural do país. Dessa forma, o adulto analfabeto era visto como incapaz e marginal.
Felizmente, durante a campanha, essas ideias preconceituosas foram criticadas e os saberes
e capacidades dos adultos analfabetos foram reconhecidos. Logo, de acordo com Ribeiro
(1997), houve a difusão de um método de ensino de leitura para adultos, denominado Laubach,
o que inspirou a iniciativa do Ministério da Educação em produzir material didático específico
para o ensino da leitura e da escrita para adultos. Conforme a autora,
As lições partiam de palavras-chave selecionadas e organizadas segundo suas
características fonéticas. A função dessas palavras era remeter aos padrões silábicos,
estes sim o foco do estudo. As sílabas deveriam ser memorizadas e remontadas
para formar outras palavras. As primeiras lições também continham pequenas frases
montadas com as mesmas sílabas. Nas lições finais, as frases compunham pequenos
textos contendo orientações sobre preservação da saúde, técnicas simples de trabalho
e mensagens de moral e civismo (RIBEIRO, 1997, pp. 21-22).
No final da década de 50, muitas críticas foram lançadas à Campanha de Educação de Adultos,
como a denúncia ao caráter superficial do aprendizado, já que a alfabetização acontecia num
intervalo de tempo muito curto, e à inadequação do método. Foram promovidas diversas
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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Campanhas contra o analfabetismo, destacando-se a Campanha de Educação de Adultos e
Adolescentes em 1947 e a Campanha Nacional de Educação Rural em 1952.
A organização de programas de massa destinados a Educação de Jovens e Adultos mediante
o Fundo Nacional do Ensino Primário, foi acompanhado de euforia nos primeiros momentos
e seguido de atividades rotineiras durante os anos 50, até sua extinção oficial, no início da
década de 1960. Assim, surgiu uma nova visão sobre o problema do analfabetismo e um novo
paradigma pedagógico para a educação de adultos, a partir da proposta do educador Paulo
Freire.
PAULO FREIRE E SUA PROPOSTA PARA A ALFABETIZAÇÃO DE ADULTOS
Uma breve biografia
Paulo Reglus Neves Freire nasceu no dia 19 de setembro de 1921, em
Recife, no nordeste do Brasil, e faleceu em 2 de maio de 1997, em São
Paulo. Como estudioso, ativista social e trabalhador cultural, Freire desenvolveu, mais do que uma prática de alfabetização, uma pedagogia
crítico libertadora. Em sua proposta, o ato de conhecimento tem como
pressuposto fundamental a cultura do educando; não para cristalizá-la,
mas como “ponto de partida” para que ele avance na leitura do mundo,
compreendendo-se como sujeito da história. É através da relação dialógica que se consolida a educação como prática da liberdade.
Em sua primeira experiência, em 1963, Freire ensinou 300 adultos a ler e escrever em 45 dias.
Esse método foi adotado em Pernambuco, um estado produtor de cana-de-açúcar. O trabalho
de Freire com os pobres e, internacionalmente aclamado, teve início no final da década de 40
e continuou de forma ininterrupta até 1964.
BIOGRAFIA de Paulo Freire. Disponível em: <http://www.abec.ch/Portugues/subsidios-educadores/biografias/Biografia_de_
Paulo_Freire.pdf>. Acesso em: 01 dez. 2010.
1
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Os 16 anos de exílio foram períodos tumultuados e produtivos: uma estadia de cinco anos no
Chile como consultor da UNESCO no Instituto de Capacitação e Investigação em Reforma
Agrária; uma nomeação, em 1969, para trabalhar no Centro para Estudos de Desenvolvimento
e Mudança Social da Universidade de Harvard; uma mudança para Genebra, na Suíça,
em 1970, para trabalhar como consultor do Escritório de Educação do Conselho Mundial
de Igrejas, onde desenvolveu programas de alfabetização para a Tanzânia e Guiné Bissau,
que se concentravam na reafricanização de seus países; o desenvolvimento de programas
de alfabetização em algumas ex-colônias portuguesas pós-revolucionárias como Angola e
Moçambique; ajuda ao governo do Peru e da Nicarágua em suas campanhas de alfabetização...
Paulo Freire (1921-1997) representa um dos maiores e mais significantes educadores do século
XX. Sua pedagogia mostra um novo caminho para a relação entre educadores e educandos.
Caminho este que consolida uma proposta político-pedagógica elegendo educador e educando
como sujeitos do processo de construção do conhecimento mediatizados pelo mundo, visando
à transformação social e construção de uma sociedade justa, democrática e igualitária.
Na América do Sul, Europa, África, América do Norte e Central, suas ideias revolucionaram
o pensamento pedagógico universal, estimulando a prática educativa de movimentos e
organizações de diversas naturezas. Três filosofias marcaram sucessivamente a obra de Paulo
Freire: o existencialismo, a fenomenologia e o marxismo sem, no entanto, adotar uma posição
ortodoxa. Seu pensamento rompeu a relação cristalizadora de dominação, buscando pensar a
realidade dentro do universo do educando, construindo a prática educacional considerando a
linguagem e a história da coletividade elementos essenciais dessa prática.
Em Paulo Freire, vida, pensamento e obra se juntam. Pensa a realidade e a ação sobre ela,
trabalhando teoricamente a partir dela. Segundo ele, as questões e problemas principais de
educação não são somente questões pedagógicas, ao contrário, são políticas. Sua proposta,
a pedagogia crítica, como práxis cultural, contribui para revelar a ideologia encoberta na
consciência das pessoas. Seu trabalho revela dedicação e coerência aliados à convicção de
luta por uma sociedade justa, voltada para o processo permanente de humanização entre as
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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pessoas, onde ninguém é excluído ou posto à margem da vida. Paulo Freire provou que é
possível educar para responder aos desafios da sociedade, nesse sentido, a educação deve
ser um instrumento de transformação global do homem e da sociedade, tendo como essência
a dialogicidade.
As ideias de Paulo Freire chamavam a atenção para as causas sociais do analfabetismo, além
de uma visão do analfabeto como produtor social e cultural de uma sociedade. O Congresso
deu início a um novo período na Educação de Adultos no Brasil, onde a busca intensa era por
inovações neste terreno e se percebia esforços realizados pelos mais diversos grupos em
favor da educação da população adulta para a participação na vida política da nação.
O trabalho de Paulo Freire passou a direcionar diversas experiências com a Educação de
Adultos como o Movimento de Educação de Base (MEB), ligado à Igreja Católica. As ideias
deste autor demonstravam a necessidade de realizar uma Educação de Adultos crítica, voltada
para a transformação social, o diálogo como princípio educativo e a ascensão dos educandos
adultos, de seu papel de sujeitos de aprendizagem, de produção de cultura e de transformação
do mundo.
A Educação de Jovens e Adultos no Brasil está muito ligada a Freire. Seu sistema de ensino
foi desenvolvido em 1960 e com o sucesso da experiência, ficou conhecido em todo o Brasil,
sendo praticado por diversos grupos da cultura popular. Com ele, veio uma mudança de
paradigma teórico-pedagógico na EJA.
Durante muitos séculos, para alfabetizar alguém se utilizava o método silábico de aprendizagem;
partia-se da ideia de que conhecendo as sílabas e juntando-as poderia se formar qualquer
palavra. Por essa concepção não se desenvolvia o pensamento crítico, não importava entender
o que era escrito e o que era lido, porque o importante era dominar o código.
Por essa nova concepção, educador e educando devem interagir, são criados novos métodos
de aprendizagem por meio dos quais o alfabetizador trabalha o conteúdo a ser ensinado: a
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
escrita. Com a preocupação de que seus alunos estejam compreendendo o sentido para o
sistema de escrita, a partir de temas e palavras geradoras ligadas às suas experiências de
vida.
É nos anos 60 que aparecem Paulo Freira e sua equipe de trabalho, que dão uma virada
no enfoque da educação popular, ao propor que os processos metodológicos para a
alfabetização de adultos transcendam as técnicas e centrem-se em elementos de
conscientização. Lançam seu manifesto contra a educação bancária que desumaniza
o homem e o converte num depósito de conteúdos; e propõem como saída a Educação
Problematizadora. O desafio proposto por Freire era conceber a alfabetização de
adultos para além da aquisição e produção de conhecimentos cognitivos, mesmo sendo
estes necessários e imprescindíveis (MEDEIROS, 2005, p.3).
A proposta de Paulo Freire baseia-se na realidade do educando, levando em conta suas
experiências, suas opiniões e sua história de vida. Educador e educando devem caminhar
juntos, interagindo durante todo o processo de alfabetização. Seu objetivo maior era a
alfabetização visando à libertação, e para ele essa libertação não se dá somente no campo
cognitivo, mas deve acontecer, essencialmente, nos campos social, cultural e político.
Segundo ele, a visão ingênua que os indivíduos têm da realidade torna-os escravos, na
medida em que, não sabendo que podem transformá-la, sujeitam-se a ela. Essa descrença na
possibilidade de intervenção na realidade é alimentada pelas cartilhas e manuais escolares que
colocam homens e mulheres como observadores e não como sujeitos ativos dessa realidade.
O Método Paulo Freire
No início dos anos 60, os principais programas de alfabetização e educação popular se
inspiraram na proposta de alfabetização de adultos de Paulo Freire. De acordo com Ribeiro
(1997), tais programas foram empreendidos por intelectuais, estudantes e católicos engajados
numa ação política junto aos grupos populares. Em 1964, foi aprovado o Plano Nacional de
Alfabetização, espalhando, por todo o país, os programas de alfabetização orientados pela
proposta de Freire, os quais foram interrompidos pelo golpe militar.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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Conforme a autora, a partir dessas práticas, o analfabetismo deixou de ser visto como causa
da pobreza e da marginalização e “passou a ser interpretado como efeito da situação de
pobreza gerada por uma estrutura social não igualitária” (RIBEIRO, 1997, p. 23).
Segundo Ribeiro (1997), Freire desenvolveu um conjunto de procedimentos pedagógicos que
ficou conhecido como MÉTODO PAULO FREIRE, o qual previa uma fase de preparação, em
que o alfabetizador deveria realizar uma pesquisa sobre a realidade do grupo em que atuaria,
além de um levantamento de seu universo vocabular. Desse universo vocabular, o educador
selecionaria as palavras com maior densidade de sentido e que expressassem as situações
existenciais mais importantes.
Após essa etapa, caberia ao educador selecionar um conjunto com os diversos padrões
silábicos da língua, organizando-o conforme o grau de complexidade. A partir dessas palavras,
denominadas “palavras geradoras”, realizaria o estudo da leitura e da escrita. Antes, porém,
propiciaria uma discussão a respeito do conceito antropológico de cultura, a fim de levar o
educando a assumir-se como sujeito de sua aprendizagem.
No estudo das palavras geradoras, utilizavam-se cartazes com imagens referentes às situações
existenciais, gerando um debate em torno do tema em questão para, somente após, analisar
a palavra escrita. Esta, por sua vez, era estudada a partir de um quadro com as famílias
silábicas, com as quais os alfabetizandos montavam novas palavras.
Posteriormente, as palavras geradoras eram substituídas por temas geradores, “a partir dos
quais os alfabetizandos aprofundariam a análise de seus problemas, preferencialmente já se
engajando em atividades comunitárias ou associativas” (RIBEIRO, 1997, p. 25).
Assim, o Método Paulo Freire é composto por três etapas, denominadas: “Investigação”,
“Tematização” e “Problematização”, conforme sistematizamos a seguir.
1. Etapa de Investigação: busca conjunta, entre professor e aluno, das palavras e temas
mais significativos da vida do aluno, dentro de seu universo vocabular e da comunidade em
que ele vive.
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
2. Etapa de Tematização: momento da tomada de consciência do mundo, por meio da
análise dos significados sociais dos temas e palavras.
3. Etapa de Problematização: etapa em que o professor desafia e inspira o aluno a superar
a visão mágica e a crítica do mundo, para uma postura conscientizada.
Para a aplicação de seu método, Freire propõe cinco fases:
• 1ª fase: Levantamento do universo vocabular do grupo. Nessa fase, ocorrem as interações
de aproximação e conhecimento mútuo, bem como a anotação das palavras da linguagem
dos membros do grupo, respeitando seu linguajar típico.
• 2ª fase: Escolha das palavras selecionadas, seguindo os critérios de riqueza fonética,
dificuldades fonéticas - numa sequência gradativa das mais simples para as mais complexas, do comprometimento pragmático da palavra na realidade social, cultural, política do
grupo e/ou sua comunidade.
• 3ª fase: Criação de situações existenciais características do grupo. Trata-se de situações
inseridas na realidade local, que devem ser discutidas com o intuito de abrir perspectivas
para a análise crítica consciente de problemas locais, regionais e nacionais.
• 4ª fase: Criação das fichas-roteiro que norteiam os debates, as quais deverão servir como
subsídios, sem, no entanto, seguir uma prescrição rígida.
• 5ª fase: Criação de fichas de palavras para a decomposição das famílias fonéticas correspondentes às palavras geradoras.
Para exemplificarmos, tomemos a palavra TIJOLO, usada pelo educador como a primeira
palavra, em Brasília, nos anos 60, escolhida por ser uma cidade em construção.
1º) Apresenta-se a palavra geradora "tijolo", inserida na representação de uma situação
concreta: homens trabalhando numa construção.
2º) Simplesmente escreve-se a palavra:
TIJOLO
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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3º) Escreve-se a mesma palavra com as sílabas separadas:
TI - JO – LO
4º) Apresenta-se a "família fonêmica" da primeira sílaba:
TA - TE - TI - TO – TU
5º) Apresenta-se a "família fonêmica" da segunda sílaba:
JA - JE - JI - JO – JU
6º) Apresenta-se a "família fonêmica" da terceira sílaba:
LA - LE - LI - LO – LU
7º) Apresentam-se as "famílias fonêmicas" da palavra que está sendo decodificada:
TA - TE - TI - TO - TU
JA - JE - JI - JO - JU
LA - LE - LI - LO – LU
O conjunto das "famílias fonêmicas" da palavra geradora foi denominado de "ficha de
descoberta", pois ele propicia, ao alfabetizando, juntar os "pedaços", isto é, fazer dessas
sílabas novas combinações fonêmicas que necessariamente devem formar palavras da língua
portuguesa.
8º) Apresentam-se as vogais:
A-E-I-O-U
Assim, no momento em que o alfabetizando consegue formar palavras, articulando as
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
sílabas, está alfabetizado. Obviamente, o processo requer aprofundamento, ou seja, a pósalfabetização.
A eficácia e validade do "Método" consistem em partir da realidade do alfabetizando, do que
ele já conhece, do valor pragmático das coisas e fatos de sua vida cotidiana, de suas situações
existenciais. Respeitando o senso comum e dele partindo, Freire propõe a sua superação.
O Método obedece às normas metodológicas e linguísticas, mas vai além delas, porque desafia
o homem e a mulher que se alfabetizam a se apropriarem do código escrito e a se politizarem,
tendo uma visão de totalidade da linguagem e do mundo.
O Método nega a mera repetição alienada e alienante de frases, palavras e sílabas, ao
propor aos alfabetizandos "ler o mundo" e "ler a palavra", leituras, aliás, como enfatiza Freire,
indissociáveis, por isso, opõe-se à metodologia utilizada nas cartilhas.
Em suma, o trabalho de Paulo Freire é mais do que um método que alfabetiza, é uma ampla
e profunda compreensão da educação que tem como cerne de suas preocupações a sua
natureza política. Vale a pena você conhecer as obras desse importante educador.
Freire aplicou publicamente seu método, pela primeira vez, no Centro de Cultura Dona
Olegarinha, um Círculo de Cultura do Movimento de Cultura Popular (Recife). Foi aplicado,
inicialmente, com 5 alunos, dos quais três aprenderam a ler e escrever em 30 horas, outros 2
desistiram antes de concluir.
Com base na experiência de Angicos, onde em 45 dias alfabetizaram-se 300 trabalhadores,
João Goulart, presidente na época, chamou Paulo Freire para organizar uma Campanha
Nacional de Alfabetização. Essa campanha tinha como objetivo alfabetizar 2 milhões de
pessoas, em 20.000 círculos de cultura, e já contava com a participação da comunidade - só
no estado da Guanabara (Rio de Janeiro) se inscreveram 6.000 pessoas.
Porém, com o Golpe de 64, toda essa mobilização social foi reprimida, Paulo Freire foi
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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considerado subversivo, foi preso e depois exilado. Assim, infelizmente, esse grande projeto
foi abandonado. Em seu lugar, surgiu o MOBRAL, uma iniciativa para a alfabetização, porém,
visceralmente distinta dos ideais freirianos. O golpe militar de 1964 encerrou as atividades
da Comissão Nacional da Alfabetização encabeçada por Freire e do Programa Nacional de
Alfabetização de Adultos. Por um lado, o golpe militar tentou acabar com práticas pedagógicas
que vinham contrárias aos ideais políticos, mas por outro, a Educação de Jovens e Adultos não
poderia ser abandonada pelo aparelho do Estado. Não havia como justificar para a comunidade
nacional e internacional a criação de um país com altos índices de analfabetismo.
Em discurso ao Dia Nacional de Alfabetização, em 1966, o Ministro Muniz de Aragão,
explicitou a visão dos militares sobre a questão do analfabetismo, transcrito por Paiva,
2003, p.293: “uma chaga, mancha vergonhosa a desfigurar as faces da sociedade
brasileira, que se apresenta, no conceito dos povos, como constituída em grande parte
por cidadãos incultos e ignorantes, [...]; erradicar o analfabetismo era uma exigência do
pudor nacional. O analfabetismo era visto como entrave ao progresso já que uma pátria
grande não poderia ser edificada sobre um povo esmagados pelos fardos da ignorância
e da miséria” (CORREIA, 2008, p. 23).
Por isso, o regime militar criou o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL), em 1967,
que era um projeto para acabar com o analfabetismo em apenas 10 anos e dedicou um capítulo
especial na Lei 5692/71 sobre o ensino supletivo, expresso do artigo 24 ao artigo 28. Neles, são
explicitadas as duas grandes finalidades do ensino supletivo: a de suprir a escolaridade regular
aos jovens e adultos que não a concluíram na idade própria e a de proporcionar atualização
de conhecimentos mediante o constante retorno à escola. A criação do Movimento Brasileiro
de Alfabetização (MOBRAL) aconteceu conforme a lei 5.379 em 15 de Dezembro de 1967.
Com o golpe militar de 1964, os programas de alfabetização e educação popular que se
haviam multiplicado no período entre 1961 e 1964 foram vistos como uma grave ameaça
à ordem e seus promotores duramente reprimidos. O governo só permitiu a realização de
programas de alfabetização de adultos assistencialista e conservadores até que em 1967 ele
mesmo assumiu o controle dessa atividade lançando o MOBRAL (RIBEIRO, 1997, pp.25-26).
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Fonte: PHOTOS.COM
O MOBRAL
Com significativos recursos, o Mobral instalou
comissões municipais por todo o país que executavam
as atividades de alfabetização, enquanto controlavam
supervisão, orientação pedagógica e produção de
materiais didáticos. Organizado a partir do golpe
militar, ele tinha o intuito de chegar a quase todos
os municípios do país e deveria atestar às classes
populares o interesse do governo pela educação do
povo.
Neste momento, o Brasil contava com 33% de
brasileiros acima de cinco anos analfabetos e o
Mobral ampliou sua atuação durante a década de 1970. Entretanto, a crítica pelos níveis de
aprendizagem e a dúvida quanto aos indicadores apresentados ampliou seu descrédito, sendo
extinto em 1985.
O MOBRAL foi criticado pelo pouco tempo destinado a alfabetização e pelos critérios
empregados na verificação de aprendizagem. Mencionava-se que, para evitar a
regressão, seria necessária uma continuidade dos estudos em educação escolar
integrada, e não em programas voltados a outros tipos de interesses como, por exemplo,
formação rápida de recursos humanos (PIERRO, 2000, p.116).
As tarefas relacionadas à alfabetização passaram a compor a estrutura da recém-criada
Fundação Educar:
Sua função era de articular o subsistema de ensino e a política nacional de jovens e
adultos, fomentar o atendimento nas séries iniciais do Ensino de 1° grau, promover a
formação e aperfeiçoamento de professores, produzir material didático e supervisionar
e avaliar as atividades (CORREIA, 2008, p. 24).
Os programas de alfabetização e educação popular se multiplicaram, no Brasil, no período
compreendido entre 1961 e 1964, quando foram interrompidos pelo golpe militar, que os
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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considerava como ameaça à ordem. Somente em 1967, o governo autorizou a realização
desses programas, no entanto, sob o seu controle, lançando o MOBRAL (Movimento Brasileiro
de Alfabetização), que surgiu como um prosseguimento das campanhas de alfabetização de
adultos iniciadas com Lourenço Filho.
Para Ribeiro (1997), o MOBRAL seria a resposta do regime militar à situação, ainda grave, do
analfabetismo no Brasil. Em 1969, foi lançada uma campanha massiva de alfabetização, com
orientação, supervisão pedagógica e produção de materiais didáticos centralizados.
A expansão do MOBRAL pelo país se deu durante a década de 70, variando sua atuação.
Alguns grupos que se opunham à ditadura procuraram seguir as propostas mais críticas, com
base no Método Paulo Freire, os quais puderam se ampliar na década de 80, com o início da
abertura política.
O movimento, mantido pelo governo federal, propunha a alfabetização funcional de jovens
e adultos, visando instrumentalizar o cidadão e torná-lo capaz de exercer sua cidadania.
No entanto, o MOBRAL se limitou a alfabetizar de maneira funcional, não oferecendo uma
formação mais abrangente.
A metodologia utilizada pelo Programa de Alfabetização Funcional baseava-se no
aproveitamento das experiências significativas dos alunos, dessa forma, embora divergisse
ideologicamente do método que Paulo Freire utilizava-se, semelhantemente a este, de
palavras geradoras, porém, totalmente esvaziadas de sentimentos críticos. Além disso, havia
uma uniformização do material utilizado em todo o território nacional, não traduzindo, assim, a
linguagem e as necessidades do povo de cada região e de uma série de procedimentos para
o processo de alfabetização.
O MOBRAL não exigia frequência e a avaliação era feita em 2 módulos, uma ao final do
módulo e outra pelo sistema de educação. O fato de não exigir frequência, possibilitava o
elevado índice de evasão que se estabeleceu nesse nível.
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Quanto aos materiais didáticos, Ribeiro salienta o fato de que seguiram muitos procedimentos
consagrados nas experiências realizadas no início da década de 60, porém eram destituídos
de sentido crítico e problematizador. Assim, de acordo com Ribeiro (1997, p. 26),
Propunha-se a alfabetização a partir de palavras-chave, retiradas “da vida simples do
povo”, mas as mensagens a elas associadas apelavam sempre ao esforço individual dos
adultos analfabetos para sua integração nos benefícios de uma sociedade moderna,
pintada sempre de cor-de-rosa.
A recessão econômica iniciada nos anos 80 inviabilizou a continuidade do MOBRAL que
demandava altos recursos para se manter. Seus últimos anos foram marcados por denúncias
quanto às aplicações dos recursos financeiros e ao falso índice de analfabetismo emitido por
conta do programa.
Assim, em 1985, o MOBRAL foi extinto, por estar desacreditado nos meios políticos e
educacionais. Conforme Ribeiro (1997, p.27-28), “seu lugar foi ocupado pela Fundação
Educar, que abriu mão de executar diretamente os programas, passando a apoiar financeira
e tecnicamente as iniciativas de governos, entidades civis e empresas a elas conveniadas”.
Ampliando a concepção de alfabetização
As críticas aos programas de alfabetização de jovens e adultos se voltavam, principalmente,
com relação ao pouco tempo que se levava para alfabetizá-los e a não continuidade do
processo. Dessa forma, segundo Ribeiro (1997, p. 28) surgiram programas que previam,
Um tempo maior, de um, dois ou até três anos dedicados à alfabetização e pósalfabetização, de modo a garantir que o jovem ou adulto atinja maior domínio dos
instrumentos da cultura letrada, para que possa utilizá-los na vida diária ou mesmo
prosseguir seus estudos, completando sua escolarização.
Dessa maneira, a alfabetização foi incorporada, de forma crescente, a programas mais
extensivos de educação básica de jovens e adultos, o que se refletiu na produção dos materiais
didáticos.
Conforme a autora, para a alfabetização inicial, foram incluídos exercícios complementares
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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de montar ou completar palavras com sílabas dadas, palavras e frases para ler e associar
imagens e exercícios de coordenação motora, notando-se uma preocupação em oferecer
materiais de leitura. Para a etapa de pós-alfabetização, os materiais eram mais escassos
e acabavam por reproduzir os livros didáticos utilizados no ensino primário regular, com a
adaptação dos temas, que se voltavam para a vida adulta, referindo-se ao mundo do trabalho,
aos problemas urbanos, saúde etc.
Além disso, a ampliação da concepção de alfabetização também se deu a partir da preocupação
com relação a iniciação à matemática, uma vez que os educandos demonstravam seu desejo
de aprender a fazer contas. Logo, via-se a necessidade de incluir a aprendizagem dos jovens
e adultos numa concepção de alfabetização integral, que incorporasse a cultura da realidade
vivenciada por eles.
Quanto ao caráter crítico e problematizador na EJA, de acordo com Ribeiro (1997, p.
30), alguns educadores conseguiram promover situações de debates, que os levavam
a “reconhecer, comparar, julgar, recriar e propor”. Contudo, quando se tratava do trabalho
específico de leitura, escrita ou matemática, tornava-se difícil garantir a natureza construtiva
da aprendizagem. Os textos lidos contemplavam sempre o mesmo estilo e a mesma estrutura.
Assim, produziu-se uma “dissociação entre os momentos de ‘leitura do mundo’, quando os
educandos são chamados a analisar, comparar, elaborar, e os momentos de ‘leitura da palavra’
(ou dos números), quando os educando devem repetir, memorizar e reproduzir” (RIBEIRO,
1997, p. 30).
NOVOS RUMOS NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Na década de 80, à luz da Linguística e da Psicologia, surgiram muitas pesquisas sobre o
ensino e a aprendizagem da leitura e da escrita, consideradas práticas sociais, realizadas por
meio da linguagem, vista como formas de interação.
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Logo, segundo Ribeiro (1997), as propostas pedagógicas para a alfabetização começam
a incorporar a convicção de que não é necessário nem recomendável montar uma língua
artificial para ensinar a ler e escrever. Os adultos analfabetos podem escrever enunciados
significativos, com base em seus conhecimentos da língua, ainda que, no início, não produzam
uma escrita convencional. Com relação à leitura, também houve a preocupação em ampliar o
universo linguístico, utilizando-se uma diversidade maior de textos. Assim, a formação de um
bom leitor não dependia só da memorização das correspondências entre letras e sons, mas
também do conhecimento das funções, estruturas e dos estilos próprios dos diferentes textos
que circulam em nossa sociedade.
Quanto ao ensino de Matemática, Ribeiro (1997) aponta para o fato de se terem observado
que os jovens e os adultos eram capazes de resolver problemas envolvendo cálculos mais
complexos, sem, muitas vezes, saberem representá-los por escrito, ou sem saberem explicar
como chegaram ao resultado. Várias pesquisas foram realizadas para investigar a natureza
desses conhecimentos e o seu alcance.
Com relação ao ensino das Ciências Sociais e Naturais, a autora destaca o reconhecimento da
limitação das abordagens que visam apenas a aprendizagem de conhecimentos imediatamente
úteis para os jovens e adultos. Dessa maneira, caberia aos educadores orientá-los para uma
compreensão mais abrangente dos fenômenos, para a qual podem contribuir conceitos
científicos e informações das mais diversas fontes.
Na década de 90, com a extinção da Fundação Educar, criou-se um vazio em termos de
políticas para o setor. Assim, segundo Ribeiro (1997, p. 34), “A história da educação de jovens e
adultos no Brasil chega à década de 90, portanto, reclamando a consolidação de reformulações
pedagógicas que, aliás, vêm se mostrando necessárias em todo o ensino fundamental”.
Para a autora, a maioria das pessoas que procuram os programas para jovens e adultos já
tiveram passagens fracassadas pela escola. Muitos adolescentes e jovens foram recémexcluídos do sistema regular. Dessa forma,
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
35
Esta situação ressalta o grande desafio pedagógico, em termos de seriedade e
criatividade, que a educação de jovens e adultos impõe: como garantir a esse segmento
social que vem sendo marginalizado nas esferas socioeconômica e educacional um
acesso à cultura letrada que lhe possibilite uma participação mais ativa no mundo do
trabalho, da política e da cultura (RIBEIRO, 1997, p. 34).
Assim, percebemos que o MOBRAL foi extinto no ano de 1985 pelos políticos que não mais
acreditavam nele, no seu lugar ficou o ensino supletivo que foi regulamentado e os seus
fundamentos são bem desenvolvidos trazendo à tona a visão de um novo conhecimento na
escola. Após ser extinto no período da nova república, foi substituído pela Fundação Educar e
os educadores tinham que enfrentar com poucos recursos sua tarefa.
Se em muitos sentidos a Educar representou a continuidade do MOBRAL, devem-se computar
como mudanças significativas a sua subordinação à estrutura do MEC e a transformação em
órgão de fomento e apoio técnico em vez de execução direta.
No início da década de 1980, a sociedade brasileira viveu importantes transformações sociais
e políticas com o fim dos governos militares e a retomada do processo de democratização, é
só lembrarmos da Campanha nacional a favor das eleições diretas.
Neste novo contexto, houve a possibilidade de ampliação das atividades da EJA. Estudantes,
políticos e professores organizaram-se em prol de uma escola pública e para todos. A
constituição de 1988 trouxe importantes avanços para a EJA: o ensino fundamental obrigatório
e gratuito passou a ser direito constitucional também para aqueles que não tiveram acesso na
idade própria.
A história da Educação de Jovens e Adultos no período de redemocratização, entretanto, é
marcada pela contradição entre o plano jurídico do direito formal da população jovem e adulta
à educação básica de um lado, e por outro, de sua negação pelas políticas públicas concretas
no terreno social.
As práticas pedagógicas informadas pelo ideário da educação popular, que até então eram
36
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
desenvolvidas quase que clandestinamente por organizações civis ou pastorais da Igreja,
retomaram espaços nos ambientes universitários e passaram a influenciar programas públicos
e comunitários de alfabetização de jovens e adultos.
Além da garantia consagrada pela Constituição de 1988, a Carta Magna propunha um prazo de
dez anos onde os governos e a sociedade civil deveria concentrar esforços para a erradicação
do analfabetismo e a universalização do ensino fundamental, objetivos estes, aos quais
deveriam ser aplicados 50% dos recursos vinculados à educação dos três níveis do governo.
Esses mecanismos somados à descentralização das receitas tributárias em favor dos estados e
municípios e à vinculação constitucional de recursos para o desenvolvimento e manutenção do
ensino, constituiu a base para que nos anos posteriores pudesse vir a ocorrer uma significativa
expansão e melhoria do atendimento público da escolarização de jovens e adultos.
Contudo, a partir dos anos de 1990, a EJA começou a perder espaço nas ações governamentais.
Em março de 1990, com o início do governo Collor de Melo a fundação Educar foi extinta
e todos os seus funcionários colocados em disponibilidade. Em nome do enxugamento da
máquina administrativa, a União foi se afastando das atividades da EJA e transferindo as
responsabilidades para os estados e municípios.
Neste mesmo pacote de medidas foi retirado o mecanismo que facultava às pessoas jurídicas
direcionar voluntariamente 2% do valor do imposto de renda às atividades de alfabetização de
adultos, recursos esses, que nas duas décadas anteriores haviam financiado o MOBRAL e a
Educar.
A medida representou um marco na descentralização da escolarização básica de jovens e
adultos, pois embora não tenha sido negociada entre as esferas do governo, representou
a responsabilidade da transferência direta de responsabilidade pública dos programas de
alfabetização de jovens e adultos da União para os municípios.
Em 1996 é promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, lei n° 9394/96. A
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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seção dedicada à educação de jovens e adultos se apresentou curta e pouco inovadora:
A seção dedicada à educação básica de jovens e adultos resultou curta e pouco
inovadora: seus dois artigos reafirmam o direito dos jovens e adultos trabalhadores
ao ensino básico adequado às suas condições peculiares de estudo, e o dever do
poder público em oferecê-lo gratuitamente na forma de cursos e exames supletivos.
A única novidade dessa seção da Lei foi o rebaixamento das idades mínimas para
que os candidatos se submetam aos exames supletivos, fixadas em 15 anos para o
ensino fundamental e 18 anos para o ensino médio. A verdadeira ruptura introduzida
pela nova LDB com relação à legislação anterior reside na abolição da distinção entre
os subsistemas de ensino regular e supletivo, integrando organicamente a educação de
jovens e adultos ao ensino básico comum (HADDAD, 2000, p. 122).
Em 1999, por meio do Plano Nacional de Educação adere-se um paradigma da educação
continuada ao longo da vida como um direito da cidadania. A partir deste ponto de vista, os
desafios para a educação de jovens e adultos seriam três: erradicar o analfabetismo presente
em nossa sociedade, treinar o imenso contingente de jovens e adultos para o mercado de
trabalho e criar oportunidades de educação permanente.
A reforma educacional iniciada em 1995 tem como objetivo descentralizar os encargos
financeiros com a educação, racionalizando o gasto público em favor do ensino fundamental
obrigatório. Essas diretrizes implicaram que o MEC mantivesse a educação básica de jovens
e adultos na posição marginal que ocupava.
Após muitas discussões, criou-se em cada um dos estados o Fundo do Desenvolvimento
do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF), como um mecanismo onde
os recursos públicos destinados à educação foram redistribuídos as entes governamentais,
estaduais e municipais de acordo com o número de alunos matriculados no Ensino Fundamental.
Esse mecanismo induziu à municipalização do ensino Fundamental, ficando o Estado com a
responsabilidade maior do Ensino Médio e a União com o Ensino Superior.
A operacionalização do dispositivo constitucional que criou o FUNDEF exigiu
regulamentação adicional. Embora tenha sido aprovada por unanimidade do Congresso,
a Lei 9.424/96 recebeu vetos do presidente, um dos quais impediu que as matrículas
registradas no ensino fundamental presencial de jovens e adultos fossem computadas
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
para efeito dos cálculos dos fundos, medida que focalizou o investimento público no
ensino de crianças e adolescentes de 7 a 14 anos e desestimulou o setor público a
expandir o ensino fundamental de jovens e adultos (HADDAD, 2000, p. 123).
Com o estabelecimento da distribuição dos recursos financeiros destinados à educação,
ficam três segmentos da educação parcialmente descobertos, sendo eles: educação infantil, o
ensino médio e a educação básica de jovens e adultos. Assim, a educação de jovens e adultos
experimentou uma série de dificuldades como aquelas já constatadas no passado.
A atual LDBN abriga no seu título V, capítulo II, a seção V denominada de educação de jovens
e adultos. Logo, a EJA constitui-se numa modalidade da Educação básica, nas suas etapas
fundamental e média.
Em janeiro de 2003, o MEC anunciou que a alfabetização de Jovens e Adultos seria uma
prioridade do governo federal, para isso foi criada a Secretaria Especial de Erradicação do
analfabetismo, cuja meta seria a erradicação do analfabetismo durante o governo Lula.
Para alcançar essa meta foi lançado o programa Brasil Alfabetizado, por meio do qual o
Governo Federal contribuirá com os estados e municípios, instituições de ensino superior e
organizações sem fins lucrativos que desenvolvam projetos de alfabetização. Neste programa,
a assistência será direcionada ao desenvolvimento de projetos com as seguintes ações:
alfabetização de jovens e adultos e formação de alfabetizadores.
É necessário que o alfabetizador antes de iniciar as atividades de ensino, conheça o grupo com
o qual irá trabalhar. Esse conhecimento prévio deve servir de base para o encaminhamento
das atividades. A intenção é tornar o processo de alfabetização participativo e democrático. A
formação de educadores compreende a formação inicial e continuada. O programa está em
andamento, por isso não é possível ainda, afirmar se o objetivo pretendido foi alcançado e se
os resultados foram significativos.
Com o término do FUNDEF e o nascimento do FUNDEB (Fundo de Desenvolvimento da
Educação Básica), em 2006, amplia-se o raio de extensão na organização e distribuição dos
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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recursos destinados à educação. Segundo a lei:
Art. 60, § 4.º do ADCT: “§ 4º Para efeito de distribuição de recursos dos Fundos a
que se refere o inciso I do caput deste artigo, levar-se-á em conta a totalidade das
matrículas no ensino fundamental e considerar-se-á para a educação infantil, para o
ensino médio e para a educação de jovens e adultos 1/3 (um terço) das matrículas no
primeiro ano, 2/3 (dois terços) no segundo ano e sua totalidade a partir do terceiro ano”
(Emenda Constitucional n° 53/06).
A partir da leitura deste trecho da lei do FUNDEB percebemos um avanço na organização desta
modalidade de ensino, bem como uma preocupação com recursos financeiros específicos
para a educação de jovens e adultos na atualidade.
Apesar de muitas vezes não haver continuidade dos programas ou ideias para a erradicação
do analfabetismo em nosso país, ao longo dos tempos, a Educação de Jovens e Adultos está
sempre sendo buscada, com o objetivo de realmente permitir o acesso de todos à educação,
independente da idade. Fica claro o caminho que a EJA percorreu em nosso país até os dias
atuais. Muito já foi feito, mais ainda há caminhos a percorrer. Não se pode acomodar com os
avanços alcançados, é necessário vislumbrar novos horizontes na busca da total erradicação
do analfabetismo em nosso país, pois a educação é direito de todos.
Paulo Freire: Três de suas Obras e Alguns Pontos para Reflexão
Após o contexto histórico da Educação de Jovens e Adultos, no qual se insere o grande
educador Paulo Freire, conforme estudamos nesta unidade, não poderíamos deixar de falar
um pouco mais sobre suas ideias. Por isso, trazemos algumas reflexões sobre as obras
“Pedagogia do oprimido”, “Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa”
e sobre o capítulo “Desafios da educação de adultos ante a nova reestruturação tecnológica”,
da obra “Pedagogia da Indignação: cartas pedagógicas e outros escritos”.
Paulo Freire delineou uma Pedagogia da Libertação, intimamente relacionada com a visão
marxista do Terceiro Mundo e das consideradas classes oprimidas na tentativa de elucidá-las
e conscientizá-las politicamente. Uma proposta que consiste em uma educação voltada para
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
a conscientização da opressão e a consequente ação transformadora.
As obras são importantes e necessárias para a formação do professor, pois trazem noções
essenciais para compreendermos a Educação, como um todo, e, em especial, a Educação de
Jovens e Adultos.
Nosso intuito, aqui, é discutir sobre os principais aspectos abordados nos livros, contudo, não
dispensamos a leitura das obras em sua íntegra.
O livro apresenta o Método Paulo Freire, a mais importante proposta pedagógica
pensada a partir da realidade do Terceiro Mundo. Apesar dos mais de vinte anos
que o separam da primeira edição, o Método mantém atual a avaliação do papel da educação, o vigor de suas perspectivas e sua aplicabilidade. É, por isso
mesmo, obra de referência, imprescindível ao estudo da pedagogia.
Fonte: <http://popnews.wordpress.com/2007/03/06/pedagogia-paulo-freire>. Acesso em:
28 nov. 2010.
Essa obra é dividida em quatro capítulos “Justificativa da ‘pedagogia do oprimido’”; “A
concepção ‘bancária’ da educação como instrumento da opressão. Seus pressupostos, sua
crítica”; “A dialogicidade – essência da educação como prática da liberdade”; “A teoria da ação
antidialógica”; nos quais o autor relata sua experiência em cinco anos de exílio, mostrando o
papel da conscientização, numa educação libertadora.
Para Paulo Freire, a luta pelo direito do ser humano, pelo trabalho livre, pela afirmação dos
homens como pessoas só é possível porque a desumanização não é um destino dado, mas
resultado de uma ordem injusta que gera a violência dos opressores. Assim, Freire mostra a
opressão contida na sociedade e no universo educativo, em especial na EJA.
A opressão é apresentada por Freire (1987) como problema crônico social, uma vez que as
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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camadas menos favorecidas são oprimidas e terminam por aceitar o que lhe é imposto. Por
isso, a Pedagogia do Oprimido não é aquela que parte dos interesses individuais, egoísta, é
uma pedagogia problematizadora, que se apresenta como pedagogia humanista.
Uma das características dos oprimidos, segundo Freire (1987, p. 28), é a autodesvalia, que
resulta da introjeção que eles fazem da visão que os opressores têm deles. Assim, “de tanto
ouvirem de si mesmos que são incapazes, que não sabem nada, que não podem saber, que
são enfermos, indolentes, que não produzem em virtude de tudo isto, terminam por se convencer de sua ‘incapacidade’”.
Conforme o autor:
Somente quando os oprimidos descobrem, nitidamente, o opressor, e se engajam na
luta organizada por sua libertação, começam a crer em si mesmos, superando, assim,
sua “convivência” com o regime opressor. Se esta descoberta não pode ser feita em
nível puramente intelectual, mas da ação, o que nos parece fundamental é que esta não
se cinja a mero ativismo, mas esteja associada a sério empenho de reflexão, para que
seja práxis (FREIRE, 1987, p. 29).
Essa pedagogia humanizadora só é possível, para Freire (1987), a partir da união entre
teoria e prática, em que a liderança revolucionária, ao invés de sobrepor aos oprimidos e
continuar mantendo-os como quase "coisas", com eles estabelecem uma relação dialógica.
Ao alcançarem esse saber da realidade, na práxis, descobrem-se como seus refazedores
permanentes.
Assim, o autor discute sobre uma educação problematizadora em oposição a uma “educação
bancária”. Nesta, o educador é o dono do saber e o educando um mero ouvinte, que recebe os
“depósitos” dos conteúdos. Naquela, não se transferem, mas se compartilha experiências, pois
há interação entre ambos, na qual educador e educando aprendem e ensinam simultaneamente.
Deste modo, o educador problematizador re-faz, constantemen-te, seu ato cognoscente,
na cognoscitividade dos educandos. Estes, em lugar de serem recipientes dóceis de
depósitos, são agora investigadores críticos, em diálogo com o educador, investigador
crítico, também (FREIRE, 1987, p. 40).
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Logo, Freire postula sobre a dialogicidade como prática da liberdade, em que o diálogo não é
apenas uma relação entre duas pessoas, é o encontro dos homens, mediatizados pelo mundo.
Por isso, para o autor, não há diálogo sem amor ao mundo e aos homens.
Na educação problematizadora, esse diálogo não se inicia em uma situação pedagógica em
sala de aula, mas quando o educador se pergunta sobre o que irá dialogar com os educandos.
Dessa forma, o conteúdo programático deve levar em conta o contexto social em que os
educandos estão inseridos, pois, de acordo com Freire (1987, p. 48),
não podemos chegar aos operários, urbanos ou camponeses, estes, de modo geral,
imersos num contexto colonial, (...) à maneira da concepção “bancária”, entregar-lhes
“conhecimento” ou impor-lhes um modelo de bom homem, contido no programa cujo
conteúdo nós mesmos organizamos.
Dessa maneira, o conteúdo se organiza e se constitui a partir da visão de mundo dos educandos,
na qual se encontram seus temas geradores, por isso, ele sempre precisa de renovação, de
ampliação. Segundo Freire (1987), na etapa da alfabetização, a educação problematizadora
busca e investiga a “palavra geradora” e, na pós-alfabetização, o “tema gerador”.
Freire cita como exemplo um plano de educação de adultos, em uma área camponesa, na
qual há alto índice de analfabetismo. Nesse plano, estariam incluídas a alfabetização e a
pós-alfabetização, a partir da investigação das palavras e dos temas geradores. De posse do
resultado dessa investigação, caberia ao educador elaborar seu plano de educação, por meio
de metodologias diversas, que envolvam os educandos, transformando-os. Um dos recursos
didáticos citado pelo autor seria a leitura e discussão de artigos de revistas ou jornais sobre o
tema gerador, iniciando-se pela discussão do contexto de produção do gênero a ser lido (quem
é o autor, qual é a finalidade do texto, onde é veiculado etc.), propiciando um debate antes da
leitura propriamente dita, a qual poderia também ser iniciada por trechos dos textos.
O autor ainda discute sobre as teorias da ação cultural que se desenvolvem a partir das
matrizes antidialógica e dialógica. Para Freire, a primeira é opressora e busca a reificação
humana, já a segunda é revolucionário-libertadora e busca a transformação do mundo pela
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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união colaborativa dos sujeitos.
Na teoria da ação antidialógica, conforme o autor, há uma invasão cultural, desrespeitando
as potencialidades do ser a que condiciona, ou seja, os invasores impõem aos invadidos a
sua visão do mundo, inibindo sua criatividade. Já na teoria dialógica, não há invasores, as
lideranças montam, coletivamente, as pautas de necessidades e ações com as massas. O
saber mais apurado das lideranças se refaz no saber empírico o povo, pois “os sujeitos se
encontram para a transformação do mundo em co-laboração” (FREIRE, 1987, p. 97).
Assim, dentro da perspectiva dialética, Freire (1987) procura estabelecer um vínculo teóricocientífico com o sentimento de esperança e mostrar que:
Assim como o opressor, para oprimir, precisa de uma teoria da ação opressora, os
oprimidos, para se libertarem, igualmente necessitam de urna teoria de sua ação.
O opressor elabora a teoria de sua ação necessariamente sem o povo, pois que é
contra ele.
O povo, por sua vez, enquanto esmagado e oprimido, intro-jetando o opressor, não
pode, sozinho, constituir a teoria de sua ação libertadora. Somente no encontro dele
com a liderança revolucionária, na comunhão de ambos, na práxis de ambos, é que
esta teoria se faz e se re-faz (FREIRE, 1987, p. 107).
Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa
Sinopse
Somos muitos professores neste país. Preocupados com salários, com
capacitação, com condições de trabalho, com a tarefa de ensinar. Na busca permanente de aprendizado, poucas vezes encontramos textos apropriados como este. Nele Paulo Freire nos ensina a ensinar partindo do ser
professor. Numa linguagem acessível e didática ele reflete sobre saberes
necessários à prática educativo-crítica fundamentados numa ética pedagógica e uma visão de mundo alicerçadas em rigorosidade, pesquisa,
criticidade, risco, humildade, bom senso, tolerância, alegria, curiosidade,
esperança, competência, generosidade, disponibilidade… molhadas pela
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
esperança. Aqui as leitoras e os leitores encontrarão a necessária Pedagogia da Autonomia. Autonomia que faz da própria natureza educativa. Sem ela não há ensino, nem aprendizagem.
Fonte: <http://www.paulofreire.org>. Acesso em: 10 dez. 2010.
O tema central dessa obra de Paulo Freire é a formação de professores, inserida numa reflexão
sobre a prática educativo-progressista em favor da autonomia dos alunos. O livro é dividido
em três capítulos: “Não há docência sem discência”, “Ensinar não é transferir conhecimento”
e “Ensinar é uma especificidade humana”, a partir dos quais o autor tece reflexões sobre as
exigências do ensinar.
Freire enfatiza a necessidade de se respeitar o conhecimento que o aluno traz para a escola, já
que ele é um sujeito social e histórico, e de se compreender que “formar” é muito mais do que
apenas “treinar”. Dessa forma, ele define essa postura como ética, denominando-a de “ética
universal do ser humano”, a qual defende ser essencial para o trabalho do professor.
Para Freire (1996), educar é construir, é libertar o ser humano das cadeias do determinismo
neoliberal, reconhecendo que a história é um tempo de possibilidades. Assim, ensinar é algo
profundo e dinâmico, que considera a questão de identidade cultural, a qual atinge a dimensão
individual e a classe dos educandos.
Ao relacionarmos essa visão do autor à Educação de Jovens e Adultos, percebemos como é
importante reconhecer a história e a identidade cultural daqueles que já têm certa caminhada
de vida.
Logo, a autonomia, dignidade e identidade do educando tem de ser respeitada, caso contrário,
o ensino se tornará "inautêntico, palavreado vazio e inoperante" (FREIRE, 1996, p.36). Por
isso, é preciso levar em consideração os conhecimentos adquiridos das experiências vividas
antes dos alunos chegarem à escola, sejam eles crianças, jovens ou adultos.
Dessa forma, Freire (1996, p. 12) afirma que:
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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Ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos nem formar é ação pela qual um
sujeito criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. Não há
docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças
que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro. Quem ensina
aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender.
Assim, ensinar não é transmitir algum conhecimento, pré-determinado, mas propiciar aos
alunos a curiosidade, o senso crítico. Por essa razão, o autor afirma que “não há docência sem
discência” (FREIRE, 1996, p. 12), ou seja, o ensino não depende exclusivamente do professor,
da mesma forma, a aprendizagem não é algo apenas do aluno. Portanto, não podemos
considerar o professor como superior ou como melhor que o educando, porque aquele domina
conhecimentos e este ainda não os domina, mas como participante do mesmo processo de
construção da aprendizagem.
A atuação como participante desse processo envolve outro aspecto importante abordado pelo
autor: ensinar exige respeito à autonomia do ser do educando, à dignidade de cada um, isto é,
exige ser ético. Conforme Freire (1996, p. 35),
O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto estético, a sua
inquietude, a sua linguagem, mais precisamente, a sua sintaxe e a sua prosódia; o
professor que ironiza o aluno, que minimiza, que manda que "ele se ponha em seu
lugar" ao mais tênue sinal de sua rebeldia legitima, tanto quanto o professor que se
exige do cumprimento de seu dever de ensinar, de estar respeitosamente presente à
experiência formadora do educando, transgride os princípios fundamentalmente éticos
de nossa existência.
Segundo Freire, ensinar também exige a convicção de que é possível realizar uma mudança,
a partir da ação político-pedagógica do professor, pois, conforme o autor “Ninguém pode
estar no mundo, com o mundo e com os outros de forma neutra. (...) A acomodação em mim
é apenas caminho para a inserção, que implica decisão, escolha, intervenção na realidade”
(FREIRE, 1996, p. 46).
É importante, também, que professores e alunos sejam curiosos, instigadores. Sem a
curiosidade, conforme o autor, ninguém aprende, ninguém ensina. Porém, não se trata de
uma curiosidade domesticada, que memoriza, de forma mecânica, o perfil de dado objeto,
46
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
mas de uma curiosidade que leve à construção do conhecimento do objeto de forma crítica,
observando-o, delimitando-o, comparando-o etc. Dessa forma, estimular a pergunta, a reflexão
crítica sobre a própria pergunta, ao invés da passividade, indica defender a curiosidade, a
criatividade e criticidade do aluno, adotando, assim, uma postura dialógica, aberta, indagadora.
Para tanto, o professor precisa estar disposto a ouvir, a dialogar, a fazer de suas aulas
momentos de liberdade para falar, debater, possibilitando a voz e a vez dos alunos. Para
isso, é preciso que ele goste de seu trabalho, de seu educando, já que, segundo o autor,
ensinar também é uma especificidade humana. Entretanto, não se trata de um gostar ingênuo,
que permite atitudes erradas e não impõe limites, ou que sente pena da situação de menos
experiente do aluno, ou ainda que deixe tudo como está que o tempo resolve, mas um querer
bem pelo ser humano em desenvolvimento que está ao seu lado, a ponto de dedicar-se, de
doar-se e de trocar experiências, um gostar de aprender e de incentivar a aprendizagem, um
sentir prazer em ver o aluno descobrindo o conhecimento.
Conforme o autor, ensinar exige, ainda, compreender que a educação é uma forma de
intervenção no mundo. Essa intervenção vai além do conhecimento dos conteúdos, pois
implica tanto o esforço de reprodução da ideologia dominante, como o seu desmascaramento.
Assim, a prática do professor não é neutra e, por isso, exige dele uma definição, uma tomada
de posição, uma escolha entre uma ou outra ideologia, pois, para Freire (1996, p. 63), “Não
posso ser professor a favor de quem quer que seja”.
Essas são algumas das considerações sobre a prática docente que o autor cita em sua obra.
Assim, após essa reflexão, apontamos algumas relações que nunca podem ser desenlaçadas,
para que a pedagogia da autonomia seja aplicável:
a) Ensino dos conteúdos x formação ética dos educandos.
b) Prática x teoria.
c) Autoridade x liberdade.
d) Respeito ao professor x respeito ao aluno.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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e) Ensinar x aprender.
Os aspectos políticos também devem ser sempre levados em conta. Classes dominantes
enxergam a educação como imobilizadora e ocultadora de verdades e não como uma forma
de se intervir no mundo. Porém, o educador precisa estar consciente de que a educação é
ideológica, assim, dependendo da ideologia, ele pode acabar aceitando ideias perigosas.
A afetividade é outro fator imprescindível para se exercer a docência com qualidade. Logo, a
generosidade, o comprometimento, o saber escutar, o querer bem etc. são fatores que auxiliam
no processo de ensino e aprendizagem.
Portanto, vários são os fatores e diversas são as práticas pedagógicas que contribuem para a
construção da autonomia do educando, porém, precisamos entender que ela não se faz de um
dia para o outro, mas leva tempo para se construir.
Considerações Sobre o Livro Pedagogia da Indignação, Capítulo “Desafios da Educação
de Adultos Ante a Nova Reestruturação Tecnológica”
Pedagogia da Indignação
Sinopse
As cartas pedagógicas de Paulo Freire recolocam a educação no espaço do coloquial e afetivo. Toda a sua obra se encurva, e reencontra o essencial da educação
– o diálogo que compartilha e provoca. Ética, liberdade, transformação, violência… velhos e novos temas se entrelaçam e realçam a antiga verdade freireana
– não se educa sem a capacidade de se indignar diante das injustiças.
Fonte: <http://www.editoraunesp.com.br/titulo_view.asp?IDT=447>. Acesso em: 13 dez.
2010.
“Pedagogia da Indignação: cartas pedagógicas e outros escritos” foi o último livro escrito
pelo educador Paulo Freire, ficando inacabado em razão de sua morte em 1997. Nas cartas
pedagógicas e outros escritos, o intelectual defende as condições para a realização da utopia
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
que é a democratização da sociedade brasileira.
Ana Maria Araújo Freire, viúva de Paulo Freire, educadora, historiadora, ex-professora da PUC
e da Cátedra Paulo Freire e organizadora dessa obra, deixa-nos a seguinte mensagem na
apresentação do livro:
Entregar aos leitores e leitoras de Paulo Freire o livro que ele escrevia quando nos
deixou, em 2 de maio de 1997, é um momento de grandes emoções. Certamente não só
para mim, mas também para aqueles e aquelas que acreditavam que entre dezembro
de 1996, quando publicou a Pedagogia da autonomia, e maio de 1997, Paulo não teria
ficado sem pôr no papel as suas sempre criativas idéias. Não teria, por quase um
semestre, deixado de expressar por escrito a sua preocupação de educador-político.
Não se enganaram os que assim pensaram e esperaram. Agora, se não passadas
todas as angústias, dúvidas, expectativas e tristezas por ele não estar mais entre nós,
podemos comemorar com alegria a sua volta às editoras e livrarias, inicialmente, com o
seu último trabalho (FREIRE, 2000, p. 8).
Na primeira parte do livro, estão presentes as três “Cartas pedagógicas”, resultantes de 29
páginas manuscritas por Freire entre janeiro e abril de 1997, com um discurso espontâneo
e informal. Os universos de sujeitos referidos por Freire no decorrer das cartas são: Galdino
Jesus dos Santos - o índio pataxó queimado por adolescentes em Brasília (1997), homens
e mulheres, as crianças, os sem-terra, sem-teto, sem-escola, desempregados, injustiçados,
sem-hospital, os renegados brasileiros.
Tecemos, aqui, alguns comentários a respeito do capítulo “Desafios da educação de adultos
ante a nova reestruturação tecnológica”, para podermos refletir a respeito da visão freiriana
sobre a EJA.
Freire (2000) inicia a discussão afirmando seu entendimento sobre a alfabetização, como um
ato criador a que os alfabetizandos devem atuar como sujeitos. Assim, critica a alfabetização
apresentada nas cartilhas, por meio da memorização mecânica de letras e sílabas, a partir de
frases descontextualizadas como “Eva viu a uva” e acredita que:
Ler e escrever a palavra só nos fazem deixar de ser sombra dos outros quando,
em relação dialética com a “leitura do mundo”, tem que ver com o que chamo a “reescrita” do mundo, quer dizer, com sua transformação. Daí a natureza política, não
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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necessariamente partidária, da educação em geral, da de adultos e da alfabetização
em particular (FREIRE, 2000, p. 40).
O educador afirma que nunca dissociou a prática educação de adultos e a alfabetização das
opções políticas, uma vez que, sendo a educação uma teoria do conhecimento posta em
prática, é, naturalmente, política. Assim, sua compreensão das relações entre subjetividade
e objetividade, consciência e mundo, prática e teoria foi sempre dialética e não mecânica e,
por isso, ressalta a importância da educação no processo de transformação, de denúncia da
realidade.
Freire (2001, p. 41-42) aponta alguns problemas que desafiam aqueles que pensam e discutem
a prática educativa:
Se, de um lado, a educação não é a alavanca das transformações sociais, de outro,
estas não se fazem sem ela. Se de meu projeto de ação política, por exemplo, excluo
a ação educativa porque só depois da transformação é que posso me preocupar com
educação, inviabilizo o projeto. Se, por outro lado, enfatizo apenas a educação com
programas de natureza técnica e/ou espiritual e moral não mobilizo e organizo forças
políticas indispensáveis à mudança, o projeto se perde em bla-bla-blá ou vira puro
assistencialismo. Vale dizer: não importa se o projeto é de alfabetização de adultos, se
de educação sanitária, se de cooperativismo, se de evangelização, a prática educativa
será tão mais eficaz quanto, possibilitando aos educandos o acesso a conhecimentos
fundamentais ao campo em que se formam os desafie a construir uma compreensão
crítica de sua presença no mundo.
Nessa perspectiva, Freire adota como ponto de partida não só para a educação de adultos, mas
para a educação geral, a constatação de que “mudar é difícil, mas é possível” (FREIRE, 2000,
p. 42). Dessa forma, ele postula que a educação de hoje não é aquela que treina os educandos
para certas destrezas, mas a que melhor os adapte ao mundo, à sociedade moderna.
Por isso, desde a década de 60, em seu projeto de alfabetização de adultos, Freire debatia
sobre o conceito de cultura, a partir de uma compreensão mais crítica do mundo da natureza
e do mundo da cultura. Para o autor, intervindo no mundo da natureza, criamos o mundo da
cultura. Logo, ele afirma que é tão cultura o instrumento com que os camponeses cavam o
chão quanto um poema, ou uma obra de arte e relata:
50
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Tenho na memória, ainda hoje, retalhos de críticos discursos de alfabetizandos
expressando sua satisfação ao descobrirem nos debates em torno do conceito de
cultura, que também "eram cultos, que faziam isso" e apontavam para o jarro de barro
projetado na tela. Mais do que retalhos desses discursos, como o do gari de Brasília,
quase fora dele mesmo, empolgado com a descoberta que fazia, "amanhã vou entrar
no meu trabalho de cabeça para cima", mais do que esses retalhos de discursos
confortantes eu revivo hoje a emoção com que "morrendo" de alegria, de uma alegria
tão menina quanto a dos alfabetizandos, constatava a reação que esperava e com que
sonhara. Reação dos alfabetizandos e alfabetizandas ao longo do território nacional
que anunciava uma forma diferente de compreender a História e o papel de mulheres e
de homens no mundo (FREIRE, 2001, p. 44).
Assim, Freire acredita que a educação de adultos precisa estar voltada para um trabalho
conscientizador, democrático, que valorize a cultura, que ensine o aprendiz a pensar, a ser
crítico, indagador e que esteja pronto para as surpresas trazidas pelo impacto da modernização
tecnológica. Ele critica a educação do treino, a educação bancária, em que o educador realizava
“depósitos” nas cabeças “vazias” dos educandos e aposta numa educação libertadora, em que
o erro não é condenado, pois faz parte do processo de ensino e aprendizagem.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Caros alunos, chegamos ao final da primeira unidade, espero que a partir das leituras realizadas
você tenha compreendido o desenrolar da história da educação de jovens e adultos.
Percebe-se que na EJA existem alguns termos que são próprios dessa modalidade, dessa
forma procuramos trazer as contribuições de Paulo Freire, um grande educador que foi e ainda
é, mesmo depois da sua morte uma referencia para quem quer compreender os entraves,
desafios e necessidades de jovens e adultos que não tiveram oportunidade de estudar no
tempo devido.
No decorrer da unidade, deixamos para você indicações de sites e livros que o ajudarão na sua
prática como educador. A seguir, você encontrará atividades de autoestudo sobre o conteúdo
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
51
abarcado até aqui.
ATIVIDADE DE AUTOESTUDO
1) Faça uma linha do tempo compondo a história da Educação de Jovens e Adultos.
Organize-a em duas colunas, inserindo, na primeira, as principais datas e, na segunda, os
principais acontecimentos.
2) Comente sobre a importância de Paulo Freire na Educação de Jovens e Adultos.
3) Escolha 1 das obras de Paulo Freire citadas nesta unidade e realize uma leitura na íntegra
da obra. Depois elabore um fichamento da leitura com as ideias principais do autor.
4) Pesquise, em sua cidade, quais são os programas de Educação de Jovens e Adultos. Procure saber onde e como funciona.
Quem ensina, ensina alguma coisa a alguém. Por isso é que, do ponto de vista gramatical, o verbo
ensinar é um verbo transitivo-relativo. Verbo que pede um objeto direto - alguma coisa - e um objeto
indireto - a alguém. Do ponto de vista democrático em que me situo, mas também do ponto de vista
da radicalidade metafísica em que me coloco e de que decorre minha compreensão do homem e da
mulher como seres históricos e inacabados e sobre que se funda a minha inteligência do processo de
conhecer, ensinar é algo mais que um verbo transitivo-relativo.
(FREIRE, 1996, p.12).
52
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Ensinar inexiste sem aprender e vice-versa e foi aprendendo socialmente que, historicamente, mulheres e homens descobriram que era possível ensinar. Foi assim, socialmente aprendendo, que ao longo
dos tempos mulheres e homens perceberam que era possível - depois, preciso - trabalhar maneiras,
caminhos, métodos de ensinar. Aprender precedeu ensinar ou, em outras palavras, ensinar se diluía
na experiência realmente fundante de aprender. Não temo dizer que inexiste validade do ensino de
que não resulta um aprendizado em que o aprendiz não se tornou capaz de recriar ou de refazer o
ensinado, em que o ensinado que não foi apreendido não pode realmente aprendido pelo aprendiz.
(FREIRE, 1996, pp.12-13).
Educação de Jovens e Adultos no Brasil: uma análise histórico – crítica. Disponível em: <http://
revistas.facecla.com.br/index.php/reped/article/viewFile/287/193>. Acesso em: 03 dez. 2010.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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UNIDADE II
FUNÇÕES DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E
O PAPEL DO EDUCADOR NESTA MODALIDADE DE
ENSINO
Professora Me. Márcia Cristina Greco Ohuschi
Professora Me. Dalva Linda Vicentini
Objetivos de Aprendizagem
• Analisar as funções da Educação de Jovens e Adultos, bem como considerá-las na
organização do trabalho pedagógico nesta modalidade de ensino.
• Compreender o papel do professor como fundamental no desenvolvimento de uma
Educação de Jovens e Adultos de qualidade.
• Reconhecer a importância do desenvolvimento de habilidades específicas para o
trabalho pedagógico nesta Modalidade de Ensino.
• Fundamentar-se teórico – metodologicamente para adquirir clareza no exercício da
docência na EJA.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nessa unidade:
• Funções da Educação de Jovens e Adultos
• O papel do educador frente à Educação de Jovens e Adultos
INTRODUÇÃO
Chegamos a nossa segunda unidade e aqui faremos juntos uma discussão sobre a necessidade
de promover a inclusão social e a inserção no mercado de trabalho de jovens e adultos que
não tiveram acesso à educação na idade própria, bem como proporcionar condições para que
essa parte da população construa sua cidadania e possa ter acesso à qualificação profissional,
aumentar as taxas de escolarização.
Para atingirmos este objetivo faz-se necessário uma conscientização sobre as funções desta
modalidade de ensino. A inclusão da EJA no projeto educativo da escola é de vital importância
para o cumprimento das funções de reparar, equalizar e qualificar. Determinar claramente a
identidade de um curso da EJA pressupõe um olhar diferenciado para seu público, acolhendo
de fato seus conhecimentos, interesses e necessidades de aprendizagem. Para tanto, se deve
ter uma proposta flexível e adaptável às diferentes realidades, contemplando temas como
cultura e sua diversidade, relações sociais, necessidades dos alunos e da comunidade, no
meio ambiente, cidadania, trabalho e exercício da autonomia.
A partir destas reflexões analisaremos o papel do professor na verdadeira efetivação deste
planejamento de trabalho. O professor, no desempenho de seu papel de formador de
consciência crítica, deve ter clareza de que é preciso chamar a atenção também para a
questão da crítica. Nesse caso, o professor atua como mediador entre o conhecimento e o
aluno. Nessa experiência são proporcionadas expectativas e desejos no aluno, portanto deve
ser realizada de maneira a valorizar o prazer de conhecer, principalmente em classes da Eja.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
57
Fonte: PHOTOS.COM
FUNÇÕES DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E
ADULTOS
Recentemente foi criado um documento que estabelece
as Diretrizes Curriculares para a Educação de Jovens e
Adultos, trata-se do documento CNB/CEB 11/2000. Este
parecer atribui à EJA a função de restaurar o direito de
todos à educação escolar de qualidade, além disso, o
governo torna-se responsável em assegurar as condições
necessárias para que o acesso a este direito seja garantido.
O perfil deste adulto que busca do acesso a esta modalidade
não é o universitário ou o trabalhador qualificado que
frequenta cursos de formação continuada, mas geralmente é o adulto proveniente de áreas
empobrecidas, filhos de trabalhadores não qualificados e com baixo nível de instrução escolar.
Assim também acontece com o adolescente, que normalmente é um excluído da escola e que
normalmente é incorporado a um curso supletivo:
Isso não significa que a educação básica de jovens e adultos deva reproduzir as formas
de organização, currículos, métodos, e materiais da educação básica infanto-juvenil.
Muito ao contrario, a experiência internacional recomenda flexibilizar currículos, meios
e formas de atendimento, integrando as dimensões de educação geral e profissional,
reconhecendo processos de aprendizagem informais e formais, combinando meios
de ensino presenciais e a distancia de modo a que os indivíduos possam obter
novas aprendizagens e a certificação correspondente mediante diferentes trajetórias
formativas (PIERRO, 2001, p.71).
Para pensar sobre a educação de jovens e adultos é necessário refletir sobre como esses
jovens e adultos pensam e aprendem. Isso implica reflexão sobre três aspectos: a condição
de não criança, a condição de excluído da escola e a condição de determinados membros
culturais.
Quanto ao primeiro aspecto esbarramos em uma limitação da psicologia, pois as teorias do
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
desenvolvimento referem-se historicamente, predominantemente à criança e ao adolescente,
não tendo sido estabelecido, na verdade, uma boa psicologia do adulto. Neste sentido, o
processo de conhecimentos dos adultos é muito menos explorado pela literatura.
Mas embora nos falte essa exploração, podemos afirmar algumas características específicas
desta faixa etária: a primeira delas seria que o adulto está inserido no mundo do trabalho e das
relações interpessoais de um modo diferente do da criança e do adolescente. Traz consigo
uma história mais longa de conhecimentos, experiências acumuladas e reflexões sobre o
mundo externo, sobre si mesmo e as outras pessoas.
A questão é discutir sobre a adequação da escola para um grupo que não é o alvo principal.
Currículos, programas e métodos de ensino foram originalmente concebidos para crianças e
adolescentes que percorreriam o caminho da escolaridade regular. Isso implica um pensamento
em que jovens e adultos muitas vezes estão em condições inadequadas, ou seja, vivenciam
situações que não correspondem ao desenvolvimento de processos de real aprendizagem.
Uma segunda característica a se pensar é que a escola funciona com regras específicas
e uma linguagem particular que deve ser conhecida por aqueles que estão envolvidos na
mesma. Assim, os adultos têm vergonha de frequentar a escola depois de adultos e muitas
vezes pensam que serão os únicos adultos em classes de crianças. Sentem-se humilhados e
inseguros quanto a sua própria capacidade de aprender.
Uma terceira característica a ser analisada é a especificidade cultural deste grupo, uma vez
que compreendamos que estes jovens e adultos não são representantes da classe social
dominante. Aqui o problema colocado é o da homogeneidade e o da heterogeneidade. Diante
disto, os jovens e adultos enquanto sujeitos de conhecimento e aprendizagem operam por uma
pertinência cultural específica.
É preciso que a sociedade compreenda que os alunos da EJA vivenciam problemas
como preconceito, vergonha, discriminação, críticas dentre tantos outros. E que tais
questões são vivenciadas tanto no ambiente familiar como na comunidade. Mister se
faz evidenciar que a EJA é uma educação possível e capaz de mudar significativamente
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
59
a vida de uma pessoa, permitindo-lhe reescrever sua história de vida (LOPES, 2009,
p. 2).
Embora abrigue 36 milhões de crianças no ensino fundamental, o quadro socioeducacional
seletivo continua a reproduzir excluídos dos ensinos fundamental e médio, mantendo
adolescentes, jovens e adultos sem escolaridade obrigatória completa.
Apesar deste quadro dramático, nos últimos anos, os sistemas de ensino têm desenvolvido
esforços para propiciar a jovens e adultos um atendimento mais aberto no que se refere ao
acesso à escolaridade obrigatória.
Segundo dados do IBGE entramos no terceiro milênio exibindo um grande número de jovens
e adultos analfabetos. Neste sentido, Educação de Jovens e Adultos representa uma dívida
social não reparada para os que não tiveram acesso a escolarização na idade apropriada e
tenham sido força de trabalho na constituição de riquezas e obras públicas. Sem contar que
esta perda é algo significativo para a convivência na sociedade contemporânea.
Seguindo esta linha de raciocínio, coloca-se como primordial uma reflexão acerca do que o
parecer 11/2000 sobre a educação de jovens e adultos traz acerca das funções da EJA: a
função reparadora, equalizadora e qualificadora.
A partir do documento, a função reparadora da EJA significa não só a entrada no circuito dos
direitos civis pela restauração de um direito negado, mas o direito de uma escola de qualidade
aliado ao direito do reconhecimento de igualdade a qualquer ser humano.
Assim, esse documento que institui as Diretrizes curriculares para a Educação de Jovens e
Adultos e lhe atribui as funções já citadas, vem esclarecer que a função reparadora diz respeito
a reparação da dívida social resultante da história excludente de nosso país.
Esses documentos legais, ao adotarem a idéia da inclusão educacional, fazem a defesa
do atendimento de alunos que não tiveram, na idade própria, acesso ou continuidade de
estudo. Mais do que um direito, a EJA é considerada a chave para o século XXI, por ser
resultante do exercício da cidadania e condição para a participação plena na sociedade,
60
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
incluindo aí a qualificação e a requalificação profissional (CHILANTE, 2009, p. 226).
O argumento apontado é que essa modalidade de ensino pode ajudar na eliminação das
discriminações e na busca de uma sociedade mais justa e menos desigual. Assim, a EJA
assume a tarefa de estender a todos o acesso e o domínio da leitura e escrita como bens
sociais tanto no contexto escolar, como fora deste.
De acordo com o parecer, essa função é justificada pelo alto número de analfabetos ainda
presentes em nossa sociedade. O parecer reconhece os avanços nas políticas públicas em
garantir a universalização da educação, mas ao mesmo tempo considera que condições
histórico-sociais comprometem o empenho dos poderes públicos em assegurar uma educação
básica para todos.
Em decorrência dos condicionantes do insucesso escolar de muitas crianças, tem-se
que: 1) a média nacional de permanência na escola, no Brasil, fica entre quatro e seis
anos, quando deveria ser de oito; 2) o tempo médio de conclusão do ensino fundamental
se converte em onze anos, quando os alunos já deveriam estar cursando o ensino
médio. Após diagnosticar essa distorção idade/série, o Parecer enfatiza a problemática
da repetência, da reprovação e da evasão, e conclui que “o quadro sócio- educacional
seletivo continua a reproduzir excluídos dos ensinos fundamental e médio, mantendo
adolescentes, jovens e adultos sem escolaridade obrigatória completa” (CHILANTE,
2009, p. 229).
Neste sentido, o parecer indica algumas ações que podem propiciar um atendimento mais
aberto a adolescentes e jovens como: classes de aceleração, programas de renda negativa
como a bolsa-família. Sabemos, no entanto, que mesmo considerando os esforços de correção
idade/série e permanência das crianças na escola, as estatísticas educacionais brasileiras
mostram um número significativo de analfabetos. Para esses, o documento apresenta a EJA
como forma de acabar com o analfabetismo, considerado uma dívida social.
Considerando a participação do analfabeto na sociedade altamente letrada, este não estaria
em condições iguais no interior de uma sociedade grafocêntrica, onde a escrita é predominante.
Essa é uma problemática a ser enfrentada.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
61
Assim compete à EJA fazer a reparação desta realidade, recuperando o princípio da igualdade
para todos. A ideia é que essa modalidade resolveria um problema arcaico, seria uma medida
corretiva destes erros históricos.
Sabe-se que em todas as sociedades a alfabetização é condição primordial e indispensável,
inclusive, para o desenvolvimento de outras habilidades. O desafio apresentado a essa
modalidade é conceder esse direito. A ausência de leitura e escrita pode levar a novas formas
de divisão social, processo que se acentua cada vez mais na contemporaneidade com a linha
divisória de alfabetizados e analfabetos.
Neste sentido, entendendo que o espaço escolar pode constituir-se numa possibilidade de
alteração da posição social do indivíduo; desta forma, a aquisição da leitura e escrita tende a
assinalar o surgimento de uma sociedade mais humana e fraterna.
Seguindo essa linha de raciocínio, nota-se que a ideia central da função reparadora da EJA
é a inclusão. Por meio dela, busca-se a inclusão de alunos no sistema educacional daqueles
que estão fora da escola, a ideia é que pela inclusão escolar, estaríamos paulatinamente
diminuindo as diferenças sociais. Não podemos, no entanto, fazermos uma leitura ingênua
dessas diferenças, pois
Enquanto não houver a superação do modo de produção fundamentado na divisão
social em classes com interesses antagônicos, na qual a produção é cada vez mais
socializada, mas a apropriação da riqueza social é privada, não há como superar a
desigualdade social fundamental e reparar a dívida social, apontada no Parecer, a
não ser parcialmente, exatamente porque são de ordem histórico-social. Quanto mais
se produz a riqueza em um pólo, mais a contrapartida é a miséria no outro, quadro
agravado com a magnitude dos processos de concentração e centralização do capital
na fase do capitalismo mundializado (CHILANTE, 2009, p.232).
A partir dessas questões, a ideia da chamada inclusão social via escola baseia-se em um
reduciocismo, uma vez que a escolarização na atual fase do desenvolvimento capitalista é
utilizada para justificar a seletividade no mercado de trabalho, já que não há lugar para todos.
Diante disto, o parecer 11/2000 que aponta a função reparadora da EJA como dívida para
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
com aqueles que não tiveram oportunidade no tempo apropriado de concluir seus estudos,
colabora com a ideia de que, por meio da escola, a inserção profissional e a melhoria das
condições de vida do indivíduo, que vê nas suas características pessoais a responsabilidade
pelo fracasso escolar e profissional.
Já a função equalizadora apontada no mesmo documento vai dar cobertura a trabalhadores e
a outros segmentos sociais como donas de casa, migrantes, aposentados e encarcerados. Ela
representa assim, a possibilidade de reentrada no sistema educacional para aqueles que por
um motivo ou outro tiveram seus estudos interrompidos.
A eqüidade é a forma pela qual se distribuem os bens sociais de modo a garantir
uma redistribuição e alocação em vista de mais igualdade, consideradas as situações
específicas. Segundo Aristóteles, a eqüidade é a retificação da lei onde esta se revela
insuficiente pelo seu caráter universal. (Ética a Nicômaco, V, 14, 1.137 b, 26). Neste
sentido, os desfavorecidos frente ao acesso e permanência na escola devem receber
proporcionalmente maiores oportunidades que os outros. Por esta função, o indivíduo
que teve sustada sua formação, qualquer tenha sido a razão, busca restabelecer sua
trajetória escolar de modo a readquirir a oportunidade de um ponto igualitário no jogo
conflitual da sociedade (PARECER 11/2000, p.10).
Desta forma, percebe-se a educação como uma chave indispensável para o exercício da
cidadania na contemporaneidade. Ela apresenta-se como possibilidade do indivíduo jovem e
adulto retomar seu potencial, desenvolver habilidades, bem como alcançar um nível maior na
Fonte: PHOTOS.COM
competência técnica profissional mais qualificada.
Neste sentido, a Educação de Jovens e Adultos
representa uma promessa de desenvolvimento
de todas as pessoas e de todas as idades, e
estes poderão atualizar conhecimentos e mostrar
habilidades. Essa função remete a qualificação
de vida para todos, inclusive idosos. Assim, a
tarefa de propiciar a todos o aprimoramento
dos conhecimentos por toda a vida, é a função
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
63
permanente, ou seja, a qualificadora da EJA.
Mais do que uma função, ela é o próprio sentido da EJA. Ela tem como base o caráter
incompleto do ser humano cujo potencial de desenvolvimento e de adequação pode
se atualizar em quadros escolares ou não escolares . Mais do que nunca, ela é um
apelo para a educação permanente e criação de uma sociedade educada para o
universalismo, a solidariedade, a igualdade e a diversidade (PARECER 11/2000, p. 11).
Sabe-se que a realização da pessoa não é um universo fechado e acabado e a função
qualificadora, quando colocada em prática pode ser o caminho dessas descobertas. Assim,
esta função tem por objetivo alcançar o caráter incompleto do ser humano e restabelecer seu
potencial de desenvolvimento e de adequação em quadros escolares ou não escolares.
A partir deste raciocínio, a educação de jovens e adultos passa a ser vista como meio de
conscientização e de mobilização de grupos sociais excluídos, afirmadas pela ideia de Paulo
Freire que propõe uma educação com o homem e não para o homem. Nesta perspectiva,
cria-se uma nova concepção de alfabetização e de educação: educação enquanto prática
libertadora.
A base da perspectiva qualificadora na EJA seria o aprender a aprender. Uma proposta de
educação que aponte para além dos muros escolares e se consolida no contexto de uma
sociedade plural e heterogênea.
Um ser humano, considerado um ser inacabado, mas a quem se reconhece capacidade para
permanentemente, ao longo da vida, procurar saber, realizar e valorizar em qualquer contexto
as suas potencialidades para uma plena realização. Aquele que não aprende apenas na escola,
mas ao longo da vida: para além da educação e trabalho, o desenvolvimento de aspectos que
incluem o desenvolvimento pessoal e social dos sujeitos. O jovem e o adulto, ao buscar a
escola, procuram outro tipo de conhecimento, novos saberes, que se somam à sua vida.
Nossa sociedade apresenta uma perspectiva sobre as diversas fases da vida. Ser reconhecido
como criança, adolescente, jovem e adulto faz parte de importantes significações relativas ao
indivíduo e à cultura na qual está inserido.
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Aos estudiosos não pode passar que da idade decorrem a assinalação de direitos e deveres e
que suas demarcações demonstram uma relação com os níveis de estratificação social. Muitos
alunos da EJA têm origem em quadros de desfavorecimento e suas experiências familiares e
sociais e suas expectativas, muitas vezes, divergem dos conhecimentos e aptidões veiculados
pela escola.
Identificar, conhecer, distinguir e valorizar tal quadro é princípio metodológico a fim de se
produzir uma atuação pedagógica capaz de produzir soluções justas e eficazes.
A contextualização se refere aos modos como estes estudantes podem dispor de
seu tempo e de seu espaço. Por isso a heterogeneidade do público da EJA merece
consideração cuidadosa. A ela se dirigem adolescentes, jovens e adultos, com suas
múltiplas experiências de trabalho, de vida e de situação social, aí compreendidos as
práticas culturais e valores já constituídos (PARECER 11/2000, p. 61).
Se cansaço e fadiga não são exclusividades da EJA, também métodos ativos não são
específicos de outro turno. Assim, demonstra-se a possibilidade de atuação na EJA com
métodos ativos e envolventes, que promovam realmente formação humana.
No Brasil, país que ainda se ressente de uma formação hierárquica e escravocrata, a EJA
tem sido vista como uma compensação e não como direito. Essa tradição foi aos poucos
sendo alterada em nossos códigos legais, na medida em que foi se deslocando a ideia
de compensação para reparação e equidade, embora o caminho ainda seja longo para
alcançarmos o pleno desenvolvimento do ser humano.
A necessidade contemporânea tem se alargado, exigindo mais e mais da educação, por isso,
mais do que ensino fundamental, os alunos buscam a educação básica. Diante desta revelação,
mais uma vez impõem-se a necessidade de refletir sobre a produção do inegável fracasso
escolar que atinge crianças e adolescentes participantes dos processos de escolarização.
A democratização de oportunidades de acesso à escolarização básica é fato inegável, assim
como o tempo de permanência na escola, principalmente no nível fundamental. Contudo,
a permanência não se tem traduzido para a maioria, em aprendizados significativos, que
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
65
possam garantir aos sujeitos melhores condições de continuidade em processos de ensino, de
ingresso no mundo do trabalho e na sociedade como um todo.
Os índices de analfabetismo funcional de sujeitos com 8 anos ou mais de escolaridade
vem sendo objeto de investigação, na busca por compreender suas motivações, e com
isso, empreender intervenções nos sistemas educacionais que possam trazer algum
impacto para a reversão deste quadro (HADDAD, 2000, p. 130).
O analfabetismo é um bom indicador dos desafios pendentes no campo educacional. Embora
as taxas de analfabetismo venham declinando, ele ainda apresenta-se no início deste milênio,
a redução no número absoluto de analfabetos é um fenômeno bastante recente que não resulta
de políticas públicas educacionais abrangentes, contínuas e adequadas para a população jovem
e adulta, mas sim do esforço realizado em direção à universalização do ensino fundamental
para crianças e adolescentes, acompanhada por programas para estudantes com defasagem
na relação entre idade e série cursada.
Os índices de analfabetismo também revelam outras formas de desigualdade, a começar
pela diferença de rendimento. Em 2001, o índice de analfabetismo entre as pessoas que
vivem em famílias com rendimento entre cinco e dez salários mínimos mensais era de
4,7%, enquanto que nas famílias com renda inferior a um salário mínimo mensal essa
taxa subia para 28,8%. Entre a população negra, a taxa de analfabetismo era de 20%,
contra 8,3% da branca. O maior contingente de analfabetos (48,7%) encontrava-se nos
grupos etários mais idosos, com pessoas de idade igual ou maior a 50 anos. Mas o
analfabetismo não é um fenômeno do passado, restrito aos idosos: entre as pessoas
não alfabetizadas em 2000, quase 2 milhões eram jovens entre 15 e 24 anos, e 1,4
milhão eram adolescentes de 10 a 14 anos. Certa equidade de gênero no acesso à
alfabetização foi alcançada nas faixas etárias mais jovens, mas não nos grupos de
idade mais avançada, o que fez com que as mulheres ainda fossem a maioria (51%)
entre os analfabetos computados em 2000 (PIERRO, 2001, p. 89).
Analisando estes dados, podemos constatar que o caminho a ser perseguido em nosso país
é longo no que diz respeito à universalização da educação básica, pois muito grande é a
assimetria entre alfabetizados e não alfabetizados em nossa sociedade.
Embora tenhamos leis educacionais que contemplem a importância e a necessidade do
estado oferecer aos seus cidadãos uma educação de qualidade para todos, as experiências
vivenciadas em nosso cotidiano escolar demonstram esse dramático quadro de nossos dias
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
atuais e que precisam ser superados. No entanto, a coordenação de políticas sociais em um
país populoso, extenso e com estrutura político administrativa federativa, como é o caso do
Brasil, é sempre complexa.
A participação da sociedade civil nas ações de alfabetização não é um fenômeno recente
no Brasil, ao contrário, este segmento sempre foi chamado a concretizar as campanhas
coordenadas pelo governo federal, desde a década de 1940. No entanto, na década de 1990
a relação entre Estado e sociedade civil adquiriu novas características e significados em
decorrência da reforma do Estado.
Na segunda metade da década 1990, as ações visando a escolarização de jovens e adultos
foram desenvolvidas em parceria com diferentes grupos de atores sociais. De um lado, houve
a continuidade, e até mesmo a intensificação da presença de centros de educação popular e
organizações não governamentais que, tendo desenvolvido especialização técnica, passaram
a prestar serviços de pesquisa, planejamento, assessoria e avaliação dos programas
educativos, formação de educadores e produção de materiais didático-pedagógicos, tarefas
antes desempenhadas pelo Estado.
Sabemos, entretanto, que o estado é o mentor das políticas públicas e somente por meio
de decisões políticas sérias é que alcançaremos patamares mais elevadas quanto a
universalização da educação básica, principalmente no que diz respeito a educação de jovens
Fonte: PHOTOS.COM
e adultos.
O PAPEL DO EDUCADOR FRENTE À EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Com o avanço da legislação educacional brasileira voltada
para a Educação de Jovens e Adultos, o papel do educador
em relação à EJA possui três dimensões de ensino, sendo
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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elas a dimensão política, a dimensão pedagógica e a dimensão ética.
O professor é um educador que contribui para a educação do educando e sendo assim tem que
estar pautado em socializar seus conhecimentos, visando uma educação de qualidade para
o educando; torna-se educador, no decorrer de sua existência, ensinando o conhecimento ao
aprendiz; com isso o educador ganhou uma parte importante de responsabilidade sobre que
é ensinar:
Na atuação pedagógica deve ser acrescentada a dimensão educativa, que lhe é
imputada por força de sua própria definição institucional. O Professor é um educador...
e, não querendo sê-lo, torna-se um deseducador. Professor-Instrutor qualquer um pode
ser dado que é possível ensinar relativamente com o que se sabe; mas Professor/
Educador nem todos podem ser, uma vez que só se educa o que se é (ROMÃO, 2001,
p.61 ).
De algum modo todos somos educador, mas o educador é institucionalizado estabelecendo
relações metódicas, formais e sistemáticas com outros educadores sempre procurando
orientar e mediar o conhecimento cognitivo:
Enquanto o saber sistematizado, com densidade epistemológica, pode ser adquirido
em curós, treinamento e capacitações, o ser educador vai se construindo com o saber
adquirido na teia das relações historicamente determinadas, que vão construindo as
dúvidas, perplexidades, convicções e compromissos. Por isso, não há como fugir
de uma analise da inserção do Professor na sociedade concreta, abordando todas
as dimensões de seu papel – atribuído ou conquistado. E não se trata de qualquer
Professor e de qualquer sociedade; trata-se do Educador de jovens e adultos, na
sociedade brasileira, neste final de século (ROMÃO, 2001, p.64 ).
Na Dimensão Política, devemos reconhecer que o empenho na Educação Básica é dar um
enfoque maior em que o compromisso do educador é a mobilização e organização dos projetos
da Educação Básica. Sendo educadores nos gestos, atitudes, palavras de ordens; tornandose necessário identificar com clareza os aliados e adversários.
Em Escolas Públicas, o educador tem sido alvo de movimentos reivindicatórios, onde se reflete
o cargo do educador que estuda as formas e estratégias de aula trocando experiências com
outros educadores capacitados e, assim, em uma sala de aula tentam mudar o mundo pela
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
educação e resultam em grandes gestos, iniciativas cotidianas, e a persistência.
Atualmente, faz-se necessário a superação da concepção autoritária, em que o educador
se coloca como único detentor do conhecimento e que tem o papel de repassar todas as
informações, todo o conteúdo para o educando; o educador autoritário impõe um jeito
impaciente de ensinar à sua atividade e com isso espera que os educandos absorvam os
conhecimentos por ele demonstrados. Essa concepção autoritária de ensino implica em uma
avaliação de classificar os educandos por quantidade de conhecimento obtido no decorrer das
aulas.
Com a Dimensão ética, a educação passou a ser um instrumento de desenvolvimento de
diferenças econômicas entre os indivíduos nas classes sociais dentro da sociedade, onde
muitas vezes o papel do professor resume-se a reproduzir as diferenças colocadas socialmente.
Essa é uma profissão difícil que exige segurança, tranquilidade, equilíbrio, competência,
compromisso, e acaba sendo pouco reconhecida. A formação do educador vem sofrendo falta
de reconhecimento social. Um ponto fundamental é a relação com o educando perseguindo
uma qualidade na prática do alfabetizador e sua experiência como leitor e escritor. Educar
implica em ser referência para os alunos e a formação inicial não determina a qualidade do
alfabetizador, mas contribui para que essa qualidade melhore paulatinamente nos espaços de
formação continuada.
A construção do conhecimento é uma formação científica que surge com um ponto de reflexão
e uma pergunta, base para que seja a prática do educador pesquisador; às vezes responde-se
as perguntas e com isso configura-se um educador crítico-reflexivo.
A formação é uma pratica de conhecimento e todo conhecimento nasce com uma
pergunta. A pergunta é o primeiro passo do conhecimento. As perguntas surgem na
ação, em sua grande maioria. Tentar responder as perguntas antes que elas surjam na
cabeça do alfabetizador é, no mínimo, pouco racional. No entanto, isto que acontece nas
formações que antecedem à ação. Temos, então, o absurdo de responder a perguntas
não formuladas e depois, quando elas aparecem, não ter um momento de formação
para respondê-las (BARRETO, 2001, p.81 ).
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
69
Neste sentido, é fundamental o educador participar efetivamente de programas de formação
continuada, onde a maioria das dificuldades enfrentadas ocasionam uma certa angústia e o
professor não consegue resolvê-las, sentindo a necessidade de uma assessoria pedagógica
como uma das melhores formas de interferir na realidade, e assim é aplicada essa teoria em
prática e com isso a formação não tem a finalidade de trabalhar discursos e sim a prática com
os educadores. A forma de estabelecer o conhecimento teórico é observando a prática.
A única forma segura de identificar a teoria que sustenta a pratica do alfabetizador é a
observação da pratica do próprio alfabetizador. É nesta pratica que se exprime no que
o alfabetizador realmente acredita. Esta observação pode ser feita pela observação
direta ou pelos relatos do próprio alfabetizador (BARRETO, 2001, pp.84-85 ).
Os conteúdos administrados devem ser o mais claro e assimiláveis possíveis, lembrando-se
que ensinar o educando não é transmitir conhecimento, e sim criar as possibilidades para
sua produção ou construção do conhecimento, pois quem ensina aprende ao ensinar e quem
aprende ensina ao aprender.
Paulo Freire (1987) propõe que seja trabalhada a conscientização como forma de resgatar
as pessoas da condição de vida que se encontram, isso implicaria numa transformação
total da teoria e prática, que é abordado a necessidade da conscientização com objetivo de
libertar os oprimidos da violenta opressão a que estão submetidos conduzindo para um viver
generosamente autêntico, crítico.
De acordo com Freire (1987) é usada uma concepção apontada por “Educação Bancária”,
como instrumento de opressão às classes menos favorecidas, que seriam libertas mediante o
fundamental papel da educação. Na Educação Bancária, o educando é visto como indivíduo
que não sabe de nada, alguém que recebe conhecimento dos educadores que julgam saber de
tudo, onde o educando é aquele que recebe depósitos na mente e os armazena.
A narração de que o educador é o sujeito, conduz os educandos à memorização
mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em “vasilhas” em
recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Quanto mais vá “enchendo os recipientes
com seus “depósitos, tanto melhor educador será. Quanto mais se deixem docilmente
“encher” tanto melhores educandos serão (FREIRE, 1987, p.58).
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
A Educação Bancária instiga o desacordo na medicação entre educador-educando, onde
o educador é visto como quem educa, que sabe e pensa, impõe a disciplina, opta pelos
conteúdos e métodos, mostrando-se que é a autoridade na sala de aula, em que os educandos
não sabem nada, só escutam, são disciplinados, não podendo ser ouvidos.
Para Freire (1987), essa perspectiva de trabalho docente é identificada como processo de
alienação, não tendo criatividade nenhuma na sala de aula, uma vez não criativo não saberá
transformar essa relação. Esse silêncio que o educador realiza no educando acaba criando a
condição de um sujeito passivo que não participa do processo educativo.
O educador, que aliena a ignorância, se mantém em posições fixas, invariáveis. Será
sempre o que sabe, enquanto os educandos serão sempre os que não sabem. A
rigidez desta posições nega a educação e o conhecimento como processos de busca
(FREIRE,1987,p.58).
Para superar a Educação Bancária que é a prática que produz o falso saber tornando o
educando um sujeito não critico, e poder conseguir trabalhar a educação como prática e
tendo liberdade, é sugerido a Educação Problematizadora, onde a realidade é inserida no
contexto educativo, sendo valorizado o diálogo, a reflexão e a criatividade, de modo a construir
a libertação.
Em verdade, não seria possível à educação problematizadora que rompe com os
esquemas verticais característicos da educação bancária, realizar-se como prática da
liberdade, sem superar a contradição entre o educador e os educandos. Como também
não lhe seria possível fazê-lo fora do dialogo (FREIRE, 1987, p.68).
Assim, a realidade da Educação problematizadora é inserida no contexto educativo, sendo
valorizado o diálogo, a reflexão e a criatividade, de modo a construir a libertação, buscando
trabalhar a teoria dialógica, opondo-se à manipulação das classes menos favorecidas pela
cultura mediante os meios de comunicação, no qual devem ser conduzidas ao diálogo.
Freire (1987) diz que a teoria da ação dialógica escrita pela organização e síntese cultural é
forte arma de combate à manipulação se usada pela liderança revolucionária. O diálogo é
necessário na educação como prática da liberdade, estando presente em todos os momentos
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
71
do processo ensino-aprendizagem, da busca e opção pelos conteúdos, métodos, temas
geradores e seus significados até as relações homens-mundo.
Fonte: PHOTOS.COM
O diálogo aparece como o grande
incentivador da educação mais humana e
até revolucionária, o educador antes dono
da palavra passa a ouvir, e segundo Freire
(1987) “não é no silencio que os homens
se fazem, mas na palavra, no trabalho,
na ação-reflexão”, assim foi chamado de
mediatização pelo mundo, em relação ao
educador-educando.
É necessário que no diálogo, e na mediação haja humildade e fé no educando, o diálogo
começa na busca do conteúdo programático, ou seja, a listagem de conhecimentos que o
aluno tomará contato em determinado ano, série, escola. Para o educador, o conteúdo não é
uma doação ou uma imposição, mas a devolução organizada, sistematizada e acrescentada
ao povo daqueles elementos que esta lhe entregou de forma desestruturada.
Para a escolha do conteúdo programático é proposto que seja construído a partir de temas
geradores, e o conteúdo para o educando passa a ser investigado e destacado para tornar o
trabalho em equipe de forma interdisciplinar. Na alfabetização (de adultos), o destaque é feito
por meio de palavras geradoras, já que o objetivo é o letramento, porém de forma crítica e
conscientizadora.
É mostrada a teoria da ação dialógica sendo apoiada pela colaboração, organização e síntese
cultural, tendo como compromisso a libertação das pessoas oprimidas que são vistas em um
sentido, onde muitas vezes a vida é proibida de ser vivida. Isto devido às condições precárias
em que vivem, convivendo com injustiças, misérias e enfermidades, onde é obrigada a manter
a condição de opressão.
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Impõe-se, pelo contrario, a dialogicidade entre a liderança revolucionária e as massas
oprimidas, para que, em todo o processo de busca de sua libertação, reconheça na
revolução o caminho da superação verdadeira da contradição em que se encontram,
como um dos pólos da situação concreta de opressão. Vale dizer que devem se engajar
no processo com a consciência cada vez mais crítica de seu papel de sujeitos da
transformação (FREIRE, 1987, pp. 123-124).
Nos dia de hoje, a idade jovem e adulta veio ser reconhecida e é constituída e exigidos
saberes, habilidades, socializações, informações, conhecimentos, valores, que são próprios
dessas idades, independentemente dos anos de escolarização tidos na infância, saberes que
são construídos no conjunto de relações e experiências e que são exigidos para lidar com o
trabalho, e a sua cultura, tornando-se importante que a educação oferecida aos alunos jovens
e adultos seja dotada de estatuto teórico-metodológico próprio.
Os educandos e educadores vão se transformando em sujeitos reais da construção e
reconstrução em relação da qualidade na aprendizagem, e no saber onde não há ensino
sem pesquisa e pesquisa sem ensino, cabe ao professor continuar pesquisando para melhor
atualização de conhecimentos. A pesquisa se faz importante também, pois nela se cria o
estímulo e o respeito à capacidade criadora do educando.
Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que fazeres se encontram
um no corpo do outro. Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino
porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar,
constatando, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não
conheço e comunicar ou anunciar a novidade (FREIRE, 1996, p.29).
A escola e os educadores precisam respeitar o educando podendo, assim, trabalhar seu
conhecimento empírico, sua experiência anterior e aconselha-se a discussão sobre os
problemas sociais que as comunidades carentes enfrentam e a desigualdade que as cercam.
As teorias e as novas descobertas realizadas precisam ser debatidas e aceitas mesmo que
parcialmente, porém é importante que se preserve de alguma forma, o conhecimento obtido
anteriormente e as formas tradicionais de educação.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
73
Qualquer forma de discriminação seja ela: racial, política, religiosa, de classe social é imoral e
lutar contra ela é um dever por mais que se reconheça a força dos condicionamentos a enfrentar,
sendo uma ação de reprovação, pois a discriminação nega radicalmente a democracia e fere
a dignidade do ser humano.
O educador representa muito na vida do educando, onde um gesto mal interpretado pode ser
fatal, e o que pode ser considerado um gesto insignificante pode valer como força formadora
para o desenvolvimento intelectual e acadêmico do educando.
Às vezes, mal se imagina o que pode passar a representar na vida de um aluno um
simples gesto do professor. O que pode um gesto aparentemente insignificante valer
como força formadora ou como contribuição à do educando por si mesmo (FREIRE,
1996, P.42).
Portanto, ensinar exige bom senso, observando como os educadores estão agindo ao cobrar
os conteúdos das suas disciplinas, o exercício ou a educação do bom senso vai superando o
que há nele de tendência natural na avaliação que é feita. O educador que pensa certo deixa
manifestar aos educandos que a beleza de se estar no mundo é a capacidade de perceber que
ao intrometer-se no mundo ele conhecerá e transformará o mundo.
O educador que desacata a curiosidade do seu educando, a sua linguagem, a sua ortografia,
que ironiza o aluno, que o minimiza entre outras ofensas em defesa da ordem em sala de aula,
transgride os princípios fundamentais éticos de nossa existência e esta transgressão jamais
poderá ser vista ou entendida como virtude, mas como abertura com a dignidade.
Se há uma pratica exemplar como negação da experiência formadora é a que dificulta
ou inibe a curiosidade do educando e, em conseqüência, a do educador. É que o
educador que, entregue a procedimentos autoritários ou paternalista que impedem
ou dificultam o exercício da curiosidade do educando, termina por igualmente tolher
sua própria curiosidade. Nenhuma curiosidade se sustenta eticamente no exercício da
negação da outra curiosidade (FREIRE, 1996, p.85).
Com isso, o educando deve ser civilizado e determinado a lutar pelos direitos dos professores,
apoiando sua luta por salários mais justos e respeito por sua profissão. O responsável da
classe deve priorizar o empenho da formação permanente dos quadros do magistério como
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
tarefa altamente política e repensar a prática das greves, inventando uma nova maneira de
lutar que seja mais eficaz.
A maioria dos educadores luta pela dignidade de sua função, não sendo somente importante
como pode ser interpretada como uma prática ética. Quanto às comunidades carentes,
a mudança é difícil, mas é possível, baseando-se neste saber fundamental, é que a ação
político-pedagógica poderá ser programada com esperança, respeito e conscientização, não
impondo a população expulsada e sofrida que se revolte, que se mobilize ou se organize para
se defender.
Mas sim trata de mostrar aos demais grupos populares um desafio para que percebam a
violência e a profunda injustiça que caracterizam sua situação, desta forma a educação se faz
presente como interferir no mundo.
Consiste em uma exclusividade humana, em que o ato de educar exige segurança,
competência profissional, comprometimento e generosidade. O educador que não leva a sério
sua formação, não quer aprofundar e melhorar o seu conhecimento; não tem força moral para
coordenar as atividades de sua classe. Existem educadores preparados com seu conhecimento
atualizado, mais a maioria deles são autoritários e arrogantes em relação ao educando, onde a
incapacidade profissional e o despreparo comprometem a autoridade do educador.
[...] nenhuma autoridade docente se exerce ausente desta competência. O professor
não que não leve a serio sua formação, que não estude, que não se esforce para
estar à altura de sua tarefa não tem força moral para coordenar as atividades de sua
classe. Isto não significa, porém, que a opção e a pratica democrática do professor
ou da professora sejam determinadas por sua competência científica. Há professores
e professoras cientificamente preparados mas autoritários a toda prova. O que quero
dizer é que a incompetência profissional desqualifica a autoridade do professor
(FREIRE, 1996, pp. 91-92).
Seguindo esta linha de raciocínio é importante que o educador tenha autoridade, mas não seja
autoritário:
A autoridade coerentemente democrática, fundando-se na certeza da importância,
quer da liberdade dos educandos para a construção de um clima de real disciplina,
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
75
jamais minimiza a liberdade. Pelo contrario, aposta nela. Empenha-se em desafiá-la
sempre e sempre; jamais vê, na rebeldia da liberdade, um sinal de deterioração da
ordem (FREIRE, 1996, p.93).
Educar não é transferir conhecimento e sim criar possibilidades para sua produção ou sua
construção, não existe educador sem educando em uma sala de aula esperando para ter
o conhecimento desejado, no entanto o educando é a única razão para o educador estar
ali, o educador não pode deixar escapar nenhum detalhe de seu educando devendo sempre
despertar e instigar a curiosidade e capacidade critica, exigindo pesquisa para conhecer e o
que ainda não conhece comunicar a novidade.
Para instruir os educandos é necessário respeito, criatividade, deixar de ser ingênuo passando
a ser um indivíduo crítico no sentido de ser curioso em relação à aprendizagem dos educandos.
Ensinar é dar vida as palavras, onde o educador que não consegue expressar aquilo que pensa
com exemplos práticos de nada serve o que ele fala. Saber, quer dizer segurança no que diz.
Segundo Paulo Freire (1996), o professor deverá ensinar a pensar certo, sendo a prática
educativa a disponibilidade ao risco, a aceitação do novo e a utilização de um critério para
alargar o ensino antigo, estando presente a rejeição a qualquer tipo de descriminação. Ainda
destaca a importância de propiciar condições aos educando, em suas socializações com os
outros e com o professor, de testar a experiência de assumir-se como um ser histórico e social.
Acredita-se que a educação é uma forma de transformação da realidade, que não é neutra e
nem indiferente, mas que tanto pode destruir a ideologia dominante como mantê-la. Segundo
Paulo Freire (1996), os educadores têm a precisão de criar condições para a construção
do conhecimento para os educandos como parte de um processo em que o educador e o
educando não se reduzam à condição de objeto um do outro, porque ensinar não é transferir
conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção.
Os educandos e os educadores precisam ser acatados em sua autonomia, portanto a
autoavaliação é um excelente recurso para ser utilizado dentro da prática pedagógica,
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
necessitando de estímulos que despertem a curiosidade e, em decorrência disso, a busca para
chegar ao conhecimento. O educador não deve barrar a curiosidade do educando, pois é de
fundamental relevância à sua imaginação, intuição, senso investigativo, enfim, sua capacidade
de ir além, e instigar a ser um indivíduo curioso.
Paulo Freire (1996) protege a conquista de conhecimento e afetividade por parte do educador
para que tenha liberdade, autoridade e competência no decorrer de sua prática docente,
acreditando que a disciplina verdadeira não está na quietude do individuo presente e sim
naquele que é um ser crítico.
A autoridade e liberdade do educador deve ser exercida de forma que a liberdade deve ser
vivida em sua totalidade com a autoridade em uma relação lógica, centrada em experiências
estimuladoras de decisão e responsabilidade.
Noutro momento deste texto me referi ao fato de não termos ainda resolvido o problema
de tensão entre a autoridade e a liberdade. Inclinados a superar tradição autoritária,
tão presente entre nos resvalamos para formas licenciosas de comportamento e
descobrimos autoritarismo onde só houve o exercício da autoridade (FREIRE, 1996,
p.104).
Na maioria das vezes, o educador tem que saber escutar o educando, pois é somente escutando,
crítica e pacientemente, que se é capaz de falar. O educador como um ser histórico, político,
pensante, crítico e emotivo deve procurar mostrar o que pensa, indicando diferentes caminhos
sem conclusões acabadas e prontas, para que o educando construa assim a sua autonomia.
Escutar é obviamente algo que vai mais além das possibilidades auditiva de cada um.
Escutar, no sentido aqui discutido, significa a disponibilidade permanente por parte do
sujeito que escuta para a abertura à fala do outro, ao gesto do outro, às diferenças do
outro. Isto não quer dizer, evidentemente, que escutar exija de quem realmente escuta
sua redução ao outro que fala (FREIRE, 1996. p.119).
Para Freire (1996), ensinar exige querer bem aos educandos, expressando a afetividade.
A atividade docente é uma atividade também de caráter afetivo, porém de uma formação
científica séria, juntamente com o esclarecimento político dos educadores.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesta unidade estudamos as funções da Educação de Jovens e Adultos. Compreendemos que
é importante analisarmos as mesmas e notar o quanto elas propõem princípios que poderão
tornar-se norteadores de todo o trabalho com a EJA.
Vimos, ainda, o fundamental papel que o educador que está frente a uma sala de Jovens e
Adultos precisa desempenhar. Sabemos que a ação docente não é simples, mas composta de
uma certa complexidade, que exige preparo, competência técnica e metodológica. Esse é um
grande desafio: que nossos educandos sejam encaminhados por profissionais devidamente
preparados.
A falta de profissionais com perfil para trabalhar na EJA é um problema sério e que acarreta
uma série de dificuldades para que possamos seguir as bases curriculares oferecidas aos
mesmos. Ser professor na Educação de Jovens e Adultos não é para qualquer professor.
Implica em um perfil apropriado.
A avaliação, metodologias e relação professor e aluno precisam ser adequadas a esta
modalidade de ensino. O que exige desse profissional lidar com várias realidades e atuar dentro
de uma especificidade. Penso que estas foram as principais contribuições desta unidade e as
que ficam estão abertas a possibilidade de novas questões e ampliação do olhar para o Jovem
e o Adulto em processo de escolarização.
ATIVIDADE DE AUTOESTUDO
1) Apresente uma síntese das funções da EJA de acordo com as Diretrizes Curriculares para
a Educação de Jovens e Adultos.
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
2) Faça uma pesquisa em algumas salas de aula da EJA e anote atitudes do cotidiano destas
aulas que possam remeter ao atendimento das funções da Educação de Jovens e Adultos
3) A partir das leituras e discussões nas aulas, reflita e escreva uma lista com dez características que julga importante na ação docente dessa modalidade de ensino.
LIBANEO, José Carlos. Adeus professor, Adeus professora? Novas exigências educacionais a
profissão docente. 10. ed. Editora Cortez: São Paulo, 2007.
GADOTTI, Moacir. A docência na Educação de Jovens e Adultos. Disponível em: <http://www.
cereja.org.br/pdf/revista_v/Revista_LediSchneia.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2010.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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UNIDADE III
O JOVEM E O ADULTO NA SOCIEDADE LETRADA:
QUESTÕES CURRICULARES EM FOCO
Professora Me. Márcia Cristina Greco Ohuschi
Professora Me. Dalva Linda Vicentini
Objetivos de Aprendizagem
• Refletir sobre o papel do jovem e do adulto na sociedade letrada.
• Compreender a diferença entre alfabetização e letramento.
• Contribuir para a construção de uma concepção de letramento crítico, para a formação do cidadão letrado.
• Contribuir para a formação de um pensamento crítico e reflexivo acerca de questões
curriculares para o Jovem e Adulto em nossa sociedade.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nessa unidade:
• Alfabetização e Letramento
• O letramento crítico
• A formação do cidadão letrado
• Organizando uma grade curricular para a EJA
INTRODUÇÃO
Em sociedades industrializadas modernas, o uso da leitura e da escrita, assim como das
diversas tecnologias, é cada vez mais exigido nas práticas sociais.
Dessa forma, é importante que as pessoas saibam escrever, que compreendam as notícias
dos jornais, que defendam seus direitos de consumidor, dentre outras atividades necessárias
no cotidiano de um cidadão.
Jovens e adultos que não sabem ler e escrever convivem em uma sociedade letrada, porém,
sua participação nela é, muitas vezes, restrita. Vários são excluídos e se tornam alvo de
fácil manipulação, pois seus conhecimentos são considerados inferiores em relação aos
apresentados por pessoas escolarizadas.
Assim, nessa unidade refletimos sobre o jovem e o adulto na sociedade letrada, iniciando
por uma discussão sobre a dicotomia alfabetização e letramento, seguindo por definições e
características do letramento crítico, por considerações sobre o cidadão letrado e por uma
reflexão a respeito do educador de jovens e adultos. Para finalizar, incluímos, como leitura
complementar, a reportagem “Histórias de jovens adultos”, publicada na Revista Nova Escola
on-line, em 22/02/2008.
A unidade tem como referências, diferentes obras e artigos científicos de pesquisadores como
Fonte: PHOTOS.COM
Leda Verdiani Tfouni, Magda Soares, Sylvia Bueno Terzi, Jaqueline Moll, Ângela Kleiman e
Luiz Paulo da Moita Lopes.
ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
De acordo com Tfouni (1995), nem sempre os termos
escrita, alfabetização e letramento têm sido enfocados,
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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pelos estudiosos, como um conjunto, já que muitos consideram a escrita como um produto
cultural e a alfabetização e o letramento como processos de aquisição de um sistema escrito.
Para a autora, a escrita “é o produto cultural por excelência” (Tfouni, 1995, p.10) e pode ser
vista como uma das principais causas do surgimento das civilizações modernas, associandose ao desenvolvimento científico, tecnológico, cultural, cognitivo e social dos povos. Além
disso, ela se relaciona com os jogos de poder e dominação que estão por trás da utilização de
um código escrito.
Quanto à alfabetização, a autora aponta para duas concepções existentes. A primeira é vista
como um processo de aquisição individual de habilidades requeridas para a leitura e a escrita,
considerada como algo que se chega a um fim, correspondendo a um modelo linear de
desenvolvimento, em que se aprende a usar e decodificar símbolos gráficos que representam
os sons da fala, partindo de um ponto e chegando a outro.
A segunda concepção é vista como um processo de representação de objetos de diferentes
naturezas, caracterizando-se pela incompletude, pois passa por variáveis, desde a questão
da escolarização, até a consideração de que esse não é um processo linear, já que segue um
percurso determinado pelas buscas sociais, nas quais os indivíduos se engajam.
Dessa forma, conforme Tfouni (1995, p. 15), a partir de uma visão sociointeracionista, “a
alfabetização, enquanto processo individual, não se completa nunca, visto que a sociedade
está em contínuo processo de mudança, e a atualização individual para acompanhar essas
mudanças é constante”. Por isso, a autora prefere falar em níveis de alfabetização.
Quanto ao termo letramento, podemos dizer que é um vocábulo novo nas áreas da Educação,
da Linguística e da Linguística Aplicada, o que causa certa polêmica quanto à sua definição.
De acordo com Soares (2004), o termo letramento surgiu na década de 80, simultaneamente,
no Brasil, na França (illettrisme), em Portugal (literacia), nos Estados Unidos e na Inglaterra
(literacy). Dessa forma, várias pesquisas surgiram em torno do tema que se operacionalizou
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
em vários programas de avaliação do nível de competências de leitura e escrita. Na mesma
época, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO)
sugeriu que as avaliações internacionais sobre domínio de competências de leitura e de escrita
fossem além do medir apenas a capacidade de saber ler e escrever.
Assim, nos países desenvolvidos:
As práticas sociais de leitura e de escrita assumem a natureza de problema relevante
no contexto da constatação de que a população, embora alfabetizada, não dominava
as habilidades de leitura e de escrita necessárias para uma participação efetiva
e competente nas práticas sociais e profissionais que envolvem a língua escrita
(SOARES, 2004, p. 6).
Na França, por exemplo, conforme a autora, o letramento surge para caracterizar jovens e
adultos que possuem um domínio precário das competências de leitura e de escrita, dificultando
sua inserção no mundo social e no mundo do trabalho.
Já, no Brasil, o movimento se deu em outra direção, mantendo sua especificidade no contexto
das discussões sobre problemas de domínio, de habilidades de uso da leitura e da escrita.
Assim, em nosso país, os conceitos de alfabetização e letramento acabaram se mesclando e,
frequentemente, sendo confundidos.
Para Kleiman (1995, p. 19), letramento é definido como “conjunto de práticas sociais que usam
a escrita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia, em contextos específicos, para
objetivos específicos”.
A partir desse conceito, podemos dizer que as práticas de letramento mudam conforme
mudam o contexto em que estão inseridas e, por conseguinte, podemos dizer também que
as orientações de letramento são específicas em cada uma de suas agências, quais sejam:
escola, família, igreja, local de trabalho, dentre outras.
Kleiman (1995, p.20) afirma que a escola, principal agência do letramento, “preocupa-se,
não com o letramento, prática social, mas apenas com um tipo de prática de letramento, a
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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alfabetização [...]”. Segundo a autora, a escola privilegia a aquisição do código escrito, em
detrimento ao desenvolvimento de habilidades para usar a leitura e a escrita em diversos
contextos socioculturais e possibilitar, ao aluno, o desenvolvimento da competência para se
inserir nas diversas práticas de letramento, de forma autônoma.
Assim, segundo Tfouni (1995), o letramento pode ser entendido em caráter de produto, como:
a) Aquisição da leitura e da escrita como código (alfabetização tradicional).
b) A relação entre leitura e escrita e o desenvolvimento da sociedade e dos recursos tecnológicos.
c) O aprendizado, como produto de atividades mentais do indivíduo.
Tais perspectivas estão centradas apenas nas habilidades de leitura e escrita, entretanto, para
esta autora, letramento é algo muito mais amplo e complexo, pois seu processo envolve uma
natureza sócio-histórica.
Magda Soares (1998) também considera o letramento como prática social de interação oral,
em que a língua é vista como interação entre os interlocutores, os quais vão se construindo
enquanto indivíduos ao longo de suas trocas linguísticas.
Moita-Lopes (2004) postula que o letramento tem sido considerado apenas como habilidades
de decodificação ou de cognição, sem considerar o sujeito letrado e as práticas sociais em
que ele está envolvido. Logo, para o autor, o termo é entendido como práticas discursivas,
ou seja, modos de usar a linguagem e fazer sentido, tanto na fala, como na escrita. Para ele,
essas práticas discursivas estão diretamente ligadas à constituição da identidade das pessoas,
assim, mudar de prática discursiva significa mudar de identidade.
Percebemos, portanto, que Soares e Moita-Lopes vêm ao encontro de Tfouni (1995, pp. 2021), ao dizerem que o letramento focaliza os aspectos sócio-históricos da aquisição de um
sistema escrito por uma sociedade. Segundo a autora, estudiosos do letramento buscam
responder as seguintes questões:
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
- Quais mudanças sociais e discursivas ocorrem em uma sociedade quando ela se
torna letrada?
- Grupos sociais não-afabetizados que vivem em uma sociedade letrada podem ser
caracterizados do mesmo modo que aqueles que vivem em sociedades “iletradas”?
- Como estudar e caracterizar grupos não-alfabetizados cujo conhecimento, modos
de produção e cultura estão perpassados pelos valores de uma sociedade letrada?
Dessa forma, a autora demonstra que os estudos do letramento não se restringem às pessoas
que adquiriram a escrita (alfabetizados), mas investigam as consequências da ausência da
escrita em indivíduos ou comunidades perpassados pelos valores das sociedades letradas.
Assim, Tfouni considera que há graus de letramento e argumenta que os termos “iletrado” e
“letrado” não podem ser usados como antônimos, pois, em sua concepção, nas sociedades
modernas, o “iletramento”, ou “letramento de grau zero” não existe, já que elas são perpassadas
pela escrita.
Letrar é mais que alfabetizar, é ensinar a ler e escrever dentro de um contexto onde a escrita
e a leitura tenham sentido e façam parte da vida do aluno. Magda Becker Soares, professora
titular da Faculdade de Educação da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e
doutora em educação, explica que ao olharmos historicamente para as últimas décadas,
poderemos observar que o termo alfabetização, sempre entendido de uma forma restrita como
aprendizagem do sistema da escrita, foi ampliado.
Já não basta aprender a ler e escrever, é necessário mais que isso para ir além da alfabetização
funcional (denominação dada às pessoas que foram alfabetizadas, mas não sabem fazer uso
da leitura e da escrita). O sentido ampliado da alfabetização, o letramento, de acordo com
Magda, designa práticas de leitura e escrita.
A entrada da pessoa no mundo da escrita se dá pela aprendizagem de toda a complexa
tecnologia envolvida no aprendizado do ato de ler e escrever. Além disso, o aluno precisa
saber fazer uso e envolver-se nas atividades de leitura e escrita. Ou seja, para entrar nesse
universo do letramento, ele precisa apropriar-se do hábito de buscar um jornal para ler, de
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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frequentar revistarias, livrarias, e com esse convívio efetivo com a leitura, apropriar-se do
sistema de escrita.
Afinal, a professora defende que, para a adaptação adequada ao ato de ler e escrever, “é preciso
compreender, inserir-se, avaliar, apreciar a escrita e a leitura”. O letramento compreende tanto
a apropriação das técnicas para a alfabetização quanto esse aspecto de convívio e hábito de
utilização da leitura e da escrita.
Uma observação interessante apontada pela educadora Magda Soares diz respeito à
possibilidade de uma pessoa ser alfabetizada e não ser letrada e vice-versa. “No Brasil as
pessoas não leem. São indivíduos que sabem ler e escrever, mas não praticam essa habilidade
e alguns não sabem sequer preencher um requerimento.”
Este é um exemplo de pessoas que são alfabetizadas e não são letradas. Há aqueles que
sabem como deveria ser aplicada a escrita, porém não são alfabetizados. Como no filme
Central do Brasil – alguns personagens conheciam a carta, mas não podiam escrevê-la
por serem analfabetos. Eles ditavam a carta dentro do gênero, mesmo sem saber escrever.
A personagem principal, a Dora (interpretada pela atriz Fernanda Montenegro), era um
instrumento para essas pessoas letradas, mas não alfabetizadas, usarem a leitura e a escrita.
No universo infantil, há outro bom exemplo: a criança, sem ser alfabetizada, finge que lê um
livro. Se ela vive em um ambiente literário, vai com o dedo na linha, e faz as entonações de
narração da leitura, até com estilo. Ela é apropriada de funções e do uso da língua escrita.
Essas são pessoas letradas sem ser alfabetizadas.
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Fonte: PHOTOS.COM
O LETRAMENTO CRÍTICO
Terzi (2003, p. 228) define como letramento
crítico “a relação que indivíduos e comunidades
estabelecem com a língua escrita. Essa relação
inclui: relação de uso cultural da escrita;
relação de conhecimento da escrita; relação de
valorização da escrita, e relação com a escrita permeada por crenças e valores”, conforme
comentamos a seguir.
Na relação de uso cultural da escrita, a autora aponta para o fato de que algumas comunidades
utilizam-se mais da língua escrita que outras, devido a fatores econômicos, políticos,
socioculturais e históricos. Assim, Terzi cita como exemplo a diferença dessa utilização em
grandes e pequenos centros. Nas grandes cidades, o apoio na língua escrita é uma questão de
sobrevivência, na identificação de um ônibus para se locomover, na identificação dos nomes
das ruas, na procura por um emprego, a partir de ofertas afixadas em cartazes etc., já nas
cidades pequenas, essa necessidade é bem menor.
Porém, a relação do sujeito com a escrita não ocorre apenas pelo seu uso. As pesquisas
mostram que há uma grande diversidade no conhecimento que cada um traz da escrita. Logo,
conforme a autora, os jovens e os adultos não escolarizados já trazem um conhecimento da
escrita, a partir de sua vivência. Para Terzi (2003, p. 230):
Mesmo aqueles que nunca tiveram oportunidade de ter nas mãos um jornal sabem que
ele traz notícias. No outro extremo, temos o jardineiro analfabeto que diariamente leva,
da casa em que trabalha, o jornal para que sua esposa o leia para ele (...) e surpreende
ao participar de discussões sobre o conflito no oriente médio, sobre o terrorismo nos
Estados Unidos ou sobre as eleições no Brasil.
Segundo Terzi (2003), o letramento crítico do sujeito também se constitui pela maneira como
cada indivíduo valoriza a escrita, sabendo ou não utilizá-la. Entre os indivíduos escolarizados,
a autora cita como exemplo pessoas com nível superior de educação que não leem jornais,
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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livros, manuais de instrução antes de utilizar um aparelho etc., usando a escrita somente nas
ocasiões em que ela se faz muito necessária. Entre as pessoas não escolarizadas, também
há diferença de valorização da escrita: para algumas, ela pode ser importante apenas para a
assinatura de um documento, para outras, pode significar maiores oportunidades de emprego,
ou realização pessoal a partir do acesso à informação.
O letramento crítico também abrange a relação com a escrita permeada por crenças e valores
do indivíduo ou da comunidade em que ele vive, como por exemplo, uma comunidade em que
palavra dada e honra não se distinguem. Conforme a autora,
Os membros dessa comunidade, embora tendo conhecimento de que um texto escrito
– a escritura – é parte integrante da prática social de compra e venda de um pedaço
de terra, e de que sem ele a transação não se oficializa, rejeitam o documento por
acreditarem que a palavra empenhada por ocasião da realização do negócio vale mais
(TERZI, 2003, pp. 232-233).
Essas relações com a escrita se concretizam simultaneamente, caracterizando o letramento
das pessoas. Por isso, podemos dizer que há diversos letramentos. De acordo com a autora,
as situações de letramento são dinâmicas, pois se transformam constantemente, a partir de
influências de fatores sociais, econômicos e políticos, como já citamos anteriormente.
A autora apresenta alguns exemplos, dentre eles a implantação de um assentamento de semterras em que a liderança passou a exigir a leitura de textos sobre agricultura, ecologia e outros,
o que desencadeou na abertura de cursos de educação de jovens e adultos. Logo, esses
cursos propiciaram a leitura de textos politizantes, o que contribuiu para uma transformação
nas técnicas de plantio e a consequente melhora na produtividade. Dessa forma, temos,
segundo Terzi (2003, p. 233), “uma decisão política influenciando o letramento e este, por sua
vez, influenciando as condições políticas e econômicas”.
Assim, Terzi (2003) nos mostra que a alfabetização não se encerra no desenvolvimento de
uma habilidade individual que tem um fim em si mesma. Pelo contrário, ela é um componente
do letramento crítico, que, num mesmo processo, contribui para a formação do cidadão letrado,
90
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
ou seja, capaz de fazer uso da língua escrita para a sua participação na sociedade.
A educadora Magda Soares argumenta que a criança precisa ser alfabetizada convivendo com
material escrito de qualidade. “Assim, ela se alfabetiza sendo, ao mesmo tempo, letrada. É
possível alfabetizar letrando por meio da prática da leitura e escrita.” Para isso, Magda diz ser
preciso usar jornal, revista, livro. Sobre as antigas cartilhas que ensinavam o ‘Vovô viu a uva’, a
educadora afirma que é necessária a prática social da leitura que pode ser feita, por exemplo,
com o jornal, que é um portador real de texto, que circula informações, ou com a revista ou,
até mesmo, com o livro infantil.
“Tem que haver uma especificidade, aprendizagem sistemática sequencial, de aprender”.
A professora Magda Soares afirma que o PNLD (Programa Nacional do Livro Didático),
desenvolvido pelo MEC (Ministério da Educação), é excelente porque “avalia o livro didático
segundo critérios sensatos”. Mas ela enfatiza que na alfabetização e letramento há um problema
a ser resolvido. “As cartilhas desapareceram do mercado. Não se fala mais em cartilha,
fala-se em livro de alfabetização. Mas com o desaparecimento das cartilhas, praticamente
desapareceu também o conceito de método.
Não é possível ensinar a ler e escrever, ou qualquer coisa em educação, sem um método.
Há poucos livros de alfabetização que tenham uma organização metodológica para orientar
professores e crianças envolvidos neste processo de aprendizagem. “Os professores usam
precariamente os livros de que dispõem ou buscam as cartilhas nas prateleiras da biblioteca
da escola”.
A FORMAÇÃO DO CIDADÃO LETRADO
Moll (2004a, p. 11) fala em “adultos em processo de alfabetização”, referindo-se, no contexto
social brasileiro, “a homens e mulheres marcados por experiências de infância na qual não
puderam permanecer na escola pela necessidade de trabalhar”. A autora também se refere
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
91
Fonte: PHOTOS.COM
a adultos que, por vezes, tentaram voltar à
escola, mas que “a assistematicidade dos
programas de alfabetização e de educação
para adultos no Brasil tornou-os reféns de
uma lógica que, durante décadas, fez dessa
temática um discurso político rentável e
desconectado de compromissos reais”.
Dessa maneira, muitos desses cidadãos
acabam encontrando formas para driblar as situações que precisam enfrentar em seu dia a
dia, como, por exemplo:
“Que ônibus é este? Esqueci meu óculos em casa!” “Podes me dizer o preço deste
produto? Não consigo compreender esta letra!” “Podes escrever este bilhete para mim?
Minha letra é muito ruim!” “Podes ler esta carta para mim? Hoje acordei com muita dor
de cabeça!”
Conforme a autora, por encararem o analfabetismo como um problema social, muitas dessas
pessoas constroem estratégias sociais e cognitivas para conseguirem decodificar o que lhe é
básico, a fim de que os outros não percebam sua não escolarização.
A volta ao ambiente escolar é o primeiro desafio do trabalho com esses cidadãos. Segundo
Moll (2004a), muitos adultos retornam para a escola com uma visão daquela que permaneceu
em suas memórias, seja na época da palmatória, dos castigos no grão de milho, do absolutismo
do professor, dos cadernos cheios de cópias etc. Dessa forma, vários esperam esse tipo de
instituição. Um exemplo, mostrado pela autora, se dá em salas de aula em que os professores
valorizavam a palavra dos alunos, escutando-os e estes, por sua vez, perguntam quando
terminará a conversa para poderem copiar e “encher o caderno”.
Logo, o educador precisará levar em conta essas memórias trazidas por esses alunos, mas,
aos poucos, “desconstruir” essa concepção de escola neles arraigada. Contudo, a autora
alerta para o fato de que ressignificar essa bagagem não significa diminuir as exigências da
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
produção escrita e da leitura, ou seja, não significa mudar “de uma escola na qual só se
copiava para uma escola na qual só se conversa” (MOLL, 2004a, p. 14).
Nesse contexto de formação do cidadão letrado, Ribeiro (1997, pp. 47-48) sintetiza os objetivos
gerais da EJA, dizendo que, a partir dela, os educandos devem ser capazes de:
• Dominar instrumentos básicos da cultura letrada, que lhes permitam melhor
compreender e atuar no mundo em que vivem.
• Ter acesso a outros graus ou modalidades de ensino básico e profissionalizante,
assim como a outras oportunidades de desenvolvimento cultural.
• ncorporar-se ao mundo do trabalho com melhores condições de desempenho e
participação na distribuição da riqueza produzida.
• Valorizar a democracia, desenvolvendo atitudes participativas, conhecer direitos e
deveres da cidadania.
• Desempenhar de modo consciente e responsável seu papel no cuidado e na
educação das crianças, no âmbito da família e da comunidade.
• Conhecer e valorizar a diversidade cultural brasileira, respeitar diferenças de
gênero, geração, raça e credo, fomentando atitudes de não-discriminação.
• Aumentar a auto-estima, fortalecer a confiança na sua capacidade de aprendizagem,
valorizar a educação como meio de desenvolvimento pessoal e social.
• Reconhecer e valorizar os conhecimentos científicos e históricos, assim como a
produção literária e artística como patrimônios culturais da humanidade.
• Exercitar sua autonomia pessoal com responsabilidade, aperfeiçoando a
convivência em diferentes espaços sociais.
Um dos graves problemas que enfrentamos é que há pessoas que se preocupam com
alfabetização sem se preocupar com o contexto social em que os alunos estão inseridos. “De
que adianta alfabetizar se os alunos não têm dinheiro para comprar um livro ou uma revista?”
A escola, além de alfabetizar, precisa dar as condições necessárias para o letramento.
A educadora Magda Soares faz uma crítica ao Programa Brasil Alfabetizado, do Ministério da
Educação que prevê a alfabetização de 20 milhões de brasileiros em quatro anos. Para ela, o
programa irá, na melhor das circunstâncias, minimamente alfabetizar as pessoas num sentido
restrito. “Onde elas aprendem o código, a mecânica, mas depois não saberão usar”.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
93
Um ponto importante para letrar, diz Magda, é saber que há distinção entre alfabetização
e letramento, entre aprender o código e ter a habilidade de usá-lo. Ao mesmo tempo em
que é fundamental entender que eles são indissociáveis e têm as suas especificidades, sem
hierarquias ou cronologia: pode-se letrar antes de alfabetizar ou o contrário.
Para ela, essa compreensão é o grande problema das salas de aula e explica o fracasso do
sistema de alfabetização na progressão continuada. “As crianças chegam ao segundo ciclo
sem saber ler e escrever. Nós perdemos a especificidade do processo”, diz. A educadora
argumenta que o educando precisa ser alfabetizado convivendo com material escrito de
qualidade. Para os professores que trabalham com alfabetização, Magda recomenda:
Alfabetize letrando sem descuidar da especificidade do processo de alfabetização,
especificidade é ensinar e o aluno aprender. O aluno precisa entender a tecnologia da
alfabetização. Há convenções que precisam ser ensinadas e aprendidas, trata-se de
um sistema de convenções com bastante complexidade.
O estudante (além de decodificar letras e palavras) precisa aprender toda uma tecnologia
muito complicada: como segurar o lápis, escrever de cima pra baixo e da esquerda para a
direita; escrever numa linha horizontal, sem subir ou descer. São convenções que precisam
Fonte: PHOTOS.COM
ser ensinadas pelo professor e aprendidas pelos alunos.
A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
FRENTE AOS DESAFIOS CURRICULARES
Existem muitas preocupações com relação à
formação docente na esfera da EJA, pois muitos
professores que nela atuam não foram preparados
especificamente para o trabalho com esse público de alunado. Normalmente, encontramos
professores recrutados no próprio corpo docente do ensino regular que, por vezes, recebem
treinamentos e cursos rápidos para atenderem às demandas da EJA.
94
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Isso nos mostra certo descaso com relação a este segmento educacional, o que, de acordo
com Moll (2004b), pode estar, aos poucos, começando a ser revertido pela ação local dos
municípios e seus parceiros:
O papel fundamental que o poder local pode desempenhar nesse processo,
avançando em relações que permitam a ampliação da esfera pública, sem levar ao
descomprometimento governamental, pode estar relacionado à leitura do universo dos
sujeitos da educação de jovens e adultos, para além de sua designação como dados
estatísticos anônimos (MOLL, 2004b, p. 22).
Diversas pesquisas demonstram que, para se desenvolver um ensino adequado a esse público
é necessário que haja um trabalho de formação continuada, porém, é na formação inicial, nos
cursos de graduação, que esse ensino se consolida.
Esse profissional que atua na EJA, além de muito bem preparado, precisa atentar-se para
questões curriculares que vão determinar os conhecimentos, os conteúdos, objetivos e
metas que serão necessários ser perseguidos na organização do trabalho pedagógico nesta
Modalidade de Ensino.
De acordo com as recomendações internacionais (Conferência Internacional de Educação de
Adultos – Confintea), a educação de jovens e adultos deve ter como princípios:
• Sua inserção num modelo educacional inovador e de qualidade, orientado para a formação
de cidadãos democráticos, sujeitos de sua ação, valendo-se de educadores que tenham
formação permanente como respaldo da qualidade de sua atuação.
• Currículo variado, que respeite a diversidade de etnias, de manifestações regionais e da
cultura popular, cujo conhecimento seja concebido como uma construção social fundada
na interação entre a teoria e a prática e o processo de ensino e aprendizagem como uma
relação de ampliação de saberes.
• A educação de jovens e adultos deve abordar conteúdos básicos, disponibilizando os bens
socioculturais acumulados pela humanidade.
• As modernas tecnologias de comunicação existentes devem ser colocadas à disposição da
melhoria da atuação dos educadores.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
95
• A articulação da educação de jovens e adultos à formação profissional, no atual estágio de
desenvolvimento da globalização da economia, marcada por paradigma de organização
do trabalho, não pode ser vista de forma instrumental, mas exige um modelo educacional
voltado para a formação do cidadão e do ser humano em todas as suas dimensões.
• O respeito aos conhecimentos construídos pelos jovens e adultos em sua vida cotidiana.
Para atingir esses princípios é importante esclarecer que os alunos constroem conhecimentos
na interação com o contexto social, mesmo sem ter passado pelo processo de escolarização.
Valorizar esses conhecimentos e relacioná-los com novos conteúdos é imprescindível para
uma aprendizagem significativa, possibilitando ao professor o planejamento de situações de
aprendizagem para ampliá-los e/ou transformá-los. Quanto maior a profundidade e qualidade
das relações, maior a significatividade da aprendizagem.
Os novos conteúdos devem ser significativos, cientificamente bem construídos, ter
funcionalidade, considerando-se as capacidades dos alunos, suas possibilidades cognitivas e
afetivas. Tais conteúdos devem ser ressignificados, resgatando-se sua importância no processo
de ensino e aprendizagem, entendendo-se como saberes culturais: conceitos, explicações,
habilidades, linguagens, fatos, valores, crenças, sentimentos, atitudes, interesses, condutas,
raciocínios etc., para o desenvolvimento do educando e sua formação integral. Ressignificar
os conteúdos pressupõe entender o que o educando deve saber, o que deve saber fazer e
como deve ser.
As experiências realizadas por Paulo Freire na década de 60 indicam uma valorização dos
conhecimentos construídos fora da escola pelos jovens e adultos e a consideração destes como
pontos de partida para novos conhecimentos. Nessas experiências havia uma preocupação
com o repertório linguístico dos alunos, afirmando que «a leitura do mundo precede a leitura
da palavra».
Estes conhecimentos são pontos de partida para a produção de novos conhecimentos. Sendo
assim, quando se dirigem a uma escola, os jovens e adultos não se encontram «vazios», como
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
muitas vezes a escola acredita.
Em relação aos conteúdos e propostas curriculares, deve-se ressaltar as orientações dos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para 1ª a 4ª séries. Em 1997, o MEC disponibilizou
a proposta curricular para o 1º segmento da educação de jovens e adultos. Essas medidas
irão proporcionar elementos que propiciam a elaboração e implementação de propostas
curriculares adequadas às especificidades dos alunos dessa modalidade de ensino.
A proposta curricular do 1º segmento pressupõe o trabalho com três áreas: Língua Portuguesa,
Matemática e Estudos da Sociedade e da Natureza. É necessário, porém, também considerar
todas as áreas do conhecimento e os temas transversais, de acordo com os PCN de 1ª a 4ª
série.
As orientações curriculares elaboradas pelo MEC para o Primeiro seguimento da EJA referemse à alfabetização e pós-alfabetização de jovens e adultos, cujo conteúdo corresponde às
quatro primeiras séries do 1º grau. Elas não constituem propriamente um currículo, muito
menos um programa pronto para ser executado. Trata-se de um subsídio para a formulação de
currículos e planos de ensino, que devem ser desenvolvidos pelos educadores de acordo com
as necessidades e objetivos específicos de seus programas.
A legislação educacional brasileira é bastante aberta quanto à carga horária, à duração e aos
componentes curriculares desses cursos. Considerando positiva essa flexibilidade, optou-se
por uma proposta curricular que avança no detalhamento de conteúdos e objetivos educativos,
mas que permite uma variedade grande de combinações, ênfases, supressões, complementos
e formas de concretização. Como qualquer proposta curricular, esta não surge do nada; sua
principal fonte são práticas educativas que se pretende generalizar, aperfeiçoar ou transformar.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
97
Fonte: PHOTOS.COM
LÍNGUA PORTUGUESA
A área de Língua Portuguesa abrange o desenvolvimento
da linguagem oral e a introdução e desenvolvimento da
leitura e escrita. Com relação à linguagem oral, o ambiente
escolar deve propiciar situações comunicativas que
possibilitem aos educandos a ampliação de seus recursos
linguísticos. Em outras palavras, os educandos devem
aprender a planejar e adequar seu discurso a diferentes
situações formais e informais.
Com relação à linguagem escrita, além da compreensão
e domínio dos seus mecanismos e recursos básicos, como o sistema de representação
alfabética, a ortografia e a pontuação, é essencial que os educandos compreendam suas
diferentes funções sociais e conheçam as diferentes características que os textos podem ter,
de acordo com essas funções. Todos sabem quão distintas são as linguagens que se usam
numa carta de amor, bula de remédio, jornal e enciclopédia.
Por isso, além dos tópicos que normalmente compõem os currículos de Língua Portuguesa,
esta proposta curricular traz indicações de como trabalhar com textos escritos de modo a
possibilitar que os educandos conheçam e experienciem suas diferentes modalidades. A
aprendizagem da escrita exige ainda o desenvolvimento da capacidade de análise linguística e
o aprendizado de palavras que servem para descrever a linguagem. Esses aspectos compõem
os blocos de conteúdo da área.
Linguagem Oral
Os modos de falar das pessoas analfabetas ou pouco escolarizadas são a expressão mais
forte de toda a bagagem cultural que possuem, de suas experiências de vida. Podemos
encontrar adultos pouco escolarizados que têm um excepcional domínio da expressão oral:
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TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
contadores de histórias, poetas, repentistas, líderes populares.
Entretanto, deparamos também com aqueles que têm seu discurso marcado por experiências
de privação, humilhação e isolamento, que se expressam de forma fragmentada e têm
dificuldade de se fazer entender.
Para a sala de aula, o professor deve planejar estratégias para que os alunos experimentem e
ampliem suas formas de expressão, promover momentos em que os educandos se expressem
em pequenos grupos, em grupos maiores, em conversas com o professor.
É necessário criar oportunidades de ouvir e falar, reelaborar argumentos a partir de novas
informações, construir conceitos, incorporar novas palavras e significados, compreender
e avaliar o que ouvimos. Nessas ocasiões, o professor deve chamar a atenção dos alunos
para os diferentes modos de falar e os efeitos que podem provocar sobre os que recebem
a mensagem. No que diz respeito à linguagem oral, portanto, o papel do professor é mais
desinibir, perguntar, comentar e sugerir do que propriamente corrigir.
Linguagem Escrita
Numa sociedade letrada, mesmo os jovens e adultos que nunca passaram pela escola
têm conhecimentos sobre a escrita. Muitos conhecem algumas letras e sabem assinar seu
nome. Todos já se defrontaram com a necessidade de identificar placas escritas, preencher
formulários, lidar com receitas médicas ou encontrar o preço de mercadorias.
Na escola, o professor deve criar situações em que os educandos exponham e reconheçam
aquilo que já sabem sobre a escrita. Baseado no que os alunos já sabem é que o professor
poderá decidir que novas informações fornecer, para quais aspectos chamar a atenção, de
modo que o aluno vá elaborando seus conhecimentos até chegar a um domínio autônomo
desse sistema de representação. Nosso sistema de escrita é alfabético e, no processo de
aprendizagem, os alunos devem estabelecer as relações existentes entre os sons da fala e as
letras.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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Entretanto, a escrita não é uma mera transcrição da fala. Não escrevemos do mesmo jeito que
falamos, pois a comunicação escrita têm outras exigências e utiliza-se de outros recursos.
Quando escrevemos, nosso leitor não está presente, por isso temos de assegurar que a
mensagem seja eficiente e para tanto é preciso usar recursos próprios de organização do
discurso. A escrita é utilizada, muitas vezes, para registrar mensagens que devem perdurar no
tempo ou atravessar grandes distâncias, por isso ela não pode ser tão flexível quanto à fala,
obedecendo a normas mais rígidas de organização.
Para dominar o mecanismo de funcionamento da escrita é necessário conhecer as letras, pois
são os signos que nosso sistema de representação utiliza. Também é necessário compreender
a relação entre as letras e os sons da fala. Para cada fonema, temos uma representação
gráfica (é por isso que nosso sistema de representação escrita é chamado de alfabético). É a
partir do estabelecimento desta relação fonográfica e da compreensão de suas regularidades
e irregularidades que se chega ao domínio do sistema alfabético.
Essas irregularidades dizem respeito às peculiaridades da ortografia da Língua Portuguesa: um
mesmo som pode ser representado por mais de uma letra e uma mesma letra pode representar
sons diferentes dependendo da posição em que se encontra na palavra. Uma mesma palavra
pode ser pronunciada de muitas formas, mas deve ter uma única grafia. Por exemplo, no
Brasil, a pronúncia da palavra “muito” pode ser muintu, muinto, muntcho, munto ou outras,
mas sempre ela é escrita da mesma forma. Não podemos escrever do jeito que falamos, pois
isso tornaria o registro escrito extremamente instável e seria muito difícil conseguirmos nos
entender. Além da ortografia, há outros recursos e normas que caracterizam a escrita, como
o sentido da esquerda para a direita, a segmentação das palavras, a pontuação, os diferentes
alfabetos (maiúsculo e minúsculo, de imprensa e cursivo etc.). Utilizamos todos esses recursos
e mecanismos da escrita para produzir textos. Existem vários tipos de texto, nos quais esses
recursos se combinam de forma característica.
Para que os alunos leiam e escrevam com autonomia, precisam familiarizar-se com a diversidade
de textos existente na sociedade. Precisam reconhecer as várias funções que a escrita pode
100 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
ter (informar, entreter, convencer, definir, seduzir), os diferentes suportes materiais onde pode
aparecer (jornais, livros, cartazes etc.), as diferentes apresentações visuais que pode adquirir
e suas características estruturais (organização sintática e vocabulário). O objetivo central em
Língua Portuguesa é formar bons leitores e produtores de textos, que saibam apreciar suas
qualidades, encontrar e compreender informações escritas, expressar-se de forma clara e
adequada à intenção comunicativa.
Portanto, atividades que envolvam leitura e produção de textos são essenciais para alcançar
esse objetivo. Para aprender a escrever é preciso escrever, e o mesmo vale para a leitura. Na
interação com este objeto de conhecimento — o texto — e com a ajuda do professor, o aluno
poderá realizar essas aprendizagens.
O trabalho com a linguagem escrita deve estruturar-se, desde o início, em torno de textos.
Para as turmas iniciantes, podem ser selecionados textos mais curtos e simples, como
listas, folhetos, cartazes, bilhetes, receitas, poesias, anedotas, manchetes de jornal, cartas,
pequenas histórias e crônicas. Quanto maior o domínio do sistema de representação, maiores
as possibilidades de ler e escrever textos mais longos e complexos.
O professor de jovens e adultos deve ter um cuidado especial com a busca e seleção de textos
para trabalhar com os alunos, já que ele não conta com a abundância de materiais didáticos
já elaborados disponíveis para a educação infantil. Além dos textos literários, outros podem
ser usados em sala de aula: receitas culinárias, textos jornalísticos, artigos de divulgação
científica, textos de enciclopédias, cartas, cartazes, folhetos informativos ou textos elaborados
pelos próprios alunos. O professor deve dispor de uma boa coletânea de textos, organizar
pequenas bibliotecas na sala de aula ou levar seus alunos a bibliotecas.
Escrever textos significa saber usar a escrita para expressar conhecimentos, opiniões,
necessidades, desejos e a imaginação. Nessa aprendizagem, entra em jogo a disponibilidade
da pessoa de se expor e criar. Para expressar-se por escrito, o educando terá que lançar
mão de um sistema de convenções já estabelecido, mas deverá utilizá-lo para expressar suas
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
101
próprias ideias ou sentimentos, apropriando-se criativamente dos modelos disponíveis. Os
textos que os educandos encontram dentro e fora da escola são os modelos a partir dos quais
eles aprendem a escrever.
Para isso, será essencial a ajuda do professor, orientando-os na análise dos sons da fala e dos
sinais escritos, chamando-lhes a atenção para as regularidades e irregularidades. No processo
de aprendizagem, entretanto, os modelos não são simplesmente copiados, sem um trabalho
de reelaboração do educando. O professor deve procurar compreender esse processo de
elaboração da escrita dos alunos para poder prestar-lhes uma ajuda adequada.
Para isso, é preciso criar situações em que os alunos possam colocar em jogo aquilo que sabem,
expor suas elaborações sobre a linguagem escrita, discutir sua produção com outros colegas,
sentir a necessidade de melhorá-la. O professor não pode simplesmente rejeitar os erros dos
alunos, pois é baseando-se neles que se pode saber que tipo de ajuda oferecer. É a análise de
seus próprios erros que possibilita aos novos escritores avançar para produções escritas cada
vez mais adequadas. Na sala de aula, a produção de um texto deve ser compreendida como
um processo que passa por várias reescritas, até que o produto seja satisfatório.
Uma boa forma de organizar o trabalho com a escrita é articulá-lo com o da leitura, dentro de
uma mesma modalidade textual. À medida que leem e analisam modelos variados de cartas, por
exemplo, os educandos podem ser encorajados a escrever suas próprias cartas, inicialmente
ainda com bastante ajuda do professor, paulatinamente com maior autonomia, fazendo e
refazendo, relendo e comparando e, finalmente, enviando suas cartas, experimentando o
poder e o prazer da escrita em situações reais de comunicação.
A Análise Linguística
A alfabetização implica, desde suas etapas iniciais, um intenso trabalho de análise da
linguagem por parte do aprendiz. Nesse processo, ele acabará aprendendo e servindo-se de
palavras e conceitos que servem para descrever a linguagem, tais como letra, palavra, sílaba,
102 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
frase, singular, plural, maiúscula, minúscula etc.
Mais adiante, ele poderá ainda aprender outros conceitos mais complexos, como as
classificações morfológicas (substantivo, adjetivo etc.) e sintáticas (sujeito, predicado etc.). É
necessária uma proposta curricular que sugere atividades de análise linguística que estejam
voltadas para a reflexão sobre a produção do texto, ajudando os alunos a melhorarem cada
Fonte: PHOTOS.COM
vez mais a forma de escrever.
MATEMÁTICA
Saber Matemática torna-se cada vez mais necessário
no mundo atual, em que se generalizam tecnologias e
meios de informação baseados em dados quantitativos
e espaciais em diferentes representações. Também
a complexidade do mundo do trabalho exige da
escola, cada vez mais, a formação de pessoas que
saibam fazer perguntas, que assimilem rapidamente
informações e resolvam problemas utilizando processos
de pensamento cada vez mais elaborados.
No ensino fundamental, a atividade matemática deve
estar orientada para integrar de forma equilibrada
seu papel formativo (o desenvolvimento de capacidades intelectuais fundamentais para a
estruturação do pensamento e do raciocínio lógico) e o seu papel funcional (as aplicações na
vida prática e na resolução de problemas de diversos campos de atividade). O simples domínio
da contagem e de técnicas de cálculo não contempla todas essas funções, intimamente
relacionadas às exigências econômicas e sociais do mundo moderno.
Como acontece com outras aprendizagens, o ponto de partida para a aquisição dos conteúdos
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
103
matemáticos deve ser os conhecimentos prévios dos educandos. Na educação de jovens e
adultos, mais do que em outras modalidades de ensino, esses conhecimentos costumam ser
bastante diversificados e muitas vezes são encarados, equivocadamente, como obstáculos
à aprendizagem. Ao planejar a intervenção didática, o professor deve estar consciente
dessa diversidade e procurar transformá-la em elemento de estímulo, explicação, análise e
compreensão.
Muitos jovens e adultos, pouco ou nada escolarizados, dominam noções matemáticas que foram
aprendidas de maneira informal ou intuitiva, como, por exemplo, procedimentos de contagem e
cálculo, estratégias de aproximação e estimativa. Alguns chegam a manejar, com propriedade,
instrumentos técnicos de alta precisão. Embora tenham um conhecimento bastante amplo de
certas noções, poucos são os que dominam as representações simbólicas convencionais,
cuja base é a escrita numérica. Esses alunos, ao entrarem na escola, demonstram grande
interesse em aprender os processos formais. Porém, é fato que eles não costumam abandonar
rapidamente os informais, substituindo-os pelos convencionais.
Resolução de Problemas
Para que a aprendizagem da Matemática seja significativa, ou seja, para que os educandos
possam estabelecer conexões entre os diversos conteúdos e entre os procedimentos informais
e os escolares, para que possam utilizar esses conhecimentos na interpretação da realidade
em que vivem, sugere-se que os conteúdos matemáticos sejam abordados por meio da
resolução de problemas.
Uma situação-problema pode ser entendida como uma atividade cuja solução não pode ser
obtida pela simples evocação da memória, mas que exige a elaboração e execução de um plano.
Não se pode confundir essa ideia com os problemas que são tradicionalmente trabalhados nas
salas de aula ou que aparecem nos livros didáticos, nos quais a situação é apresentada por
um texto padronizado que, por sua vez, evoca uma resposta também padronizada, como neste
exemplo: João tinha 35 reais, gastou 22 reais, com quanto ele ficou? 35 - 22 = 13.
104 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Explorar os conteúdos mediante questionamentos leva os alunos a estabelecerem conjecturas
e buscarem justificativas, o que pode ajudá-los a se dar conta do sentido das ideias matemáticas,
além de favorecer a capacidade de expressão. A resolução de problemas matemáticos na sala
de aula envolve várias atividades e mobiliza diferentes capacidades dos alunos:
• compreender o problema;
• elaborar um plano de solução;
• executar o plano;
• verificar ou comprovar a solução;
• justificar a solução;
• comunicar a resposta.
Ler, escrever, falar e escutar, comparar, opor, levantar hipóteses e prever consequências
são procedimentos que acompanham a resolução de problemas. Esse tipo de atividade cria
o ambiente propício para que os alunos aperfeiçoem esses procedimentos e desenvolvam
atitudes como a segurança em suas capacidades, o interesse pela defesa de seus argumentos,
a perseverança e o esforço na busca de soluções. A comunicação e a interação com os colegas
favorecem não apenas a clareza do próprio pensamento, mas as atitudes de cooperação e
respeito pelas ideias do outro.
Números e Operações Numéricas
Esse bloco de conteúdos engloba o estudo dos números naturais, de suas funções e
representações, das características do sistema decimal de numeração, dos números racionais
na forma decimal e fracionária; do significado da adição, subtração, multiplicação e divisão,
dos fatos fundamentais, dos diferentes procedimentos de estimativa, cálculo mental e cálculo
escrito.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
105
Medidas
Este bloco de conteúdos reúne conhecimentos de grande utilidade prática, que também
podem ser articulados com o estudo do espaço, das formas, dos números e das operações.
Os conteúdos deste bloco envolvem a noção de medida e de proporcionalidade, de unidade de
medida e das relações entre suas diferentes representações. Tais noções são desenvolvidas
a partir do estudo e utilização de diferentes sistemas de medida: tempo, massa, capacidade,
comprimento, superfície e valor (sistema monetário).
Geometria
O eixo “Geometria” trata da construção das noções espaciais por meio da percepção dos
próprios movimentos e da representação gráfica do espaço. As figuras bidimensionais e
tridimensionais são exploradas a partir da observação das formas dos objetos e também
de representações que possibilitam a identificação de semelhanças e diferenças, além de
algumas propriedades dessas figuras.
Introdução à Estatística
Aqui, reúnem-se conteúdos relacionados a procedimentos de coleta, organização, apresentação
e interpretação de dados, leitura e construção de tabelas e gráficos. Esses conteúdos, que não
costumam aparecer nos currículos de Matemática das séries iniciais, justificam-se pela sua
grande utilidade prática, como potentes recursos para descrever e interpretar o mundo à nossa
volta.
Basta abrir um jornal ou um livro didático de Geografia ou Ciências para constatar como é
frequente o uso dessas formas de apresentação e organização de dados e, portanto, como é
importante para os jovens e adultos poder compreendê-las.
106 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Fonte: PHOTOS.COM
ESTUDOS DA SOCIEDADE E DA
NATUREZA
O processo de iniciação dos jovens e adultos
trabalhadores no mundo da leitura e da
escrita deve contribuir para o aprimoramento
de sua formação como cidadãos, como
sujeitos de sua própria história e da história
de seu tempo. Coerente com este objetivo, a área de Estudos da Sociedade e da Natureza
busca desenvolver valores, conhecimentos e habilidades que ajudem os educandos a
compreender criticamente a realidade em que vivem e nela inserir-se de forma mais consciente
e participativa.
A complexidade da vida moderna e o exercício da cidadania plena impõem o domínio de certos
conhecimentos sobre o mundo a que jovens e adultos devem ter acesso desde a primeira
etapa do ensino fundamental. Esses conhecimentos deverão favorecer uma maior integração
dos educandos em seu ambiente social e natural, possibilitando a melhoria de sua qualidade
de vida.
Os caminhos para atingir esses objetivos são vários, assim como vários são os fenômenos
sociais e naturais que podem ser estudados. Nessa proposta, tratamos de organizar blocos de
conteúdos de modo a auxiliar os educadores na seleção, organização e integração de temas
a serem abordados.
A ordem em que esses blocos temáticos são apresentados não é necessariamente a que
deve ser seguida no desenvolvimento da atividade didática, uma vez que eles não estão
hierarquizados por grau de importância ou de complexidade. Caberá aos educadores, na
elaboração de seu plano de ensino, selecionar, recombinar e sequenciar conteúdos e objetivos
de acordo com as características de seu projeto pedagógico.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
107
O Educando e o Lugar de Vivência
São conteúdos que podem ter uma aplicação imediata, especialmente no desenvolvimento
de atitudes favoráveis ao convívio no centro educativo, na comunidade e no ambiente natural.
Esses conteúdos podem constituir pontos de partida para abordagens mais gerais sobre
a sociedade e a natureza, assim como para o desenvolvimento de algumas ferramentas
cognitivas básicas como as noções de espaço e tempo, a capacidade de observar, comparar,
classificar, relacionar, elaborar hipóteses etc. Igualmente, é válido abordar os conteúdos desse
bloco como pontos de chegada; por exemplo, depois de tematizar a organização política do
Estado brasileiro, refletir sobre a organização política da escola ou sobre a política do bairro.
O Corpo Humano e Suas Necessidades
Neste eixo, articulam-se conteúdos relativos ao conhecimento dos educandos sobre o próprio
corpo, seu esquema e aspecto externo, formas de relacionamento com o meio exterior,
mecanismos de preservação do indivíduo e da espécie. Destacam-se aspectos relativos à
nutrição, reprodução e preservação da saúde, visando fomentar atitudes positivas com relação
à manutenção da qualidade de vida individual e coletiva.
Propõe-se, ainda, que se abordem as necessidades das diferentes fases do desenvolvimento,
especialmente da infância, no sentido de promover uma educação voltada à paternidade e
maternidade responsáveis. O conceito de cultura é um dos principais elementos explicativos
da condição humana, da condição de um ser que é capaz de pensar, acumular conhecimentos
e transmiti-los às novas gerações.
Por esse motivo, esse conceito deverá emergir constantemente no trato dos conteúdos
desta área. Para desenvolver o sentido crítico dos alunos em relação aos conhecimentos, é
fundamental que eles reconheçam que, enquanto produtos culturais, os conhecimentos são
dinâmicos, transformam e diferenciam-se no tempo e de um grupo social para outro.
108 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Cultura e Diversidade Cultural
Nessa perspectiva, julgou-se pertinente ordenar um conjunto de conteúdos e objetivos
orientados especificamente para um enfoque pluralista de aspectos da cultura brasileira. Os
temas reunidos neste bloco, Cultura e diversidade cultural, também são fundamentais para
o aprendizado de atitudes de não discriminação e tolerância, respeito à pluralidade cultural
e étnica, às diferenças de credo, gênero e geração. Essas atitudes são essenciais para o
convívio democrático numa sociedade diversificada como a brasileira.
Os Seres Humanos e o Meio Ambiente
Neste eixo, articulam-se conteúdos que extrapolam as vivências imediatas dos educandos e
dão lugar à introdução da linguagem cartográfica (estudo de mapas) e sistemas conceituais
das ciências naturais e sociais. Destacam-se aspectos relevantes sobre as relações que se
estabelecem entre os seres vivos, em particular os seres humanos e o ambiente físico.
Questões relativas à degradação ambiental são relacionadas à atividade produtiva e
contextualizadas nos espaços urbanos e rurais. Como suporte à estruturação das noções de
tempo e espaço, inclui-se nesse bloco, em caráter introdutório, o estudo da Terra como corpo
celeste em movimento, ao qual estão associados fenômenos como o dia e a noite, as estações
e as marés.
As Atividades Produtivas e As Relações Sociais
Enfatizam-se relações que os seres humanos estabelecem entre si para a produção de sua
existência, além da nova qualidade que o trabalho humano adquire mediante o desenvolvimento
tecnológico. São introduzidas então periodizações históricas relativas à História do Brasil,
ampliando-se as possíveis conexões entre as atividades produtivas e outras dimensões da
cultura.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
109
Cidadania e Participação
Aqui, o foco é a dimensão política da vida humana, visando-se aprimorar a consciência cidadã
dos educandos. Aí estão implicados a adesão a valores democráticos e o conhecimento da
organização social e política do país, dos direitos políticos, sociais e trabalhistas que a posição
de cidadãos lhes confere, dos espaços e formas de organização e participação na sociedade.
Educação de Jovens e Adultos: Proposta curricular para o primeiro segmento do Ensino Fundamental.
Disponível em: <http://www.acaoeducativa.org.br/downloads/parte1.pdf>. Acesso em: 26 nov. 2010.
Histórias de jovens adultos2
por Gustavo Heidrich
Repórter
22/02/2008
Um panorama e a primeira história
Na edição de novembro de 2003, a NOVA ESCOLA trouxe um encarte especial sobre Educação de
Jovens e Adultos (EJA). Naquele ano, havia no Brasil 4,2 milhões de adultos nas salas de aula e
um quadro de escolarização com números alarmantes. Sessenta e cinco milhões de brasileiros não
haviam completado a Educação Básica. Desses, 30 milhões tinham até quatro anos de sala de aula e
outros 16 milhões eram analfabetos.
O encarte da revista NOVA ESCOLA celebrava o crescimento no número de matriculados no EJA.
De acordo com o censo escolar daquele ano, o número de frequentadores da Educação de Jovens e
Adultos havia crescido 12% em relação há anos anteriores. O governo federal consolidava programas
como a Alfabetização Solidária e o Fazendo Escola.
Confirmando os bons prognósticos, as matrículas na modalidade deram um salto para 5,6 milhões no
ano seguinte, mantendo-se nesse patamar até 2007, ano em que caíram para 4,9 milhões. A queda
pode ser parcialmente explicada pela mudança na metodologia do censo, que buscou reduzir as
duplicações de matrícula.
Com a entrada em vigor do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb),
que substituiu o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (Fundef), em
HEIDRICH, Gustavo. Histórias de jovens adultos. Nova Escola on-line. São Paulo: Abril, jul. 2008. Disponível em: <http://
revistaescola.abril.com.br/online/redatores/gustavo/20080222_posts.shtml> Acesso em: 20 nov. 2008.
2
110 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
2006, o EJA passou a ser contemplado com uma parte dos recursos, uma vez que a Lei de Diretrizes
e Bases (LDB), de 1996, determinou a classificação da Educação de Jovens e Adultos como categoria
de Ensino Básico, e não mais supletivo. Programas foram lançados, como o Brasil Alfabetizado, o
Proeja e o ProJovem, além de iniciativas da sociedade civil.
As altas taxas de evasão continuam a ser a grande batalha do EJA, que levam quase 70% dos ingressantes a não concluir os cursos. Faltam também didáticas específicas e estratégias de ensino voltadas
para esse público.
Os dados mais recentes sobre o analfabetismo no país são da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (Pnad), de 2006. Segundo ela, dos brasileiros com mais de 10 anos, 15 milhões são analfabetos. Um novo critério, o do analfabetismo funcional, entrou no cenário: 37 milhões de indivíduos
têm dificuldades para ler ou não compreendem um bilhete simples.
Dado o panorama, apresento o propósito desta coluna. Quero abordar, aqui, o debate de políticas
públicas sobre EJA, as boas práticas de educadores e instituições que oferecem essa modalidade de
ensino, mas, sobretudo, contar boas histórias sobre a Educação de Jovens e Adultos. Deixo vocês, a
seguir, com a primeira, da paulista Gislene Gonçales.
Minha história, por Gislene Gonçales
Minha paixão pela Educação começou no nome. Explico. Meus pais eram analfabetos e eu nunca
soube como era meu nome completo. Eles sempre me chamavam por apelido. Fui conhecer meu
nome verdadeiro na sala de aula de uma escolinha na Fazenda Bom Princípio, onde nasci, em Mirassol, no interior de São Paulo.
Eu cresci na roça. Ainda bebê, meus pais estendiam um pano embaixo dos cafezais onde me vigiavam enquanto trabalham na plantação do patrão. Aos cinco anos, comecei a ajudar trabalhando na
limpeza dos cafezais com enxada. Minha infância foi dividida entre os afazeres da casa e a lida diária
no campo. Ia à escola no tempo que sobrava. Adorava a sala de aula e ficava triste toda vez que não
tirava um 10.
Era uma vida de trabalho e sem fartura, mas livre. Tudo mudou quando eu estava para concluir a
quarta série. Minha irmã mais velha se suicidou. Meus pais ficaram muito abalados e adoeceram.
Acabaram se mudando da fazenda para a cidade, levando a família. Meus outros irmãos mais velhos
se casaram e as contas e a responsabilidade da casa passaram para mim, que tinha 10 anos, e meu
irmão Paulinho, de 12.
Tive que parar de fazer o que eu mais gostava: ir à escola. Comecei a trabalhar em período integral
como babá e fazendo faxinas. Persisti, porque sempre tive fé que, às vezes, temos que percorrer um
caminho na vida até conseguirmos as coisas boas que queremos. Mantive a casa ao lado do meu
irmão, que trabalhava consertando bicicletas e numa fábrica de móveis. Com 15 anos me casei com
um metalúrgico de 24. Aos 16 tive o primeiro filho, o Willian e aos 18 uma menina, a Evelin.
Quando fiz 19, meu pai morreu e resolvi me mudar para Campinas. Era a primeira vez que saia de
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
111
Mirassol e foi assustador chegar numa cidade grande sem emprego e sem amigos e com dois filhos
pequenos para criar, mesmo que tivesse apoio do meu marido.
Comprei em uma banca de revistas um modelo de currículo e preenchi sozinha, mesmo tendo pouca
prática na escrita e vocabulário ruim. Distribui em hospitais, casas de família, lojas, universidades.
Procurava uma vaga de copeira, faxineira, algo sim. Sabia que, naquele momento, não podia querer
muito.
Passamos aperto, até que conseguisse um emprego. Morávamos num cortiço com banheiro coletivo e
pagávamos o aluguel com dificuldade. Finalmente, dois meses depois, consegui uma vaga de diarista
na casa de dois professores universitários. Era a Educação cruzando meu caminho.
Eles me receberam mesmo sem ter nenhuma referência, porque contei minha história e eles perceberam minha vontade de crescer. Com o tempo nos tornamos amigos e eles sempre me incentivavam
a procurar um emprego melhor, estudar, porque sentiam que eu tinha capacidade.
Ficaram muito felizes quando consegui uma vaga como faxineira na Unicamp, para ganhar mais do
que eles podiam me pagar. E disseram que eu poderia voltar a qualquer momento. Imagina, o emprego era justamente na Faculdade de Educação!
Lembro do primeiro dia em que pisei na universidade. Me encantava ver todos aqueles alunos e
professores discutindo, lendo. Passou a ser um hábito ficar na soleira das portas das salas para ouvir
algum pedaço de aula. Adorava também sentir o cheiro dos livros quando ia limpar tudo.
Minha rotina era puxada. Limpava os banheiros, pátios, salas de aula. Cuidava, ainda, da manutenção
dos jardins.
Queria mudar - Tinha feito até a quarta série na roça, então conseguia ler e escrever mesmo com
um pouco de dificuldade e meu vocabulário era muito limitado. Tinha também muitos vícios da fala
do campo. Por exemplo, ainda falava “bassoura” em vez de “vassoura” e “cuié” em vez de “colher”.
Nunca tive problema em fazer amigos e acabei conhecendo muita gente na universidade. Tive amizades com professores, alunos, outros funcionários. Quando conversava, sentia que não conseguia
discutir com aquelas pessoas no mesmo nível. Faltava vocabulário, leitura, capacidade para me expressar mesmo, sabe? Tinha parado a escola muito cedo. Resolvi que ia mudar isso.
Por vontade própria, me matriculei no programa de Ensino de Jovens e Adultos (EJA) da Unicamp.
Nessa altura já tinha 23 anos, os filhos estavam mais grandinhos. O maior tinha 8 anos e a menor 6.
Voltei, então, para a sala de aula.
Nossa, foi muito emocionante! Pensar que a última vez que eu tinha assistido uma aula e sentado
numa carteira de escola tinha sido aos 10 anos! Completei o Ensino Fundamental e o Ensino Médio
em seis anos. Foi um dos períodos mais felizes da minha vida. Adorava ver minhas redações destacadas no mural da sala. Fui muito acolhida pelos professores e isso é fundamental no EJA. Imagina,
você sai menina e volta mulher! É preciso muito carinho, atenção. Voltei a ser criança, crescendo com
meus erros e acertos, sendo corrigida. Acho que não importa a idade, todo mundo precisa disso.
112 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
No meio do caminho, me separei do meu marido e fiquei com a guarda dos filhos. Ele nunca pagou
pensão e tive que segurar as pontas sozinha. Assim que me formei, fiz um concurso para técnico
administrativo da Unicamp e fui aprovada em primeiro lugar. De lá, consegui uma promoção em 2003
e hoje sou uma das chefes na Secretaria de Pós-Graduação da universidade, que é uma das maiores
do país.
Comando uma equipe de 6 técnicos e estagiários. Cuido da matrícula, de relatórios oficiais e distribuo
as tarefas, faço tudo no computador. Me formei em nível superior em Recursos Humanos e fiz um
curso técnico em Informática, com bolsa paga como mérito pelo meu desempenho no trabalho. Trabalho no mesmo prédio onde fui faxineira.
Nunca descuidei da Educação dos meus filhos, apesar de todas as dificuldades. Eles estudaram em
escola pública, mas nunca repetiram nenhum ano. Meu filho está com 19 anos e está fazendo faculdade de Logística, para trabalhar na administração de fábricas. Minha menina está com 17 anos e
terminando o Ensino Médio. Ela está decidindo entre Biologia e Pedagogia. Faço questão sempre de
chamá-los pelo nome, nunca por apelidos como meus pais me chamavam.
Minha mãe morreu há quatro anos e um dos maiores orgulhos dela era contar para as amigas que a
filha tinha se formado e trabalhava na universidade. Isso era uma grande conquista para ela que era
analfabeta.
Minha próxima meta é fazer um mestrado em Pedagogia. Quero trabalhar com Educação de Jovens
e Adultos.
As pessoas dizem que fui muito corajosa e sou especial. Não acho. Todo mundo tem capacidade e, se
falta oportunidade, basta querer. Nunca é tarde para correr atrás.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao término dessa unidade, você deve ter percebido que a escolarização passou a ser uma,
entre outras, pré-condições para sobreviver na lógica da sociedade capitalista. O povo é
obrigado a trabalhar para sobreviver e tem de lutar pelos instrumentos que o conduza até o
trabalho.
A escola é um desses instrumentos. Entretanto, deparamos com a contradição: o mesmo
trabalho que exige do indivíduo um certo nível de escolaridade, muitas vezes é responsável
pela evasão escolar, pois o educando jovem ou adulto, encontra dificuldades de conciliar os
estudos com as atividades profissionais da qual, na maioria dos casos, provem sua subsistência.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
113
Nos últimos anos, o Ministério da Educação preocupado com o analfabetismo, investiu uma
quantia significativa na educação de jovens e adultos e lançou campanhas para estimular a
população evasiva a voltar para a escola.
Porém, conseguir a permanência dos inscritos até a conclusão, pelo menos do ensino
fundamental é um grande desafio para o professor. A evasão se dá por diversos motivos:
dificuldades financeiras, doenças, mudanças de bairro, cansaço devido ao trabalho e
desinteresse pelo curso, o que na maioria das vezes demonstra o despreparo do professor
que não oferece recursos atrativos capazes de prender o aluno na sala de aula. É evidente
que a qualidade da educação de jovens e adultos não depende da boa vontade de voluntários
dentro da unidade escolar, ou de instituições solidárias.
É necessária a formação de políticas que priorizem de fato a qualidade desta modalidade de
ensino. Que garantam a contratação de profissionais qualificados, formados especificamente
para este fim. O grande especialista, inovador na educação de jovens e adultos, Paulo Freire, há
décadas já condenava a utilização de métodos infantilizados na alfabetização dos educandos.
A qualidade do educador e dos métodos utilizados na educação de jovens e adultos influencia
muito na permanência ou não do aluno em sala de aula. Abordar temas pertinentes à realidade
do aluno, fazer conexões entre as disciplinas e suas relações culturais, econômicas e sociais,
é primordial para prender a atenção do aluno, pois torna o aprendizado mais atraente,
despertando o seu interesse, e fazendo com que descubra na educação um verdadeiro
significado, um poder transformador da sociedade e de sua própria vida.
114 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
ATIVIDADE DE AUTOESTUDO
1) Apresente a diferença entre alfabetização e letramento.
2) Quais as áreas de conhecimento em que é importante contemplar uma proposta curricular
para a EJA? Resuma o que aprendeu sobre a importância de cada uma delas.
3) Entreviste um adulto em processo de alfabetização e identifique qual a visão dele sobre a
escola.
O letramento pode atuar indiretamente e até influenciar culturas e indivíduos que não dominam a
escrita.
(TFOUNI, 1995, p. 38).
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
115
UNIDADE IV
ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS:
O PROCESSO DE AVALIAÇÃO
Professora Me. Márcia Cristina Greco Ohuschi
Professora Me. Dalva Linda Vicentini
Objetivos de Aprendizagem
• Compreender os motivos que levam os jovens e adultos a (re)iniciarem seus estudos.
• Refletir sobre o ensino e aprendizagem na educação de jovens e adultos.
• Compreender a importância do processo de avaliação para o ensino e a aprendizagem do Jovem e Adulto
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nessa unidade:
• Os significados da alfabetização
• Os motivos que levam os Jovens e Adultos a frequentarem a escola
• A avaliação na Educação de Jovens e Adultos
INTRODUÇÃO
Aprender exige tempo, paciência e participação em situações reais de interlocução, você
concorda comigo? O aluno aprende a ler e a escrever interagindo com pessoas e com “objetos”
escritos. Desse modo, quanto maior for sua familiaridade com a língua escrita (jornais, livros,
poemas etc.) e sua reflexão sobre os modos e usos da linguagem escrita, maior será a
probabilidade de que rapidamente compreenda o funcionamento deste complexo sistema de
representação que é a escrita.
Nessa unidade, buscamos, primeiramente, compreender os significados da alfabetização para
aqueles que a buscam na fase jovem ou adulta de suas vidas. Em seguida, refletimos sobre
o ensino e a aprendizagem na EJA. Após, apresentamos a importância da avaliação nesta
modalidade de ensino.
OS SIGNIFICADOS DA ALFABETIZAÇÃO
Para iniciar o trabalho com essa unidade, gostaria de fazer a você algumas perguntas: Quais
fatores levam jovens e adultos a iniciarem ou reiniciarem seus estudos?
Muitos são os fatores que contribuem com essa busca pela escolarização, entre elas, tomar
um ônibus, escrever cartas, ler a Bíblia etc. é o desejo de muitos jovens e adultos não
escolarizados.
Normalmente, o analfabetismo é visto por eles como uma mancha, que os impede de progredir
social ou economicamente e, por isso, sentem-se culpados. Garcia (2005) realizou uma
pesquisa em que mostra os diferentes significados da alfabetização para jovens e adultos. A
partir de relatos de alunos, a pesquisadora categorizou esses significados em:
• Alfabetização como busca de emprego.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
119
• Alfabetização como valorização da imagem social.
• Alfabetização como prazer em aprender.
• Alfabetização como exercício da cidadania.
• Alfabetização como uso da norma-padrão da língua.
Alfabetização Como Busca de Emprego
Na realidade social em que vivemos no Brasil, com os altos índices de desemprego, é
necessário que as oportunidades de emprego se definam em função da escolarização, como
observamos no relato de um dos sujeitos da pesquisa de Garcia:
[...] pra trabalhar na Comlurb, para colher lixo na rua tem que ter o 2º. grau ou senão a
4ª. série, 5ª. série... E qualquer servicinho que vai fazer hoje tem que ter a 5ª. série, né!?
[...] Eu não consegui trabalhar em prédio porque eu não sei assim anotar recado, essas
coisas de portaria, né? Aí tem que encarar esse serviço [...] É muito difícil hoje em dia,
pra viver sem estudo tá difícil. (PAULO, 46 anos, gari) (GARCIA, 2005, p. 5).
Para atender a essas expectativas, conforme Soares (2002, p. 73, apud GARCIA, 2005, p.6),
A escola precisa estar comprometida com a luta contra as desigualdades para assim
garantir a aquisição dos conhecimentos e habilidades que possam instrumentalizar as
classes populares para que elas participem no processo de transformação social, ou
seja, uma escola transformadora, que dê aos alunos condições de reivindicação social.
Alfabetização Como Valorização da Imagem Social
De acordo com Garcia (2005), alguns dos alunos entrevistados demonstram o que os motiva
a estudar é o desejo de serem reconhecidos pelos outros:
Trabalhei de 1985 até o ano 2000 no grupo Gerdau, saí aposentado. Descansei um
pouco, achei que era tempo de voltar ao colégio para tentar cumprir um sonho que
sempre, quando iniciei, eu iniciei com esse sonho... Forçar, ver se consigo chegar a
eletro-técnico [...] Se a senhora me der um esquadro, eu esquadreio um prédio desse,
mas não posso assinar um projeto. Eu sei com qual material começa e como termina.
Mas como vou assumir se não tenho a base para assinar um papel? Não posso.
(...).(DALTO, 51 anos, aposentado) (GARCIA, 2005, p. 6).
120 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Alfabetização Como Prazer em Aprender
Segundo a autora, outros alunos querem mostrar para si mesmos que são capazes de
aprender, como observamos no seguinte relato:
Eu hoje estou aposentado [...] mas é muito importante a gente aprender cada vez mais.
Enquanto estou vivo, vou aprendendo cada vez mais porque abre espaço para novos
relacionamentos [...] Cada vez eu me aprofundo mais. O meu grupo aí é o terceiro. Eles
acham que eu sou muito sabido, mas não sou. Eu procuro me aprofundar e vou embora.
Enquanto estiver vivo vou, entendeu? [...] Eu já com essa idade... os mais jovens então,
esses adolescentes então têm que se aprofundar [...]. (ANTÔNIO, 70 anos, aposentado)
(GARCIA, 2005, pp. 6-7).
Antônio sente prazer em aprender, enfatizando o quanto é importante para ele aprender e
que os demais alunos sempre se referem a ele como aquele que sabe mais. Assim, a autora
aponta para o fato de o saber comportar também uma dimensão de identidade. Para Garcia
(2005), Antônio está se construindo enquanto sujeito nesse processo de aprendizagem.
Alfabetização Como Exercício da Cidadania
Para a pesquisadora, muitos voltam a estudar para ter uma participação social mais ativa, pois
não quer depender dos outros para as situações do dia a dia:
Eu quero falar que estou muito satisfeito com o estudo. Eu quero continuar porque é
muita dificuldade a gente ler o nome de uma rua, uma vista de um ônibus, entendeu?
Porque por muitas das vezes eu passei dificuldade de chegar numa loja, comprar assim
um rádio, umas coisas assim, uma roupa, que pedia pra assinar o nome, coisa e tal que
eu não sabia e agora graças a Deus que hoje em dia eu sei fazer esse tipo de coisa,
sei ler, sei escrever, não é tanto, um pouco [...] (SIMÃO, 32 anos, lancheiro) (GARCIA,
2005, p. 7).
Alfabetização Como Uso da Norma-padrão da Língua
Conforme Garcia (2005), muitas pessoas sentem-se inibidas pelo fato de utilizarem uma
variedade linguística diferente, como observamos no relato da aluna Neida:
Você vai numa festa cheia de gente falando bem e você fica lá, sentado. Aí perguntam:
-“Por que você não fala”? – Ah, eu não quero falar não. -“Ah, mas por que não quer
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
121
falar não”? Mas só você sabe por que você está com vergonha de falar, né? Então você
estudando, não, você vai aprendendo, vai desenvolvendo, vai falando um monte de
coisa. (NEIDA, 34 anos, doméstica) (GARCIA, 2005, p. 8).
Dessa forma, é preciso levar em conta a diversidade linguística com que os alunos chegam à
escola e colocá-los em contato com outras variedades, inclusive a padrão, mostrando-lhes que,
dependendo da situação comunicativa, eles poderão se dispor de uma ou de outra variedade.
Assim, não podemos aceitar o preconceito linguístico, que, segundo Britto (2003, p. 39, apud
GARCIA, 2005, p.9), não tem sido combatido: “Quando se ridiculariza em público uma pessoa
por seu jeito de falar, o agente do preconceito é avaliado positivamente, como se fosse culto,
inteligente, enquanto o agredido é avaliado negativamente, como se fosse ignorante, estúpido”.
Alfabetização Como Busca de Mais Convivência Social
Como nos mostra a pesquisa de Garcia, há aqueles que retornaram aos estudos para
preencher o tempo, suprindo um vazio, o que pode ser observado nos seguintes relatos:
[...] Porque eu já sei ler, escrever, eu já sei tudo, então como eu fico muito em casa,
assim, à noite, então eu achei melhor, em vez de ver novela, né! Então agora, nessa
idade, é que eu resolvi estudar para aprender mais, mais é conta, o resto das coisas
eu sei, entendeu? [...] todo mundo até pergunta: nem parece que você nem estudou o
segundo ano, porque eu sempre fui muito desembaraçada. (STELA, 53 anos, manicure)
(GARCIA, 2005, pp. 9-10).
Fonte: PHOTOS.COM
Então agora eu sou viúva, fiquei sozinha, só com meu filho. Meu filho sai pra trabalhar...
mas ficar sozinha é muita solidão, aí passei a voltar pra estudar, pra eu sair dessa,
entendeu?(ZILÁ, 52 anos, passadeira) (GARCIA, 2005, p. 10).
O ENSINO E A APRENDIZAGEM NA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
O conhecimento resulta de uma motivação
dos seres humanos para explicar o mundo
e a si mesmos, bem como uma forma para
122 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
responder aos desafios que o ambiente lhes propõe. Desde que nascemos, temos por
característica universal o desejo de conhecer, de explicar o que é percebido. Foi esse desejo
que impulsionou, e continua a impulsionar, as grandes descobertas da humanidade, as belas
produções artísticas, literárias e os avanços da ciência e da tecnologia.
Antes mesmo de ter acesso a conhecimentos considerados oficiais ou formais, cada um
de nós cria, pela própria experiência concreta, explicações para os fenômenos naturais,
sociais e culturais. Nossas teorias particulares são, inclusive, a porta de acesso a outros
novos conhecimentos. Sendo assim, cada aluno é um sujeito repleto de saberes. Saberes
particulares, diversos, nascidos da interação com o meio físico, familiar, da experiência com
o trabalho, do fazer e dos papéis sociais que cada um de nós desempenha em cada fase da
vida.
Visto dessa forma, entendemos o conhecimento como resultado de uma interação entre o
sujeito e o meio externo: aprendemos com as pessoas com as quais convivemos, com o que
fazemos e com o que acontece ao nosso redor. Trata-se de um constante ir e vir da informação
externa com os conhecimentos de que já dispomos.
O(a) aluno(a) jovem e adulto chega à sala de aula repleto de teorias, explicações e hipóteses.
Sua família, a comunidade onde vive, seu trabalho e sua religiosidade permitiram-lhe
construir um sem-número de saberes. Cabe ao(à) professor(a) descobrir qual é esse corpo de
conhecimentos, feito de pura experiência e percepção para, a partir dele, convidar seus alunos
a acederem outras formas de pensar, explicar, fazer e agir.
Essa visão de conhecimento pressupõe, então, um aprendiz ativo e pensante, capaz de elaborar
conhecimentos. Transformar a sala de aula da EJA num espaço de reflexão, de pensamento,
nem sempre é uma tarefa fácil. Numa sociedade tão hierarquizada como a brasileira, nossos
alunos e alunas, geralmente, desenvolvem as ocupações mais subalternas, nas quais o que
mais se tem a fazer é obedecer a uma série de chefes, patrões, gerentes.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
123
Treinados a seguir orientações, não é de estranhar que ao chegarem à escola desejem
encontrar atividades em que predominem a cópia, a repetição do que disse o(a) professor(a) e
outras situações do mesmo tipo. Pensar e tomar decisões é bem diferente e dá muito trabalho,
principalmente para quem tem pouco exercício dessa prática. Entretanto, como queremos
formar cidadãos críticos e atuantes, não podemos esquecer que, provavelmente, a EJA é o
único espaço na vida desses alunos onde a prática de pensar de forma organizada tem lugar.
É uma imensa responsabilidade alcançar este objetivo! A entrada, muitas vezes precoce, no
mundo do trabalho e a experiência social fizeram com que esses alunos acumulassem uma
bagagem rica e diversa de conhecimentos e formas de atuar no mundo em que vivem.
A escola representa para eles um espaço ao mesmo tempo de recolocação social, de
sociabilidade, de formalização do saber e de desenvolvimento pessoal. Nesse sentido, os
alunos jovens e adultos diferem, em muitos aspectos, das crianças, e isto deve ser sempre
considerado. Esses alunos precisam ver na escola um espaço que atenda suas necessidades
como pessoas, cidadãos e aprendizes em potencial. De sua parte, vão para a sala de aula
ávidos por aprender.
É preciso repensar horários de entrada e saída, os tipos de tarefas extraescolares, as
exigências em torno da frequência, as propostas feitas que não conseguem manter os alunos
motivados e atuantes, de tal modo que estar na escola a despeito do cansaço, do adiamento
de outros compromissos e da ausência na família seja realmente importante e indispensável.
Defendemos, nesse sentido, uma escola voltada, de fato, para seus alunos, no conteúdo e na
forma em que se propõe a ensinar.
Devemos trabalhar para que, além de tornarem-se companheiros nessa busca pelo saber,
os alunos de um mesmo grupo tornem-se parceiros, reais colaboradores comprometidos a
chegar juntos ao seu objetivo. Um grupo se constrói pela constância do diálogo, pela produção
em equipe, pela expressão individual, garantindo o direito à voz.
Na sala de aula, o(a) professor(a) é aquele(a) que provoca e facilita esse diálogo, essa produção
124 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
e essa expressão individual. Ele(a) auxilia na resolução dos conflitos, favorece as trocas e as
ajudas mútuas. Nas classes de EJA, a homogeneidade quanto à origem muitas vezes facilita a
aproximação das pessoas e a construção de elos entre elas. E dessa homogeneidade podem
nascer os temas de estudo que vão unir e integrar o grupo. Por outro lado, a diferença de idade
dos alunos e a diversidade de crenças, de valores e gênero podem constituir, inicialmente,
obstáculos à formação do grupo.
É muito comum que os mais velhos critiquem os mais jovens e que estes se recusem a trabalhar
com aqueles. É comum, também, que pela crença religiosa alguns alunos não aceitem realizar
determinadas propostas, como assistir a um filme, aprender matemática por meio de jogos, e
que essa postura desencadeie conflitos entre estes e outros alunos. Acontece, ainda, de as
mulheres não gostarem de formar grupo com homens, temendo o ciúme de seus companheiros.
Essas resistências dos alunos constituem muitas vezes obstáculos à vida em grupo e à
aprendizagem, mas à medida que todos vão se conhecendo melhor, a situação vai se
modificando e o sentimento de grupo vai nascendo e se fortalecendo. Entretanto, para que a
sala de aula se torne um espaço verdadeiro de trocas e aprendizagens, é fundamental a forma
de agir do(a) professor(a).
É ele(a) que ajuda a quebrar as barreiras dos preconceitos e cria situações de estreitamento
de amizade entre todos. É aquele(a) que propõe situações que aproximam, diminuem a
distância entre as idades, as crenças, os valores. É experimentando participar de um grupo
que os alunos descobrem que juntos sempre é possível aprender melhor. O(a) professor(a)
desempenha também um papel importante quando evidencia a potencialidade do grupo ao
mesmo tempo em que garante a expressão individual.
Para alcançarmos estes objetivos é importante repensarmos a organização das carteiras
em sala de aula, propor rodas de conversas, organizar mapas do grupo, promover encontros
culturais.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
125
Hoje sabemos que cada pessoa dispõe de algumas portas de acesso à aprendizagem: os
temas, a forma de trabalhar e as atividades ora interessam e facilitam a aprendizagem de
algumas pessoas, ora de outras. É comum, em um grupo, existirem alunos com facilidade
especial para escrever e que, diante de uma proposta matemática, apresentam grandes
dificuldades.
Há aqueles que se saem melhor em situações que requerem uso da lógica; há outros
que circulam com sucesso por atividades mais convencionais, como realizar operações
matemáticas. Daí a importância das atividades propostas, num mesmo dia ou ao longo de
uma semana, serem diversificadas. Se propusermos seguidamente o mesmo tipo de situação
didática, corremos o risco de favorecer apenas uma parte de nossos alunos. Além disso, a
diversidade permite que os alunos acompanhem um mesmo conteúdo sob diferentes olhares,
por diferentes caminhos, o que permite a eles ter uma visão mais global sobre o que estão
aprendendo.
Por fim, é preciso considerar que os alunos da EJA chegam à escola, todos os dias, depois de
uma jornada de trabalho e que a diversidade pode contribuir para o dinamismo da aula, para
o despertar do interesse, da atenção e do envolvimento. É bom lembrar que diversificar as
atividades, na rotina da sala de aula, não significa ter a responsabilidade de criar uma novidade
a cada aula, a cada dia. Falamos de uma diversidade de caminhos, tempos, lugares e de olhar;
pensamos numa aula onde a lógica didática mais tradicional dê lugar à experiência inteira do
aprender: ver, agir, pensar, fazer, experimentar, com todos os sentidos acionados.
A Avaliação na Educação de Jovens e Adultos
De uma maneira bem objetiva, o(a) professor(a) observa tudo que considera importante para
iluminar a sua prática, tudo que chama sua atenção, que faz pensar e querer saber mais.
Uma pergunta feita a um grupo de professores da EJA sobre o que costumam “ver” nos seus
alunos, teve variadas respostas. As mais frequentes foram: A observação que está sendo alvo
126 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
da nossa atenção vai além desse ver espontâneo: quer saber mais para interferir melhor. No
fundo, todo(a) professor(a) observa seus alunos de alguma forma. Entretanto, na maioria das
vezes, são observações espontâneas que quase nada mudam na prática que fazem.
- ser muito quieto;
- ser bom aluno;
- não querer se esforçar;
- ter boa aparência;
- ser muito educado;
- o interesse;
- o desinteresse;
- o hábito de fazer muitas perguntas;
- o hábito de nunca perguntar;
- o fato de ser barulhento.
De uma maneira bem objetiva, o(a) professor(a) observa tudo que considera importante para
iluminar a sua prática, tudo que chama sua atenção, que faz pensar e querer saber mais.
Como ferramenta básica do seu fazer, a observação está presente nas diferentes atividades
de um(a) professor(a): na busca de compreender cada vez melhor seus alunos.
Neste sentido, a observação busca saber como trabalham na sala de aula, quais seus
interesses, suas dificuldades e facilidades, sua forma de relacionar com os colegas, com o(a)
professor(a) e suas características pessoais: timidez, tranquilidade, agitação, concentração,
habilidades, sua forma de pensar.
Na avaliação do que sabem os alunos
A observação contribui para a análise das hipóteses que quer provar, no que parece
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
127
incompreensível, no que é só intuição.
No acompanhamento do planejamento
Ao acompanhar o desenvolvimento das ações planejadas, o(a) professor(a) avalia sua própria
ação, notando os aspectos onde planejou de acordo com a realidade de sua classe e nos
momentos onde se afastou dela.
No registro do(a) professor(a)
A observação cumpre um papel relevante ao contribuir para a percepção da realidade - objeto
do registro do(a) professor(a). Ela faz notar o que não aparece com evidência e que exige
saber ver, ouvir e interpretar. É possível concluir que a observação é elemento importante
nos atos de registrar, avaliar e planejar, instrumentos metodológicos de todo(a) professor(a).
Como instrumento de formação do(a) professor(a), a capacidade de observação ocupa um
lugar-chave na possibilidade de aperfeiçoamento da prática pedagógica. É sua principal fonte
de informação.
É mediante um diagnóstico constante das atuações de seus alunos, a partir das informações
que tem, do que infere ou interpreta, que o(a) professor(a) pode alcançar uma melhoria em sua
prática educativa. Embora saber observar seja uma necessidade verdadeira, ela não é tudo.
Além de observar é importante:
- saber o que fazer com o que se observa;
- ampliar os conhecimentos em relação ao que é observado;
- saber mudar os aspectos negativos de tal forma que não impeçam o avanço dos alunos.
Para isso, é preciso saber o que falta ao(à) aluno(a) e qual é a melhor forma de intervir
adequadamente. Só é possível aprender a observar, observando. Não há outro caminho.
O mesmo acontece com todas as outras práticas. Mas além do exercício de observar, o(a)
professor(a) aprende quando comenta suas observações com outros professores. O mesmo
128 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
acontece quando, na sua escola, existe um coordenador com o qual pode dialogar em torno da
sua forma de observar. No olhar de um(a) professor(a), se destacam três pontos de observação:
- O da sua atuação como guia dos alunos na busca do conhecimento.
Questões relativas ao que o(a) aluno(a) percebeu que aprendeu; o que lhe foi mais significativo; em que aspecto quer aprofundar o estudo, como foi sua participação no grupo.
- O da dinâmica onde ele(ela) percebe as relações estabelecidas entre os elementos do
grupo e entre o grupo e o seu objeto de estudo.
Entre esses elementos destacam-se a tensão em torno do erro, o prazer de conhecer e de
ajudar o outro.
- O do aprendizado individual e/ou coletivo, onde seu olhar vai procurar o que foi mais significativo aprender para os alunos e para ele(ela).
Nesse ponto, pode ser objeto de observação do(a) educador(a) a forma como trabalhou, como
respeitou os diferentes ritmos dos alunos e como socializou suas descobertas com os outros
professores e professoras.
Observar os três pontos, ao mesmo tempo, cria uma complexidade que acaba interferindo no
próprio ato de observar, principalmente, quando se está no começo dessa prática. Assim, é
preferível escolher um dos aspectos para observar.
Para um bom exercício de observar, vale a pena:
- Ter um caderno com algumas páginas dedicadas a cada um dos alunos. Nele serão anotados os fatos significativos que caracterizam a forma de aprender, de conviver de cada um,
com as datas das observações.
- Dar atenção às perguntas feitas pelos alunos. Elas sempre têm um sentido para quem
pergunta.
- Em algumas situações, onde o fazer pode dizer mais que o falar ou escrever, é interessante se valer de outras linguagens para apresentar questões significativas para o grupo.
O desenho, as dramatizações, os painéis são bons exemplos destas linguagens.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
129
O Registro
Uma das formas que temos para ir sempre aprendendo mais e melhor é pensar. Mas, o pensar
que ajuda a aprender não é um pensar qualquer, solto sem uma direção e sem compromisso.
É um pensar organizado, um pensar que pergunta e vai atrás das respostas.
Dizia o grande educador brasileiro, Paulo Freire, que a gente pensa melhor quando pensa a
partir do que faz, da prática. Mas pensar sobre a prática sem registrá-la tem muitas limitações.
O pensamento acaba se tornando mais uma lembrança, e por ficar só na oralidade, perde a
possibilidade de ser repensado e revisto. O registro escrito mostra o pensamento de seu autor.
O próprio ato de escrever já leva o(a) professor(a) a um certo distanciamento do seu fazer,
dando-lhe um olhar mais amplo e facilitando a escrita do seu pensamento.
Além disso, como toda escrita, o texto pode ser revisto, ter algumas das suas ideias
aprofundadas e outras corrigidas. Tudo isso faz com que o(a) professor(a), ao registrar suas
reflexões, vá se tornando autor(a) do que pensa e, em consequência, autor(a) do seu jeito
de fazer. Quando isso não ocorre, ele(a) está destinado(a) a ser um(a) copista da teoria dos
outros. E, pior: se a teoria dos outros não for refletida, os copistas não alcançarão os sucessos
obtidos pelos seus autores.
É importante dizer que as teorias dos outros são de grande validade para o(a) professor(a)
quando estabelece um diálogo entre seu pensamento e o dos outros teóricos. Diálogo que,
certamente, será muito produtivo no avanço do pensar do(a) professor(a) e, consequentemente,
no seu jeito de atuar. É próprio dos seres humanos registrarem o que vivem, o que pensam e
a realidade onde se encontram.
Escritos ou não, todos os registros falam das experiências humanas e por meio deles é
possível reconstruir a própria história da humanidade. Os registros expressam como seus
autores observam, sentem e pensam sua participação no mundo. Quando temos contato com
esses registros, nosso modo de olhar e de sentir “conversa” com o do autor e com os dos
130 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
outros leitores compondo uma memória que deixa de ser só de quem fez o registro, para se
tornar coletiva. O registro escrito guarda partes do nosso tempo que consideramos dignas de
permanecerem vivas.
Afinal, é graças ao registro escrito que hoje podemos conhecer a história da humanidade. Para
o(a) professor(a), o registro da sua prática constitui importante instrumento de aperfeiçoamento
do seu trabalho. Isso acontece porque ao registrar, representa sua experiência por meio de um
objeto concreto, feito de palavras, que podem ser lidas, revisadas e analisadas. Trabalhando
com essa representação, ele(a) é estimulado(a) a repensar a prática ali representada.
Poderá descobrir atitudes que deveriam ter sido tomadas, destacar as alternativas adequadas
que foram utilizadas e todo um conjunto de procedimentos que levariam a melhores resultados.
Além disso, o registro da prática do(a) professor(a) quando comunicado a outros educadores
sugere novas práticas pedagógicas.
Mesmo sabendo da importância do registro, poucas vezes o realizamos. Isso tem seus motivos:
a cultura brasileira é essencialmente oral, falamos muito mais que escrevemos e confiamos a
nossa memória a capacidade das nossas cabeças de armazenar o que aprendemos e vivemos.
O exercício da escrita, como registro das observações feitas pelos professores, além de
documento que pode ser consultado, possibilita também ampliar o domínio da linguagem
escrita e dinamizar o potencial de criatividade próprio de cada um. As prováveis dificuldades
iniciais quanto ao que e como escrever, falta de inspiração e descoberta dos momentos mais
adequados para começar serão minimizadas no decorrer do processo, a medida que seja
criado maior envolvimento com o ato de registrar.
As Diferentes Formas de Registrar
Imaginemos que estamos iniciando um encontro de professores de jovens e adultos. Nos
primeiros momentos, entre abraços e conversas informais, alguém retira de sua pasta várias
fotos onde aparece seu grupo de alunos, numa apresentação de trabalhos. Outra professora
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
131
mostra uma atividade que preparou e que deu muito certo naquela semana.
Noutra rodinha, podemos ouvir uma conversa animada sobre o envolvimento dos alunos numa
produção de cartazes que são mostrados com muito orgulho. Estes são alguns exemplos de
situações nas quais os professores estão, informalmente, socializando experiências que foram
registradas de diferentes maneiras: uma foto, uma produção de aluno, um relato oral, uma
atividade que deu certo.
Ao fazer isso, eles exercitam sua comunicação e assim refletem, rememoram e partilham
o seu fazer. O registro permite uma diversidade de funções e está a serviço de diferentes
propósitos: comunicar, documentar, refletir, organizar, rever, aprofundar e historicizar. A forma
e o conteúdo do registro também podem e devem variar, tanto quanto variam suas finalidades.
O registro escrito torna visível estes diferentes objetivos. Além disso, o ato de escrever nos
obriga a fazer perguntas, levantar possíveis respostas e organizar o que pensamos. Tudo isso
nos leva a dar conta de que caminhos devemos seguir, que mudanças devemos fazer, que
escolhas não foram felizes e que decisões facilitaram as aprendizagens dos alunos.
Avaliação Como um Instrumento do Professor e do Aluno
A avaliação, tal como a vemos, é um valioso instrumento do(a) professor(a) e acompanha todo
o processo de ensino/aprendizagem. Diferentemente da avaliação tradicional, que é realizada
geralmente no final do ano letivo, falamos de uma avaliação que se faz presente durante toda
a duração do processo educativo.
No início, ela serve para dar aos professores os elementos fundamentais para a realização
do seu planejamento. Para isso informa: quem são os alunos, que conhecimentos trazem,
quais suas curiosidades frente ao saber, seus desejos etc. Durante o trabalho de sala de aula,
ela oferece os dados para que o(a) professor(a) possa agir como um(a) orientador(a) sempre
atento(a) para que todos consigam chegar, com ele(a) até a meta esperada.
Para isso 'puxa pela mão' os que ficam atrasados, diminui os passos para ter certeza que o grupo
132 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
está conseguindo acompanhá-lo(a), imagina formas para diminuir as dificuldades encontradas,
levando todos a se envolver e se ajudar. Para desenvolver esse papel, o(a) professor(a) precisa
da avaliação para estar atento(a) ao que acontece com seus alunos. Estamos chamando de
avaliação inicial aquela que se dá no começo do trabalho escolar, quando começamos a saber
quem são as alunas e alunos, os colegas professores e a realidade que envolve a todos nós.
Na EJA, muitas vezes, a avaliação tem seu começo na formação das turmas. Todos os anos
chegam à escola alunos e alunas em diferentes níveis de escolaridade. Nem sempre é fácil
definir qual a série ou etapa mais adequada para cada um deles. Tem gente que traz no
histórico escolar uma escolaridade que o passar do tempo em grande parte já apagou da
memória de quem traz o documento. Muitos são pessimistas, acreditam não saber quase
nada, quando isso não corresponde à verdade. Outros não foram à escola, mas tiveram algum
parente ou amigo que desempenhou junto a eles, o papel de professor.
E tantas outras situações. Para resolver essas questões, as escolas buscam diferentes saídas
que envolvem algum tipo de avaliação:
- a realização de testes para conhecer o nível de escolaridade;
- entrevistas com os interessados com o objetivo de avaliar os conhecimentos considerados
básicos, como: ler, escrever e contar;
- e outras formas mais, sem contar quando a única possibilidade é formar uma única classe
com todos os candidatos.
Vamos retomar o que dizíamos. A avaliação faz parte da ação do(a) professor(a) desde o seu
primeiro contato com os alunos. Os primeiros dias de aula são de grande importância para
“quebrar” as possíveis resistências e começar a construção de uma relação de confiança. São,
também, momentos propícios para, por exemplo, conhecer o grupo quanto às experiências
escolares já vividas; as profissões que, atualmente, desempenham ou a forma como ganham
a vida; as cidades de origem; os grupos familiares, as expectativas em relação ao futuro etc.
Nessas conversas, vão sendo percebidos os “jeitos” de cada um - quem é muito falante, quem
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
133
é mais tímido, quem está sempre risonho, quem desponta logo como uma liderança enfim, as
características de cada um dos alunos. A percepção dessas características levou Elena, uma
professora que começava a trabalhar com jovens e adultos, a pôr no papel suas descobertas
e encantamento em relação aos seus novos alunos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta unidade trouxe uma série de questões a serem pensadas sobre a avaliação na Educação
de Jovens e Adultos. A avaliação inicial faz com que o(a) professor(a) tenha os elementos
básicos para fazer seu primeiro planejamento. Ela permite a escolha do primeiro tema a ser
desenvolvido e das primeiras atividades que serão trabalhadas. Conhecer o que os alunos
sabem não é uma tarefa só para primeiras semanas de aula, mas uma preocupação permanente
do(a) professor(a) em todas as atividades que propõe. Ele(a) deve sempre considerar o que
os alunos já sabem sobre o que vai ser tratado na sala de aula. Afinal, é partindo do que se
conhece que construímos novos conhecimentos.
A avaliação não acaba quando todos já são conhecidos o suficiente para o trabalho andar.
O processo de aprender demanda um acompanhar atento sobre o que vai acontecendo com
alunos e professores. Assim, a avaliação continuada vai indicando as dificuldades e facilidades
que estão sendo encontradas pelos alunos e professores. Como o próprio nome indica, ela vai
acontecendo durante todo o período escolar.
É uma avaliação que exige reflexão e interpretação dos acontecimentos e atividades realizados
na sala de aula à medida que ocorrem. Ela propicia informações que devem ser analisadas por
todos os participantes. É, portanto, um processo que envolve professores e alunos. Os alunos
participam falando ou demonstrando o que aprenderam, as dificuldades que conseguiram
vencer e o que ainda falta aprender. Para poder contar com a participação consequente dos
alunos, o(a) professor(a) precisa ouvi-los com atenção, além de valorizar as observações que
134 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
fazem.
Muitas vezes, um simples comentário do(a) professor(a) sobre o trabalho ou atitude do aluno
tem um efeito imenso. Criar um clima que estimule a coragem de se expor em classe pode
demorar algum tempo, particularmente quando são alunos jovens e adultos, que não estão
habituados a ver suas opiniões levadas em conta e valorizadas. Entretanto, é fundamental a
existência desse clima. A avaliação continuada ajuda o(a) professor(a) a rever os procedimentos
que vem utilizando e a replanejar sua atuação buscando novas alternativas de ação.
ATIVIDADE DE AUTOESTUDO
1) Escolha dois motivos que levam jovens e adultos a procurar a escola e explicite sobre eles.
2) Faça uma entrevista com dois professores que atuam na EJA e pesquise sobre como
procedem a avaliação nesta modalidade de ensino.
3) Discorra um pequeno texto sobre a importância da avaliação para a Educação de Jovens
e Adultos, bem como os instrumentos mais adequados para realizá-la.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
135
UNIDADE V
INTERDISCIPLINARIDADE NA EDUCAÇÃO DE
JOVENS E ADULTOS
Professora Me. Márcia Cristina Greco Ohuschi
Professora Me. Dalva Linda Vicentini
Objetivos de Aprendizagem
• Refletir sobre o papel da interdisciplinaridade na educação de jovens e adultos,
bem como sua importância para o processo de aprendizagem significativa.
• Verificar a aplicação, em práticas educativas, do projeto interdisciplinar para o desenvolvimento de jovens e adultos.
• Contribuir para a formação de futuros educadores de jovens e adultos.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nessa unidade:
• O projeto interdisciplinar
• O conhecimento não fragmentado
INTRODUÇÃO
Nos dias de hoje, a unidade e a totalidade do universo exigem o repensar dos saberes
fragmentados, em busca de trabalhos que envolvam a interdisciplinaridade. Ao analisarmos a
etimologia do termo, observamos o prefixo “inter” como “entre” e “disciplina” como “ciência”,
daí o ato de troca, de reciprocidade entre as áreas do conhecimento.
Especialmente na educação de jovens e adultos, percebemos que o aluno, enquanto
trabalhador inserido no mercado de trabalho, e nas questões da cidadania, necessita também,
na sua formação, de estar imerso num processo de ensino-aprendizagem nessa perspectiva.
Por isso, nessa unidade, tecemos uma reflexão teórico-prática sobre o projeto interdisciplinar e
suas contribuições para a educação de jovens e adultos. Em seguida, trazemos, como leitura
complementar, a reportagem “O que dá certo na educação de jovens e adultos”, publicada na
Fonte: PHOTOS.COM
Revista Nova Escola on-line, em agosto de 2005.
O PROJETO INTERDISCIPLINAR
A necessidade de romper com a tendência
fragmentadora e desarticulada do processo do
conhecimento, justifica-se pela compreensão
da importância da interação e transformação
recíprocas entre as diferentes áreas do saber.
Dessa forma, o projeto interdisciplinar, conforme Borges e Corrêa (2005), contribui para
reverter as perdas causadas pela fragmentação do conhecimento na modernidade, havendo,
na interdisciplinaridade, um novo tipo de saber, o qual compreenderia os saberes de duas ou
mais disciplinas.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
139
O projeto é definido pelos PCN’s como uma organização didática que “tem um objetivo
compartilhado por todos os envolvidos, que se expressa em um produto final em função do
qual todos trabalham e que terá, necessariamente destinação, divulgação e circulação social”
na escola ou fora dela. (BRASIL, 1998, pp.87-88).
A ação pedagógica, por meio da interdisciplinaridade, aponta para a construção de uma escola
participativa e decisiva na formação do sujeito social. Um projeto interdisciplinar de educação
deverá ser marcado por uma visão geral da educação, num sentido progressista e libertador.
Essa prática favorecerá as ações que buscam ampliar a capacidade do aluno em expressarse por meio de múltiplas linguagens e novas tecnologias, bem como posicionar-se diante da
informação e interagir de forma crítica e ativa, com o meio físico e social.
Ao pensarmos na EJA, precisamos considerar que os alunos jovens e adultos necessitam
de práticas educativas diferentes daquelas que um dia tiveram na escola, tendo em vista sua
história de vida e suas vivências de trabalho. Por isso, acreditamos que o trabalho a partir de
projetos interdisciplinares constitui uma estratégia diferenciada e adequada de ensino para
este público de alunos.
No ensino da Língua Portuguesa a partir da perspectiva bakhtiniana dos gêneros discursivos,
por exemplo, o projeto pode envolver a leitura, a análise linguística e a produção textual, não
necessariamente todas as práticas. Ele pode ser monotemático (a partir de um tema gerador)
ou pluritemático (vários temas), monogenérico (envolve a apropriação de um gênero específico)
ou, ainda, ser desenvolvido em função de uma prática linguística específica.
Vários são os exemplos de projetos a partir dos gêneros discursivos, os quais também podem
envolver outras disciplinas: a organização de uma coletânea de poemas; a elaboração de um
jornal mural; a implantação de uma campanha de publicidade comunitária; a elaboração de um
álbum legendado com fotos antigas e modernas da cidade ou do bairro etc.
De acordo com Borges e Corrêa (2005, p. 32):
140 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Quando se fala em educação de adultos, devemos também falar das relações de
trabalho e das relações de produção. Devemos levar em conta os saberes que o
aluno vem acumulando ao longo de sua vida, e que formam a sua visão de mundo,
para, a partir dela, podermos construir juntos um caminho que leve à subjetividade e
desenvolva o pensamento crítico acerca das relações cotidianas do aluno e do universo
em que está inserido.
No Brasil, normalmente encontramos projetos de alfabetização com um tempo de trabalho
limitado, podendo durar apenas alguns meses. Em consequência disso, segundo as autoras,
temos “como resultado a alfabetização funcional, utilitária ou mecânica, desprovida de caráter
significativo e crítico” (BORGES; CORRÊA, 2005, p. 33).
A maioria dos alunos do Programa de Ensino Fundamental para Jovens e Adultos Trabalhadores,
em que se inserem as autoras, derivam de uma classe menos privilegiada da sociedade, que
não teve a oportunidade de frequentar a escola regular. Assim, o grupo é bastante heterogêneo,
quanto à idade, tempo de escolarização, profissão, vivências etc.
Por isso, justifica-se a necessidade de se trabalhar com projetos interdisciplinares, que possam,
para Borges e Corrêa (2005, p. 35), “descompartimentar os saberes, levando, por exemplo, o
texto para a aula de artes e a corporeidade para a aula de português”.
As autoras atentam para o fato de se lidar com a baixa estima e o sentimento de incapacidade
de aprender desse público de alunos, que traz suas vivências para a sala de aula, as quais
precisam ser aproveitadas no processo de ensino e aprendizagem.
A prática das autoras em programas como o já citado revela que os alunos da EJA “precisam
entrar em contato com conteúdos e atividades que favoreçam a aquisição de conhecimentos
por meio da observação, da análise, da comparação, da generalização, da reflexão e do
pensamento crítico, visando sempre ao desenvolvimento de ações criativas” (BORGES;
CORRÊA, 2005, p. 35).
Ao trabalharem no bloco das linguagens, que reúne as disciplinas de Artes, Língua Portuguesa
e Línguas Estrangeiras, para montar o projeto, as pesquisadoras repensaram suas atividades a
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
141
Fonte: PHOTOS.COM
partir dos eixos: oralidade, corporeidade, produção
textual, leitura e ensino da gramática e optaram por
trabalhar com o gênero discursivo teatro.
Na língua portuguesa, Borges e Corrêa (2005, p.
35), trabalharam com “textos teatrais, características
gerais, regras para a escrita desse texto, leitura,
entonação e representação”, em artes, trabalharam com “a expressão da criatividade para a
produção de bonecos, criação detalhada das personagens por escrito e na execução de peças
criadas por eles”.
Transcrevemos o relato das autoras sobre o trabalho realizado:
Os alunos mostravam-se muito constrangidos no início das aulas pois muitos não se
conheciam. Começamos criando os personagens individualmente. Depois, em grupos
de quatro alunos, eles tentavam integrar estes personagens, criando uma história, uma
cena onde os quatro personagens pudessem interagir. Um deles escrevia a história
para depois narrar para a turma. Na seqüência, foram solicitados a materializar os seus
personagens em bonecos de dedo e, novamente em grupos, criaram as histórias e as
cenas, já incluindo diálogos. Improvisamos um palco com a mesa do professor, a fim de
contemplar o movimento nas atividades.
Sempre nos reuníamos no final da aula para trocarmos idéias e avaliarmos o processo.
Percebemos a necessidade de aumentar o tamanho dos bonecos, pois ficava difícil
de enxergar de longe e combinamos as diversas possibilidades de confecção destes
personagens.
Paralelamente, realizamos a leitura e a análise de peças de teatro com o objetivo de
observar a forma do texto teatral e a linguagem empregada. Comparamos com textos
narrativos, o que evidenciou a tipologia do texto de teatro. Fizemos leituras em voz alta
e representações em sala de aula, como uma forma de experimentar cada um dos
elementos que dá vida a um texto, vivenciando o texto na prática.
Trabalhamos a criação de pequenas intervenções do cotidiano, salientando a
necessidade de respeitar as convenções da escrita, para que os outros pudessem
também captar a dimensão e a expressividade do que estávamos escrevendo. Os
diálogos foram ficando mais elaborados.
Os alunos perceberam o efeito de usarem durante a apresentação uma flexão de voz
para cada personagem, e ficaram mais desinibidos na encenação. Alguns grupos
142 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
incluíram outros sons ou músicas e os personagens tornaram-se dinâmicos.
As dificuldades no uso da língua não desapareceram por completo, mas compreendemos
que a educação é um processo e foi iniciada uma reflexão sobre este tema, de forma
a valorizar os saberes dos alunos e a incentivar que buscassem sempre ampliá-los. O
fato de eles estarem escrevendo os textos, muitas vezes de três a quatro páginas, é
muito importante, pois eles estão produzindo algo por seu próprio esforço e assumindo
a autoria dos trabalhos.
Acreditamos estar caminhando em direção a um trabalho interdisciplinar, pois
trabalhamos com a expressão, produção textual, criatividade, oralidade, corporeidade,
sociabilidade, cooperação, autovalorização e também com o incentivo à tolerância e o
respeito às diferenças (BORGES; CORRÊA, 2005, p. 35-36).
A partir do relato dessa prática, percebemos a importância do trabalho interdisciplinar e
os resultados dele obtidos. Assim, é preciso buscar formas alternativas de organização
curricular para a Educação de Jovens e Adultos, buscando a integração entre as disciplinas e
organizando projetos que envolvam ativamente os alunos, a fim de que possam navegar por
diversos campos do saber.
Simões (2005) apresenta um planejamento didático-pedagógico de trabalho interdisciplinar na
educação de jovens e adultos. Sua proposta de leitura crítica da realidade foi nomeada “Os
sons da vila”, que consistiu em investigar o cotidiano dos alunos em seu local de moradia, com
o objetivo de levar esses alunos a se situarem como agentes (e não espectadores) em sua
própria comunidade.
O autor aponta diversos subtemas propostos para o trabalho com os alunos, dos quais
destacamos:
- O que se escuta na vila à noite, de dia, nos fins de semana? Mais coisas alegres do
que tristes?
-
O que se escutam sobre a atuação da polícia na comunidade?
-
Quais as músicas que a comunidade prefere? Quais músicas você prefere?
-
Existe uma cultura na vila? O que mais gostas de fazer?
-
Como é o linguajar no local onde moram? Ele é errado?
-
Como era a comunidade antes de existir o asfalto, a quadra de esportes, a escola,
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
143
o galpão de reciclagem?
[...] (SIMÕES, 2005, p. 78).
O projeto envolve várias áreas do saber, como Língua Portuguesa, Matemática, Estudos
Sociais e Ciências.
Para o trabalho com a língua materna, o autor propõe a ressignificação social das práticas de
leitura e escrita, sua variedade de usos e funcionalidades, a partir de atividades com gêneros
como: cartas, contracheques, rótulos, receitas, jornais, revistas, placas de comércio, letras de
músicas etc.
Na Matemática, a proposta de Simões (2005) parte do conhecimento prévio dos alunos,
para propiciar o aprendizado dos conhecimentos lógico-matemáticos básicos para a vida
em sociedade, como o valor do número, numeração crescente e decrescente, questão dos
centavos do real, adição de parcelas iguais, tabelas, contracheques e outros.
Com relação aos estudos sociais, sugere as inter-relações dos acontecimentos históricos,
políticos, culturais, sociais, especificamente aqueles relacionados ao bairro em que mora. A
gama de materiais possíveis, como maquetes, mapas da comunidade, fotos antigas, listagens
dos sons do bairro, placas de comércio e outros possibilitariam a promoção do resgate da
autoestima em relação ao local de moradia, além da sua localização como um sujeito histórico
dentro desse contexto.
Nas ciências, o arroio, o tipo de solo do bairro, a arborização, o lixo, o saneamento básico etc.
também propiciariam, segundo o autor, o aprendizado a partir da realidade que esses alunos
vivem. O estudo seria viabilizado a partir de panfletos da prefeitura sobre a coleta seletiva,
reportagens sobre a poluição, dentre outros.
Como observamos, as possibilidades de resgate desses indivíduos são diversas, a partir de
trabalhos interdisciplinares. Por isso, devemos pensar sobre eles de forma mais complexa,
buscando aplicabilidade nas escolas dos conhecimentos adquiridos dentro e fora dela.
144 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
De acordo com Vital Júnior (2006, p. 108), o que não podemos nos esquecer, ao pensarmos
em práticas interdisciplinares junto a jovens e adultos é:
-
O sentido do que ensinamos e o porquê ensinamos;
- O debate em torno do tema, que deve ser permanente. Devemos ‘discursar sobre
nossos discursos’ (VEIGA-NETO, p.35), como forma de darmos clareza a nós próprios
daquilo que falamos;
- A necessidade de pensar em cenários mais coletivos, que possam contemplar uma
maior interdependência do quadro disciplinar, de modo a permitir intercâmbios mais
regulares entre as diversas áreas do conhecimento;
- A noção de que o espaço de sala de aula não está desvinculado de outros
cenários que integram o mundo contemporâneo. Logo, articular propostas curriculares
interligadas a demandas cotidianas torna-se essencial para dar significado àquilo que
ensinamos.
Assim, conforme o autor, não podemos privar os alunos de se apropriarem daquilo que temos
de melhor a oferecer em práticas educativas, para reafirmar a complexidade do que se ensina,
mediante a novas formas que não fragmentem o conhecimento e que lhe deem mais sentido
diante das demandas do mundo contemporâneo.
Uma Nova Visão de Mundo
Português, Matemática, História, Geografia..., nos exames vestibulares, nas coleções lançadas
anualmente pelas editoras, nas grades curriculares das escolas, nos cadernos dos alunos,
organizados com divisões “por matéria”, estamos acostumados a encontrar as diferentes
disciplinas sempre separadas, isoladas em compartimentos, organizadas em espaços bem
definidos nos horários e ministradas por diferentes professores.
Essa falta de comunicação entre as áreas, essa fragmentação do conhecimento – reflexo de
um complexo processo social e histórico desencadeado pela Revolução Industrial, que exigia
mão de obra especializada – têm deixado sequelas profundas em nosso modo de pesquisar,
de ensinar e, sobretudo, de pensar e ver o mundo.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
145
Se os alunos, durante toda sua escolaridade e processo de aprendizagem, tomam contato
com as disciplinas sempre divididas em segmentos que nunca dialogam, forçosamente
desenvolvem uma percepção igualmente fragmentada dos conhecimentos de cada área. Isso,
sem dúvida, acaba moldando uma forma de pensar que dificilmente incluirá a síntese, o que é
compreensível, considerando que essa habilidade só é adquirida quando se aprende a buscar
a visão global dos fatos. Portanto, a organização compartimentada das disciplinas não pode
preparar o sujeito para perceber a unidade das coisas, para observá-las e analisá-las por
diferentes ângulos e estabelecer relações entre eles, uma vez que essas capacidades vão
sendo conquistadas ao longo do tempo, à custa de muitas experiências de unidade.
Em outras palavras, a visão parcelada do conhecimento é um obstáculo para o sujeito alcançar
uma integração interna, porque não o instrumentaliza para ver o todo. Fazendo o caminho
contrário, podemos pensar que um ensino que conciliasse diferentes conceitos, de diferentes
áreas; que integrasse as várias disciplinas e fosse capaz de substituir a fragmentação
pela interação, daria ao sujeito a oportunidade de aprender a relacionar conceitos e,
consequentemente, de construir novos conhecimentos, com muito mais autonomia e
criatividade. Mais autonomia, porque ele teria aprendido a considerar fatores de diferentes
ordens na realização de seus objetivos, inclusive de aprendizagem.
Mais criatividade, porque a prática de relacionar implica também a arte de encontrar
combinações inéditas, ousadas, saídas novas para velhos problemas. Esse seria um ganho
inestimável do processo de ensino no novo milênio. Outro aprendizado importante que essa
nova forma de pensar traz em seu bojo é o fato de que as experiências bem-sucedidas de
integração incentivam a disposição para buscar relações de complementaridade e estabelecer
parcerias. A convivência com o outro, por sua vez, obrigatoriamente impõe a necessidade de
administrar os conflitos e desentendimentos provocados pelas diferenças; de compreender a
importância de considerar todas as colaborações possíveis; de respeitar e valorizar todos os
campos de conhecimento, apesar das divergências. Nesse sentido, não é exagerado dizer que
a convivência das disciplinas pode ser uma estratégia para desenvolver a noção de tolerância.
146 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
Enfim, parece correto concluir que, tanto quanto a vivência da compartimentalização incentiva o
que é sectário e isolado, ou seja, a base do individualismo, a comunhão de áreas, de conceitos,
de professores pode ser uma mensagem eloquente sobre os benefícios da composição,
articulação de forças, cooperação, que são a base da postura solidária. Considerando o
tamanho dos problemas econômicos e ambientais que já enfrentamos, é de grande valia
sonhar com um ensino que parte da integração e ensina os alunos a usufruírem melhor dos
conhecimentos recebidos na escola.
O que dá certo na Educação de Jovens e Adultos3
Meire Cavalcante
Misturar as disciplinas - já que no mundo elas não estão separadas -, integrar os alunos na vida
escolar e usar a experiência deles em sala. Essas são algumas das chaves para você abrir as portas
da escola àqueles que demoraram tanto para chegar até ela.
"A caneta que meu pai me deu foi o cabo da enxada", lamenta Luzinete Maria da Silva, agricultora
pernambucana de 50 anos, que cresceu na roça e acaba de se alfabetizar. "Ele dizia que mulher só
servia para trabalhar e que, se eu fosse para a escola, ia ficar mandando bilhetinho para namorado".
A história de Luzinete é semelhante à de milhões de brasileiros com mais de 15 anos que são analfabetos ou têm escolarização incompleta. E as causas são as mesmas: pais analfabetos ou machistas,
necessidade de trabalhar, inexistência de escolas, paternidade e maternidade precoces e falta de
dinheiro, transporte, comida e oportunidade. Mas esse quadro está mudando. Luzinete estuda em
uma turma de alfabetização na cidade de Limoeiro e quer fazer o Ensino Fundamental. Assim, ela
será um dos 4,5 milhões de brasileiros que cursam as aulas de Educação de Jovens e Adultos (EJA)
para conquistar não só um diploma, mas uma vida mais digna. É claro que a melhora da escolaridade
da população não depende apenas de programas de alfabetização. É preciso incentivar os egressos
a continuar os estudos.
Os alunos também vão em busca de instrumentos para viver no mundo da informação e elaborar
pensamentos e ações de forma crítica. "Disso depende a autoestima, a identidade e até a possibilidade de conseguir um emprego", afirma Timothy Ireland, diretor de Educação de Jovens e Adultos da
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad). Criado em julho de 2004
pelo Ministério da Educação, o órgão coordena ações de alfabetização e oferece apoio financeiro e
CAVALCANTE, Meire. O que dá certo na Educação de Jovens e Adultos. Nova Escola on-line, São Paulo: Abril, 184, ago,
2005. Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/edicoes/0184/aberto/mt_81079.shtml> Acesso em: 18 nov. 2008.
3
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
147
pedagógico para que estados e municípios garantam a continuidade dos estudos de quem já aprendeu a ler e escrever. "Nos últimos 30 anos, não houve articulação entre a escolarização e a alfabetização de jovens e adultos. Não se pode separar uma da outra", afirma Ireland.
Quem tem uma turma de EJA sabe das dificuldades de manter o interesse dos alunos - que chegam
cansados do trabalho -, de planejar aulas que tenham relação com a vida deles e que não sejam uma
versão empobrecida do que é dado a crianças e adolescentes. Mas já há inúmeras escolas trabalhando a EJA com sucesso. Selecionamos experiências que trazem os fundamentos para que você
possa dar aos estudantes oportunidade de se tornarem cidadãos autônomos e transformar a escola
na porta de entrada de um mundo a ser descoberto.
Ensino diversificado: o Educandário Beatriz França, em Limoeiro (PE), abre a biblioteca e oferece
aulas de ginástica laboral aos estudantes de alfabetização do Sesi
Um dos grandes parceiros do governo na luta contra o analfabetismo é o Serviço Social da Indústria
(Sesi). O Projeto Sesi, por um Brasil Alfabetizado, começou em 2003 e já alfabetizou 600 mil pessoas.
Enquanto o governo federal capacita e paga os alfabetizadores, o Sesi fornece material didático e
capacita e paga os supervisores. "Eles orientam o trabalho em sala, tiram dúvidas e proporcionam
a troca de experiências entre os alfabetizadores", explica Eliane Martins, coordenadora nacional de
alfabetização do projeto.
Seguindo a linha do educador Paulo Freire (1921-1997), o projeto alfabetiza com base em temas
geradores, fazendo a ligação dos conteúdos escolares com a vida dos estudantes. Em sua turma de
alfabetização na Escola Municipal José Clementino Coelho, na zona rural de Limoeiro, o professor
Aluízio Barbosa da Silva, por exemplo, começou uma das aulas com uma canção sobre o meio ambiente. Enquanto cantavam, os alunos treinavam a leitura e aprendiam que as queimadas empobrecem
o solo, tirando o sustento deles e das próximas gerações. "Eu vi por que é importante reciclar o lixo
e que muitas famílias vivem de vender os materiais recicláveis", conta a agricultora Marlene Rosa de
Lima Silva, 46 anos.
O Sesi atua ainda em parceria com escolas particulares. Na mesma Limoeiro, o Educandário Beatriz
França recebe algumas turmas do projeto no período noturno. Os alfabetizandos participam, uma
vez por semana, de aulas de ginástica laboral dadas voluntariamente pela professora de Educação
Física da escola, Cristina Maria de Mendonça. "Ensino exercícios de relaxamento e alongamento e
utilizo músicas e brincadeiras. Com o espírito mais leve, a aprendizagem melhora." Cristina revela que
alguns estudantes mais velhos não conheciam doenças como artrite e osteoporose. "Eles falam que
com a ginástica as dores sumiram", diz. "Não estamos apenas emprestando algumas salas de aula.
Todos têm acesso à biblioteca e, assim que inaugurar a sala de informática, também poderão usá-la.
É uma forma de contribuir para o desenvolvimento da nossa comunidade", afirma a diretora Maria do
Socorro Pereira de Souza.
Paralelamente a trabalhos como esse, estados e municípios já se movimentam para proporcionar a
148 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
continuidade da escolarização aos formandos das turmas de alfabetização. A orientação da Secad
é de que os alunos sejam estimulados pelos professores a prosseguir os estudos. "Em Limoeiro,
estamos mobilizando as secretarias estadual e municipal de educação para ampliar a oferta de EJA.
Muitos desistem porque a escola fica distante demais", afirma Luíza Antônia Ferreira, supervisora do
projeto do Sesi no município.
Mostrar que a escola se modernizou
Um grande desafio para professores de jovens e adultos é acabar com a estranheza que a escola
causa a muitos logo nos primeiros dias de aula. O modelo que a maioria guarda na memória é de salas
com carteiras enfileiradas, quadro-negro, giz, livro, caderno e um professor - que fala o tempo todo e
passa tarefas. Muitos alunos, ao participar de debates, estudos do meio, apresentações de vídeo ou
dinâmicas de grupo, ficam com a sensação de que estão sendo "enrolados."
Para Vera Masagão Ribeiro, coordenadora de programas da Ação Educativa, organização não-governamental em São Paulo, é importante mostrar que recursos variados também fazem parte da aprendizagem. Para isso, relacionar esses recursos com o conteúdo da aula é um bom começo. "Se a idéia
é passar um vídeo para a turma, o professor pode antes dar um texto sobre o tema e provocar uma
breve discussão. Terminado o filme, ele pergunta aos alunos qual foi o trecho mais emocionante ou
marcante", sugere Vera. Ela alerta, no entanto, que é preciso combinar essas atividades com o momento do registro escrito que, para a turma, é uma característica específica da escola. "Ao escrever,
eles têm o sentimento de aprendizagem, de apropriação do conhecimento."
Na Escola Estadual Jorge Fernandes, em Natal, os professores de EJA são orientados a preparar
o terreno antes de cada atividade diferenciada. "Se o aluno for pego de surpresa, acaba achando
que aquilo não faz parte da aula", afirma a vice-diretora da escola, Maria Gorete de França Gomes.
"Por isso, os professores mostram, aos poucos, que existe um mundo além do quadro e do giz: há
filmes, músicas, entrevistas, documentários, livros e tantas outras coisas interessantes às quais a
maioria não tem acesso", explica. Mas e se, mesmo adotando essas estratégias, o aluno insistir em
questionar a qualidade da aula? "Essa é uma boa oportunidade de o professor mostrar que o simples
fato de questionar já é um aprendizado", diz Sônia Giubilei, professora da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp).
"Eu estudei até a 4ª série do primário. No meu tempo, o professor parecia que ficava um degrauzinho
acima da gente e ninguém abria a boca. Dava para ouvir a respiração dos colegas", conta a auxiliar
de enfermagem Maria de Lima Pimenta Silva, 60 anos, que acabou de completar o Ensino Médio. Os
anos de rigidez escolar fizeram com que Maria tivesse medo e vergonha de fazer perguntas e de errar.
"Quando voltei para a escola, eu achava que tinha só que escutar. Perguntar e discutir era perda de
tempo. Agora aprendi que, se não pergunto, não aprendo", conclui Maria. "Cabe ao educador mostrar
que o conhecimento não está apenas no livro ou em sua fala, mas em tudo que nos cerca, no nosso
cotidiano", afirma Sônia, que coordena desde 1995 o Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
149
de Jovens e Adultos (Gepeja) da Unicamp. O objetivo do grupo é dar uma formação cidadã e crítica
aos estudantes.
Ensinar as disciplinas como elas aparecem na vida
O estudo do meio é uma das atividades desenvolvidas pelo Gepeja com as turmas de EJA, em Campinas. Em uma viagem realizada no último mês de junho à cidade de Porto Feliz, distante cerca de 90
quilômetros, cada aluno recebeu uma pasta com seu nome, folhas para anotações, textos, mapas,
reportagens e crônicas sobre a visita e o tema gerador, "água". Tudo serviu de gancho para a aprendizagem graças ao preparo dos professores. O ônibus contratado para fazer o transporte atrasou em
quase uma hora. Além disso, não tinha microfone - uma das exigências feitas pelo Gepeja. "Pessoal,
segunda-feira vamos escrever uma carta à empresa reclamando. Pagamos por um serviço e temos o
direito de exigir que ele seja feito", ensinou a professora Sônia.
Os alunos estudaram conceitos de física, como velocidade, relacionando o tempo da viagem e os
quilômetros percorridos, calcularam quantos litros de água uma cidade como Campinas consome a
cada mês e aprenderam sobre a história das monções - expedições de navegação em rios ocorridas
nos séculos 18 e 19 - que partiam de Porto Feliz. Ao verem peças de tortura da época da escravidão
expostas em um museu, debateram sobre as condições de vida dos negros no Brasil. Eles discutiram também o grau de poluição do rio Tietê e que impactos isso traz para a vida deles e das futuras
gerações. "Nossa preocupação é despertar o senso crítico para que os alunos possam, por exemplo,
perceber o que é possível fazer na comunidade para melhorar a qualidade de vida", afirma Angélica
Sacconi Leme, professora da sala de alfabetização do Gepeja.
No final do dia, o grupo foi convidado a responder uma folha de avaliação. O questionário abordava,
por exemplo, o que mais chamou a atenção da turma e a qualidade do transporte e do lanche. Em
seguida, os professores organizaram um bate-papo, que resgatou temas de aulas anteriores e conteúdos estudados. Todos estavam com a matéria na ponta da língua. "Temos que conservar os lençóis
freáticos para ensinar aos mais novos. Senão, tudo isso vai acabar", afirmou Josué Pimenta Silva, 78
anos, motorista aposentado.
Usar a experiência da turma como base das aulas
Sintonia com o trabalho: empregadas domésticas, alunas da Escola Jorge Fernandes, em Natal, preparam deliciosos pratos e, em sala, a turma toda estuda conteúdos com base nas receitas
Projetos que fazem sentido para os alunos mostram que o mundo não pode ser dividido por disciplinas, como acontece na escola. Dessa forma, eles começam a relacionar os conteúdos estudados com
fatos do cotidiano e do trabalho. Ao aprenderem o que eram bactérias, as empregadas domésticas
que cursam as aulas do nível 2 de EJA (3ª e 4ª séries) da Escola Estadual Jorge Fernandes, em Natal,
descobriram por que para cozinhar é tão importante manter as unhas cortadas e as mãos sempre
limpas.
A professora Maria das Graças Cardoso Amorim percebeu que a profissão de grande parte da turma
150 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
daria um bom mote para as aulas. Todas as segundas-feiras um grupo de estudantes vai para a
cozinha preparar uma iguaria. Enquanto isso, o restante da turma copia a receita do quadro-negro
e faz os exercícios de gramática e ortografia. Ao fim da aula, todos se reúnem para provar o prato e
conversar. É um momento de socialização, que fortalece os vínculos do grupo.
No decorrer da semana, a professora trabalha leitura, conteúdos de Matemática e Ciências, noções
de higiene e também fala da cultura e da história das receitas regionais. Maria das Graças leva em
conta a assiduidade, a participação e o envolvimento com as aulas. Esse acompanhamento contínuo
permite que ela lance mão de estratégias variadas para ajudar cada um a superar suas dificuldades.
Além de dar conta do currículo, as alunas que trabalham como empregadas domésticas saem mais
qualificadas para o trabalho e para a vida.
"Minha patroa adora as receitas que eu levo daqui", conta Maria das Vitórias Domingos da Silva,
29 anos. "Algumas patroas ligaram para a escola elogiando o trabalho desenvolvido e a evolução
no vocabulário das funcionárias", diz a professora Maria das Graças. Ela se preocupa em mostrar
à turma que o trabalho de cada um é de extrema importância para a sociedade. "Minha patroa é
professora aposentada. O saber dela é um, o meu é outro. E nós duas somos importantes", constata
Maria Analete da Silva Aguiar, 45 anos, que pretende continuar os estudos e, no futuro, trabalhar com
alimentos congelados e doces e salgados para festas. "Meu trabalho melhorou muito. Aqui aprendi
a usar touca, luvas e avental para manter a higiene", afirma Maria Auxiliadora dos Santos, 35 anos.
"Nossa cozinha ainda é pequena, mas o sucesso do projeto tem sido tão grande que já estamos sonhando com uma cozinha experimental", revela a vice-diretora Maria Gorete.
Ampliar os horizontes culturais dos estudantes
Um mundo novo: alunos da Escola Rodrigues Alves, em São Paulo, descobrem a vida cultural da
cidade e até se arriscam a criar suas próprias obras de arte
A escola pode apresentar o mundo cultural aos alunos. Para explorar uma metrópole como São Paulo, que oferece tantas opções, Ricardo Barros, professor-coordenador de EJA da Escola Estadual
Rodrigues Alves, criou o projeto Você Tem Fome de Quê?, em que os conteúdos aprendidos em
sala se relacionam com as manifestações culturais da cidade. Os professores organizam visitas a
exposições de arte, teatros, cinemas e museus e recebem artistas na escola, que expõem seus trabalhos e suas idéias.
"A primeira vez que fui a uma exposição, achei tudo elegante demais. Fiquei tímido. Hoje já me sinto
mais à vontade", conta o manobrista Marcos Antônio dos Santos Soares, 26 anos. "Quando vi que a
gente ia sair por aí visitando exposições, pensei que era bobagem. Achava que eu tinha que aprender
a ler e escrever e só. Agora fico ansiosa esperando o próximo passeio", diz a acompanhante Arlete
Alves Feitosa, 22 anos. Marcos e Arlete cursam o 1º ano do Ensino Médio.
Ao participar de uma visita monitorada ao Centro Universitário Maria Antônia, os alunos discutiram
o consumismo e a influência da TV no nosso modo de pensar e participaram de uma oficina sobre
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
151
desenho e linguagem da fotografia. Como o trabalho é interdisciplinar, quem acompanhou o grupo foi
a professora de Geografia Aline Cristina Cardoso de Castro. "A turma precisa perceber que, apesar de
ser um só assunto, ele se relaciona com várias disciplinas."
São comuns casos de estudantes que nunca foram ao cinema ou ao teatro. "O projeto torna esses
adultos mais sensíveis à ação transformadora da arte", afirma Ricardo. "A nossa mente se abre, a
gente começa a ficar mais crítico. Eu nunca pensei em fazer uma faculdade. Agora meu objetivo é
ser psicóloga e trabalhar com Educação Especial", revela a empregada doméstica Maria de Lourdes
Alves Nascimento, 35 anos.
Integrar os jovens e adultos aos demais alunos
Todos juntos: os alunos da rede municipal de Pombal (PB) enfeitam a carroça da EJA e desfilam com
as turmas dos menores na festa de são João
Tornar as turmas de EJA parte da comunidade escolar é fundamental para o sucesso da aprendizagem e para evitar a evasão. O aluno não pode sentir que aquele espaço é apenas emprestado. "Não
são raros os casos de escolas que trancam a biblioteca, a sala de informática e até alguns banheiros
à noite, no período em que os adultos estão lá", afirma Vera Masagão. Além disso, muitas vezes eles
são excluídos das festas e feiras culturais, do jornal interno e dos eventos da escola.
Para promover a integração de todas as modalidades de ensino, a secretaria de educação de Pombal, na Paraíba, organiza anualmente um desfile de carroças na época de são João. Todos, desde a
creche até a Educação de Jovens e Adultos, enfeitam suas carroças - e os burros que as puxam - para
mostrar ao público o quanto conhecem e valorizam a própria cultura. Antes do grande dia, os alunos
estudam os símbolos de são João, como a fogueira e as bandeirinhas, e aprendem sobre a origem
da festa e a culinária local. O tema escolhido pelas turmas de EJA para enfeitar a carroça foi a mulher
rendeira. O capricho na confecção dos adereços, laços e babados e da boneca rendeira mostra o
carinho e o interesse dos alunos pela escola. "Participo de tudo que os mais jovens fazem. É uma
alegria", afirma Raimundo dos Santos Lima, 52 anos, o orgulhoso dono do burro que puxou a carroça
da EJA no desfile.
Assim como em todo o Brasil, Pombal não atende apenas senhores e senhoras. Cristiano Santos
Morais, por exemplo, tem apenas 15 anos. "Parei na 1ª série, quando tinha 9 anos, para ajudar meu
pai na roça. Não deu nem para aprender a ler e escrever." De volta à 1ª série do ensino regular, a
distorção idade-série foi um peso muito grande para o adolescente. Ele se sentia deslocado e envergonhado por estar entre os pequenos. "Um dia ele me disse que ia abandonar os estudos. Perguntei
se não queria tentar na EJA e deu muito certo", diz Mayenne-Van Bandeira de Lacerda, secretária
municipal de educação.
A EJA foi implantada na cidade em 2001, incentivada pela atuação do Alfabetização Solidária, organização não-governamental que desde de 1998 já atuava ali. "Muitos ficavam frustrados por não ter
escola para seguir os estudos. Entrei em contato com a secretaria para atender a essa demanda",
152 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
lembra Vera Lúcia Vieira Medeiros, coordenadora do Alfabetização Solidária e de EJA de 1ª a 4ª série
do município.
A metodologia voltada à formação de cidadãos mostra aos alunos que o estudo faz diferença no seu
cotidiano. "Morria de vergonha de não saber assinar meu nome. Estar em uma escola tão boa, que ensina a ler, escrever e saber dos meus direitos, é como ganhar na loteria", conta o agricultor Raimundo
Laurentino de Matos Filho, 38 anos. A satisfação é também dos professores. "Até pouco tempo eu não
sabia se era realizada profissionalmente. Depois de ver meus alunos progredindo, apesar de tantas
dificuldades, não tenho mais dúvidas", conclui Maria Silene Martins Gomes, professora da 2ª série da
Escola Municipal de Ensino Fundamental Newton Seixas.
Como evitar a evasão de jovens e adultos
Quem se matricula em uma sala de EJA tem a auto-estima devastada. O estudante sente vergonha
de nunca ter estudado – ou de ter parado de estudar a muitos anos – e medo do ridículo e do desconhecido. Sem contar o cansaço e as preocupações que só os adultos têm, como pagar as contas ou
educar os filhos. Mas, algumas ações podem ser tomadas para evitar que tudo isso afaste os alunos
da escola:
- Mostrar que a atitude de voltar a estudar não deve ser motivo de vergonha, mas de orgulho.
- Ajudar o aluno a identificar o valor e a utilidade do estudo em sua vida por meio de atividades ligadas
ao seu cotidiano.
- Elaborar aulas dinâmicas e estimulantes (é tentador ir para casa dormir, assistir TV, ou ficar com a
família depois de um dia inteiro de trabalho).
- Ser receptivo para conversar, pois muitos vão à escola preocupados com problemas pessoais ou
profissionais.
- Mostrar que a aula é um momento de troca entre todos e que o saber do professor não é mais importante que o dele;
- Valorizar e utilizar os conhecimentos e as habilidades de cada um. Isso pode mudar o seu planejamento no meio do caminho, mas as aulas vão ficar mais interessantes.
- Promover entre os colegas o sentimento de grupo. Quando criam vínculos, eles se sentem estimulados a participar das atividades.
Planejamento: alguns pontos para reflexão
Com registros em cadernos, fichas, ou qualquer outra folha de papel, boa parte dos professores
planeja o que pretende desenvolver na sala de aula. Mesmo assim, há professores que dizem que o
planejamento é dispensável. Muitas delas afirmam que não sentem, como necessário, fazer o planejamento por escrito, uma vez que já tem tudo pronto na cabeça.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
153
Para outros professores, o planejamento é o cumprimento de uma exigência
apenas burocrática. Provavelmente, um planejamento feito com esse espírito não tem função no diaa-dia porque não corresponde a nenhuma necessidade apontada pela avaliação da realidade onde o
trabalho acontecerá.
Infelizmente, existem professores que trabalham na base do improviso: “Na hora eu decido o que
vou fazer com os alunos.” Outros, transformam o livro didático em plano de trabalho. Dizem: “É mais
prático, não tenho tempo para ficar criando novidades.” Ainda outros, repetem todos os anos o mesmo
plano: “Afinal, para que mudar?.”
Para o(a) professor(a) comprometido(a) com seu trabalho, o planejamento faz parte do processo de
tomada de decisão sobre a sua forma de agir, no dia-a-dia da sua prática pedagógica. Nele estão
envolvidas ações e situações que se dão de forma continuada entre professor(a) e alunos e alunos
entre si.
Para planejar, o(a) professor(a) precisa responder a algumas perguntas:
Para que ensinar? Pergunta que leva aos objetivos;
O que ensinar? Pergunta que faz pensar na seleção dos conteúdos;
Como ensinar? Pergunta que faz escolher quais métodos e técnicas usar.
Para que ensinar?
Esta pergunta nos leva a considerar onde esperamos chegar com o nosso trabalho educativo. Isto
significa dizer quais os resultados que buscamos atingir. Mas, só temos condições de estabelecer
esses objetivos depois de analisar o grupo de alunos, com as suas características, seus limites, suas
histórias de vida e suas facilidades. Sem estas considerações corremos o risco de tornar o nosso
planejamento um instrumento sem função, inútil por não corresponder às verdadeiras necessidades
dos envolvidos. Esse processo de definição dos objetivos se torna muito mais eficiente quando envolve os alunos. Afinal, esse processo é tão importante para o(a) professor(a) quanto para eles.
Alguns cuidados são importantes na definição dos objetivos que buscamos com o nosso trabalho.
É preciso que os objetivos escolhidos sejam:
• claros, objetivos - para que não deixem dúvidas. Os objetivos devem ser expressos de tal forma
que tenham o mesmo significado, tanto para o(a) professor(a) quanto para o aluno. Para isso devem
estar numa linguagem simples e de fácil compreensão;
• viáveis - ou de possível realização. A escolha dos objetivos deve levar em conta as condições reais
do grupo e da escola, respeitando sua capacidade, interesse e motivações;
• apresentados na sua totalidade - os objetivos devem ser apontados como uma ação que envolve
atividades a serem realizadas ou comportamentos a serem demonstrados;
• possíveis de serem avaliados - os objetivos devem deixar evidentes os conteúdos que serão desenvolvidos, para que permitam conhecer o avanço dos alunos no domínio deles.
154 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
O que ensinar?
O que ensinar é a pergunta que nos leva aos conteúdos, isto é, ao conhecimento a ser desenvolvido.
Abrange tanto os conhecimentos que a humanidade acumulou durante sua história - informações,
dados, fatos, princípios e conceitos - quanto atitudes e comportamentos. Na hora de escolher os
conteúdos, alguns critérios devem ser levados em conta.
Apontando alguns deles, podemos dizer que os conteúdos devem:
• ter validade - devem ser os mais importantes e significativos para a realidade e a época em que se
vive;
• ter significado - devem estar relacionados com os alunos, suas histórias de vida, suas experiências
e motivações;
• possibilitar a reflexão - devem levar o aluno a associar, comparar, compreender, selecionar, organizar, criticar e avaliar os próprios conteúdos;
• ser flexível - devem estar sujeitos a modificações, adaptações, renovações e enriquecimentos;
• ter utilidade - deverão considerar as exigências e as características do contexto sócio-econômico
e cultural dos alunos;
• ser viável - os conteúdos deverão ser possíveis de aprendizagem dentro das limitações de tempo e
dos recursos que temos. A razão de ser desses critérios é apontar para aspectos que facilitam o trabalho pedagógico. Mas, não podemos esquecer que os conteúdos mais válidos são sempre aqueles
que melhor levam os alunos a responder as suas necessidades, fazendo-os aprender o que é mais
útil para a vida deles.
Precisamos lembrar que planejar não é apenas relacionar atividades a serem desenvolvidas. É um
processo de:
• conhecer a realidade sobre a qual se vai trabalhar;
• propor ações para influir nela e
• desenvolver as ações propostas avaliando sempre seus resultados para a continuidade do mesmo
processo: avaliação, planejamento, execução e avaliação, e assim por diante.
Pensando assim, o planejamento que o(a) professor(a) faz envolve aspectos que são nossos velhos
conhecidos:
O conhecimento dos alunos - o que eles já sabem, suas experiências de vida, suas expectativas,
motivações etc;
A concepção que orienta o nosso projeto de educação - que tipo de pessoa queremos formar;
A realização de atividades de aprendizagem que respondem ao nosso projeto - a coerência entre
o que fazemos e o projeto educativo é fundamental;
A avaliação - que deve ser permanente, de todas as atividades desenvolvidas.
Fonte: <http://portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/eja_caderno4.pdf>. Acesso em: 14 dez. 2010.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
155
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O maior objetivo desta unidade é entender como o mundo é integrado e os problemas existentes
no mundo são complexos e multidependentes, aprender os conhecimentos científicos de forma
integrada é um modo de entender esse mundo, de explicar e de poder intervir nos problemas.
A abordagem integrada de conteúdos é aprovada e considerada para a Educação de Jovens
e Adultos.
Contudo, a forma como essa integração tem acontecido no EJA deixa a desejar na medida
em que não é totalmente efetivada, havendo discordâncias e dificuldades de real efetivação da
mesma. Isso implica em:
• Repensar a proposta pedagógica do curso.
• Haver uma definição mais clara de objetivos a serem alcançados.
• Promover um trabalho de capacitação e formação continuada dos professores.
Assim, a unidade esclarece que formar o homem numa visão sistêmica passa fundamentalmente
por uma prática interdisciplinar dos conceitos a serem trabalhados.
ATIVIDADE DE AUTOESTUDO
1) Comente sobre a importância do projeto interdisciplinar na Educação de Jovens e Adultos.
2)Pesquise, em sua cidade, projetos interdisciplinares voltados à Educação de Jovens e
Adultos e analise-os.
3) Pense em dois temas possíveis para a elaboração de um projeto interdisciplinar para a EJA
e procure relacioná-los a, no mínimo, duas disciplinas diferentes.
4) Você considera importante o ato de planejar? Por quê?
156 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
FAZENDA. Ivani. Interdisciplinaridade: um projeto em parceria. Ed Loyola, 5. ed.
Educação de Jovens e Adultos e Interdisciplinaridade. Disponível em: <http://www.fundaj.gov.br/licitacao/jovens_adultos.pdf>. Acesso em: 25 nov. 2010.
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
157
CONCLUSÃO
Caro aluno, por meio desta disciplina encontramos um espaço para discussões e
aprofundamento de conhecimentos extremamente importantes na formação do Pedagogo que
terá como uma das possibilidades de atuação a docência na Educação de Jovens e Adultos.
O contato com esses conceitos nos possibilitou uma maior clareza na organização e condução
do trabalho pedagógico da EJA. Precisamos refletir sobre o quanto estes Jovens e Adultos
muitas vezes se sentem excluídos ou à margem da sociedade tentando recuperar, naquele
espaço da sala de aula, o tempo que, segundo eles, fora perdido. Não há como desenvolver
docência no improviso. Isso implica, numa postura que enquanto educadores, alfabetizadores
de jovens e adultos, tomemos o cuidado de refletirmos sobre a prática quanto: ao conteúdo
que vier escolher, mais tarde para ensinar, ao que pretendo com os alunos e a maneira de
desenvolvê-la sobre a visão que temos dos nossos “alunos”.
Finalizando nossas discussões, precisamos reconhecer a importância da modalidade de
Educação de Jovens e Adultos na sociedade contemporânea, bem como identificar o papel do
educador como medicação no processo de construção dos conhecimentos dos alunos inseridos
nessa modalidade de ensino, além de também de identificar as dificuldades encontradas pelos
jovens e adultos no processo de alfabetização.
Baseados nas discussões levantadas pela disciplina, podemos ver a contribuição dada pelos
profissionais ligadas à área da educação e pela sociedade como um todo, nas diversas
lutas em diferentes momentos para a constituição efetiva da educação como direito de
todos, independente de idade. Por essas lutas travadas em diferentes momentos, criou-se a
possibilidade de se repensar e reconfigurar a EJA, até chegarmos aos dias atuais.
Em função de mudanças socioeconômicas e culturais ocorridas na sociedade brasileira,
a Escola teve de reformular suas funções tradicionais, redefinir o seu papel e criar novos
serviços, aumentando-se assim, o número de pessoas envolvidas no processo educativo, bem
158 TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
como o nível de complexidade dessa instituição. Neste contexto, encontramos a Educação de
Jovens e Adultos.
Espera-se, que as reflexões aqui colocadas possam ajudar aos profissionais da educação a
resgatar seu papel e função como instrumento de transformação. Grandes são os desafios e
muitas são as mudanças sociais da atualidade que refletem a educação.
No entanto, fica uma certeza ao término desse livro: além de apresentar discussões pertinentes
a esta modalidade e apresentar como fundamental e extremamente importante o perfil do
educador que atuará junto aos alunos inseridos na Educação de Jovens de Adultos, abre-se
a possibilidade de agregar uma grande parcela da população, que no início deste milênio,
encontra-se ainda a mercê da instituição escolar. Acreditamos, firmemente, neste sentido, que
a escola é um poderoso meio de emancipação humana.
Com Carinho!!
Professoras Márcia e Dalva
TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | Educação a Distância
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