UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
IVAIR NOVATO DE OLIVEIRA FILHO
CRIME DE DESERÇÃO
CURITIBA
2013
IVAIR NOVATO DE OLIVEIRA FILHO
CRIME DE DESERÇÃO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado no
Curso de Direito da Faculdade de Ciências
Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como
requisito parcial para a obtenção de graduação.
Orientador: Néfi Cordeiro
CURITIBA
2013
TERMO DE APROVAÇÃO
IVAIR NOVATO DE OLIVEIRA FILHO
CRIME DE DESERÇÃO
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado e aprovado para obtenção do título de Bacharel no
Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.
Curitiba, _____ de _____________ de 2013.
____________________________________
Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite
Coordenação do Núcleo de Monografia
Universidade Tuiuti do Paraná
____________________________________
Orientador: Néfi Cordeiro.
Universidade Tuiuti do Paraná
Curso de Direito
____________________________________
Professor
Universidade Tuiuti do Paraná
Curso de Direito
____________________________________
Professor
Universidade Tuiuti do Paraná
Curso de Direito
Dedico este trabalho À Deus e a todos
aqueles que estiveram comigo nesta
caminhada.
AGRADEÇO:
Primeiramente À Deus que me ilumina em cada passo que dou, sempre me
fortalecendo e me protegendo;
À meus pais pela criação que me deram e a toda minha família pela
compreensão da minha ausência;
À minha Querida Josiane, esposa e companheira, pelo apoio e que dia após
dia acompanha minha dura jornada, por vezes ficando privada de minha
companhia;e
Aos meus amigos, que são poucos, porém verdadeiros e fiéis.
RESUMO
Este trabalho abordará o crime de Deserção, previsto no Art. 187 do Código
Penal Militar Brasileiro, que nada mais é senão a ausência injustificada do militar por
mais de oito dias da unidade em que serve ou do lugar em que deve permanecer. O
objetivo deste estudo é analisar o crime de deserção, tanto no aspecto material
quanto processual dando ênfase em sua aplicação no âmbito da Polícia Militar do
Estado do Paraná. Através de pesquisa bibliográfica será feito um breve estudo do
histórico do Direito Penal Militar, analisando em paralelo o surgimento do Crime de
Deserção, desde suas origens até os dias atuais, sendo também explanado sobre o
que é entendido pela doutrina pátria como crimes militares que por sua vez
classificam-se em crime militar próprio e impróprio. Aqueles apenas são cometidos
pela pessoa que está investida da condição de militar e, estes, são crimes que estão
definidos tanto no Código Penal Castrense quanto no Código Penal Comum, mas
que acabam tornando-se militares por se enquadrarem em uma das hipóteses do
Art. 9º do CPM. Por fim será feita uma breve explanação a respeito dos aspectos
administrativos que, via de regra, são atos administrativos que devem ser levados a
efeito pela Administração Militar e que acabarão com a lavratura do Termo de
Deserção, quando a partir de então estará o militar em situação de flagrante delito.
Palavras-chave: Militar. Crime militar. Crime de Deserção.
LISTA DE ABREVIATURAS
CPM - Código Penal Militar
CPPM - Código de Processo Penal Militar
CRFB – Constituição da República Federativa do Brasil
ICO - Instruções de Comunicação Oficial
IPM - Inquérito Policial Militar
OPM - Organização Policial Militar.
PMPR - Polícia Militar do Estado do Paraná
RDE - Regulamento Disciplinar do Exército
STM - Superior Tribunal Militar
VAJME - Vara da Auditoria Militar
SUMÁRIO
Resumo
Lista de Abreviaturas
1. INTRODUÇÃO. .................................................................................................... 10
2. JURISDIÇÃO MILITAR. ....................................................................................... 13
2.1 HISTÓRIA DO DIREITO PENAL MILITAR. ....................................................... 13
2.2 HISTÓRIA DO DIREITO PENAL MILITAR NO BRASIL. ................................... 13
2.3. DIREITO PENAL MILITAR. ............................................................................... 15
2.4 DIREITO ESPECIAL. ......................................................................................... 16
2.5 CONCEITO DE MILITAR. .................................................................................. 19
2.6 CRIME MILITAR. ................................................................................................ 21
2.6.1 CRIME PROPRIAMENTE MILITAR. .............................................................. 21
2.6.2 CRIME IMPROPRIAMENTE MILITAR. .......................................................... 23
3. CRIME DE DESERÇÃO NO CÓDIGO PENAL MILITAR BRASILEIRO. ............ 24
3.1 OBJETIVIDADE JURÍDICA DO CRIME DE DESERÇÃO. ................................ 25
3.2 SUJEITOS DO DELITO. .................................................................................... 26
3.3 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA. ................................................................... 27
3.4 PRAZO DE GRAÇA. .......................................................................................... 27
3.5 PRESCRIÇÃO NO CRIME DE DESERÇÃO. .................................................... 29
4. ART. 188 DO CPM - CASOS ASSIMILADOS AO CRIME DE DESERÇÃO. ...... 32
4.1 DESERÇÃO APÓS TRÂNSITO OU FÉRIAS. .................................................. 33
4.2 DESERÇÃO APÓS CASSAÇÃO DA LICENÇA OU AGREGAÇÃO OU APÓS
DCRETAÇÃO DO ESTADO DE SÍTIO OU DE GUERRA. ...................................... 35
4.3 DESERÇÃO APÓS CUMPRIMENTO DE PENA. .............................................. 37
4.4 CARACTERIZAÇÃO DA DESERÇÃO POR SIMULAÇÃO DE DOENÇA OU
INCAPACIDADE. ..................................................................................................... 38
4.5 ATENUANTES ESPECIAIS. .............................................................................. 40
4.6 AGRAVANTE ESPECIAL. ................................................................................. 40
5. DA DESERÇÃO ESPECIAL. ................................................................................ 42
5.1 ATENUANTES ESPECIAIS. .............................................................................. 43
5.2 AGRAVANTES ESPECIAIS............................................................................... 44
6. CONCERTO PARA DESERÇÃO. ........................................................................ 45
7. DESERÇÃO POR EVASÃO OU FUGA. .............................................................. 47
11. CONSIDERAÇÕES FINAIS. .............................................................................. 50
REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 51
1. INTRODUÇÃO.
O presente trabalho abordará o crime de Deserção no aspecto material
dando ênfase em sua aplicação no âmbito da Polícia Militar do Estado do Paraná.
Para nos situarmos, num primeiro momento há que ser realizado um estudo
histórico a respeito do Direito Penal Militar, inclusive analisando em paralelo o
surgimento do Crime de Deserção, remontando desde suas origens até os dias
atuais.
Num segundo momento há que ser realizado um estudo do Direito Penal
Militar no aspecto técnico, analisando o Código Penal Militar que dentre vários
outros crimes, tem previsto no Art. 187 o crime de Deserção que nada mais é senão
a ausência injustificada do militar por mais de oito dias da unidade em que serve ou
do lugar em que deve permanecer.
Será necessário realizar uma abordagem relativa ao Direito Penal Militar,
enquanto disciplina especial e autônoma, ou seja, diversa do Direito Penal Comum,
o qual tutela bens jurídicos próprios inerentes às forças militares federais e
estaduais.
No decorrer do trabalho será explanado sobre o que é entendido pela
doutrina pátria como crime militar e que no dizer de Jorge Cesar de Assis vem a ser:
“[...] toda violação acentuada ao dever militar e aos valores das instituições
militares. Distingue-se da transgressão disciplinar porque esta é a mesma
violação, porém na sua manifestação elementar e simples. A relação entre
crime militar e transgressão disciplinar é a mesma que existe entre o crime e
contravenção penal.” (ASSIS, 2004, p. 39).
Em relação ao crime militar há que ser explorada sua classificação uma vez
que doutrinariamente tais crimes subdividem-se em crime militar próprio e impróprio,
sendo que aqueles apenas são cometidos pela pessoa que está investida da
condição de militar. Neste ponto há de ser feita uma breve explicação sobre o que
vem a ser entendido como militar perante a lei penal, sendo que no Art. 22 do CPM Código Penal Militar Decreto Lei 1.001 de 21 outubro de 1969 encontramos o
conceito de Militar, vejamos:
Art. 22. É considerada militar, para efeito da aplicação dêste Código,
qualquer pessoa que, em tempo de paz ou de guerra, seja incorporada às
fôrças armadas, para nelas servir em pôsto, graduação, ou sujeição à
disciplina militar.
Ainda, segundo leciona Jorge Cesar de Assis, como crime Militar Impróprio
temos:
“[...] aqueles que estão definidos tanto no Código Penal Castrense quanto
no Código Penal Comum e que por um artifício legal torna-se militares por
se enquadrarem em uma das várias hipóteses do inc II do Art. 9º do diploma
militar repressivo. (Assis, 2004, p. 41)
Depois de realizada a classificação dos crimes militares será conceituado o
crime de Deserção capitulado no Art. 187 Código Penal Militar - Decreto Lei 1.001
de 21 outubro de 1969, segundo o qual entende-se como deserção o fato do militar
ausentar-se sem licença da unidade em que serve, ou do lugar em que deve
permanecer, por mais de oito dias.
Após a configuração do Crime de Deserção, com a lavratura do Termo de
Deserção estará o desertor em situação de flagrante delito, pois, segundo
entendimento consolidado da doutrina, trata-se de crime permanente sujeitando o
infrator a ser preso a qualquer momento e responsabilizado perante a Justiça Militar
castrense.
Cabe ressaltar que quando se fala no termo “militar” no mundo civil
rapidamente remete-se na mente das pessoas aos órgãos previstos no Art. 142 da
Constituição da República Federativa do Brasil, quais sejam a Marinha, Exército e
Aeronáutica, no entanto, muitas vezes por esquecimento ou mesmo por
desconhecimento não se visualizam como tais os integrantes das forças estaduais
de segurança que em verdade são militares estaduais.
Apesar de representarem um universo menor em relação às supracitadas
forças federais, também são militares em sua essência inclusive com previsão
Constitucional. Vejamos o que prevê o Art. 42 da Constituição da República
Federativa do Brasil:
Art. 42 Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares,
instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares
dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.
Estando as forças estaduais enquadradas como militares, por força do já
citado Art. 42, sobre elas incidem o Código Penal Militar e o Código de Processo
Penal Militar, cuja competência para aplicação neste caso recai sobre a Justiça
Militar Estadual também com previsão no Art. 125 §§ 3º e 4º da Constituição de
1988.
Cabe ressaltar que em sede de Crime de Deserção, apesar de não parecer,
tal tipo penal é bastante recorrente em julgamentos na Vara da Auditória Militar do
Estado do Paraná, haja vista que muitos milicianos acabam por se ausentar das
organizações policiais militares por mais de oito dias ou mesmo deixam de se
apresentar quando do término de seus afastamentos tais como férias, licenças e
congêneres.
Justifica-se a elaboração do presente estudo, tendo em vista que o meio
militar pelas importantes funções que exerce no âmbito pátrio possui em seu
cotidiano certas peculiaridades em seu modo de ser que muitas vezes são
desconhecidas das pessoas em geral, inclusive de boa parte de seus integrantes,
ficando seu conhecimento restrito a uma minoria. Mesmo as faculdades de Direito
existentes em nosso país, via de regra, não possuem uma disciplina específica que
trate a respeito do Direito Penal Militar que, em verdade, trata-se de um Direito
Especial.
Diante da ausência de disciplina específica o operador do Direito interessado
em atuar especificamente nesta área necessita buscar conhecimentos de forma
aleatória através de cursos de especialização ou através da doutrina pátria versante
sobre o assunto, que por sinal não é assim tão extensa em comparação com os
demais ramos do direito comum.
Diante do exposto e sendo integrante da Polícia Militar do Estado do Paraná,
inclusive já tendo atuado como juiz militar junto a Vara da Auditoria Militar do Estado
do Paraná, decidi escrever sobre a respeito do Crime de Deserção que muito
embora seja desconhecido de boa parcela da população e também de muitos
integrantes da classe jurídica, tal crime é muito recorrente nas fileiras da Polícia
Militar do Estado do Paraná.
Ao escolher esse tema objetivei de forma simultânea aprender mais sobre os
aspectos jurídicos que permeiam a caserna, em especial sobre o Crime de
Deserção, bem como dentro de minhas limitações, participar ainda que de forma
tímida na divulgação dos entendimentos dos nossos pouquíssimos doutrinadores a
respeito do Direito Militar.
2. JURISDIÇÃO MILITAR.
2.1 HISTÓRIA DO DIREITO PENAL MILITAR.
Segundo Loureiro Neto (2001, p. 19) evidências históricas indicam que entre
alguns povos civilizados da antiguidade já existia o embrião do Direito Penal Militar,
sendo que Indianos, Atenienses, Persas, Macedônios e Cartagineses, já conheciam
certos delitos militares e seus agentes eram julgados pelos próprios militares,
especialmente em tempo de guerra.
Apesar do exposto, Loureiro Neto (2001, pg. 19 e 20) reconhece que é em
Roma que o Direito Penal Militar ganhou força, adquirindo vida própria e passando a
ser considerado como instituição jurídica e diz que são numerosos e variados os
textos das leis romanas sobre essa matéria no Corpus Juris, figurando como
epígrafe no Digesto as expressões de re militare, de veteranis.
Na mesma linha de entendimento Pietro Vico (1917 apud Célio Lobão, 2006)
também entende que em Roma a violação do dever militar alcançou noção jurídica
perfeita, fato este que explica como conquistou seus vastos territórios através do
rigor da disciplina militar.
De acordo com Célio Lobão (2001, pg.48), no Digesto, Livro XLIX, Título
XVI, L. 2, vinha descrito o conceito de delito militar próprio como sendo o crime que
era cometido pelo militar nesta qualidade.
De acordo com Loureiro Neto (2001, pg. 20) os Gregos não conheciam a
noção exata dos crimes militares, uma vez tinham o entendimento de que todo
cidadão era considerado um soldado da pátria, fato este que não os motivou a
separar a justiça militar da comum. Continua o referido autor dizendo que na Idade
Média a Justiça Militar adquire a caráter feudal de foro privilegiado, vindo a se
despojar de tal característica somente com a Revolução Francesa no ano de 1889,
estabelecendo-se a restrição tão somente em razão das pessoas e da matéria.
2.2 HISTÓRIA DO DIREITO PENAL MILITAR NO BRASIL.
Segundo leciona Célio Lobão (2006, p. 50), “vigorava em Portugal o
Regulamento de 1763, conhecido como Artigos de Guerra do Conde de Lippe, que
vigorou no Brasil juntamente com a legislação esparsa em grande número de
alvarás, provisões, decretos, leis [...]
No mesmo sentido, Loureiro Neto (2001, pg. 21), segundo o qual “a primeira
legislação penal militar no Brasil refere-se aos Artigos de Guerra do Conde Lippe,
aprovados em 1763”.
De acordo com Godinho (1982 apud Loureiro Neto 2001), com a vinda da
Família real para o Brasil em 1808, D. João VI através do alvará de 21 de abril de
1808, criou o Conselho Supremo Militar e de Justiça, sendo que em 20 de outubro
de 1834 fora editada uma Provisão a qual previa crimes militares os quais por sua
vez eram divididos em duas categorias: os praticados em tempo de paz e de guerra.
Na mesma esteira Esmeraldino Bandeira (1919 apud Célio Lobão 2006),
observa que a provisão de 1834 é um dos mais antigos documentos que procura
extremar o crime militar do comum [...]
Com o passar do tempo, em 1891 através do decreto nº 18 de 7 de março
de 1891 houve a criação do primeiro Código Militar brasileiro que era o Código da
Armada, posteriormente também aplicado ao Exercito através da Lei nº 612 de 28
de setembro de 1899.
O Código Penal da Armada vigorou até o ano de 1944, quando então fora
editado novo diploma legal castrense, o Código Penal Militar de 1944 expedido pelo
Decreto Lei nº. 6.227 de 24 de janeiro de 1944, seguindo-se o atual Código Penal
Militar expedido pelo Decreto Lei nº. 1.001, de 21 de outubro de 1969. (LOBÃO,
2006, p. 51)
2.3. DIREITO PENAL MILITAR.
Antes de adentrarmos efetivamente ao estudo do tipo penal relativo ao crime
de Deserção, cumpre fazermos um breve apontamento a respeito das funções que
são desempenhadas diretamente pelas Forças Armadas e pelas polícias e
bombeiros militares, instituições estas com previsão Constitucional.
Como é de se esperar, o Direito Militar é mais rígido em sua aplicação em
razão da natureza das missões atribuídas às instituições militares, vejamos a
respeito.
De acordo com o previsto no Art. 142 da Constituição da Republica
Federativa do Brasil de 1988, temos que:
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e
pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares,
organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade
suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à
garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer
destes, da lei e da ordem. [grifo nosso]
Do exposto no texto Constitucional, podemos observar claramente que a
finalidade da existência das Forças Armadas no Brasil é a sua destinação à defesa
da pátria, à garantia dos poderes constituídos e quando requisitadas por qualquer
dos Poderes Constitucionais, também se destinam à garantia da lei e da ordem.
Outro aspecto de suma importância que não podemos olvidar refere-se à
finalidade da existência das polícias e bombeiros militares das unidades federativas,
que conforme já visto, são instituições militarizadas, organizadas com base na
hierarquia e disciplina e que exercem simultaneamente funções de suma
importância dentro de nossa organização estatal, pois, atuam cotidianamente na
área da Segurança Pública no combate à criminalidade e no exercício do socorro
público através das atividades de defesa civil, sem prejuízo da previsão feita pela Lei
Maior de serem forças reserva e auxiliares do Exército Brasileiro, ou seja, com
possibilidade de aplicação na Defesa Territorial em casos de agressão estrangeira.
Constitucionalmente,
cabem
às
polícias
militares
a
realização
do
policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública, sendo que aos Corpos de
Bombeiros Militares cabem as atividades de defesa civil, vejamos o previsto no Art.
144 da CRFB:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade
de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
[...]
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.
[...]
§ 5º - às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da
ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições
definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.
§ 6º - As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças
auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as
polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos
Territórios. [grifo nosso]
2.4 DIREITO ESPECIAL.
Os doutrinadores dividem o direito penal em direito penal comum e especial.
Segundo leciona Julio Fabbrini Mirabete em seu Manual de Direito Penal,
Parte Geral,
“distinguem os doutrinadores o Direito Penal comum, que se aplica às todas
as pessoas e aos atos delitivos em geral, do Direito Penal especial dirigido a
uma classe de indivíduos de acordo com sua qualidade especial, e a certos
ilícitos particularizados”. (MIRABETE, 2003, p. 26)
Segundo Noronha (2003, p. 9): ”a nosso ver, o melhor critério que estrema o
direito penal comum dos outros é o da consideração do órgão que os deve aplicar
jurisdicionalmente.”
Também de acordo com Lobão (2006, p. 41): dentre as correntes que
procuram extremar o Direito Penal Comum do Especial, destaca-se aquela liderada
por Frederico José Marques a qual é seguida por outros doutrinadores, dentre os
quais Damásio de Jesus e segundo o qual o critério para essa diversificação está no
órgão encarregado de aplicar o direito objetivo.
Cabe ressaltar que a doutrina não é unânime em classificar o Direito Penal
Especial em virtude do órgão encarregado da aplicação da lei penal objetiva. De
acordo com Lobão (2006, p. 42) fazê-lo desta forma “demonstra evidente confusão
entre Direito Penal especial e Direito Processual Penal especial, talvez em razão de
existir igualmente, Direito Processual Penal Comum e Direito Processual especial
[...]”.
Continua o ilustre doutrinador, citando o entendimento de Romeu de
Campos Barros, de acordo com o qual
[..] a especialidade do processo pode não levar em conta a especialidade
da Justiça. Assim, numa outra divisão, vamos encontrar normas de
processo reguladas nas chamadas leis estravagantes, estabelecendo
procedimentos especiais para determinadas infrações penais, mas que são
aplicadas pela Justiça comum.
De acordo com Lobão (2006, p. 43), se a Justiça especial não serve de critério
único e determinante do processo penal especial, uma vez que na Justiça Comum
muitas vezes tramita processo penal especial, com muito menos razão não serve
para distinguir ou extremar o direito penal comum do especial.
Frederico Marques (1980 apud Célio Lobão, 2006), afirma que o direito
processual, seja ele civil ou penal, possui objeto próprio, qual seja, a jurisdição que
nada mais é do que a função estatal para resolver litígios. De acordo com o ilustre
autor, para exercer a jurisdição penal o juiz aplica o Direito Penal que é o
instrumento para resolver o litígio penal. Dizendo isso, Frederico Marques quer
demonstrar que o direito penal possui objeto próprio, assim como o Processo Penal
também o tem. De acordo com Marques, o Direito Penal tem como objeto estruturar
juridicamente o crime estabelecendo a sanção, sendo que o Processo Penal por sua
vez tem como objeto regular o exercício da jurisdição.
De acordo com Lobão (2006, p. 43), tendo cada um objeto próprio, um tratando
do “crime, sanção penal e a respectiva ligação”, o outro da “jurisdição, processo e
resolução da lide penal”, como seria possível incluir neste a classificação daquele?
Continua Lobão, dizendo que a classificação proposta é insustentável, citando
à titulo de exemplo
a Lei 1.802 de 5 de janeiro de 1953 editada durante a
Constituição de 1946, na qual alguns delitos nela como atentar contra a vida,
incolumidade e a liberdade das autoridades das Forças Armadas eram de
competência da Justiça Militar, sendo que os demais delitos, em sua maioria delitos
especiais eram de competência da Justiça Comum.
Segundo Lobão, outro fator que demonstra a insustentabilidade da doutrina
pátria que defende ser o órgão responsável pela aplicação da lei o fator responsável
pela diferenciação do Direito Penal Comum e do especial, é a questão relativa ao
direito penal militar francês, que cerca de 15 anos atrás extinguiu a Justiça Militar de
seu território, apenas a mantendo junto a seus corpos de tropa acantonadas em
outro país. Desta forma, caso um militar acantonado fora do território francês venha
a cometer um crime será julgado pela Justiça Militar caso esta exista junto aquele
corpo de tropa; já o será de competência da justiça comum francesa caso seja
cometido fora do território francês em corpo de tropa desprovido de justiça
especializada, bem como assim também ocorrerá se o militar cometer um delito em
território francês.
Dando prosseguimento à sua linha de raciocínio, Lobão diz que o critério do
órgão encarregado da aplicação do direito positivo não se presta para distinguir o
direito penal especial do comum.
Romeu de Campos Barros (1987 apud Lobão) diz que há crimes especiais que
são processados e julgados pela justiça comum, bem como a recíproca é
verdadeira, onde o delito comum pode ser processado e julgado pela jurisdição
especial conforme ocorreu com o DL nº. 898/69, na Lei 1.802/53 e ocorre no Código
Penal Militar.
De acordo com os ensinamentos de Lobão (2006, p. 47), o fato do direito
francês julgar na Justiça comum o crime militar cometido por seus militares em seu
território ou fora dele junto à unidade de tropa desprovida de justiça especializada
não transforma a norma especial em comum. Ainda, para o ilustre autor, a questão
da Constituição Brasileira prever a aplicação da lei penal militar por órgão
especializado também, por si só, não é suficiente para especializar a norma penal,
pois esse mesmo órgão especial no passado já foi responsável pela aplicação da
norma penal comum como explanado anteriormente em relação ao DL nº. 898/69 e
na Lei 1.802/53, e continua a fazê-lo quando, por exemplo, conhece de homicídio
cometido de militar contra militar ou de civil contra militar em serviço.
Concluindo seu raciocínio, Lobão (2006, p. 48), nos diz que “O Direito Penal
Militar é especial não só porque se aplica a uma classe ou categoria, como afirma
Heleno Fragoso,1 como também pela natureza do bem jurídico tutelado”. Assim
sendo, o direito penal militar, como lei especial que é, aplica-se predominantemente
ao militar, muito embora não se possa falar do caráter de personalidade dessa lei,
tendo em vista que excepcionalmente também aplica-se ao civil nos casos de ofensa
aos bens jurídicos de interesse das instituições militares e que estejam relacionados
com sua destinação Constitucional e legal.
2.5 CONCEITO DE MILITAR.
De acordo com o previsto no Art. 22 do Código Penal Militar observamos que:
Art. 22. É considerada militar, para efeito da aplicação dêste Código,
2
qualquer pessoa que, em tempo de paz ou de guerra, seja incorporada às
fôrças armadas, para nelas servir em pôsto, graduação, ou sujeição à
disciplina militar.
Para Jorge Cesar de Assis (2007, p.65), este dispositivo encontra-se
atualmente revogado, tornando-se Constitucional o conceito de militar, sendo que a
“Emenda Constitucional nº. 18 de 05.02.1998, passou a disciplinar os militares em
artigos distintos, sem lhes alterar, entretanto, a classificação Constitucional.”
De acordo com Assis, o Art. 42 da Carta Magna passou a disciplinar os
militares dos Estados, Distrito Federal e Territórios e o Art. 142 § 3º disciplinou os
militares integrantes das Forças Armadas Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 e modificado pela Emenda Constitucional nº 18 de 1998. Vejamos o
Art. 42 da CRFB/88:
Art. 42 Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares,
instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares
dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.
1
(...) o direito penal comum é o que se aplica a todos os súditos indistintamente. Especial é o que se
aplica apenas a uma classe ou categoria em que se acham. Perante nossa legislação, é Direito Penal
especial o Direito Penal Militar.
2
Incorporação é o ato de inclusão do convocado ou voluntário em uma Organização Militar da Ativa
das Forças Armadas (Art. 20 da Lei 4.375 de 17 agosto de 1964 – Lei do Serviço Militar).
Vejamos também o Art. 142 § 3º da CRFB/88:
§ 3º Os membros das Forças Armadas são denominados militares [...]
Para o citado autor, servidor público militar é gênero que apresenta duas
espécies, a saber:
- Servidores Militares Federais, que são os componentes das Forças
Armadas; e
- Servidores Militares Estaduais, que são os componentes das Polícias e
Bombeiros Militares do Estados, Distrito Federal e Territórios.
Para o doutrinador Célio Lobão (2006, p.101) o conceito de militar também
vem expresso no Art. 22 do Código Penal Militar, e ao contrário de Jorge Cesar de
Assis, não faz menção á revogação do mesmo pela atual Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988. Segundo ele, as alterações ocorridas no texto
Constitucional nos Art. 42 e 142 § 3º ocorreram por razões de reajustes salariais dos
militares, tendo em vista que de acordo com o texto original o Inciso X do Art. 37
estabelecia que “a revisão geral da remuneração dos servidores públicos, sem
distinção de índices entre servidores públicos civis e militares, far-se-á sempre na
mesma data.”
Da forma como estava redigido o texto Constitucional, qualquer reajuste
salarial alcançaria todos os servidores públicos, mas, devido a inflação, era
necessário conceder um reajuste salarial aos militares, sendo feitas as devidas
alterações através da Emenda Constitucional nº 18 de 05 de fevereiro de 1998.
Para Lobão, as modificações realizadas no texto Constitucional, em nada
modificou a competência da Justiça Militar, seja ela Federal ou Estadual, pois
segundo ele, os integrantes das Polícias Militares e Bombeiros Militares eram e
ainda continuam sendo militares estaduais e devem ser julgados pela Justiça Militar
Estadual, pelos crimes militares que vierem a cometer nos termos do Art. 125 § 4º
da CRFB:
§ 4º Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos
Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra
atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a
vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do
posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças.
De acordo com Lobão “Os integrantes das forças armadas, referidos no art.
22 do Código Penal Militar, só e exclusivamente eles, são militares para efeito da
aplicação da lei penal castrense pela Justiça Militar Federal [...]
Finalizando seu entendimento, Célio Lobão diz que por militar entende-se
quem:
“se encontra incorporado as Forças Armadas, à Polícia Militar e ao Corpo
de Bombeiros Militares, mesmo estando afastado temporariamente do
serviço ativo, por licença para tratamento de saúde, licença especial, férias,
licença para tratar de interesse particular, etc.. Enfim, o que interessa é o
vínculo à instituição militar que desaparece com a exclusão do serviço ativo
por transferência para a reserva remunerada, por reforma, demissão ou
outros previstos no Estatuto dos Militares.” (LOBÃO, 2006. P. 103)
2.6 CRIME MILITAR.
Para Jorge Cesar de Assis (2007, p. 42) crime militar é “toda violação
acentuada ao dever militar e aos valores das instituições militares.” Para ele o crime
militar distingue-se da transgressão disciplinar, tendo em vista que esta, apesar de
também ser uma violação, o é apenas em seu aspecto mais elementar, ou seja,
ofende os bens jurídicos tutelados pela norma penal militar só que em menor escala.
Finaliza o ilustre doutrinador dizendo que a “relação entre crime militar e
transgressão disciplinar é a mesma que existe entre crime e contravenção penal.”
2.6.1 CRIME PROPRIAMENTE MILITAR.
Apesar do presente trabalho versar apenas sobre o Crime de Deserção
propriamente dito, necessário se faz mencionar a respeito da classificação que a
doutrina estabeleceu em relação ao Crime Militar o qual pode ser dividido em Crime
Propriamente Militar e Crime Impropriamente Militar, vejamos o que se entende a
respeito.
Pelo olhar de Jorge Cesar de Assis, o qual levando em consideração que a
caracterização do crime militar obedece ao critério ex vi legis, entende ele como
sendo crime militar próprio:
[...] aquele que só está previsto no Código Penal Militar e que só pode ser
praticado por militar, exceção feita ao crime de INSUBMISSÃO, que apesar
de só estar previsto no Código Penal Militar (art. 183) só pode ser cometido
por civil. (ASSIS, 2007, p.43). [grifo do autor].
Silvio Martins Teixeira (1946 apud Assis 2007) entende que “são chamados
crimes propriamente militares aqueles cuja prática não seria possível senão por
militar, porque essa qualidade do agente é essencial para que o fato delituoso se
verifique.”
Já nos ensinamentos de Célio Lobão entende-se como crime propriamente
militar:
“a infração penal prevista no Código Penal Militar, específica e funcional do
ocupante do cargo militar, que lesiona bens ou interesses das instituições
militares, no aspecto particular da disciplina, da hierarquia, do serviço e do
dever militar.” (LOBÃO, 2007, p. 84).
Ainda, de acordo com os ensinamentos de Esmeraldino Bandeira (1919
apud Lobão 2007, p.81) o direito romano já conhecia definição precisa do que era
crime propriamente militar o qual consistia no tipo de crime que “só o soldado pode
cometer” haja vista que está intrinsecamente relacionado com a vida militar e assim
também estava previsto no Digesto Liv. XLIX, Título XVI, L. 2. que continha o
seguinte: “De re militare (...) Proprium militari est delictum quod quis uti
miles
admittit” .
Também de acordo com Lobão, há tempos que a doutrina e a jurisprudência,
entendia haver a distinção entre Crime Militar Próprio e Impróprio, sem, no entanto
terem qualquer sustentáculo na legislação em vigor, fato este que somente veio com
a promulgação da CRFB de 1988 que em seu Art. LXI trouxe a previsão. Vejamos.
LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de
transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;
2.6.2 CRIME IMPROPRIAMENTE MILITAR.
Para Jorge Cesar de Assis, (2007, p. 43), são considerados crimes militares
impróprios “aqueles que estão definidos tanto no Código Penal Castrense quanto no
Código Penal Comum e, que, por um artifício legal tornam-se militares por se
enquadrarem em uma das várias hipóteses do inciso II do Art. 9º do diploma militar
repressivo.”
Para Lobão (2006, p. 97-98), crime impropriamente militar “é a infração
penal prevista no Código Penal Militar que, não sendo “específica e funcional da
profissão do soldado”, lesiona bens ou interesses militares relacionados com a
destinação constitucional e legal das instituições castrenses”.
Esmeraldino Bandeira (1919 apud Célio Lobão 2006, p. 97), tem como crime
impropriamente militar,
“aquele que pela condição de militar do culpado, ou pela espécie militar do
fato, ou pela natureza militar do local ou finalmente, pela anormalidade do
tempo em que é praticado, acarreta dano à economia, ao serviço ou à
disciplina das forças armadas.” (BANDEIRA, 1919, p. 31).
3. CRIME DE DESERÇÃO NO CÓDIGO PENAL MILITAR BRASILEIRO.
Após breve estudo à respeito do Direito Penal Militar para melhor situar o
assunto objeto deste trabalho, passaremos agora a discorrer sobre o Crime de
Deserção propriamente dito.
José da Silva Loureiro Neto, (2001, p. 154) nos diz que deserção vem de
desertio que por sua vez deriva de deserere cujo significado é abandonar,
desamparar.
De acordo com os ensinamentos do citado autor, em Roma já havia a figura
do desertor que se diferenciava da figura do emansor ou ausente. Assim sendo, o
ausente ou emansor era o militar que, tendo se ausentado, regressava ao corpo de
tropa por conta própria, enquanto que o desertor era aquele militar que retornava a
seu corpo de tropa conduzido à força. Vejamos o contido em nota de rodapé da obra
de Loureira Neto e que versa sobre a Digesta de re militare, §§ 2º e 3º da lei 3ª Liv.
XLIL:
“Emansor est, qui dui vagatur, ad castra regreditur (emansor ou ausente é
aquele que regressa ao campo depois de ter vagado muito tempo) e
Desertor est, qui per prolixum tempus vagatur reducitur (desertor é o que
depois de ter vagado por muito tempo, vem reconduzido)” - (LOUREIRA
NETO, 2001, p. 154)
Atualmente, em termos de Brasil, de acordo com o previsto no Art. 187 do
Código Penal Militar, constitui crime de Deserção:
“Ausentar-se o militar, sem licença, da unidade em que serve, ou do lugar
em que deve permanecer, por mais de oito dias:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos; se oficial, a pena é agravada.“
As pessoas de um modo geral quando passam a integrar os efetivos
militares das Forças Armadas ou das milícias pertencentes às unidades federativas,
brasileiras, adquirem a condição de militares quando a partir de então farão jus a
determinadas prerrogativas, mas principalmente, passarão a observar certos
deveres e obrigações que lhes serão peculiares e que à partir de sua incorporação
deverão ser fielmente observados sob as penas da lei. Aliás, a Lei nº 6.880 de 9 de
dezembro de 1980 - Estatuto dos Militares prevê em seu Art. 32 que:
Art. 32. Todo cidadão, após ingressar em uma das Forças Armadas
mediante incorporação, matrícula ou nomeação, prestará compromisso de
honra, no qual afirmará a sua aceitação consciente das obrigações e dos
deveres militares e manifestará a sua firme disposição de bem cumpri-los.
3.1 OBJETIVIDADE JURÍDICA DO CRIME DE DESERÇÃO.
Trata-se de Crime cuja objetividade jurídica é a proteção ao serviço militar,
sendo que Coimbra Neves (2002, p.253), também entende que tutela-se “o dever
militar, o comprometimento, a vinculação do homem aos valores éticos e funcionais
da caserna e de sua profissão”.
À título de exemplo, podemos dizer que, quando um civil deixa de
comparecer a seu emprego, via de regra não há em si uma conduta a ser
criminalizada, pois assim não quis o legislador pátrio.
Já no que diz respeito aos militares, como integrantes de instituições
previstas Constitucionalmente, organizadas com base na hierarquia e na disciplina
militares, e destinadas à defesa da pátria, quis o legislador criminalizar a conduta
daquele que, sem autorização, ausenta-se, sem motivo justo, da unidade em que
serve ou do lugar que deveria permanecer, uma vez que possuía o dever de se
manter vinculado á força militar até o seu desligamento conforme estabelece a lei.
Célio Lobão (1975 apud Assis, 2007, p. 384) diz que:
“Se a lei penal considera crime o fato de o funcionário público civil
abandonar o cargo, com maior razão o Direito Penal Militar contempla, no
elenco dos fatos delituosos, a ausência do militar por mais de oito dias, sem
a devida autorização, levando-se em conta a relevância do cargo exercido
pelo funcionário militar, bem como pela necessidade de preservar a
disciplina que sofreria dano sério, com o afastamento injustificado dos
militares ao seu bel prazer, das unidades em que servem, afetando,
inclusive, a própria segurança do organismo militar e mesmo da própria
Nação.”
De acordo com Célio Lobão (2006, p. 298), quis o legislador proteger o
interesse da instituição castrense em contar com o efetivo estabelecido em lei, o que
poderia não ocorrer caso ficasse à critério do militar ausentar-se da corporação.
3.2 SUJEITOS DO DELITO.
O sujeito ativo do crime de deserção trata-se do militar, seja federal ou
estadual, considerado como tal o cidadão que é incorporado para servir nas Forças
Armadas, nas Polícias Militares ou nos Corpos de Bombeiros Militares.
De acordo Cícero Robson Coimbra Neves (2002, p. 253 e 254), “o marco
que habilita a pessoa a cometer o crime de deserção, portanto, é o ato de
incorporação à Força Militar, ou ato equiparado que inicie o vínculo de ligação com a
instituição militar”.
Como ato equiparado de tal ligação Célio Lobão (2006, p. 304) entende que
“o cidadão matriculado e incorporado em órgão de formação de reserva adquire a
condição de militar e como consequência pratica o crime de deserção.”, pois assim
dispõe o Art. 22 § 1º da Lei 4.375 de 17 de agosto de 1964 da Lei do Serviço Militar3,
bem como no Art. 3º do Decreto nº. 57.654 de 20 de janeiro de 1966 Regulamento
da Lei do Serviço Militar 4.
Sintetiza ele seu entendimento, dizendo que se o cidadão concorre à
incorporação e não comparece, comete o crime de Insubmissão; já se concorre e
chega ser incorporado, ausentando-se por mais de oito dias, será considerado
desertor, sendo irrelevante se trata-se de organização militar da ativa ou órgão de
formação de reserva.
3
Art. 22. Matrícula é o ato de admissão do convocado ou voluntário em qualquer Escola, Centro,
Curso de Formação de Militar da Ativa, ou Órgão de Formação de Reserva.
§ 1º Os brasileiros matriculados em Escolas Superiores ou no último ano do Ciclo Colegial do Ensino
Médio, quando convocados para o Serviço Militar, inicial, serão considerados com prioridade para
matricula ou incorporação nos Órgãos de Formação de Reservas, existentes na Guarnição Militar
onde os mesmos estiverem freqüentando Cursos, satisfeitas as demais condições de seleção
previstas nos regulamentos dêsses Órgãos.
4
Art. 3° Para os efeitos dêste Regulamento são estabelecidos os seguintes conceitos e definições:
[...]
21) incorporação - Ato de inclusão do convocado ou voluntário em Organização Militar da Ativa, bem
como em certos Órgãos de Formação de Reserva.
[...]
O sujeito passivo do delito são as instituições militares.
3.3 CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA.
Trata-se de crime propriamente militar, pois somente o militar pode cometêlo, haja vista que exige a tal condição.
De acordo com Assis (2007.379), quanto a natureza há divergência entre os
autores, entendendo uns que se trata de crime formal, outros de mera conduta, ou
ainda, uma terceira corrente que tal crime é simultaneamente formal e de mera
conduta.
Já para Célio Lobão (2006, p. 298), é “Crime de mera conduta e
permanente, ensejando, por este motivo a prisão do desertor em flagrante”,
entendimento este acompanhado por Assis por achá-lo mais apropriado.
Coimbra Neves (2002, p.256), também o classifica como delito de mera
conduta.
Loureiro Neto (2001, p. 154), entende que “tendo transcorrido o prazo de
graça, o crime está consumado, pois se trata de crime formal que se constitui pelo
simples transcurso desse prazo, que é de oito dias.”
Sendo crime permanente, sujeita o autor da deserção à prisão em flagrante
delito, haja vista que sua consumação se prolonga no tempo.
3.4 PRAZO DE GRAÇA.
Por questão de política criminal, a caracterização do Crime de Deserção
depende do transcurso de um determinado lapso temporal que, pelo contido no Art.
187 do CPM, é de mais de 8 (oito) dias de ausência do militar da unidade em que
serve ou do lugar onde deveria permanecer.
Antes do transcurso dos 8 (oito) dias, o que se tem é a ausência do militar,
que apenas o coloca em situação de transgressão disciplinar, passível de ser punido
administrativamente conforme os regulamentos internos da caserna.
A doutrina denomina o prazo de 8 (oito) dias de “período de graça”, sendo
que cada país adota determinado lapso temporal, uns adotando mais dias outros
menos dias.
Segundo Loureiro Neto (2001, p. 154 e 155), o prazo de oito dias é admitido
no Brasil desde a Ordenança de abril de 1805. De acordo com seu entendimento o
prazo varia conforme a tradição do direito de cada país, sendo que na Alemanha e
na Bolívia, por exemplo, o prazo de graça é de 3 (três) dias enquanto que no Chile
pode ser de 8, 4 e 3 dias, dependendo do caso. Loureiro Neto diz ainda, que o
prazo parece ter sido estabelecido na antiguidade com dupla finalidade, sendo uma
delas a de permitir o ausente regressar a seu corpo de tropa através de longa
jornada antes de ser considerado desertor, a outra seria a de proporcionar ao
ausente tempo suficiente para repensar seu ato e voltar às fileiras.
De acordo com o contido no Art. 451 § 1º do Código de Processo Penal
Militar:
“A contagem dos dias de ausência, para efeito da lavratura do termo de
deserção, iniciar-se-á a zero hora do dia seguinte àquele em que for
verificada a falta injustificada do militar.”
De acordo com Assis (2007, p. 380), “a contagem do prazo de graça iniciase no dia seguinte ao da verificação da ausência do militar, sendo que o dia final é
contado por inteiro”. Segundo ele a contagem é aritmética e não jurídica.
Exemplo: caso um militar seja dado como ausente em data de 04/02, a
contagem do primeiro dia do período de graça iniciar-se-à às 00hmin do dia 05/02, e
pós o transcurso do prazo, oitavo dia da contagem recairá em 12/02. No exemplo
em questão o crime de Deserção estará configurado no primeiro minuto do dia
13/02.
Ainda, nos ensinamentos de Assis, a expressão “dia é o período de tempo
de (24 horas) que a Terra leva para dar uma volta em torno de seu próprio eixo
(movimento de rotação)” e que não se confunde com a expressão “dia” designada
para a luz solar, contrapondo-se à sua ausência que é a “noite”. Destarte, sendo o
período de graça de oito dias, Assis, nos diz que podemos expressá-lo através da
seguinte fórmula:
PG = 8 x 24 horas = 192 horas.
Concluindo seu raciocínio, Assis, diz que para a configuração do Crime de
Deserção, necessário se faz que o militar fique ausente por mais de oito dias (192
horas), seja a ultrapassagem de um dia, uma hora, um minuto, ou mesmo que seja
de um segundo, sempre tendo como parâmetro a 00h00min (zero hora) tanto do dia
de início quanto do dia de término.
3.5 PRESCRIÇÃO NO CRIME DE DESERÇÃO.
Ao tratar da Prescrição como uma das causas extintivas da punibilidade,
Mirabete (2003, p. 402), a conceitua como sendo “a perda do interesse de punir do
Estado pelo decurso do tempo”.
De acordo com seus ensinamentos, duas são as espécies de prescrição,
sendo que uma delas trata-se da prescrição da “pretensão punitiva”, também
chamada erroneamente de “prescrição da ação penal”, relaciona-se com o direito de
punir do Estado ocorrendo sempre antes do trânsito em julgado da sentença e
sendo regulada pelo máximo de pena cominada em abstrato; por sua vez temos a
outra espécie que se trata da “prescrição da pretensão executória” que em suma,
ocorre após o trânsito em julgado da sentença para ambas as partes, surgindo um
“título penal a ser executado dentro de determinado lapso temporal e que varia de
acordo com a pena concretamente aplicada”.
No que se relaciona a legislação penal militar, o Código Penal Militar
Brasileiro prevê em seu Art. 123 as causas extintivas de punibilidade, sendo de
nosso interesse neste estudo somente aquela prevista no Inc. IV que trata a respeito
da Prescrição, vejamos o dispositivo:
Art. 123. Extingue-se a punibilidade:
[...]
IV - pela prescrição;
[...]
Dando continuidade à linha de raciocínio, temos que o Código Penal Militar
em seu Art. 125 e incisos dispõe a respeito da norma geral regulatória do instituto da
prescrição o que o faz baseado nas penas máximas em abstrato previstas para os
crimes.
Ocorre que, apesar de ter realizado uma normatização em relação à
prescrição para os crimes militares em geral, no que se relaciona aos crimes de
Insubmissão e Deserção, quis o legislador estabelecer critérios diferentes para que
ocorresse prescrição o que o fez respectivamente por meio do Art. 131 e 132 do
CPM.
Para o crime de Insubmissão (Art. 131CPM)5, ficou estabelecido que as
normas relativas a prescrição previstas no Art. 125 e Incisos, somente começam a
correr quando o Insubmisso completar 30 (trinta) anos de idade.
No que se relaciona ao Crime de Deserção, objeto de interesse deste
estudo, a norma “especial” da prescrição está regulada também pelo Art. 132 do
CPM6, de acordo com a qual “No crime de deserção, embora decorrido o prazo da
prescrição, esta só extingue a punibilidade quando o desertor atinge a idade de
quarenta e cinco anos, e, se oficial, a de sessenta”.
Verifica-se, portanto que somente aos quarenta e cinco anos de idade estará
extinta a punibilidade para a ocorrência da prescrição.
De acordo com Assis (2007, p. 273), mesmo que decorra o prazo previsto no
Art. 125 Inc. VI do CPM, estando ainda o desertor foragido, aguardar-se-à a idade
de 45 anos de idade, caso seja praça ou 60 caso seja oficial, para que seja extinta a
punibilidade.
O citado autor chama a atenção para a coexistência e conciabilidade das
regras postas no Art. 125 e no Art. 132 do CPM, assim, embora já tenha sido objeto
de explanação, importa lembrarmos que a Deserção é um crime permanente, ou
seja, sua consumação se protrai no tempo enquanto não cessar a atividade
delituosa, fato este que impede o início do prazo da prescrição. É o que se
depreende do previsto no Art. 125 § 2º do CPM, vejamos tal dispositivo:
Art. 125. A prescrição da ação penal, salvo o disposto no § 1º dêste artigo,
regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime,
verificando-se:
[...]
§ 2º A prescrição da ação penal começa a correr:
[...]
c) nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência;
5
Art. 131 do Código Penal Militar - A prescrição começa a correr, no crime de insubmissão, do dia em
que o insubmisso atinge a idade de trinta anos.
6
Art. 132 do Código Penal Militar - No crime de deserção, embora decorrido o prazo da prescrição,
esta só extingue a punibilidade quando o desertor atinge a idade de quarenta e cinco anos, e, se
oficial, a de sessenta.
[...]
Segundo Assis, não há duvida de que o Art. 132 do CPM é dirigido aos
desertores que se encontram foragidos (trânsfugas), no entanto, será a partir da
data que se apresentar ou for capturado e for reincluído, é que passará a correr o
prazo da prescrição previsto no Art. 125 Inc. VI do CPM.
4. ART. 188 DO CPM - CASOS ASSIMILADOS AO CRIME DE DESERÇÃO.
O Código Penal Militar em seu Art. 188 trata do que preferiu chamar de
Casos Assimilados.
De acordo com o caput do referido artigo, na mesma pena do crime de
Deserção incidirá o militar que praticar qualquer uma das condutas previstas nos
seus incisos, que são em número de quatro. Vejamos o dispositivo legal:
Art. 188. Na mesma pena incorre o militar que:
I - não se apresenta no lugar designado, dentro de oito dias, findo o prazo
de trânsito ou férias;
II - deixa de se apresentar a autoridade competente, dentro do prazo de oito
dias, contados daquele em que termina ou é cassada a licença ou
agregação ou em que é declarado o estado de sítio ou de guerra;
III - tendo cumprido a pena, deixa de se apresentar, dentro do prazo de oito
dias;
IV - consegue exclusão do serviço ativo ou situação de inatividade, criando
ou simulando incapacidade.
Tratando do assunto, o doutrinador Célio Lobão (2006, p. 309 e 310), ao
invés de chamar as situações elencadas nos Incisos I, II e III de Casos Assimilados,
como o fez o CPM, prefere denominá-los de Deserção Após Ausência Autorizada, e
assim o faz por entender que as descrições ali contidas não divergem do crime de
Deserção. De acordo com Lobão, nos casos tratados pelo Art. 188, não se trata de
similitude, mas sim de modalidade de deserção, “na qual o militar encontra-se
legalmente afastado da efetiva prestação de serviço” e por ocasião do término do
afastamento não se apresenta dentro do prazo de oito dias.
Sendo modalidades do Crime de Deserção, assim como ele, são crimes
militares por se enquadrarem no disposto no Art. 9º Inc. I 2ª parte. Também são
crimes militares próprios, tendo em vista que só o militar pode cometê-los.
A objetividade jurídica do crime previsto no Art. 188, também é o serviço
militar e o dever militar assim como ocorre na Deserção.
Como sujeitos do delito, temos ativamente o militar que somente ele pode
cometê-lo e passivamente temos as instituições militares.
Vamos à análise dos incisos do Art. 188 do CPM:
4.1 DESERÇÃO APÓS TRÂNSITO OU FÉRIAS.
“I - não se apresenta no lugar designado, dentro de oito dias,
findo o prazo de trânsito ou férias;”
Conforme se observa, no caso deste inciso, o militar deixa de se apresentar
no local onde deveria findo o prazo do trânsito ou das férias de oito dias.
De acordo com Coimbra Neves (2002, p. 268), “trânsito consiste no
afastamento regular do militar que, em razão de sua classificação em outra unidade,
deve deslocar-se para a assunção de novo cargo”.
O Estatuto dos Militares Lei nº 6.880 de 9 de dezembro de 1989, ao dispor
sobre os direitos de afastamento dos militares, no Art. 64 Inciso IV, estabelece que
por motivo de trânsito, pode o afastamento atingir até o limite de 30 (trinta) dias.
Art. 64. Os militares têm direito, ainda, aos seguintes períodos de
afastamento total do serviço, obedecidas às disposições legais e
regulamentares, por motivo de:
[...]
IV - trânsito: até 30 (trinta) dias.
Cabe ressaltar que cada Polícia ou Bombeiro Militar pode dispor de
regramento próprio a respeito, concedendo mais ou menos dias, no entanto o
entendimento do que vem a ser “trânsito” doutrinariamente é o mesmo no meio
militar.
À título de exemplo, podemos citar o Regulamento Interno e dos Serviços
Gerais da Polícia Militar do Estado do Paraná (RISG)7, que ao cuidar dos
afastamentos temporários dos militares estaduais, regulamenta no Art. 392 o que é
entendido como trânsito, bem como em seu Inciso II estabelece a duração dos
períodos de trânsito. Vejamos:
Art. 392. Trânsito é o período de afastamento total do serviço concedido ao
militar estadual, cuja movimentação implique, obrigatoriamente, em
mudança de sede, e que se destina à sua efetivação, devendo observar o
seguinte:
[..]
II - duração:
a) quatro dias, se onde irá servir estiver na mesma região metropolitana ou
não exceder a cem quilômetros do local em que o movimentado servia;
b) oito dias nos demais casos. (grifo nosso)
De acordo com o Art. 63 do Estatuto dos Militares Lei nº 6.880 de 9 de
dezembro de 1989, “Férias são afastamentos totais do serviço, anual e
obrigatoriamente concedidos aos militares para descanso, a partir do último mês do
ano a que se referem e durante todo o ano seguinte.” Como é sabido trata-se de
Direito Constitucionalmente assegurado pelo Art. 7º Inciso XVII c/c o Art. 142 § 3º
da Lei Maior.
As férias também estão previstas no Art. 50 Inc. IV alínea “O” do Estatuto
dos Militares sendo um dos direitos a que faz jus o militar.
No Art. 64 do Estatuto dos Militares, constam outros tipos de afastamentos
temporários do serviço como no caso de núpcias (8 dias), luto(8 dias) e
instalação(10 dias) que por sinal não estão englobados como hipóteses do Art. 188
do CPM. Cabe ressaltar porém, que apesar de não previsto na lei penal castrense, o
7
Criado pelo Decreto Estadual nº. 7.339 de 08 de junho de 2010 e publicado no Diário Oficial do
Estado do Paraná nº. 8.236 em data de 08 de junho de 2010.
não retorno do militar após estes afastamentos temporários concedidos, redundará
no crime de deserção propriamente dito previsto no Art. 187 do CPM.
Aliás, conforme já explicitado, essa é a visão de Célio Lobão (2006, p. 309 e
310) que prefere referir-se aos Casos Assimilados do Art. 188 de chamando-os de
“Deserção Após Ausência Autorizada”, e assim o faz por entender que as descrições
ali contidas não divergem do crime de Deserção, tendo-as inclusive por
desnecessárias no CPM.
4.2 DESERÇÃO APÓS CASSAÇÃO DA LICENÇA OU AGREGAÇÃO OU APÓS
DCRETAÇÃO DO ESTADO DE SÍTIO OU DE GUERRA.
II - deixa de se apresentar a autoridade competente, dentro do prazo de oito
dias, contados daquele em que termina ou é cassada a licença ou
agregação ou em que é declarado o estado de sítio ou de guerra;
De acordo com o Art. 63 do Estatuto dos Militares Lei nº 6.880 de 9 de
dezembro de 1989, “licença é a autorização para afastamento total do serviço, em
caráter temporário, concedida ao militar, obedecidas às disposições legais e
regulamentares. Possui diversas modalidades podendo ser, para tratar de interesse
particular, para tratamento de saúde de pessoa da família, para tratamento de saúde
própria e para acompanhar cônjuge ou companheiro (a).
De acordo com o Art. 70 do Estatuto Militar, podem ser interrompidas a
pedido ou nas situações elencadas em tal dispositivo, tais como para cumprir
punição, declaração de Estado de Guerra, indiciamento em IPM, dentre outras.
De acordo com o Art. 80 do Estatuto dos Militares Lei nº 6.880 de 9 de
dezembro de 1989 “Agregação é a situação na qual o militar da ativa deixa de
ocupar vaga na escala hierárquica de seu Corpo, Quadro, Arma ou Serviço, nela
permanecendo sem número.”, conforme leciona Assis ( 2007, p. 389) podendo
ocorrer por diversos motivos que estão elencados até o Art. 85 do mesmo Estatuto.
Do disposto no Art. 86 do Estatuto dos Militares, temos que a situação de
agregado do militar termina pela “reversão que é o ato pelo qual o militar agregado
retorna ao respectivo Corpo, Quadro, Arma ou Serviço tão logo cesse o motivo que
determinou [...]”.
Com relação ao Estado de Sítio, está previsto ele no Art. 137 da Constituição
da República Federativa do Brasil, podendo ser decretado por ato do Presidente da
República que, após ouvir o Conselho da República e o Conselho de Defesa
Nacional, solicitará ao Congresso Nacional autorização para decretar tal medida.
Poderá o Estado de Sítio ser decretado nos casos de comoção grave de
repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida
tomada durante o estado de defesa ou em caso de declaração de estado de guerra
ou resposta a agressão armada estrangeira.
De acordo com Jose Afonso da Silva (2009, p. 768), o estado de sítio
consiste:
“na instauração de uma legalidade extraordinária, por determinado tempo e
em certa área (que poderá ser o território nacional inteiro), objetivando
preservar ou restaurar a normalidade constitucional, perturbada por motivo
de comoção grave de repercussão nacional ou por situação de beligerância
com Estado estrangeiro.”
O Estado de Sítio está previsto no Art. 137 da Constituição da República
Federativa do Brasil, podendo ser decretado por ato do Presidente da República
que, após ouvir o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional,
solicitará ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos
casos de comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que
comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa ou em caso
de declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.
Para Coimbra Neves (2007, p. 271) decretado o Estado de Sítio deverá o militar
apresentar-se imediatamente à autoridade competente, sob pena de não o fazendo
à 00h00min do dia subsequente à decretação de tal medida ser iniciada a contagem
do prazo de graça que poderá culminar com a configuração do Crime de Deserção
do militar ausente. De acordo com o autor, mesmo que não haja em cada Instituição
Militar norma específica a respeito, ainda assim deverá o militar agir conforme
explicitado, pois “tal obrigação se infere da previsão do Art. 188, II do CPM.”
Também de acordo com Lobão (2006, p. 313), por ocasião da declaração do
Estado de Sítio ou de Guerra o afastamento legal cessará devendo o militar se
apresentar ao quartel. No caso do militar que já se encontre na condição de ausente
ilegalmente, com a declaração do Estado de Sítio ou de Guerra os dias de ausência
ilegal já transcorridos serão desprezados, recomeçando nova contagem do prazo de
graça.
Com relação ao termo “autoridade competente”, integrante do tipo penal,
Coimbra Neves (2007, p. 271) entende que, em casos de Declaração de Estado de
Sítio ou de Guerra, deverá o mesmo ser flexibilizado, pois devido a situação
emergencial poderá o militar encontrar impeditivo para sua apresentação a seu
corpo de tropa.
No mesmo sentido Lobão (2006, p. 313), que entende poder haver dificuldade
na apresentação do militar à autoridade competente, por deficiência no setor de
transportes, inundação, moléstia grave, no entanto este fato poderia ser solucionado
com a comunicação tão logo seja possível ao superior imediato a respeito do
impedimento. Ou ainda, poderia o militar apresentar em outra unidade da mesma
arma ou não, ou mesmo perante uma autoridade civil, que possa providenciar a
comunicação do impedimento.
4.3 DESERÇÃO APÓS CUMPRIMENTO DE PENA.
III - tendo cumprido a pena, deixa de se apresentar, dentro do
prazo de oito dias;
De acordo com Coimbra Neves (2007, p. 272), o inciso em questão trata do
militar que acabou de cumprir pena por sentença penal comum ou militar transitada
em julgado, pois de acordo com o autor, no caso de prisão provisória, prisão
temporária ou prisão civil, em regra passará o militar à condição de agregado, o que
por si acarretará a aplicação do Inciso II do Art. 188 do CPM.
Para Loureiro Neto (2001, p. 156), dificilmente o delito em questão ocorrerá,
haja vista o previsto no Art. 59 do CPM que dispõe que a pena de reclusão ou de
detenção até 2 (dois) anos, aplicada ao militar, é convertida em pena de prisão e
cumprida, quando não cabível a suspensão condicional, tanto pelo Oficial quanto
pela praça em recinto de estabelecimento militar. Assim, quando em liberdade
automaticamente o militar estará apresentado, pois já se encontra do ambiente da
caserna.
4.4 CARACTERIZAÇÃO DA DESERÇÃO POR SIMULAÇÃO DE DOENÇA OU
INCAPACIDADE.
IV - consegue exclusão do serviço ativo ou situação de inatividade, criando
ou simulando incapacidade.
Trata-se de inciso bastante controvertido e criticado pela doutrina.
Nos ensinamentos de Lobão (2006, p. 315), “essa conduta ilícita era
conhecida em Roma, durante o declínio do Império, quando os pais cortavam o
polegar dos filhos, incapacitando-os para o combate com as armas da época”.
Para o autor, a conduta descrita no inciso IV do Art. 188 do CPM trata-se do
Crime de “simulação de incapacidade” previsto no Art. 184 do CPM8 e não deserção,
8
Art. 184 - Criar ou simular incapacidade física, que inabilite o convocado para o serviço militar:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
tendo ocorrido no seu entendimento, um equívoco na elaboração do Código Penal
Militar de 1944 e também no atual.
Para Lobão, na Deserção a prestação do serviço militar é interrompida
temporariamente e no presente caso o militar passa a inatividade com a
consequente exclusão do serviço ativo. Outro aspecto diz respeito ao elemento
subjetivo, pois na deserção a vontade do militar está voltada no sentido de
interromper a prestação do serviço militar e no inciso em questão a vontade é
dirigida a conseguir a exclusão definitiva dos quadros militares.
A objetividade da tutela jurídico penal é o interesse do serviço militar, bem
como da administração militar.
Nos ensinamentos de Lobão as condutas a serem incriminadas são criar ou
simular incapacidade física. Criação é quando o indivíduo de algum modo adquire a
incapacidade temporária ou definitiva, seja por mutilação, criação de deficiência ou
outra forma qualquer; já na simulação o indivíduo não tem sua higidez física
alterada, mas apresenta quadro patológico de incapacidade.
Ao contrário do contido nos Incisos I, II e III, que são crimes permanentes,
trata-se de crime instantâneo, tendo em vista que após conseguir a exclusão do
serviço ativo consumado está o delito e mesmo que o indivíduo se arrependa e
confesse em nada mudará a situação.
Também de acordo com Lobão, a tentativa é possível quando o militar não
consegue a exclusão almejada por fator alheio a sua vontade, como no caso de a
junta médica constatar a simulação. No entanto cabe ressaltar que, mesmo tendo
sido descoberto o ímpeto do indivíduo, caso seja constatado o surgimento de
incapacidade, consumado estará o delito pelo verbo “criar”; já tendo sido descoberto
mas, não sendo constatada nenhuma incapacidade, verifica-se a apenas a tentativa.
Finalizando seu entendimento, Lobão (2006, p. 318 e 319) diz que, apesar
de comparado a deserção, não se lavra Termo de Deserção, mesmo tendo se
passado certo tempo.
Para apuração do ocorrido deverá ser instaurado o competente IPM, através
do qual as provas serão colhidas e encaminhas à Justiça Militar para apuração do
delito.
Em outro sentido está Jorge de Assis (2007, p. 391), com o qual nos
alinhamos, que embasado no Art. 451 § 1º do CPPM, diz:
“não há termo de ausência, mas haverá o termo de deserção, lavrado logo
no momento em que for conhecida a fraude [...] esse termo será lavrado de
imediato, mesmo que as autoridades saibam onde o autor se encontra,
ficando desde logo, o desertor sujeito à prisão”.
4.5 ATENUANTES ESPECIAIS.
Em relação aos crimes previstos nos Artigos 187 e 188 Inc. I, II e III, prevê o
CPM atenuantes especiais.
Assim, de acordo com o Art. 189 Inc. I do CPM, caso o indivíduo apresentese espontaneamente, dentro de oito dias contados da consumação do crime de
deserção, a pena será reduzida de metade; caso o desertor apresente-se no lapso
temporal compreendido entre o oitavo e o sexagésimo dia, a redução da pena será
de apenas um terço.
Para Lobão (2006, p. 321), “quis o legislador recompensar o sujeito ativo
que, após interromper a prestação do serviço militar numa atitude impensada,
arrepende-se e retorna a unidade onde serve”.
4.6 AGRAVANTE ESPECIAL.
O Art. 189 Inc. II do CPM, prevê uma agravante especial no caso de
deserção ocorrida em unidade estacionada em fronteira ou em país estrangeiro.
Nestes casos agrava-se a pena do desertor em um terço.
Para Assis (2007, p. 391), o agravamento em virtude de unidade
estacionada em fronteira ocorre tendo que “é na fronteira que começa a soberania
do Brasil.”; já no caso de ocorrência de deserção ocorrida em unidade estacionada
em país estrangeiro se dá em virtude tendo em vista que “os militares brasileiros
devem demonstrar eficiência e a mais perfeita disciplina em países que não o seu.”
Para Lobão (2006, p. 322), a agravação decorrente da primeira parte do
Inciso II, se dá tendo em vista a “necessidade de maior rigidez na disciplina dos
militares que servem em unidade de fronteira, mantendo-os em condições de
reprimir com o rigor necessário, contrabandistas, traficantes e outros criminosos que
atuam na região de fronteira.”
Já em relação à segunda parte do inciso II, Lobão (2006, p. 322), entende
que a agravação da pena, ocorre em razão da:
“necessidade da segurança da tropa em missão externa, da manutenção da
disciplina e da integridade do efetivo acantonado no exterior, bem como o
interesse de preservar o interesse de preservar a imagem das Forças
Armadas, da Polícia Militar e, se for o caso, do Corpo de Bombeiros Militar,
em serviço fora do país, principalmente em missão da ONU como tem
ocorrido recentemente.”
5. DA DESERÇÃO ESPECIAL.
De acordo com previsto Art. 190 do CPM, comete do crime de deserção
especial o militar que deixar de se “apresentar no momento da partida do navio ou
aeronave, de que é tripulante, ou do deslocamento da unidade ou força em que
serve”.
Para Lobão (2006, p. 327), não há nada de especial no crime, motivo pelo
qual discorda da ementa constante no CPM (Deserção Especial), preferindo
denominá-lo de deserção imediata, o que, em sua ótica, parece mais adequado por
se tratar de delito de consumação imediata.
Para Lobão (2006, p. 327) classifica-se como crime militar pelo disposto no
Art. 9º Inc. I 2ª parte do CPM e como crime propriamente militar, pois se trata de
“infração penal específica e funcional do ocupante de cargo militar”.
Para Lobão (2006, p. 327), o “objeto da tutela penal é o serviço militar, ao
qual o militar não pode furtar-se na condição de membro da tripulação do navio ou
da aeronave e de integrantes da unidade ou força” e também “o relevante interesse
da administração militar de que suas unidades contem com efetivo completo,
quando de sua movimentação [...] para cumprimento de exercícios, em cumprimento
de missão ou outro motivo qualquer, desde que determinada, por autoridade
competente”.
Para Lobão (2006, p. 328), o sujeito ativo do tipo é o militar e o sujeito
passivo são as instituições militares.
Para Lobão (2006, 328) pune-se conduta do militar que deixar de se
apresentar, de estar presente, no navio ou na aeronave do qual é tripulante, no
momento da partida ou na unidade ou força em que serve, quando do
deslocamento, devendo encontrar-se pronto para seguir, apresentando no local e
hora estabelecidos para a partida ou deslocamento.”
Para Lobão (2006, p. 330) o elemento subjetivo “é a vontade livre e
consciente de não se apresentar no momento da partida do navio ou aeronave, do
qual é tripulante, ou a de não se apresentar no momento da partida da unidade ou
forma em que serve.”
Para Lobão (2006, p. 330) a consumação ocorre com a simples ausência do
militar no instante da partida do navio ou avião ou do deslocamento da força ou
unidade que compõe. Mesmo que o militar faltoso consiga alcançar o navio, a
unidade ou a força, logo em seguida, ainda assim estará o crime consumado e para
ele a tentativa é juridicamente impossível, ou o militar se apresenta ou não no
momento da partida ou do deslocamento.
Como a deserção especial é modalidade do crime de deserção, não se
aplica a suspensão condicional da pena, pelo disposto no Art. 88 Inc. II “a” do CPM.
5.1 ATENUANTES ESPECIAIS.
De acordo com Lobão (2006, p. 330) assim como acontece com o crime de
deserção previsto no Art. 187 e no Art. 188, incisos I II III, também na deserção
especial o legislador procurou beneficiar o militar que, tendo consumado o crime de
deserção, arrepende-se de seu ato retornando a seu corpo de tropa ou se
apresentando a outra autoridade militar ou civil a fim de que sua vontade de ser
reintegrado seja transmitida a quem de direito.
Para Lobão (2006, p. 330), como não há prazo de graça, na deserção
especial os benefícios são mais amplos do que nas demais modalidades deste
crime. Assim, considerando-se o momento da consumação do crime, que se dá com
a partida do navio ou do avião ou o deslocamento da unidade ou força, caso a
apresentação do militar ocorra em até 24h, a pena variará de trinta dias a três meses
de detenção9. Após 24h e não excedente à cinco dias, a pena é de detenção de dois
a oito meses. Após cinco e não excedente a oito dias, a pena é de três meses a um
ano detenção. Após oito dias, a pena será de seis meses a dois anos de detenção.
De acordo com Lobão (2006, p. 331), apesar da lei não especificar, na falta
de autoridade militar ou policial, é valida a apresentação perante policial militar ou
qualquer outra qualquer autoridade civil, como prefeito, juiz, promotor, dentre outras
porventura existentes no local.
A contagem inicial do prazo é feita em horas, no entanto, para os §§ 1º e 2º
do artigo em questão a contagem é feita em dias iniciando-se às 00h do dia seguinte
ao dia da consumação do crime.
Nos exemplos de Lobão (2006, p. 331), temos que:
9
Art. 58 CPM - O mínimo da pena de reclusão é de um ano, e o máximo de trinta anos; o mínimo da
pena de detenção é de trinta dias, e o máximo de dez anos.
Para a contagem do prazo de 24 horas, “se a partida ou o deslocamento
ocorreu às 9 horas da manhã [...] o militar tem até às 9 horas do dia seguinte para se
apresentar e obter a redução de pena.”
Para a contagem do prazo em dias, se “a partida ou deslocamento ocorreu
às 9 horas (às 12, 16, 20, ou outra hora qualquer) do dia 6” o prazo em dias começa
a correr às 00h do dia 7, finalizando o prazo do § 1º(cinco dias) às 24 horas do dia
11 e o prazo do § 2º(oito) às 24 horas do dia 14. Após o oitavo dia estará o desertor
não mais gozará de redução de pena, podendo pegar de seis meses a dois anos de
detenção.
5.2 AGRAVANTES ESPECIAIS.
Para Loureiro Neto (2001, p. 158), “justifica-se o aumento da pena em se
tratando de oficial, pois além da presunção de que sua ausência faça mais falta do
que a de um soldado, ele deve ser o exemplo da pontualidade e cumprimento do
dever.”
6. CONCERTO PARA DESERÇÃO.
Para Lobão (2006, 333), atento ao risco da deserção praticada em conjunto
por militares, previu o legislador no Art. 191 do CPM o crime de Concerto para
Deserção.
Para Lobão trata-se de crime de mera conduta, quando em sua modalidade
simples (concerto), no entanto quando seguido de deserção passa a ser crime
permanente. Dando continuidade classifica-o como crime militar pelo disposto no
Art. 9º Inc. I 2ª parte do CPM e como crime propriamente militar, pois se trata de
“infração penal específica e funcional do ocupante de cargo militar”.
Para Lobão (2006, p. 333), o objeto jurídico é a “segurança da unidade
castrense, o serviço e a disciplina castrense, diante do perigo decorrente da conduta
ilícita de militares que ajustam abandonar, em conjunto, as fileiras da unidade onde
prestam o serviço militar”.
Para Lobão (2006, p. 333), o sujeito ativo somente pode ser o militar, por
tratar-se de crime propriamente militar e como sujeito passivo temos as instituições
militares. Prosseguindo esclarece que se pune a conduta daqueles militares que
concertarem, ajustarem a deserção em conjunto, sendo que o concerto significa a
conjugação de vontades para alcançar o fim expresso na lei, configurando-se no
momento da concordância de dois militares pelo menos.
Para Lobão (2006, p. 333), o tipo penal em questão não exige que os
agentes alcancem o fim do concerto, qual seja, a deserção em si, sendo que o
elemento subjetivo do tipo é “a vontade consciente de dois ou mais militares
orientada no sentido de ajustarem a deserção coletiva; já no concerto seguido de
deserção o elemento subjetivo duplica-se pois “após a conjugação de vontade para
concertarem a deserção coletiva, os agentes prosseguem no processo volitivo,
agora, dirigido para a prática da deserção em conjunto”.
Para Lobão (2006, p. 336), o delito de concerto para deserção consuma-se
no momento em que se forma o consenso, a concordância de pelo menos entre dois
militares. No caso de deserção mediante concerto, consuma-se no momento em que
a ausência dos militares ultrapassa o prazo de graça, no entanto se capturados ou
se apresentarem antes da consumação da deserção, ainda assim, estará
configurado o delito de concerto para deserção.
Também para Lobão (2006, p. 336) a tentativa é impossível e por
determinação legal aplica-se a suspensão condicional da pena aos militares que
participam do concerto, mas não se aplica aos que efetivamente desertaram após o
concerto, conforme o disposto no Art. 88 Inc. II “a” do CPM. Finalmente conclui seus
ensinamentos dizendo que se aplica ao crime de concerto para deserção o rito
ordinário do CPPM, haja vista a impossibilidade de se apurar através deste as
responsabilidades dos que participaram do concerto; ressalta no entanto a
indispensabilidade da lavratura do Termo de Deserção caso esta venha a ocorrer o
qual instruirá o IPM.
7. DESERÇÃO POR EVASÃO OU FUGA.
Art. 192. Evadir-se o militar do poder da escolta, ou de recinto de detenção
ou de prisão, ou fugir em seguida à prática de crime para evitar prisão,
permanecendo ausente por mais de oito dias:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
Segundo nos informa Lobão (2006, p. 337), o crime em questão, somente
ganhou autonomia com o Código Penal Militar de 1944, tendo em vista que no
período anterior havia divergência entre o Supremo Tribunal Federal que entendia
inexistir a deserção por ocasião da fuga da prisão, entendimento este não
compartilhado pelo Supremo Tribunal Militar, que com o passar do tempo também
passou a compartilhar do mesmo posicionamento.
Prosseguimento em magistério, Lobão, diz que correta era a orientação da
Corte Castrense, por sinal, válida tanto para a época quanto para os dias atuais.
Para Lobão (2006, p. 341) classifica-o como crime militar pelo disposto no
Art. 9º Inc. I 2ª parte do CPM e como crime propriamente militar, pois se trata de
“infração penal específica e funcional do ocupante de cargo militar”. Classifica-se
como crime de mera conduta e permanente, possibilitando a prisão em flagrante do
desertor.
Para Lobão (2006, p. 341), o objeto jurídico tutelado é:
“o serviço militar e a disciplina castrense, ambos sujeitos ao perigo que
representa a conduta ilícita do militar que abandona as fileiras da unidade
onde presta o serviço militar. [...] “o interesse da instituição castrense em
contar com efetivo estabelecido em lei, o que não acontece se ficar a critério
do militar ausentar-se da corporação em desacordo com o preceito legal
que trata da cessação do serviço militar.
Para Coimbra Neves (2007, p. 293), entende que tutela-se também “o dever
militar, o comprometimento, a vinculação do homem aos valores éticos e funcionais
da caserna e de sua profissão”.
Para Lobão (2006, p. 341), assim como nas demais modalidades do crime
de deserção, o sujeito ativo do tipo é o militar e o sujeito passivo são as instituições
militares.
Na ótica de Lobão (2006, p. 341), o que o tipo incrimina “não é fugir, não é
evadir-se, e sim desertar, que consiste em permanecer ausente, por tempo superior
a oito dias, contados do dia seguinte aquele que ocorrer a fuga” . Para ele o
elemento subjetivo é o mesmo da deserção, ou seja, “vontade livre e consciente de
interromper a efetiva prestação do serviço militar, de abandonar o cargo militar,
ausentando-se da unidade onde serve ou do local onde deve permanecer no
exercício da função militar, além do prazo previsto em lei.”
Sendo modalidade do crime de deserção, a consumação ocorre após o
decurso do prazo de mais de oito dias de ausência do militar. Aliás, neste sentido
Lobão (2006, p. 342 e 343), diz que “consuma-se a deserção no momento
imediatamente seguinte àquele em que se esgota o prazo de oito dias, sem a
apresentação espontânea ou coercitiva do militar fugitivo”.
No mesmo sentido Jorge de Assis (2007, p. 396), pois para ele em qualquer
da hipóteses elencadas no art. 192, “somente haverá deserção se o militar continuar
ausente por depois de transcorrido o prazo de graça.”
Conforme ensinamentos de Coimbra Neves (2007, p. 296), tratando-se de
modalidade de crime de deserção em que há a contagem do prazo de graça, a
contagem inicia-se às 00h do dia subsequente ao da fuga ou evasão e que “por se
tratar de crime unissubsistente, a tentativa é impossível”.
Concluindo, haja vista o disposto no Art. 88, Inciso II, alínea a e também pelo
Art. 617 II a do CPPM, não se aplica a suspensão condicional da pena.
Número e Ano do Acórdão: 2522-1992
Nome do Juiz Relator: Juiz Antônio Cláudio Barcellos de Abreu
Tipo: Apelação (criminal)
Ementa: Deserção, por evasão, art. 192, CP Militar. Preliminares de
nulidade rejeitadas, à unanimidade. Comete crime de deserção por evasão
militar que, cumprindo punição disciplinar no âmbito do aquartelamento, se
evade daquele local e, nesta situação, permanece por mais de oito dias,
embora haja, durante esse período, comparecimento ao ambulatório do
Hospital da Brigada Militar, a fim de, sem qualquer encaminhamento ou
requisição oficial, efetivar consulta e tratamento médicos. Afastada a
alegação de estado de necessidade ante a prova de que o comparecimento
ao nosocômio era feito, pelo apelante, deambulando com os próprios meios
e utilizando, normalmente, nos deslocamentos, o transporte coletivo público
urbano e interurbano. Decisão majoritária. (Apelação Criminal nº 2. 522/92,
Relator Juiz Cel Antônio Cláudio Barcellos de Abreu, 1993, p. 54).
11. CONSIDERAÇÕES FINAIS.
O presente trabalho abordou o crime de Deserção, previsto no Art. 187 do
Código Penal Militar, no aspecto material dando ênfase em sua aplicação no âmbito
da Polícia Militar do Estado do Paraná.
Conforme dito na introdução, ao optar por escrever sobre um tema na área
jurídica militar o fiz justamente tendo como um de meus objetivos participar, ainda
que de forma tímida, na divulgação dos conhecimentos e entendimentos doutrinários
já existentes. O trabalho está pronto e contribuiu de forma bastante significativa na
minha formação tanto como bacharel em Direito, quanto na minha área profissional,
sendo que espero sirva o mesmo de instrumento de transmissão de conhecimentos
aos que porventura venha o assunto interessar.
Como era de se esperar encontrei dificuldades para escrever sobre o
assunto por falta de material doutrinário, pois não há uma infinidade de
doutrinadores na área jurídica militar tal como ocorre no Direito Penal comum. Essa
escassez de doutrina, posso dizer, chega ser histórica, pois em 1915, Esmeraldino
Bandeira, no prefácio de sua obra utilizada como referência neste trabalho, já dizia:
“Não é opulenta a litteratura jurídica brasileira em obras e publicações sobre
Direito Penal Militar. Muito poucas são as que possuímos e essas mesmas
se mostram ou incompletas no tratto do assumpto ou retardadas na
orientação doutrinária.” (ipsis literis)
Interessante foi analisar o tipo penal da Deserção, desde o seu surgimento
até os dias, passando pela abordagem relativa ao Direito Penal Militar, enquanto
disciplina especial e autônoma, diversa do Direito Penal Comum, que tutela bens
jurídicos próprios inerentes às forças militares federais e estaduais.
O meio militar pelas importantes funções que exerceu, a ainda exerce, em
todas as sociedades, possui em seu cotidiano certas peculiaridades em seu modo
por vezes desconhecidas de muitos.
Não é comum em nosso cotidiano ouvirmos comentários a respeito de crimes
militares de um modo geral, em especial o crime de deserção. Em que pese essa
realidade desconhecida, volta e meia militares são levados a julgamentos perante a
vara da Auditoria Militar do Estado do Paraná por terem abandonado as fileiras da
Corporação por mais de oito dias.
REFERÊNCIAS
ASSIS, Jorge Cesar. Comentários ao Código Penal Militar. 6ª edição. Curitiba:
Juruá, 2004.
______. A Prescrição no Crime de Deserção. Disponível
http://www.jusmilitaris.com.br > Acesso em 10 fevereiro de 2013.
em:
<
______. Breves Considerações Sobre a Deserção nas Forças Militares Estaduais e
do Distrito Federal. Disponível em: < http://www.jusmilitaris.com.br > Acesso em 10
de fevereiro de 2013.
______. Justiça Militar Estadual. Curitiba. Juruá, 1997.
BADARÓ, Ramagem. Comentários ao Código Penal Militar de 1969. São Paulo:
Juriscred, 1972. 1º e 2º v.
BARROS, Romeu de Campos. Sistema do Processo Penal Brasileiro. [S.I]. Forense,
1987.
BRASIL. Superior Tribunal Militar. Apelação nº. 255-25.2011.7.01.0301 RJ. Relator
Min. Artur Vidigal de Oliveira. Brasília, DF. 13/06/2012. Disponível em: <
http://www.stm.jus.br > Acesso em: 6 fevereiro de 2013.
BRASIL. Código Penal Militar. Decreto Lei 1.001 de 21 outubro de 1969.
______. Código Penal Militar. Decreto Lei 1.002 de 21 outubro de 1969.
BANDEIRA, Esmeraldino. Curso de Direito Penal Militar. Rio de Janeiro: Tipografia
Francisco Alves. 1913.
LOBÃO, Célio. Direito Penal Militar. 3ª ed. Brasília: Jurídica 2006.
LOUREIRO NETO, José da Silva. Direito Penal Militar. 4ª ed. São Paulo: Atlas,
2001.
MARQUES, Frederico. Tratado de Direito Processual Penal. [S.I] Saraiva. 1980.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo. 36ª edição. São Paulo. Malheiros,
2010.
MIRABETE, Julio Fabrini. Manual de Direito Penal: parte especial. 20ª edição. São
Paulo. Atlas, 2003.
NEVES, Cícero Robson Coimbra. Apontamentos de Direito Penal Militar: parte
especial v. 2. São Paulo. Saraiva, 2007.
NORONHA E. Magalhães. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 2003.
SCHLISCHTING, Marcelo Wagner. O crime de deserção e seus aspectos
processuais no âmbito das praças da Polícia Militar do Estado de Santa Catarina.
TCC. Curso de Segurança Pública. Florianópolis. 2006. Universidade do Vale do
Itajaí – SC. < http://www.jusmilitaris.com.br > Acesso em 5 de janeiro de 2013.
ZAFFARONI, Eugenio Raul. Manual de Direito Penal Brasileiro. Parte geral. 7ª
edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
Download

crime de desercao - TCC On-line