UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA
ANA PAULA DE OLIVEIRA RAMOS
VÉU, GRINALDA E DIÁLOGO: UM ESTUDO SOBRE AS REPRESENTAÇÕES
SOCIAIS DA CONJUGALIDADE PARA MULHERES CASADAS E PARA
MULHERES SEPARADAS
Palhoça
2009
ANA PAULA DE OLIVEIRA RAMOS
VÉU, GRINALDA E DIÁLOGO: UM ESTUDO SOBRE AS REPRESENTAÇÕES
SOCIAIS DA CONJUGALIDADE PARA MULHERES CASADAS E PARA
MULHERES SEPARADAS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao
Curso de graduação em Psicologia, da
Universidade do Sul de Santa Catarina, como
requisito parcial à obtenção do título de Psicólogo.
Orientador: Prof. Leandro Castro Oltramari, Dr.
Palhoça
2009
ANA PAULA DE OLIVEIRA RAMOS
VÉU, GRINALDA E DIÁLOGO: UM ESTUDO SOBRE AS REPRESENTAÇÕES
SOCIAIS DA CONJUGALIDADE PARA MULHERES CASADAS E PARA
MULHERES SEPARADAS
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado
adequado à obtenção do título de Psicólogo e
aprovado em sua forma final pelo Curso de
Psicologia da Universidade do Sul de Santa
Catarina.
Palhoça, 22 de junho de 2009
_______________________________
Prof. e orientador Leandro Castro Oltramari, Dr.
Universidade do Sul de Santa Catarina
_________________________________
Profª. Nádia Kienen, Dr.
Universidade do Sul de Santa Catarina
__________________________________
Profª. Regina Ingrid Bragagnolo, Msc.
Universidade do Sul de Santa Catarina
3
AGRADECIMENTOS
A meu querido amado André Ricardo Vilela, que se mostrou um companheiro
entusiasmado e paciente durante todos os momentos que precisei.
Aos meus pais, Cleonice Marques de Oliveira Ramos e Carlos Antônio de Oliveira
Ramos que apesar da distância sempre estiveram nos meus pensamentos. Amo
vocês!
Ao professor Leandro Castro Oltramari que com paciência e dedicação iluminou
meus caminhos nesta jornada.
A meus colegas e amigos que sempre me apoiaram.
A todos o meu sincero muito obrigado e a certeza da minha gratidão.
4
RESUMO
A conjugalidade tem sido objeto de discussão no campo das ciências sociais,
pelo fato de ter aumentado o número das dissoluções conjugais. Ainda não se têm
explorado muito as justificativas para essas dissoluções. O presente trabalho referese às representações sociais de conjugalidade para mulheres casadas e para
mulheres separadas. A presente pesquisa é classificada como exploratória e
qualitativa. Utilizou-se como delineamento o estudo de campo, sendo a coleta de
dados realizada por meio de uma entrevista com o roteiro semi-estruturado, aplicado
em cinco mulheres casadas e cinco mulheres separadas. As respostas foram
agrupadas, para fins de estabelecer as categorias, de acordo com os objetivos
específicos, e, em seguida, foram feitas as análises de conteúdo do material
pesquisado. Ao final da pesquisa, constatou-se que as expectativas das
entrevistadas casadas e separadas sobre casamento eram de união para formar
uma família nuclear, sendo uma resposta representativa para os dois grupos. As
mulheres casadas trouxeram o ritual do casamento como uma expectativa que
também tinham sobre o matrimônio. As separadas consideraram que tinham antes
de se casarem uma expectativa positiva da união conjugal, assim como o amor
romântico. Atualmente, as expectativas das mulheres casadas e separadas sobre o
enlace matrimonial relacionam-se aos seguintes aspectos: confiança no parceiro, a
figura do marido como gestor da família, amor confluente, diálogo, relação de
compartilhar tarefas e também a constituição de família. Na percepção de
casamento
no
momento
atual,
as
mulheres
apontaram
aspectos
como
companheirismo, diálogo e fidelidade conjugal. Em geral, verificou-se que as
participantes dos dois grupos trouxeram representações sociais semelhantes em
relação ao enlace matrimonial.
Palavras-chave: Representações Sociais. Conjugalidade. Mulheres
5
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Caracterização das mulheres casadas................................................... 34
Tabela 2 – Caracterização das mulheres separadas................................................ 35
Tabela 3 – Referente às respostas das expectativas que mulheres casadas e
mulheres separadas tinham sobre casamento.......................................................... 42
Tabela 4 – Referente às respostas das expectativas que mulheres casadas e
mulheres separadas têm sobre casamento.............................................................. 47
Tabela 5 – Referente às respostas da percepção que mulheres casadas e mulheres
separadas têm sobre casamento.............................................................................. 52
6
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................
8
1.1 PROBLEMÁTICA..............................................................................................
9
1.2 JUSTIFICATIVA................................................................................................
12
1.3 OBJETIVOS......................................................................................................
15
1.3.1 Objetivo geral...............................................................................................
15
1.3.2 Objetivos específicos..................................................................................
15
2 REFERENCIAL TEÓRICO .................................................................................. 16
2.1 CASAMENTO.................................................................................................... 16
2.2 FAMÍLIA ............................................................................................................ 22
2.3 SEPARAÇÃO....................................................................................................
23
2.4 CONJUGALIDADE E GÊNERO........................................................................
25
2.5 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS .......................................................................
29
3 MÉTODO.............................................................................................................. 33
3.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA................................................................
33
3.2 PARTICIPANTES..............................................................................................
34
3.3 EQUIPAMENTOS E MATERIAIS...................................................................... 36
3.4 SITUAÇÃO E AMBIENTE.................................................................................
36
3.5 PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS.................................................. 37
3.6 INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS.......................................................
38
3.7 PROCEDIMENTO.............................................................................................
38
3.7.1 Seleção dos participantes..............................................................................
38
3.7.2 Contato com os participantes.........................................................................
39
3.7.3 Coleta e registro dos dados...........................................................................
39
3.7.4 Organização, tratamento e análise de dados................................................. 40
4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS ...................................................
41
4.1 Expectativas que mulheres casadas e separadas tinham sobre casamento.... 41
4.2 Expectativas que mulheres casadas e separadas têm sobre casamento........
47
4.3 Identificar a percepção que mulheres casadas e separadas têm sobre
casamento............................................................................................................... 52
5 CONSEIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 56
REFERÊNCIAS....................................................................................................... 60
7
APÊNDICE .............................................................................................................
65
APÊNDICE A - Termo de consentimento livre e esclarecimento...................... 66
APÊNDICE B - Roteiro de pesquisa..................................................................... 68
8
1 INTRODUÇÃO
A presente pesquisa tem como propósito investigar as representações
sociais da conjugalidade para mulheres casadas e mulheres separadas. Tal temática
está vinculada ao campo de atuação do serviço de mediação familiar, no Fórum da
cidade de São José, Santa Catarina. Os objetivos específicos da pesquisa
pretendem entender como as mulheres compreendem o casamento, além de
apresentar um estudo que irá comparar as percepções das mesmas sobre a
conjugalidade.
Esta pesquisa será apresentada da seguinte forma: problemática,
justificativa, objetivo geral e os objetivos específicos, compondo assim o primeiro
capítulo. O segundo capítulo se traz o referencial teórico que sustenta esta
pesquisa, partindo da discussão acerca do casamento, amor e sexualidade,
separação, conjugalidade e gênero e, por fim, representações sociais do casamento.
Inicialmente, no referencial teórico, fez-se uma contextualização da
história
do
casamento,
contemporânea.
bem
como
suas
transformações
na
sociedade
Paralelamente, buscou-se ponderar como a condição feminina
modificou-se ao longo da história, e como isso repercutiu numa série de mudanças
relativas ao casamento. Procurou-se também apontar quais as consequências
advindas do amor e da sexualidade para alterar as relações conjugais.
Posteriormente, tratou-se de apontar o modo pelo qual o modelo de família nuclear
vem se constituindo e se mantendo consolidado na sociedade ocidental.
Em seguida, apresenta-se uma discussão sobre o processo de separação
conjugal, suas implicações em relação ao fim do enlace matrimonial, bem como suas
consequências na organização familiar.
Posteriormente, o referencial trata das
novas formas de conjugalidade e como o gênero está implicado nessas
transformações. Finalizando o referencial teórico, discutiram-se as representações
sociais do casamento, conceitos de representações sociais e as implicações em
relação ao matrimônio.
Em
seguida,
apresenta-se
o
terceiro
capítulo,
que
engloba
os
procedimentos metodológicos, compostos pela caracterização da pesquisa,
descrição do instrumento de coleta de dados e a forma de análise desses dados. O
9
quarto capítulo traz a análise dos resultados, em que são apresentadas as
categorias estabelecidas através da análise de conteúdo e sua relação com o marco
teórico, a fim de responder aos objetivos da pesquisa. Concluindo, o quinto capítulo
traz as considerações finais, que pontuam os resultados alcançados e as sugestões
de temas para pesquisas futuras.
1.1 PROBLEMÁTICA
No século V, a união conjugal e a celebração do casamento aconteciam
em uma cerimônia privada entre os nobres, com o objetivo de transmitir a herança e
proporcionar a formação de alianças políticas. Nessa época, a escolha pessoal e a
paixão não faziam parte da união conjugal, e o ritual do casamento não tinha
nenhuma intervenção da Igreja. Com o Cristianismo, a Igreja começa a exercer seu
poder sobre o casamento, determinando-o como único lugar legítimo para o uso da
sexualidade e com o intuito apenas da procriação. Ao impor o casamento religioso, a
intervenção clerical passa a ser fator determinante e obrigatório na união do casal,
tornando-o monogâmico e indissolúvel. A partir de então, o ritual do casamento tem
como local tradicional a Igreja e passa a ser realizado por um padre. (ARAÚJO,
2002). A família formada sob a “bênção” de um representante de Deus tinha uma
espécie de contrato celestial em que a quebra contratual era considerada uma falta
grave. (ALMEIDA, 1992).
Segundo Morgado (1987) e Norgren (2004), na Antiguidade Clássica,
existiam alguns costumes dentro da união matrimonial que colocavam a mulher na
função de procriadora e administradora da casa. Já no Século XVII, a união conjugal
tinha que ser mantida a qualquer custo, conforme a expressão “até que a morte nos
separe”. Nessa sociedade, a mulher teria que demonstrar fidelidade e dedicação ao
marido e aos filhos, obedecendo e sendo submissa ao seu cônjuge. (NETO e
FÉRES CARNEIRO, 2005). Com a modernidade, algumas mudanças aconteceram
em relação ao casamento, passando o matrimônio a ser estabelecido por amor, com
a livre escolha e o predomínio da sexualidade na união conjugal. Tais mudanças
foram alcançadas pela emancipação feminina, possibilitando uma nova organização
social dentro do casamento. (FÉRES CARNEIRO, 1998 e LINS, 1997).
10
De modo geral, algumas mudanças ocorreram em relação ao casamento
tradicional. Dentre elas, Jablonski (1998) aponta um declínio na religiosidade,
decorrente da modernidade e da industrialização. Apesar disso, a família do século
XXI ainda se preocupa e segue os rituais e cerimônias do casamento, sendo uma
importante base de formação familiar, formando um dos principais vínculos sociais
existentes para a constituição de uma família nuclear. (JABLONSKI, 1998).
No entanto, o casamento e a família nuclear passam por uma crise, já que
várias transformações sociais, culturais e econômicas influenciam as atitudes e
comportamentos dos indivíduos, o que talvez esteja provocando um possível
aumento das dissoluções conjugais.
Jablonski (1998) aponta algumas das
mudanças que podem estar relacionadas ao crescente no número de separações,
dentre elas: o novo papel feminino desempenhado na sociedade, a dupla jornada de
trabalho das mulheres, suas novas expectativas conjugais e profissionais, a
liberdade sexual, a diminuição da influência religiosa, além da aceitação da
sociedade em relação ao divórcio. (JABLONSKI, 1998).
De acordo com Féres Carneiro (2003), existe uma diferença de opinião
entre homens e mulheres a respeito do casamento, pois a população feminina define
o matrimônio como uma “relação de amor”, e para os homens, o casamento é
principalmente a “constituição de família”. Portanto, para os homens, o fato do
relacionamento amoroso não estar bem é algo insuficiente para o fim do casamento.
Desse modo, esse pode ser um dos indicativos que explica a separação conjugal, na
maioria dos casos, ser um processo requerido pelas mulheres.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2002)
corroboram com tal afirmação, pois os gráficos estatísticos ressaltam que as
mulheres são frequentemente as maiores requerentes do processo de dissolução
conjugal. Elas requerem mais de 70% das separações e em torno de 55% dos
divórcios não consensuais.
Dados estatísticos também retratam o aumento no número de separações
e casamentos, segundo o IBGE, demonstrando que no período de 1991 a 2002, as
separações subiram de 76.223 para 99.693, um aumento de 30,7%. Os divórcios
passaram de 81.128 para 129.520, um crescimento de 59,6%. O recasamento de
divorciados passou de 5,3% do total, em 1991, para 10,8% em 2002. (IBGE, 2002).
Podemos identificar, a partir de estudos de Bertollo (et al., 2007), que uma
das representações sociais do casamento é a possibilidade de constituição de uma
11
vida em comum. Sendo assim, os indivíduos se casam e recasam na expectativa de
uma união conjugal pois, conforme Bertollo (et al., 2007), o casamento tem sua
representação social significando um fenômeno construído histórica e socialmente
compartilhado pelos sujeitos e orientando suas práticas sociais.
Estudar as representações sociais pode nos permitir compreender como
os sujeitos sociais apropriam conhecimentos compartilhados pelo senso comum, e
de que forma eles dão significados para seus comportamentos, organizando suas
práticas sociais. O ato matrimonial representa, numa sociedade contemporânea, a
preservação de alguns costumes e crenças que são compartilhados coletivamente
numa sociedade. Segundo Moscovici (1981 apud OLIVEIRA e WERBA, 2000, p.
106), as representações sociais estão atreladas a crenças e mitos de uma
sociedade tradicional; entretanto, hoje são teorias do senso comum sobre
fenômenos da modernidade.
(...) por Representações Sociais entendemos um conjunto de conceitos,
proposições e explicações originado na vida cotidiana no curso de
comunicações interpessoais. Elas são o equivalente, em nossa sociedade,
aos mitos e sistemas de crença das sociedades tradicionais; podem
também ser vistas como a versão contemporânea do senso comum.
(MOSCOVICI, 1981 apud OLIVEIRA e WERBA, 2000, p.106).
As representações sociais estão vinculadas às nossas interações sociais,
sendo criadas e internalizadas num processo coletivo e orientando o pensamento
individual, sendo produtos das nossas ações e comunicações. Contudo, vale
esclarecer que as representações sociais são criadas em grupos e não de forma
individual. São construídas, portanto, socialmente, e norteiam os comportamentos
das pessoas no seu meio social. (MOSCOVICI, 2003).
Podemos identificar que o processo histórico do casamento esteve
relacionado aos interesses políticos, econômicos e religiosos de uma época
(PERLIN e DINIZ, 2005). Dessa forma, as transformações sociais levaram ao
questionamento dos casamentos tradicionais, gerando mudanças na conjugalidade.
Logo, os sujeitos buscam em seus relacionamentos atuais um envolvimento
sentimental, como amor, confiança, carinho e respeito, além de uma relação de
companheirismo para enfrentar as dificuldades na rotina conjugal. (PERLIN e DINIZ,
2005).
12
Em relação ao casamento, não existe apenas uma representação social,
determinada
e
homogênea;
desse
modo,
as
mudanças
da
sociedade
contemporânea comprovam novas formas de vivenciar a vida conjugal. Diante disso,
tem-se como proposta apresentar a compreensão das mulheres a respeito da
conjugalidade. Para responder a essa questão será necessária a seguinte pergunta:
Quais as representações sociais da conjugalidade para mulheres casadas e para
separadas?
1.2 JUSTIFICATIVA
No Fórum de São José, é realizado o Serviço de Mediação Familiar que
tem como objetivo atender a casais que buscam a dissolução conjugal, sendo um
atendimento que prioriza prevenir conflitos familiares. No local, foi verificado que, na
maioria dos casos, quem solicita a dissolução conjugal são as mulheres. Portanto, o
interesse desta pesquisa surgiu a partir do estágio realizado nesse local, onde são
comuns os casos de separação. Partindo dos processos de mediação realizados
pela acadêmica no Fórum, passou a existir, então, o questionamento sobre a
compreensão de casamento para mulheres.
Ao se propor um estudo sobre casamento, compreende-se que na
sociedade contemporânea serão abordadas várias formas de conjugalidade e seus
significados no processo histórico, pois se sabe que todas as mudanças da
sociedade estão comprovando novas formas de viver essa vida conjugal. Segundo
Scabello (2007, p.13), “digerimos as mudanças tão vagarosamente que não
sabemos ao certo qual o retrato de família que deve ser pintado, de modo que a
percepção de um fragmentado, descontínuo e diversificado coloca questões que
desafiam o saber acumulado pelas teorias das Ciências Sociais”. A partir daí, vale
ressaltar que a importância desse estudo vem frente ao entendimento que os
conflitos sociais, culturais e morais podem ser provocados pelas mudanças que os
fenômenos casamento e separação podem trazer para uma família.
A partir do momento em que o casamento passa a ser uma escolha do
casal, movido pelo próprio desejo dos indivíduos e também aliado ao momento de
rápidas e profundas transformações sociais encontradas no século XXI, este estudo
13
procurará compreender as várias formas de conjugalidade e assim o entendimento
que mulheres têm sobre o casamento. Desta forma, as transformações ocorridas na
instituição casamento têm como propósito, nesse trabalho, de colaborar e
acrescentar conhecimento sobre as representações que orientam as práticas
sociais. Assim, profissionais e familiares, diretamente relacionados com tal realidade,
poderão ampliar o entendimento sobre as representações sociais que possam
influenciar o processo de separação.
Dessa maneira, o estudo contribuirá com dados e informações,
proporcionando o entendimento que as mulheres têm sobre casamento, além de
apontar as representações sociais que orientam os comportamentos e que podem
estar atrelados às causas das dissoluções conjugais, que repercutem não só no
casal, mas em todos os envolvidos na relação.
A pesquisa deverá promover conhecimento acerca das representações
sociais do casamento. Isso contribuirá para que profissionais que trabalham com
mediação familiar e outros profissionais que se interessem pela temática,
compreendam o quanto casamento e separação podem acarretar alterações na vida
das mulheres e suas famílias. Dessa forma, a pesquisa poderá auxiliar profissionais
no empoderamento de mulheres que estão se separando, promovendo-lhes uma
melhor qualidade de vida.
A velocidade das transformações ocorridas na sociedade no mundo
contemporâneo refletiu em alterações significativas na estrutura da união
matrimonial. Isso caracteriza uma fragilidade do casamento, o que pode trazer
prejuízos na configuração da família, acarretando problemas emocionais para os
filhos e para o próprio casal. (FÉRES-CARNEIRO, 1998). É necessário, portanto,
estudar essas novas configurações de família, a fim de preparar as pessoas a
suportarem o fim do relacionamento e poder colaborar na construção e elaboração
de projetos de políticas públicas que apóiem e contribuam para o acolhimento
psicológico das pessoas afetadas com o fim do relacionamento. Existe uma
premente necessidade de que os profissionais atuantes na mediação familiar sejam
institucionalizados no poder judiciário, para fins de mediar o conflito existente no
término do casamento. Esses profissionais teriam um material de conhecimento
capaz de esclarecer as fontes de conflitos surgidos no decorrer do andamento do
processo de mediação, tornando-se mais capacitados no que diz respeito aos
conflitos psicológicos advindos de uma separação.
14
Assim, o conhecimento sobre as representações sociais do casamento
poderá identificar as possíveis diferenças ou semelhanças das visões de mulheres
casadas e mulheres separadas, ou em processo de separação, com relação à
conjugalidade, podendo tornar-se de grande auxílio para profissionais interessados
no assunto. Além disso, os mediadores poderão ter maior discernimento em relação
aos aspectos sociais existentes nesse contexto, compreendendo e reconhecendo
aspectos comuns referentes a sentimentos e idéias sobre o enlace matrimonial.
15
1.3 OBJETIVOS
1.3.1 Objetivo geral
Compreender as representações sociais da conjugalidade para mulheres
casadas e para mulheres separadas.
1.3.2 Objetivos específicos
• Identificar as expectativas que mulheres casadas e mulheres
separadas tinham sobre o casamento.
• Identificar as expectativas que mulheres casadas e mulheres
separadas têm sobre o casamento.
• Identificar a percepção que mulheres casadas e mulheres separadas
têm sobre casamento.
16
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 CASAMENTO, AMOR E SEXUALIDADE
No século IV, não existia o casamento entre homem e mulher e, sim, um
casamento que simbolizava a união entre Deus e o homem, pregando assim a
castidade. Já o casamento que unia homens e mulheres, estava muito longe da
santidade, pois em tal união existia a sexualidade que, até o momento, não era
aceita pela Igreja, cujos valores primordiais eram a virgindade e a castidade. A
concepção de casamento correspondia a um aspecto negativo e pregado como
fonte de angústia e inquietação, contrária à serenidade da alma, sendo para os
cristãos da época equivalente à escravidão dos cônjuges. A vida conjugal, portanto,
era hostilizada na Antiguidade, sendo vista como algo que trazia riscos à virgindade
de homens e mulheres expostos a uma união matrimonial. (VAINFAS, 1986).
Na história das sociedades ocidentais, a Igreja teve um papel
preponderante na união conjugal. No século V, inúmeras modificações ocorreram na
sociedade ocidental, inclusive no campo do casamento, onde a união do casal e a
celebração do matrimônio passaram a acontecer com maior frequência, tornando-se
uma prática rotineira, vinculada à formação de uma descendência e também a uma
transmissão do patrimônio. (VAINFAS, 1986).
Os pensamentos e regras da Igreja Católica relativos ao casamento
começaram a dominar a sociedade apenas na Idade Média, quando o casamento foi
estabelecido como sacramento; já no século XII, tornou-se monogâmico e
indissolúvel. Em seguida, no século XIII, foram estabelecidas regras em relação ao
comportamento sexual. Dessa forma, a sexualidade encontrou um lugar legítimo
dentro do casamento, sendo que seu objetivo seria a procriação. O casamento
cristão tinha como premissa a promessa da fidelidade ao cônjuge, o que garantia a
fidelidade feminina e a legitimidade dos filhos. (SCABELLO, 2007).
Além da cobrança da fidelidade e da virgindade feminina até o
casamento, outras regras eram impostas, tais como: a abstinência sexual nos dias
santos, na gestação e nos períodos pós-parto e pós-menstrual, bem como a
proibição dos métodos contraceptivos e do sexo antes e fora do casamento. Casos
17
de bigamia eram penalizados com a excomunhão, o abandono ou até a morte da
esposa infratora. (SCABELLO, 2007).
Com a aceitação do casamento pela sociedade e também pela Igreja,
começou a surgir uma relação de dominação, exercida pelo homem sobre a mulher,
reforçando a união entre o casal, uma vez que a Igreja pregava uma mentalidade
patriarcal, em que a esposa estava condenada a ser uma escrava doméstica
exemplarmente obediente e submissa. Sua existência justificava-se por cuidar da
casa, cozinhar, lavar a roupa e servir ao chefe da família. (DEL PRIORE, 2005).
Na Idade Média, a mulher, ao se casar, tornava-se submissa ao marido e
teria que retirar seu sobrenome para incorporar o sobrenome do esposo, além de
romper com seus laços do passado para acompanhá-lo. Outra questão primordial
era que a mulher devia ao marido a sua virgindade ao casar-se e também a
fidelidade eterna. O homem, como chefe da família, assegurava o poder econômico
e sua esposa passava a pertencer a sua família, como uma espécie de propriedade.
(BEAUVOIR, 1980).
Conforme Jablonski (1998), no século XVIII, a união conjugal também era
celebrada basicamente para a transmissão do patrimônio, sendo sua origem fruto de
alianças familiares, tendo em vista a questão econômica, política e financeira dos
cônjuges, ou seja, eram casamentos arranjados. Os recém-casados, na maioria das
vezes, não se conheciam, não existindo o amor no momento da união conjugal.
A celebração da união do casal ocorria na casa da futura esposa, onde se
reuniam parentes dos noivos e testemunhas. Aconteciam algumas trocas de
palavras e, por fim, a união dos bens; o pai da moça entregava a tutela da filha para
o marido que o pagava com a entrega de uma donatio puellae (garantia do contrato).
Deste modo, a mulher era uma parte do patrimônio familiar, e sua união com um
homem selava a união de duas famílias reais ou nobres. Outra questão que fazia
parte do casamento era a fidelidade da mulher, já que a infidelidade poderia
provocar o abandono ou até mesmo a morte da esposa infiel. (ARAÚJO, 2002).
Segundo Del Priore (2005), Feres Carneiro (2003) e Scabello (2007), para
a Igreja, os cônjuges deveriam se unir não por amor, mas para formar uma união
entre as famílias dos noivos, tornar possível a procriação, permitindo dessa forma a
continuidade das gerações, e, principalmente, impedir que o ato sexual acontecesse
fora do casamento, evitando a promiscuidade. Sendo assim, percebe-se que o amor
não fazia parte do enlace matrimonial. O pensamento cristão pregava a abstinência
18
como fator primordial antes do casamento e assim o amor era um sentimento
irrelevante para a união entre o casal. Para Pretto (2003),
O amor nesse momento estava encarcerado na instituição casamento,
servo de Deus e não um meio para os homens adquirirem sua realização
existencial. É um aprisionamento que vem com a paixão [...] o amor se faz
incondicional: tudo suporta, tudo releva, e sacrifício, abdicação e dedicação.
(PRETTO, 2003, p. 20).
No final do século XVIII, a mulher tinha como principal função os afazeres
do lar, os cuidados com o marido e a criação e educação dos filhos. Em
contrapartida, ao homem cabia a função de provedor da família e chefe da casa.
(JABLONSKI, 1998). Para Del Priore (2005), a função da mulher no casamento
estava vinculada aos interesses do marido, cabendo a ela reverenciá-lo e cobri-lo de
suas vontades.
Com a modernidade, acontecem mudanças nos valores do casamento,
visto que começa a predominar o amor na relação conjugal. Torna-se possível a
existência de um casamento constituído com amor, onde o casal se une porque se
ama e passa a ter perspectivas a respeito do amor e da felicidade no matrimônio.
(ARAÚJO, 2002).
De acordo com Féres-Carneiro (2003), o processo de mudanças pelo qual
passam as relações conjugais, em que se viu a possibilidade da escolha do parceiro
para a união matrimonial, torna possível a complementaridade mútua conjugal,
proporcionando um envolvimento mais prolongado entre o casal. No entanto, a
possível existência do amor nas relações conjugais leva o cônjuge a questionar-se
sobre seu relacionamento a respeito da predominância desse sentimento.
Giddens (1993) relata que, com a decadência do poder patriarcal, abre-se
a possibilidade de se falar de amor no casamento. Sabe-se que casamento e amor
não estavam vinculados; o que existia era um amor ligado à responsabilidade dos
cônjuges no cuidado da casa e da família.
Deste modo, no século XIX, surge a idéia de amor romântico, acarretando
mudanças significativas na união matrimonial, onde o casamento passa a ocorrer
por amor e tornando-se a experiência mais desejável da vida do casal. Para explicar
a construção histórica do amor, recorremos a Giddens (1993), que afirma que o
amor romântico é “a possibilidade de estabelecer um vínculo emocional durável com
19
o outro, tendo como base as qualidades intrínsecas desse próprio vínculo. É o
precursor do relacionamento puro, embora também permaneça em tensão em
relação a ele”. (p.10). O autor também comenta sobre o amor confluente, que difere
do amor romântico, que é mais próximo do relacionamento puro por pensar a
igualdade na doação e nos recebimentos emocionais. O amor progride no mesmo
ritmo em que se desenvolve a intimidade, “[...] até o ponto em que cada parceiro
está preparado para manifestar preocupações e necessidades em relação ao outro e
está vulnerável a esse outro”. (GIDDENS, 1993, p. 73). A idéia de um casamento
“para sempre” e “único amor” é abandonado pela busca de relacionamentos
escolhidos e da realização sexual. "Na época atual, os ideais do amor romântico
tendem a fragmentar-se sob a pressão da emancipação e da autonomia sexual
feminina". (GIDDENS, 1993, p.72).
O amor confluente é uma forma de amor que estaria mais próxima ao
contexto contemporâneo. No amor confluente a relação de igualdade nas relações
de gênero exige equivalência, confluência de interesses e desejos e que institui
relacionamentos contingentes, negociados e duráveis, não até a morte, mas sim até
a finitude dos interesses de uma ou de ambas as partes, ou seja, não se propõe ao
“para sempre”, característico do amor romântico. (GIDDENS, 1993)
O amor romântico, segundo Lins (1997), é entendido como uma projeção
e idealização sobre o companheiro e, logo, algo momentâneo: “Enquanto estamos
apaixonados por alguém, o mundo se reveste de tamanho significado que a cada
encontro somos transportados para fora da realidade e cria-se um estado de
exaltação”. (p. 80). O amor romântico tem como alvo a busca de uma pessoa
especial e a crença nessa busca causa frustração no sujeito que está apaixonado, a
partir do momento em que percebe que o outro é um ser humano e não mais aquele
sujeito idealizado.
No entender de Giddens (1993), existe uma diferença do amor confluente
para o amor romântico; o amor confluente é aquele que recusa as idealizações e
fantasias, características próprias do amor romântico, tendo em vista o amor
confluente se pautar na realidade com envolvimento emocional dos parceiros e
igualdade na relação.
A visão de amor romântico acredita-se na idéia de indissolubilidade dos
parceiros. Oltramari (2007) comenta que o amor, mesmo na sociedade ocidental, é
entendido de forma idealista. As pessoas vivem com a certeza de que o eleito é
20
“único” e “eterno”. Contudo, a sociedade contemporânea vem passando por
mudanças que provocam alterações significativas no contexto social, bem como no
amor e na sexualidade. Giddens (1996) considera essas mudanças na sociedade
como "modernização reflexiva", que para ele têm uma diferença em relação à
modernização simples. No caso da modernização simples, os hábitos e costumes da
sociedade são previsíveis. Na reflexividade, o sujeito passa a ter um grau de
autonomia de suas ações, tendo em vista sua possibilidade de escolher e tomar
decisões, provocando mudanças significativas no contexto social.
"É institucional por ser o elemento estrutural básico da atividade social nos
ambientes modernos. É reflexivo no sentido de que os termos introduzidos
para descrever a vida social habitualmente chegam e a transformam - não
como um processo mecânico, nem necessariamente de uma maneira
controlada, mas porque tornam-se parte das formas de ação adotadas pelos
indivíduos ou pelos grupos". (GIDDENS, 1993, p. 39).
Giddens (1993) explica que a reflexividade altera as relações amorosas, visto
que as pessoas estão num movimento de individualização, resultando em alterações
na união conjugal constituída por amor. Com a reflexividade, a sexualidade também
adquiriu um novo caráter na sociedade moderna, saindo de uma finalidade
reprodutiva e passando a ser alvo de negociação, pois a mulher agora faz
exigências em relação à sexualidade. Cabe lembrar que a Igreja Católica resistiu em
aceitar o casamento (GIDDENS, 1993). Após a aceitação, a Igreja uniu o matrimônio
o amor e também a sexualidade como condição necessária e, dessa forma,
encontrou uma maneira de dominar e reprimir a sexualidade dos cristãos.
(SCABELLO, 2007).
Sendo assim, faz-se necessária a compreensão a respeito do sentido da
sexualidade na relação conjugal, pois, de acordo com o cenário sócio-cultural atual,
as transformações sociais vêm redefinindo as práticas afetivas e sexuais no
matrimônio. A emancipação sexual e a autonomia feminina trazem uma
descentralização da sexualidade em relação à procriação, e o prazer sexual passa a
ser uma reivindicação das mulheres. (GIDDENS, 1993).
Michel Bozon (2003), teórico que traz contribuições sobre a sexualidade,
a partir do século XIX, explica que o ato sexual era benquisto apenas no casamento.
Atualmente, na conjugalidade contemporânea, ele passou ser fator necessário à
21
vida conjugal. “A sexualidade, que era ontem um dos atributos do papel social do
indivíduo casado, tornou-se uma experiência interpessoal indispensável à existência
da união”. (BOZON, 2003, p.134).
Segundo o mesmo autor, a mulher, ao assumir uma nova atitude em
relação às relações afetivas e sexuais, provoca uma nova maneira de se posicionar
frente ao seu casamento e em alguns casos podendo levar à ruptura conjugal. A
mulher vivenciou mudanças mais acentuadas do que o homem no decorrer da sua
vida sexual. (BOZON, 2003). Conseqüentemente, o posicionamento feminino frente
a sua sexualidade vem rompendo obstáculos e, com isso, as mulheres vêm
adquirindo um espaço mais autônomo e liberal na sociedade.
Lins (1996) e Bozon (2003) refletem que as mudanças de costumes
aconteceram com o aparecimento da pílula anticoncepcional, nos anos 1960. A
sexualidade não era mais associada à procriação, pois a mulher começava a definir
o que quer fazer do seu corpo, e o casamento não mais considerado, para algumas
mulheres, como o espaço central para manter relações sexuais. Nos anos 1970
algumas mulheres achavam perdoável a infidelidade de um homem casado; já na
década de 1990, a opinião das mulheres sobre as relações extraconjugais difere e
tais infidelidades já não são aceitas por elas.
Em relação à moral sexual, dois pontos de vista substantivamente
diferentes se opõem. Dois terços dos homens estão de acordo com a idéia
segundo a qual “pode-se ter relações sexuais com alguém sem ser
apaixonado”, ao passo que dois terços das mulheres desaprovam esta
idéia. Os homens são também mais numerosos em pensar que “pode-se ter
aventuras sexuais durante o casamento”, do mesmo modo que “a atração
sexual leva forcosamente a transar com alguém” e que “pode haver amor
sem fidelidade”, ou que “as infidelidades passageiras reforçam o amor.” As
mulheres, ao contrário, muito mais que os homens, se mostram chocadas
com as “trocas de parceiros”, tanto quanto com a pornografia. (BOZON,
2003, p. 149).
As mulheres viveram mudanças mais significativas do que os homens na
trajetória da sexualidade. A preocupação com a satisfação sexual dos parceiros tem
ganhado destaque quando, principalmente, se fala em manter um casal unido. A
insatisfação sexual pode ser um fator crescente entre as causas que levam a mulher
a requerer a separação. Segundo Jablonski (1998), pesquisas apontam que a
mulher se destaca como a parte que solicita a separação, mesmo que, em alguns
casos, tal atitude possa gerar um dano na sua condição financeira. Desta maneira,
22
podemos dizer que a emancipação da mulher e a liberdade sexual são fatores que
possibilitam, na sociedade atual, mudanças necessárias que ensejam novas
possibilidades para as mulheres traçarem outros caminhos, sem se entregarem a
uma condição de insatisfação plena oriunda de união indesejável.
2.2 FAMÍLIA
A história da família está intimamente ligada à do casamento. Na Idade
Média, a família baseava-se na linhagem, ou seja, era constituída pela solidariedade
entre todos os descendentes e com um ancestral em comum, sendo que nem todos
se reuniam num mesmo espaço. A família, portanto, compunha-se dos pais, filhos,
sobrinhos e primos solteiros que viviam uma mesma propriedade e mantinham
relações familiares. Como não havia a divisão da propriedade, surgiu a grande
família moderna patriarcal com seus valores. No final da Idade Média, “a família
conjugal tornou-se novamente independente”. (ARIÈS, 1981, p.212). O domínio do
paterno foi fortalecido para garantir que o patrimônio familiar não fosse dividido.
Sendo assim, a mulher, a partir do séc. XIV, perdeu seus direitos, passando a ser
considerada impossibilitada para tomar qualquer decisão. O poder paterno
estabelece uma espécie de monarquia familiar, a qual a mulher e os filhos deveriam
obedecer, submetendo-se aos domínios do pai. A Igreja legitimou, nesse contexto,
essa forma de organização familiar. (ARIÈS, 1981).
A relação familiar no contexto matrimonial tinha como principal objetivo a
formação de alianças políticas e transmissão de patrimônios. Neste sentido, a
relação afetiva entre familiares não existia e, portanto, não havia uma vida familiar
em sua intimidade. (ARIÈS, 1981, SCABELLO, 2007). De acordo com Ariès (1981),
entre o século XV e XVIII, as relações afetivas entre os familiares começaram a
mudar, em virtude de uma preocupação com a educação dos filhos. Assim, a criança
passou a ser vista pelos adultos de forma diferente, e, portanto, considerada parte
importante no contexto familiar. Deste modo, a organização familiar começou a
envolver a criança, ensejando uma modificação a respeito dos afetos existentes na
dinâmica familiar. (ARIÈS, 1981).
23
Roudinesco (2003) pontua que existem três grandes períodos na
evolução da família. No primeiro momento, configura-se a família tradicional, que
serve para garantir a transmissão do patrimônio, além de casamentos arranjados
entre os pais, sem existência de vida sexual e afetiva dos futuros noivos. Nessa
esfera, a família viveu uma relação durável e dominada pela autoridade patriarcal.
No segundo período, a família dita moderna, entre o final do século XVIII e meados
do XX, tornou-se envolvida por relações afetivas. Surge o amor romântico, onde a
família admite o acordo mútuo do sentimento e os desejos carnais por mediação do
casamento. Nessa fase, começou-se a aceitar a divisão do trabalho entre os
cônjuges. Por fim, o terceiro período, distinguido pela autora como a família
contemporânea, no qual, dois indivíduos se unem em busca de relações íntimas ou
realização sexual.
De acordo com Roudinesco (2003, p.20), “a família ocidental permanece
a instituição humana mais sólida da sociedade”. Portanto, formar uma família é algo
desejado e sonhado pelos indivíduos, sendo o único valor seguro a que muitas
pessoas não querem renunciar. Sendo assim, a família tem uma representação
significativa na vida das pessoas. (ROUDINESCO 2003 e NOGREN, 2004).
2.2 SEPARAÇÃO
Para os cônjuges, o casamento é considerado um momento de realização
social e que solidifica o relacionamento. (BERGER e KELLNER, 1970 apud FÉRESCARNEIRO, 1998). No entanto, algumas pessoas acabam se divorciando, não pelo
motivo do casamento não ser importante, mas por acreditarem que seja um ato tão
importante que os cônjuges não aceitam a insatisfação de suas expectativas. Assim,
muitos indivíduos que se divorciam acabam buscando um novo casamento.
Portanto, a solução para alguns casais que não conseguem enfrentar as dificuldades
da vida a dois é o fim do casamento, independentemente de ser um momento
doloroso e estressante. “[...] A separação provoca no casal sentimento de fracasso,
impotência e perda”. (FÉRES-CARNEIRO, 1998, p. 7).
No entender de Féres-Carneiro (1998), o casamento é a união de duas
individualidades numa conjugalidade criando uma “identidade conjugal” na união
24
matrimonial; portanto, com o processo de separação, vai se desfazendo a
“identidade conjugal” que foi construída na união e, com o fim do casamento, os
sujeitos terão que definir sua nova identidade individual.
De acordo com Féres-Carneiro (1998) e Jablonski (1998), o desejo de
separação parte predominantemente das mulheres, pois elas levam muito em
consideração a relação afetiva no casamento, e os homens conseguem levar o
casamento sem conflitos internos, porque a constituição masculina de casamento
está pautada no modelo familiar, sendo mais relevante do que a questão amorosa.
(FÉRES-CARNEIRO, 2003).
Para Jablonski (1998), a emancipação feminina contribuiu na busca pela
separação, pois muitas mulheres, ao conquistarem um espaço no mercado de
trabalho, obtiveram sua independência financeira, o que modificou papéis antes
instituídos de mãe e de esposa. A pílula anticoncepcional também possibilitou às
mulheres a escolha de ter ou não filhos, diminuindo de certa forma suas obrigações
domésticas, bem como a dedicação à família. (JABLONSKI, 1998).
Independentemente do aumento no número de separações, sabe-se que
muitos homens e mulheres ainda buscam constituir uma família através do
casamento. Considera-se, assim, que a condição de felicidade está atrelada à união
conjugal. (ABREU, 2005).
O que constatamos é que os indivíduos têm se divorciado, não por
considerarem o casamento menos importante, mas, justamente, porque sua
importância é tão grande que eles não aceitam que a vida conjugal não
corresponda as suas expectativas. Com o aumento das separações,
crescem também, em número e em diversidade, as novas configurações
familiares. (FÉRES- CARNEIRO, 2002 apud ABREU, 2005, p. 22).
Para tanto, estudos de Marcones, Trierweiler e Cruz (2006) verificaram
que existem algumas características emocionais e psicológicas que fazem parte do
momento da separação e, de acordo com os estudiosos, foi constatado que existem
diferenças em relação ao sofrimento entre mulheres e homens, logo após o fim do
casamento. “A dor da separação é, com frequência, fisicamente sentida”. (p.1).
Dessa forma, podemos entender que a separação ocorre em alguns
momentos quando o casamento não satisfaz os cônjuges. Acontece, portanto, a
dissolução do vínculo matrimonial, e assim se busca uma nova situação que irá
satisfazer a individualidade de cada sujeito. Para tanto, a separação pode provocar
25
dor e sofrimento para todas as pessoas envolvidas, tornando-se um momento
complicado e com perdas significativas que provocam mudanças evidentes na
organização familiar e na vida de cada uma das partes envolvidas na separação.
2.3 CONJUGALIDADE E GÊNERO
Para que se possa entender algo a respeito de conjugalidade, é
necessário, em primeiro momento, definir o termo conjugalidade. Segundo Matos
(2000, p. 163, grifo do autor),
Conjugalidade deve ser entendida como uma forma possível de gestão
compartilhada da sexualidade e dos afetos, onde ideologias e práticas de
amor conjugal e gênero se expressam e realizam, positivamente, um lócus
ou uma cena onde se situam as trocas afetivas, sexuais e cognitivas entre
os gêneros.
O casamento tem assumido novas formas de união entre as pessoas,
podendo ser visto como um sinal de ultrapassar um modelo que não estaria mais
correspondendo às transformações que ocorrem com o indivíduo contemporâneo. A
idéia de conjugalidade é a união entre duas pessoas, sem necessariamente, a
existência de um contrato formal entre elas. O surgimento dessa nova postura do
casal se dá pelas transformações sociais e culturais pelas quais vem passando a
família na atualidade. (DIHEL, 2002 apud ABREU, 2005).
Abreu (2005) explica que as mudanças em relação às novas formas de
conjugalidade têm interferido nos projetos de vida de cada pessoa, pois, segundo a
autora, o sujeito perde as referências tradicionais para a construção da família e
dessa forma é obrigado a buscar outros padrões de conjugalidade. Contudo, “(...) os
novos arranjos matrimoniais fazem parte de um contexto social em reorganização
(especialmente se pensarmos que a família não é um fato natural, mas sim uma
construção cultural)”. (ABREU, 2005, p. 23).
Transformações vêm ocorrendo em relação à estrutura familiar. No
Código Civil de 1916, somente a família fundada no casamento era reconhecida pelo
Estado. Em 1988, com a Constituição Federal, estabeleceram-se os princípios do
26
direito familiar. (CERVENY, 2004). Sabe-se que o tamanho da família diminuiu, e
cresceu o número de uniões conjugais sem vínculos legais. (ABREU, 2005).
Jablonski (2003) afirma que a mudança do papel da mulher na
conjugalidade tem interferido nas transformações da configuração do casamento.
Existem vários fatores que são responsáveis pelas transformações nos padrões de
conjugalidade. O autor cita que umas das prováveis mudanças estão relacionadas à
entrada da mulher no mercado de trabalho, o que proporcionou casamentos mais
tardios, diminuição no número de filhos e aumento da busca por igualdade de
direitos, além da queda da submissão à religião católica, que perdeu seu domínio na
manutenção do vínculo matrimonial.
As transformações sociais provocaram alterações em relação ao contrato
matrimonial clássico e isso gerou modificações na relação conjugal, colocando-as
em um campo muito diferente do já visto anteriormente na história do casamento. A
falta de igualdade na divisão de tarefas domésticas, na administração da casa e na
educação e cuidado dos filhos são fatores que originam conflitos na esfera familiar.
Em muitos casos, à mulher cabe a tarefa de abandonar seus interesses pessoais a
serviço dos planos do cônjuge ou das necessidades do grupo familiar. Essas
diferenças na forma de acordar os interesses do casal, principalmente das mulheres,
afetam ou causam a insatisfação no casamento. (PERLIN e DINIZ, 2005).
Em relação à insatisfação no casamento, Jablonski (1998) ressalta que as
mulheres demonstram certo descontentamento quando se sentem sobrecarregadas
pela dupla jornada de trabalho, e, de certa forma, por estarem casadas com maridos
que ainda mantêm uma visão tradicional em relação aos papéis domésticos.
Portanto, a mulher ainda é cobrada das funções tradicionais de esposa, dona de
casa e mãe. E agora, ainda passa a compartilhar e assumir papéis que antes eram
exclusivamente masculinos. (PERLIN e DINIZ, 2005).
As mulheres, ao longo dos séculos, vêm redefinindo seu papel dentro da
sociedade, trazendo mudanças significativas em relação à sexualidade, a escolha do
parceiro e sua carreira profissional. Essas alterações possibilitam às mulheres sua
inclusão
igualitária
na
sociedade
contemporânea,
contribuindo
para
sua
emancipação. Essa transformação reflete nas relações de gênero, e assim
possibilita a modificação na postura masculina e feminina dentro da relação
matrimonial. (ARAÚJO, 2002).
27
As mulheres tiveram um papel de revolucionárias emocionais da modernidade
e prepararam o caminho para expansão da intimidade. Algumas disposições
psicológicas têm sido a condição e o resultado desse processo, assim como
também as mudanças materiais e sociais que permitiram as mulheres
reivindicar a igualdade e propor mudanças nas relações de gênero. (ARAÚJO,
2002, p.7).
A conjugalidade representa uma relação de forte significado para a vida
dos sujeitos. Féres-Carneiro (2003) contextualiza que a relação entre o casal é um
momento de alto grau de proximidade, de intimidade e de intenso envolvimento
afetivo; portanto, o casamento é considerado uma escolha pessoal, com
responsabilidade e autonomia, baseada em laços de afeto e afinidade. Para FeresCarneiro (1998), o casamento contemporâneo caracteriza-se por conter ao mesmo
tempo:
[...] duas individualidades e uma conjugalidade, ou seja, de o casal conter
dois sujeitos, dois desejos, duas inserções no mundo, duas percepções do
mundo, duas histórias de vida, dois projetos de vida, duas identidades
individuais que, na relação amorosa, convivem com uma conjugalidade, um
desejo conjunto, uma história de vida conjugal, um projeto de vida de casal,
uma identidade conjugal. (FÉRES-CARNEIRO, 1998, p. 3).
Reis (1992) assevera que o amor companheiro faz parte da relação
conjugal, proporcionando uma ligação intensa e estável entre o casal, sendo que a
amizade, o companheirismo e o respeito também fazem parte do enlace
matrimonial, contribuindo para que os sujeitos dividam seus projetos e interesses,
possibilitando uma construção da união entre o casal.
A relação de conjugalidade perpassa sobre as relações de gênero, pois
de acordo com Scott (1990, p. 15), “[...] o gênero é um elemento constitutivo de
relações sociais fundadas sobre as diferenças percebidas entre os sexos, e o
gênero é um primeiro modo de dar significado às relações de poder”. Sendo assim,
segundo o autor, dentro do quesito gênero existe uma relação de poder e hierarquia
que acaba por reforçar as práticas enraizadas na cultura.
De acordo com Strey (2000), gênero é uma construção histórica, cultural,
e social. Existem diferenças e semelhanças em relação aos homens e mulheres,
onde os indivíduos simbolizam o contexto social/cultural no qual estão inseridos,
dando significações próprias, o que irá determinar sua identidade de gênero.
28
A relação de gênero está presente desde a nossa infância, pois somos
criados numa sociedade que determina o que a menina e o menino podem fazer, ou
ser, ou seja, os padrões de comportamentos determinados e diferentes para cada
sexo. Atitudes e comportamentos são ensinados desde muito cedo para
diferenciarmos homens e mulheres. Das meninas, é esperado que sejam gentis,
delicadas, educadas e que não saiam sozinha, sendo ensinadas para a
dependência. Já os meninos são estimulados a serem independentes, poderosos,
fortes e sem nenhuma característica que remeta à feminilidade. Criam-se, assim,
estereótipos que acompanham a sociedade, pois se sabe que tanto homens quanto
mulheres têm as mesmas necessidades de afeto, amor e assim expressarem suas
emoções. (LINS, 1997).
De acordo com Lins (1997) e Beauvoir (1980), as mulheres acreditavam
que para conquistarem sua dignidade e segurança financeira seria essencial a união
matrimonial. O casamento como a “única fonte de segurança para a mulher é usado
como uma arma ideológica contra a mulher” (p.116). Para Beauvoir (1980), a união
matrimonial não poderia ser uma carreira para uma mulher, pois tal situação se torna
uma fonte de angústia para homens e mulheres.
Dessa forma, a questão do gênero destaca a visão tradicional do papel
feminino e masculino perante a sociedade, caracterizando uma divisão social, porém
tais divisões não acontecem de forma natural, mas, sim, são parte de um contexto
construído cultural e historicamente. Portanto, o modelo tradicional de divisão de
papéis entre homens e mulheres começou a modificar com o movimento feminista,
desencadeado nos Estados Unidos e em alguns países da Europa e no Brasil, no
final dos anos 1970 e início dos anos 1980. (ABREU, 2005).
Outra questão que também podemos pontuar em relação à diferença de
gênero é a questão da fidelidade conjugal, pois de acordo com Matos (2000), a
cultura tradicional e patriarcal tolera estimular a infidelidade masculina, sendo algo
até mesmo associado à virilidade. A sociedade contemporânea, com suas ideologias
feministas, buscando a igualdade entre os sexos, torna a infidelidade cada vez
menos aceita pelas mulheres. Sendo assim, a traição configura-se uma quebra do
contrato amoroso, isso para casais que mantêm uma convivência exclusiva, ou seja,
um relacionamento fechado. Porém, quando o vínculo conjugal é aberto, onde os
cônjuges permitem as relações extraconjugais, a fidelidade não é um compromisso
e, portanto, não provoca o rompimento do vínculo conjugal. As novas escolhas de
29
conjugalidade indicam mudanças tanto no casamento quanto na família tradicional,
apontando para o surgimento de novas formas de configurar a conjugalidade.
(MATOS, 2000).
2.4 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO CASAMENTO
A Teoria das Representações Sociais é um modelo sociológico de
Psicologia Social surgida na Europa, tendo como principal colaborador Serge
Moscovici, que propôs estudar as representações sociais da psicanálise na
sociedade francesa, a fim de compreender como esta elabora, através do senso
comum, o conhecimento científico nas suas relações cotidianas. (FARR, 1998).
Moscovici (1978 apud OLTRAMARI, 2007) se propôs a entender como as pessoas
nas suas interações sociais constroem e produzem sentido em suas práticas
cotidianas, construindo uma compreensão de mundo, a partir das representações
sociais, indo de acordo com as explicações do senso comum. Todavia, as
representações sociais são expressões, significados, opiniões, valores e atitudes
dos grupos frente a fenômenos sociais que são compartilhados e construídos
historicamente; afinal, são importantes e necessários para organizar e orientar as
suas práticas sociais. (JOVCHELOVITCH, 2008). A partir disso, os sujeitos elaboram
seus valores e significados para se posicionarem frente ao mundo. (MOSCOVICI,
2003).
Sendo assim, as representações sociais são conceitos e explicações que
surgem na vida cotidiana dos sujeitos, através da comunicação interpessoal,
podendo ser entendidas como os mitos e as crenças que são incorporadas pela
sociedade. Portanto, as representações sociais não são criadas por um sujeito
individualmente, mas por uma coletividade que, através da linguagem, confere
significado e movimento às representações sociais. (MOSCOVICI, 2003).
Todos os sujeitos são entendidos dentro de sua rede social; sendo assim,
nenhuma pessoa está livre da influência das representações sociais, da linguagem
ou da cultura. Segundo Moscovici (2003, p 35), “nós pensamos através de uma
linguagem; nós organizamos nossos pensamentos, de acordo com um sistema que
está condicionado, tanto por nossas representações como por nossa cultura”. Assim,
30
entende-se que as RS são construções coletivas, com a finalidade de informar o
sujeito sobre o mundo que o cerca e assim, orientando sua forma de agir.
As representações sociais são determinadas por grupos sociais
específicos e com características próprias. De acordo com Jodelet (2002 apud
ARRUDA, 2002, p. 138): “as representações sociais são uma forma de
conhecimento socialmente elaborado e compartilhado, com um objetivo prático, e
que contribui para a construção de uma realidade comum a um conjunto social”.
Arruda (2002) explica que as representações sociais nos dão possibilidade de
entender como se constrói a realidade através da interação entre o sujeito e a
sociedade.
As representações sociais não estão relacionadas somente à forma com
que o mundo se apresenta e tampouco com as construções subjetivas dos sujeitos.
Elas são construídas simbolicamente pelas inter-relações Eu, Outro e objetosmundo, dando significado e sentido a uma realidade. As representações, portanto,
são sociais, políticas e históricas. (JOVCHELOVITCH, 2008).
Jovchelovitch (2008) explica que as representações emergem através do
sentido e da função simbólica. Na análise do sentido, entende-se que as pessoas,
em contextos e tempos diferentes, vão produzir diferentes visões, símbolos e
narrativas sobre o real. Na função simbólica, utilizam-se os símbolos para dar
significado ao real. Dessa forma, é pelas representações sociais que os indivíduos e
comunidades vão demonstrar quem realmente são, o mundo social que habitam e o
que consideram relevante nas inter-relações em que estão envolvidos. Segundo
Jodelet (2001, p. 17), “não somos (apenas) automatismos, nem estamos num vazio
social”, pois estamos em constante relacionamento com os outros no mundo. Esse
relacionamento proporciona-nos momentos ora de apoio, outrora de conflitos, e,
dessa forma, estamos sujeitos a diversas situações, nas quais nos farão tomar
decisões e nos posicionarmos frente à realidade cotidiana, mediada pelas
representações sociais. Criamos, assim, representações sociais que podemos
considerar como o resultado de uma construção pessoal e social sobre um
determinado fenômeno, levando em conta questões afetivas, mentais e sociais,
assim como, a cognição, a linguagem e a comunicação. (JODELET, 2001). “A
particularidade do estudo das representações sociais é o fato de integrar na análise
desses processos a pertença e a participação, sociais ou culturais, do sujeito”. (p.27)
Dessa maneira, as representações são fenômenos complexos e estão sempre em
31
ação na vida social (JODELET, 2001, p. 27). Jovchelovitch (2008) ressalta as
representações sociais, parte dos saberes da vida cotidiana e do senso comum dos
grupos sociais:
[...] chamo de fenomenologia da vida cotidiana, preocupada em
compreender como pessoas comuns, comunidades e instituições produzem
saberes sobre si mesmas, sobre outros e sobre a multidão de objetos
sociais que lhe são relevantes. [...] Este saber, que é sempre plural, está
profundamente ligado ao mundo da vida e à experiência vivida de uma
comunidade, demarcando seus referencias de pensamento, ação e
relacionamento. (JOVCHELOVITCH, 2008, p.87).
Segundo Moscovici (1979 apud SÁ, 1996), a primeira forma de
elaboração da teoria das representações sociais é pautada em duas estruturas que
são conceptual e figurativa, ou seja, seria um processo que torna o conceito e a
percepção de certo modo iguais, visto que, de algum modo, estão ligados e
estabelecem entre si a possibilidade de dar significado às coisas. Partindo disso,
entende-se que, na ausência de um objeto, podemos dar um sentido ao mesmo e na
forma conceitual ou figurativa seria dar concretude ao objeto, conferindo sentido aos
objetos. (MOSCOVICI, 1979 apud SÁ, 1996).
Dentro das representações sociais encontram-se também dois processos
referentes à RS: a ancoragem e a objetivação. Dessa forma, o conceito ancoragem
“é um processo de organização e de classificação em que o não-familiar deve estar
relacionado com um conhecimento já familiarizado e conhecido”. (OLTRAMARI,
2007, p. 32). Já o conceito de objetivação consiste em modificar conceitos abstratos
em imagens concretas, ou seja, “(...) reproduzir um conceito em uma imagem”.
(MOSCOVICI, 1984 apud SÁ, 1996, p.47).
Sendo assim, pode-se concluir que as representações sociais apresentam
um caráter dinâmico e complexo e, além disso, norteado pela cultura, pela história e
por questões psicológicas. Portanto, é possível perceber que a conjugalidade pode
ser estudada a partir das representações sociais, uma vez que se constitui um
fenômeno social compartilhado e construído historicamente Bertollo (et al., 2007)
pontua em suas pesquisas que as representações feitas pelos casais acerca do
casamento
estão
relacionadas
a
amor,
confiança,
carinho,
respeito
e
companheirismo. Bertollo et al. (2007) explicam que, em relação ao casamento,
aparecem representações sociais referentes ao papel do homem e da mulher dentro
32
do casamento, respectivamente. O homem se identifica como provedor, sustentando
economicamente o lar, e assim é considerado um bom marido; e a mulher é
considerada uma boa esposa quando apresenta características como: afetuosa,
carinhosa, companheira e compreensiva.
As representações sociais são construídas a partir das relações entre
grupos, em que os sujeitos elaboram seus conceitos e explicações da vida, sempre
com o intuito de compreender o mundo e as interações sociais, partindo assim de
explicações do senso comum. (MOSCOVICI, 1981 apud OLIVEIRA e WERBA,
2000). As RS são um produto de nossas interações e comunicações, podendo
influenciar
o
comportamento
do
sujeito
participante
de
uma
coletividade
(MOSCOVICI, 2003). “[...] dessa maneira que elas são criadas, internamente,
mentalmente, pois é dessa maneira que o próprio processo coletivo penetra, como o
fator determinante, dentro do pensamento individual”. (MOSCOVICI, 2003, p. 40).
As Representações Sociais, portanto, são um conjunto coletivamente
partilhado de crenças, imagens, metáforas e símbolos num grupo, comunidade,
sociedade ou cultura. (WAGNER, 2000, p.3). Segundo o mesmo autor, o termo
sobre representação social é elucidado como:
[...] conteúdo mental estruturado, isto é, cognitivo, avaliativo, afetivo e
simbólico, sobre um fenômeno social, relevante que toma a forma de
imagens ou metáforas e que é conscientemente compartilhado com
outros membros do grupo social.
Wagner (2000, p.4) entende que a “representação social é definida como
a elaboração de um objeto social pela comunidade”. As Representações Sociais são
configurações objetivas e subjetivas do sujeito, representadas por valores e crenças;
sendo assim, é tornar familiar o que não é familiar.
Diante disso, as relações conjugais, assim como todas as nossas
relações, estão diretamente atingidas pelas nossas representações sociais sobre o
mundo. Sendo assim, procuramos conhecer através das Representações Sociais o
comportamento do sujeito, quais suas opiniões, atitudes, imagens, explicações para
certos fenômenos, além de compreender quais as representações sociais que
mulheres têm acerca do casamento. Isso nos dará possibilidades de definir os
diferentes aspectos da realidade de cada uma delas. 33
3 MÉTODO
3.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA
Esta pesquisa é caracterizada como exploratória e de caráter qualitativo,
intentando compreender, de forma adequada, a natureza do fenômeno, para fins de
produção de conhecimento. Sobre a pesquisa do tipo exploratória, Gil (1999, p. 43)
afirma:
Muitas vezes as pesquisas exploratórias constituem a primeira etapa de
uma investigação mais ampla. Quando o tema escolhido é bastante
genérico, tornam-se necessários seu esclarecimento e delimitação, o que
exige revisão da literatura, discussão com especialistas e outros
procedimentos. O produto final deste processo passa a ser um problema
mais esclarecido, passível de investigação mediante procedimentos mais
sistematizados.
Faz-se necessária a utilização do método qualitativo, pois segundo Turato
(2003), o método visa à elaboração de forma interpretativa, permitindo trabalhar com
um pequeno número de sujeitos escolhidos e possibilitando, a partir de resultados,
melhor compreensão de significados do fenômeno para os indivíduos e para a
coletividade.
Quanto ao delineamento, este trabalho caracteriza-se como pesquisa de
campo, já que esta modalidade busca levantar dados no próprio local onde o
fenômeno ocorre. Conforme estudos de Marconi e Lakatos (2005), este tipo de
pesquisa objetiva conseguir informações e conhecimento acerca de um problema,
dando um maior aprofundamento e compreensão do fenômeno que se pretende
estudar.
Assim, esse tipo de delineamento, segundo Gil (1999), é muito mais
amplo o que possibilitou um maior entendimento a respeito das representações
sociais, foco da presente pesquisa, permitindo que se levantassem hipóteses ou
novos questionamentos a serem pesquisados. Portanto, a pesquisa se caracterizou
como exploratória, qualitativa e estudo de campo, à medida que buscou-se
34
compreender as representações sociais de conjugalidade para dois grupos de
mulheres: casadas e separadas.
3.2 PARTICIPANTES
As participantes desta pesquisa foram mulheres casadas e mulheres
separadas, tendo sido entrevistadas cinco mulheres separadas e cinco casadas,
todas com idades entre 18 a 54 anos, como veremos nas tabelas 1 e 2.
O local escolhido para entrevistar as mulheres separadas foi o Serviço de
Mediação que atende à população do município de São José, em Santa Catarina, no
qual um dos requisitos para o atendimento é que os casais tenham renda mensal
que não ultrapasse o valor de cinco salários mínimos (R$1.750). As participantes
foram mulheres separadas que passaram pelo processo de separação entre os anos
de 2007 e 2008. No caso das mulheres casadas, as participantes foram quatro
entrevistadas no Serviço de Psicologia da Unisul e uma entrevistada no Fórum da
comarca de São José e, sendo as cinco mulheres casadas com renda aproximada à
das mulheres separadas.
As mulheres separadas foram selecionadas no serviço de mediação
familiar do Fórum da Comarca de São José – em Santa Catarina. As mulheres
separadas foram aquelas que assinaram o acordo no processo de mediação. Foi
entrevistada uma mulher casada que trabalha no serviço de limpeza no Fórum de
São José e quatro mulheres casadas que utilizam o serviço de Psicologia na
Universidade do Sul de Santa Catarina – Unisul. No caso de mulheres casadas,
poderiam participar aquelas que vivem em união estável e as que possuem certidão
de casamento. A pesquisadora deixou claro que não mantinha, com as mulheres,
nenhum tipo de relação prévia. As características das participantes estão
explicitadas nas Tabelas 1 e 2:
Tabela 1 – Caracterização das mulheres casadas
Mulheres
casadas
Flor
Idade
45 anos
Tempo de
casamento
15 anos
Escolaridade
2°grau completo
Tempo
de
namoro
1 ano
Filhos
Não tem filhos
35
Paula
22 anos
1 ano e 3 meses
2° grau cursando
6 meses
Não tem filhos
Lara
34 anos
13 anos
2°grau completo
1 anos
Carol
28 anos
8 anos
2°grau completo
1 ano
2 filhos (8 anos
e 11 anos)
1 filho (8 anos)
Margarida
30 anos
10 anos
2°grau incompleto
2 anos
3 filhos (4 anos,
10 anos e 11
anos)
Nomes fictícios para proteger a identidade das mulheres entrevistadas.
Fonte: elaboração da autora, 2009.
Participaram desta amostra cinco mulheres casadas, adultas entre 22 e
45 anos. Entre as mulheres casadas destacamos; Flor, Paula e Margarida casadas
com certidão de casamento. Lara e Carol vivem em união estável.
Os participantes da pesquisa são identificados com nomes fictícios para
preservar suas identidades. Na tabela 1, também apresentamos dados como tempo
de casamento, escolaridade e se as mulheres têm ou não filhos do relacionamento.
Tabela 2 – Caracterização das mulheres separadas
Mulheres
separadas
Idade
Tempo de
casamento
Maria
23 anos
5 anos
Joana
49 anos
2 casamentos
(6 anos e 20
anos)
Glória
39 anos
18 anos
Clara
27 anos
8 anos
Silvia
54 anos
17 anos
Escolaridade
2°grau
cursando
1º grau
completo
1º grau
completo
1° ensino
fundamental
2°grau
completo
Tempo
de
namoro
6 meses
1 ano
1 ano e
meio
6 meses
Aproxima
damente
4 ano
Nomes fictícios para proteger a identidade das mulheres entrevistadas.
Fonte: elaboração da autora, 2009.
Filhos
1 filho (2
anos)
3 filhos (12
anos, 16
anos e 21
anos)
1 filha (17
anos)
2 filhos (3
anos e 8
anos)
2 filhos (20,
19 anos)
Tempo de
separação
1 ano
10 meses
1 ano
8 meses
2 anos
Na tabela 2, apresentamos a amostra de cinco mulheres separadas,
adultas entre 23 e 54 anos. As participantes da pesquisa foram mulheres separadas
oficialmente, através do Serviço de Mediação do Fórum de São José, entre os anos
de 2007 e 2008.
As mulheres da pesquisa são identificadas com nomes fictícios para
proteger suas identidades. Nessa tabela, também apresentamos dados como tempo
de casamento, escolaridade, mulheres com filhos gerados no enlace matrimonial e
tempo de separação.
36
3.3 EQUIPAMENTOS E MATERIAIS
Para a realização da coleta de dados, foi necessária a utilização de livros
e trabalhos relativos ao tema, folhas A4, canetas, impressora, gravador e
computador.
3.4 SITUAÇÃO E AMBIENTE
A coleta de dados realizada com as mulheres separadas ocorreu em uma
sala no Serviço de Mediação no Fórum em São José. O cômodo era longe de ruídos
externos, para garantir que não houvesse a interferência de terceiros.
O primeiro contato com todas as mulheres separadas foi via telefone,
ocasião em que a pesquisadora informou sobre a pesquisa e, a partir do interesse
das mulheres, eram marcadas as entrevistas, conforme seus horários disponíveis. A
primeira participante da entrevista foi uma mulher separada, a entrevista com a
participante teve uma duração de 40 minutos, sem interrupções de terceiros. A
segunda participante da pesquisa foi uma mulher separada e a entrevista durou 30
minutos, igualmente sem interrupção de terceiros ou presença de ruídos. A
entrevista foi realizada na sala do Fórum de São José. A entrevista realizada com a
terceira mulher separada transcorreu sem intromissões, na sala do Fórum de São
José, a portas fechadas, durando aproximadamente 40 minutos. A quarta entrevista
foi realizada com uma mulher separada, com duração de 30 minutos, sem
interrupções, sendo a entrevista realizada em uma sala do Fórum de São José. A
quinta entrevista com uma mulher separada ocorreu no Fórum de São José, também
sem interrupções, com duração de aproximadamente 35 minutos.
A primeira entrevista com uma mulher casada ocorreu no Fórum de São
José, visto que ela é funcionária do Fórum. A entrevista durou cerca de 50 minutos
na sala do Fórum de São José, sem ruídos ou interrupções. A segunda entrevista
com uma mulher casada foi realizada no Serviço de Psicologia na Universidade Sul
37
de Santa Catarina - UNISUL, em uma sala, sem ruídos e interrupções, com duração
de, aproximadamente, 30 minutos.
A terceira mulher casada foi entrevistada numa sala no serviço de
Psicologia na UNISUL. Ao ser convidada para realizar a entrevista, ela aguardava
seu filho que estava em atendimento psicológico na Clínica Escola da UNISUL.
Durante a entrevista, houve uma interrupção, em virtude de seu filho ter terminado o
atendimento, mas logo a criança se retirou da sala e ficou esperando sua mãe. A
entrevista teve duração de 50 minutos, porém considera-se que a interrupção não
teve influência na entrevista.
A quarta mulher casada foi entrevistada na sala da Clínica de Psicologia
na UNISUL, a portas fechadas e sem interrupções de terceiros e ruídos. A entrevista
teve duração de 40 minutos.
A quinta mulher casada foi entrevistada em uma sala da Clínica de
Psicologia na UNISUL, sem intromissões de terceiros, e durou aproximadamente 30
minutos.
3.5 PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS
As entrevistas para a pesquisa foram gravadas com o consentimento
prévio das participantes, que receberam e assinaram um termo de consentimento,
além de autorizarem a utilização do material para fins de estudo e pesquisa. As
entrevistas foram realizadas individualmente.
Para a coleta de dados, a pesquisadora utilizou um roteiro como base
para a entrevista semi-estruturada, no intuito de atender aos objetivos específicos.
Para tanto, a entrevista foi escolhida como instrumento para coleta de dados, em
virtude de se tratar de uma pesquisa qualitativa. A entrevista é o método mais
adequado, pois intenta explorar, de forma ampla e coerente, os dados apresentados
pelas entrevistadas. Para o registro das informações colhidas, foi utilizado um
gravador, tendo as gravações ocorrido com a autorização das entrevistadas.
As entrevistas com as cinco mulheres separadas ocorreram no Serviço de
Mediação Familiar no Fórum de São José. No início das entrevistas, explicava-se o
tema e o objetivo da pesquisa; logo após, eram procedidas as entrevistas.
38
No Serviço de Psicologia da UNISUL, realizaram-se quatro entrevistas
com mulheres casadas que aguardavam seus familiares. O convite para participar
da pesquisa era feito pela pesquisadora na sala de espera da Clínica de Psicologia
da UNISUL. As mulheres que aceitaram foram entrevistadas em uma sala disponível
no Serviço de Psicologia. Realizou-se entrevista com uma mulher casada no Fórum
de São José, através de contato pessoal, com a entrevista marcada para depois do
seu expediente.
O local das entrevistas para mulheres separadas foi na sala de Mediação
Familiar do Fórum de São José, a fim de evitar que ocorressem influências externas,
garantindo assim a fidedignidade das respostas. Já no caso das mulheres casadas,
quatro mulheres foram entrevistadas em uma sala do Serviço de Psicologia na
UNISUL, e uma entrevista com uma mulher casada foi realizada na sala de
mediação no Serviço de Mediação no Fórum em São José.
3.6 INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS
Para a coleta de dados, foi utilizado um roteiro de entrevista semiestruturada (apêndice), individual, sendo conceituada como “uma conversação
efetuada face a face, de maneira metódica”, que “proporciona ao entrevistado,
verbalmente, a informação necessária”. (MARCONI e LAKATOS, 2005, p. 198). O
roteiro de entrevista foi adaptado de Jablonski (1998), visando a atender aos
objetivos específicos da presente pesquisa. O instrumento foi escolhido por se tratar
de uma pesquisa qualitativa, que busca investigar a compreensão de indivíduos
sobre determinado fenômeno. Foi utilizado um gravador para registro das
informações, que, conforme aludido, somente ocorreram com a autorização das
entrevistadas.
3.7 PROCEDIMENTO
3.7.1 Seleção das participantes
39
As participantes foram selecionadas através de amostragem por
conveniência ou intencional. Segundo Gil (1999), na amostra por conveniência, o
pesquisador seleciona os participantes que têm acesso, entendendo que estes
representam a população do estudo. Esse tipo de amostragem é utilizado em
estudos exploratórios ou qualitativos, nos quais não se determina elevada condição
de precisão.
Na amostra intencional, Gil (1999) pontua que se forma um tipo de
amostragem não probabilística, e assim é selecionado um subgrupo que possa ser
considerado representativo de toda a população. Uma vantagem são os baixos
custos de sua seleção, porém é requerido, por parte do pesquisador, um
conhecimento da população e do subgrupo selecionado.
3.7.2 Contato com os participantes
O contato inicial com os participantes ocorreu de duas formas. No caso
das mulheres separadas, o contato foi via telefone, em que explicou-se o objetivo da
pesquisa, além de bem esclarecidos o sigilo da sua identidade e a necessidade de
gravação da entrevista. No caso das mulheres casadas, o contato inicial foi pessoal,
esclarecendo a finalidade da pesquisa. Igualmente foram abordados o sigilo e a
necessidade da gravação da entrevista. Foi lido, também, juntamente com todas as
participantes, o termo de consentimento livre e esclarecimento. (apêndice A).
3.7.3 Coleta e registro dos dados
Foi explicado o objetivo da pesquisa, e entregue o termo de
consentimento devidamente esclarecido pela pesquisadora à participante. (apêndice
A), e, com seu consentimento, o termo foi assinado. As entrevistas foram gravadas
sem nenhum corte e transcritas na íntegra pela pesquisadora.
40
3.7.4 Organização, tratamento e análise de dados
Num primeiro momento, foi feita a transcrição na íntegra das entrevistas
feitas com as participantes. A partir dos dados transcritos, foi realizada a análise
dos dados e posteriormente a elaboração de tabelas que explicitam a categorização
dos dados coletados. Em seguida à transcrição das entrevistas, realizou-se a análise
de conteúdo, para fins de elaborar as categorias que foram organizadas a partir das
respostas das participantes, a fim de conseguir responder aos objetivos específicos
da pesquisa.
As informações referentes a cada categoria foram agrupadas e
analisadas individualmente, de acordo com os objetivos, e assim realizada a análise
de conteúdo. Marconi e Lakatos (2005) explicam que a análise tem como propósito
esclarecer de forma sistemática o conteúdo, a fim de ampliar os conhecimentos
sobre o fenômeno coletado.
As categorias são apresentadas em quadros, sendo divididos por nomes
das categorias. Em seguida, é trazida a UCE (unidade de contexto elementar), que é
a fala das entrevistadas que representa a idéia geral da categoria e ao final colocase a freqüência de cada categoria apresentada.
41
4- APRESENTAÇÃO e ANÁLISE DOS DADOS
Para a análise dos dados, inicialmente foi realizada uma organização das
respostas das entrevistadas em categorias apresentadas nas tabelas; 3, 4 e 5. As
tabelas de categorização foram elaboradas, após as transcrições das entrevistas
gravadas, analisando assim os discursos apresentados. Foram retiradas das
entrevistas apenas algumas partes consideradas relevantes para a discussão das
categorias. As análises foram feitas a partir do referencial pesquisado.
4.1 EXPECTATIVAS QUE MULHERES CASADAS E SEPARADAS TINHAM SOBRE
CASAMENTO
O primeiro objetivo buscou identificar as expectativas que mulheres
casadas e separadas tinham sobre casamento. De acordo com o referencial teórico,
observou-se que as mulheres casadas e separadas apresentaram as seguintes
categorias em relação ao casamento: o matrimônio ligado à constituição de família,
a união conjugal atrelada ao ritual do casamento, o casamento como uma
expectativa positiva, além do amor romântico. Através das categorias citadas,
buscou-se, a partir das falas das entrevistadas, identificar e fazer uma correlação
com o marco teórico da pesquisa.
Desta forma, compreende-se que várias foram as expectativas que as
entrevistadas, mulheres casadas e separadas, mostraram ter antes de se casarem,
sendo que a categoria mais significativa e apresentada, tanto pelas mulheres
casadas quanto pelas mulheres separadas, foi a constituição de família, sendo uma
frequência de quatro mulheres casadas e quatro mulheres separadas. Em seguida,
a próxima categoria apresentada pelas mulheres casadas foi a expectativa de se
casarem nos moldes tradicionais, ou seja, um ritual tradicional de casamento,
aspecto esse respondido por três mulheres casadas. Já as mulheres separadas
responderam que tinham o casamento como fuga da família, atingindo freqüência de
resposta de quatro mulheres separadas. Outra categoria apresentada por três
42
participantes separadas, em relação às suas expectativas sobre o casamento foi
uma união motivada por uma relação de amor romântico.
Tabela 3 – Referente às respostas das expectativas que mulheres casadas e
mulheres separadas tinham sobre casamento.
Categoria
Constituição
de família
nuclear
Ritual de
casamento
UCE
F
(mulheres casadas)
“... construir uma vida
4
com uma família linda
com filhos.” (Carol)
“Eu sempre quis casar de 3
vestido de noiva com
todos os detalhes. Meu
vestido foi lindo, cheio de
renda, véu, grinalda. Foi
um conto de fada.”
(Margarida)
Categoria
Constituição
de família
nuclear
Casamento
como fuga
da família
Amor
romântico
UCE
F
(mulheres separadas)
“Quando eu casei, meu sonho 4
era ter uma família que eu
não tive.” (Clara)
“... fugi de casa para me
4
casar. Fugi porque minha
família era muito rígida e meu
pai me batia muito. Minha
mãe não queria que eu me
casasse com ele.” (Maria)
“Eu acho que eu casei na
3
paixão e na empolgação de
viver longe de casa. Para mim
não era amor.” (Glória)
Fonte: Elaboração da autora, 2009.
Das dez entrevistadas (mulheres casadas e mulheres separadas), oito
participantes relataram que tinham como expectativa, em relação ao casamento, a
constituição de família, tendo uma frequência relevante na pesquisa, sendo uma
categoria apresentada por quatro mulheres casadas e quatro mulheres separadas.
Para essas entrevistadas, a constituição de família aparece relacionada ao enlace
matrimonial, tendo como função unir um casal e gerar filhos dessa união.
Conforme se pode observar, Maria, de 23 anos, foi casada por cinco
anos, tem um filho e está separada há um ano. Ela relata: “Eu pensava em construir
uma família de verdade, com filhos, uma casa e um marido que eu pudesse contar
nas horas boas e ruins”. A fala de Maria contextualiza sua expectativa em relação ao
casamento, ou seja, o desejo de formar uma família nuclear com mãe, pai e filhos.
Assim, para a entrevistada o casamento e o anseio de formar uma família se
complementam. Essa fala nos remete a Roudinesco (2003), ao pontuar que a família
é algo almejado e idealizado por todo um grupo.
Destaca-se que Maria também relatou em sua entrevista que atualmente
está se relacionando com outra pessoa e pretende casar-se novamente. Segundo
sua fala, “... quero casar de novo e tentar construir novamente uma família com essa
43
nova pessoa com quem eu estou agora”. Isso confirma ainda mais a relação que a
entrevistada faz entre o casamento e a formação de uma família. Assim, entende-se,
através da fala da entrevista, o que Jablonski (1998) cita no referencial teórico desta
pesquisa: a sociedade moderna pensa na família como algo essencial ao casamento
e que cabe ao casamento legitimar essa base familiar.
Ainda dialogando com a categoria constituição de família nuclear,
apresentamos Paula, 22 anos e casada há um ano e três meses. Sua fala vem
corroborar com a mesma expectativa que Maria tinha em relação ao casamento. “...
eu imaginava construir uma família feliz com meu marido e em seguida ter filhos”.
Vale destacar que ela ainda não tem filhos, mas na sua entrevista comentou sua
vontade de tê-los, deixando clara, novamente, a relação do casamento com a
formação familiar. Deste modo, verifica-se o quanto a família é um fator importante
no enlace matrimonial, pois nota-se, com o autor Ariès (1981), que a família tornouse o lugar de sentimento necessário entre os cônjuges, filhos e um contexto
legitimado pela Igreja. Estudos mais atuais de autores como Jablonski (1998) e
Roudinesco (2003) pontuam a importância da constituição da família na sociedade
contemporânea. Nota-se nas entrevistadas que, apesar das transformações sociais
que vêm acontecendo em relação à conjugalidade, ainda persiste o modelo de
família nuclear cristã. Assim, o casamento é algo representativo na vida das
pessoas, sendo um fenômeno vinculado à constituição de família (pai, mãe e filhos),
o que foi percebido no decorrer das entrevistas.
Recorrendo ao referencial teórico, podemos entender que a fala das
entrevistadas nos remete às representações sociais, pois a idéia de casamento
atrelado à formação de uma família influencia e orienta o seu comportamento,
conforme a fala de Maria, que relata ainda querer viver outro casamento para
constituir uma família com o novo parceiro. Por isso mesmo, esse grupo de mulheres
tem opiniões do senso comum sobre o fenômeno casamento. Pode-se identificar,
portanto, que se trata de um grupo social que orienta seus comportamentos dentro
de um senso comum e assim compreendendo o mundo a partir das suas
representações. (MOSCOVICI, 2003 e JODELET, 2001).
Ainda sobre a categoria de constituição de família, Joana, 49 anos, dois
casamentos e há 10 meses separada do último casamento, relatou: “Casamento
para mim era viver com uma pessoa para o resto da vida, ter filhos e uma casa”. O
discurso da entrevistada sobre sua expectativa sobre casamento estava também
44
relacionado a uma união matrimonial ligada à constituição de família e ainda uma
visão de casamento associado a viver com a pessoa para o resto da vida.
Entendemos, a partir de Scabello (2007), Morgado (1987) e Norgren (2004), que,no
século XII, o casamento tinha como representação uma união indissolúvel. Essa
compreensão estava presente na fala da entrevistada, ou seja, o casamento como
uma parceria para a vida toda. Assim, nota-se que a entrevistada considera o
casamento um sacramento indissolúvel com o qual os cônjuges devam se
comprometer pela vida toda. De acordo com Norgren (2004), a família é algo
significativo na vida dos indivíduos e faz parte da união conjugal. Nas entrevistas
efetuadas, podemos verificar que oito das entrevistadas consideram a construção de
uma família a expectativa que tinham com relação ao casamento. Com isso, verificase que a família ocupa um lugar de evidência na vida das entrevistadas.
Das cinco mulheres casadas, três destacaram que tinham como
expectativa sobre o matrimônio realizá-lo através do ritual do casamento, ou seja,
um casamento na Igreja com “véu e grinalda”. Trazemos tal categoria como fator
significativo por ter uma frequência de três entre as cinco mulheres casadas, e por
fazer parte de um modelo historicamente compartilhado ao longo da história do
Cristianismo. (ARAÚJO, 2002 e ALMEIDA, 1992). Desta forma, as entrevistadas
casadas relataram que para oficializar o matrimônio era necessário realizar o ritual
do casamento. Flor tem 45 anos e foi a mulher mais velha da amostra das mulheres
casadas, sendo casada há 15 anos com o mesmo parceiro. Segundo ela:
[...] eu sempre pensava em casar na Igreja e virgem e com a graça de Deus
isso foi possível. (...) Tudo nos seus conformes. Com a graça de Deus,
conseguimos nos respeitar. E sempre com aquele objetivo de estar
realmente oficializando o relacionamento após o casamento.(FLOR).
Vale destacar que Flor é evangélica, praticante desde os 20 anos de
idade. Através da fala de Flor, destacamos que o casamento se consolida com um
ritual religioso e com a permissão de Deus para a consolidação dessa união, sendo
também a possibilidade de estabelecer a sexualidade, pois a Igreja, de acordo com
o referencial citado, explica que a sexualidade só é permitida entre os parceiros
após o casamento. (ARAÚJO, 2002, LINS, 1996, BOZON, 2003 e SCABELLO,
2007). Entende-se que Flor valorizou o ritual do casamento, pois se trata de algo
importante e necessário para concretizar a união do casal e de fato permitir a
45
sexualidade entre eles.
Aqui podemos dialogar com Jovchelovitch (2008) e
Moscovici (2003), quando afirmam que as representações sociais estão atreladas a
crenças, valores e mitos de uma sociedade tradicional, podendo estar relacionadas
às suas idealizações. Assim, podemos trazer novamente as representações sociais
como algo que orienta as práticas sociais dos sujeitos dando sentido e significado as
suas compreensões frente ao mundo, de tal modo isto é percebido em nossa
participante.
Paula, 22 anos, também relata a necessidade de realizar o ritual do
casamento, nota-se que a cerimônia do casamento faz parte da concepção de
mulheres de diferentes gerações:Flor de 45 anos e Paula que tem 22 anos é a mais
jovem da pesquisa. Assim, podemos destacar que a cerimônia do matrimônio ainda
é presente na sociedade contemporânea. (JABLONSKI, 1998). Conforme a fala de
Paula: “Meu sonho era casar de véu e grinalda (...) me casei no religioso como
manda o figurino”. As mulheres casadas, de acordo com a pesquisa, priorizaram
essa expectativa e entendem que o casamento permeia todo um ritual, inclusive
religioso. De acordo com Jablonski (1998), os casais se preocupam e seguem as
cerimônias do casamento, sendo fundamental para a constituição da família nuclear.
Assim, entende-se que costumes e crenças são preservadas em relação ao
casamento, sendo historicamente compartilhadas e presentes no comportamento
das entrevistadas. Compreende-se que as representações sociais, no caso da
presente pesquisa, representaram o pensamento de nossas entrevistadas, o mundo
social em que elas habitam e o que consideram importante em suas relações
sociais. Assim, compreende-se que, através da função simbólica, elas utilizam os
símbolos véu e grinalda para darem significado ao contexto em que estão inseridas.
(MOSCOVICI, 2003 e JOVCHELOVITCH, 2008).
Em relação às expectativas que mulheres separadas tinham sobre o
casamento foi quase unânime a categoria que traz o casamento como uma fuga da
família, pois das cinco mulheres separadas quatro relataram que tinham tal
expectativa. A entrevistada Glória, 39 anos, que ficou 18 anos casada e há um ano
encontra-se separada, trouxe o seguinte relato; “Eu queria era fugir de casa. Não
planejei nada”. Já Clara tem 27 anos, permaneceu 8 anos casada e há seis meses
encontra-se separada, comentou: “Eu achava que casando eu ia me livrar de tudo,
porque minha mãe me batia bastante e quando eu casei foi um alívio”. O casamento
aparece para essas mulheres como uma forma de fugir de uma vida sofrida em suas
46
casas com seus familiares (pais e mães). Assim, elas idealizam um relacionamento
de afetividade, onde criaram expectativas de uma vida diferente no casamento.
Féres Carneiro (2003) entende que esse é um dos motivos que levam à separação,
pois quando o casamento não corresponde mais a essas expectativas, as pessoas
buscam um novo relacionamento.
Outra expectativa das mulheres separadas foi o amor romântico,
conforme a fala de Joana, 39 anos: “Naquela época, tu não sabia nem o que era
amor.” (...) Eu acho que era mais uma ilusão. Assim, sei lá uma atração, sei lá uma
coisa assim. Eu vivi seis anos com ele”. Confirma-se a expectativa com o relato de
Maria, 23 anos: “A gente casa pensando que ama, mas depois vê que não ama; é
só um momento de loucura”. Podemos destacar que das cinco entrevistadas
separadas três trouxeram essa expectativa em relação à união conjugal. Assim, as
entrevistadas apresentaram a idéia de amor romântico, no qual se idealiza um
parceiro e ao se perceber que este é um ser humano, o amor se acaba, gerando a
decepção. (LINS, 1996). No entender de Araújo (2002), Scabello ( 2007) e Giddens
(1993), o casamento impõe aos cônjuges que se amem ou que tenham expectativas
a respeito do amor e felicidade no matrimônio. Na medida em que isso não
acontece, surge a desilusão e com isso sobrevêm as dissoluções conjugais. Ainda
citando Lins (1996), o amor romântico não é verdadeiro; portanto, verifica-se que
nossas entrevistadas confundiram amor com paixão,
um sentimento intenso e
incontrolável.
Ainda de acordo com a categoria Amor romântico, destacamos a fala de
Maria (23 anos): “A gente casa pensando que ama, mas depois vê que não ama e
só um momento de loucura.” Podemos notar que na sociedade contemporânea
existe uma preocupação com o amor no casamento, visto que para a Igreja Católica
não era algo importante para o enlace matrimonial. (JABLONSKI, 1998, GIDDENS.
1993, SCABELLO, 2007). Portanto, é notória, na fala de Maria, a preocupação
voltada para o amor no relacionamento conjugal. Maria apresenta em sua fala o
sentimento de amor referente a um sentimento de loucura, uma paixão que se
confundiu com amor, um sentimento completamente intenso que surge e que de
alguma forma desaparece. Percebe-se que a entrevistada apresenta um conceito de
amor romântico que faz com que as pessoas ajam sem refletir e, no decorrer do
relacionamento, o amor acaba se dissolvendo no desenrolar da relação. (GIDDENS,
1993).
47
4.2 EXPECTATIVAS QUE MULHERES CASADAS E MULHERES SEPARADAS
TÊM SOBRE CASAMENTO
Nosso segundo objetivo foi identificar as expectativas que as mulheres
casadas e separadas têm no presente momento em relação ao casamento.
Podemos destacar que, atualmente, as expectativas das mulheres em relação ao
casamento aparecem ligadas à confiança, o marido como gestor da família, o amor
confluente, o diálogo, a relação de compartilhar tarefas e a constituição familiar.
Tabela 4 - Referente a respostas das expectativas que mulheres casadas e
separadas têm sobre casamento
Categoria
Confiança
Relação de
compartilhar
tarefas
UCE
Mulheres casadas
“... Dentro do
casamento tem que
haver confiança e
fidelidade.” (Paula)
“os dois tem que
batalhar juntos, no
trabalho, em casa e
com os filhos.” (Lara)
F
4
3
Categoria
UCE
Mulheres separadas
F
Gestor da
família
centrada no
marido
Amor
confluente
“Viver com uma pessoa
que fosse um homem que
assumisse a frente de
tudo.” (Glória)
“Amor é assim é uma
coisa boa. Você tem
vontade de ficar junto
com a pessoa, mas para
o amor não acabar os
dois tem que respeitar a
vontades um do outro.”
(Joana)
4
Diálogo
socialização
“Eu acho que o
casamento dá certo
quando tem conversa. A
gente chega em casa e
fala sobre o dia-a-dia e
com o outro não tinha
isso.” (Maria)
“Eu ainda quero encontrar
uma pessoa e construir
uma família com meus
filhos.” (Clara)
Constituição
de família
4
4
3
Fonte: Elaboração da autora, 2009.
Desta forma, notamos que a categoria de maior frequência em relação à
população de casadas foi a categoria confiança, respondida por quatro entre as
48
cinco entrevistadas. Outra categoria bastante destacada pelas mulheres casadas é a
relação de compartilhar tarefas, tendo sido respondida por três das cinco
entrevistadas. Em relação às mulheres separadas, percebe-se que as categorias
que mais se destacaram foram: o homem como gestor da família, respondida por
quatro das entrevistadas. O amor confluente, categoria respondida por quatro das
cinco entrevistadas. O diálogo também aparece como uma categoria relevante, e
respondida por quatros das entrevistadas, bem como a categoria constituição
familiar, que apareceu novamente entre as mulheres separadas, com frequência de
três respostas.
A confiança foi apontada como algo importante para as mulheres
casadas, conforme a fala de Lara: “No casamento não dá para aceitar uma traição.
Eu penso assim: se ele me traiu é porque ele não me ama. (...) tem que existir
fidelidade”. As mulheres entrevistadas casadas buscam uma relação de confiança
que está vinculada à fidelidade. Desta forma, podemos relacionar essa categoria ao
que Bertollo (et al., 2007) explica em suas pesquisas: a confiança, o amor, o carinho,
o respeito e o companheirismo são aspectos relacionados às representações sociais
de conjugalidade para os casais contemporâneos. Aqui podemos identificar
mudanças referentes aos relacionamentos atuais, pois nota-se que as idéias cristãs
sobre o casamento estavam pautadas num enlace sem escolha, sem amor, e a
infidelidade masculina era algo aceito; portanto, compreende-se que as RS são
fenômenos
complexos
e
construídos
simbolicamente
pelas
inter-relações.
(JODELET, 2001).
Através da fala de Lara, percebe-se que ela faz uma relação entre a
fidelidade e o amor, pois a entrevistada explica que quando dentro do casamento
não pode haver uma relação extraconjugal, e quando isso acontece relaciona ao fim
do amor. Através da entrevista de Lara, podemos deduzir, então, que o casal se une
porque se ama e dessa forma não pode haver a permissão de uma relação paralela
no matrimônio. (ARAÚJO, 2002). Pode-se notar que ela compartilha uma idéia de
casamento monogâmico tradicional, sem permitir relações sexuais com outras
pessoas. (MATOS, 2000). Podemos verificar, a partir da fala das entrevistadas, uma
mudança em relação ao papel tradicional da mulher na sociedade patriarcal, onde
antes era esperado que elas aceitassem a infidelidade masculina. Por isso mesmo,
as entrevistadas da pesquisa mostraram uma mudança em relação à idéia de
perdoarem uma traição de seus maridos. (LINS, 1996 e BOZON, 2003).
49
Outro aspecto apontado pelas mulheres casadas foi a categoria de
compartilhar tarefas, algo que apareceu em três das cinco entrevistas. Carol relata:
“eu acho que o homem tem que ajudar a mulher em casa, com os filhos, sair juntos.
Sempre fazendo as coisas juntos”. Identificamos que as entrevistadas assumiram
um papel diferente das mulheres separadas, sem admitir uma relação na qual a
mulher é sempre a responsável pelos afazeres do lar. (JABLONSKI, 1998). Nota-se
uma mudança de paradigma, na qual ao homem também compete as funções de
cuidador dos filhos e do lar. Neste sentido, pode-se pensar no que Féres-Carneiro
(2003) assevera, ao mencionar as mudanças ocorridas nas relações conjugais, onde
se busca a complementaridade mútua conjugal, no qual o homem também tem que
auxiliar nas responsabilidades da casa, e o que foi relatado por Flor: “Construímos a
casa juntos, os dois com o salário dos dois. Nos dois trabalhamos e eu acho o
homem tem que ajudar a mulher em casa”. Vale destacar que Flor não tem filhos e,
segundo ela, não depende financeiramente de seu marido. Isso vai ao encontro do
que Jablonski (2003) comenta: o papel da mulher na conjugalidade vem sendo
alterado e de alguma forma vem mudando a configuração do casamento. A
emancipação feminina trouxe um empoderamento das mulheres, algo que modificou
o papel da mulher dentro da relação matrimonial. (FÉRES CARNEIRO, 1998 e LINS,
1997).
Nesta categoria, pode-se perceber uma diferença em relação às mulheres
casadas e as separadas: as casadas parecem querer uma relação simétrica em
seus casamentos, e as mulheres separadas almejam que os homens tomem a frente
de decisão em seus matrimônios. Conforme os dados da pesquisa, das cinco
entrevistadas quatro pontuam a categoria: o marido como Gestor da família. A fala
de Joana confirma essa premissa:
Chegou uma hora que eu tive que ir trabalhar. Eu acho que eu não tinha
que trabalhar mais do que ele. Ele só queria sair para jogar sinuca e ainda
começou a beber. Quando você toma a decisão de fugir com um homem,
ele tem que ser homem e assumir você.(JOANA).
Pode-se notar, na fala de Joana, a presença de uma idealização da figura
do homem como provedor do lar, ou seja, aquele que protege e cuida
financeiramente da casa o que foi evidenciado para o grupo de mulheres separadas.
(BEAUVOIR, 1980 e JABLONSKI, 1998). Tal apontamento se encontra conectado
50
com Perlin e Diniz (2005), ao afirmarem que a falta de igualdade na divisão de
tarefas domésticas e na administração da casa são fatores que originam conflitos na
esfera familiar, afetando e causando a insatisfação no casamento.
O amor confluente foi uma categoria apontada pelas mulheres separadas
em relação às suas atuais expectativas em relação ao casamento. Maria, 23 anos e
separada há 1 ano, relatou: “Casamento hoje para mim é viver com uma pessoa que
eu ame, mas tem que ser um homem que respeite as minhas vontades e as minhas
decisões. Se não for assim prefiro ficar sozinha. Hoje eu busco um relacionamento
especial, algo legal tanto para mim quanto para a pessoa que estiver ao meu lado”.
Na fala da entrevistada percebe-se traços do amor confluente, no qual Maria não
idealiza a pessoa amada com a qual quer viver, mas ela acreditar na possibilidade
de ser feliz ao lado de alguém. Dessa forma, a noção de amor confluente é a
possibilidade de ter um relacionamento especial, e não de ter uma pessoa especial.
No amor confluente se respeita a individualidade do seu parceiro. Se o amor
romântico era “para toda a vida”, o amor confluente é “eterno enquanto dura”.
(GIDDENS, 1993).
Dessa forma, compreende-se que, em alguns momentos, o fim do enlace
matrimonial pode trazer perdas e sofrimentos a algumas pessoas, como é o caso de
Silvia. (MARCONES, TRERWEILER e CRUZ, 2006 e FÉRES-CARNEIRO, 1998).
Vale pontuar que Silvia, durante a entrevista, se mostrou muito emocionada e em
alguns momentos chorou. A entrevistada relatou que se fosse por ela nunca teria se
separado do marido.
O diálogo foi apontado como fundamental para quatro das cinco
entrevistadas separadas, em relação às suas atuais expectativas sobre casamento.
Joana pontua que “um casamento precisa ter muita conversa”. Logo, compreendese que os sujeitos buscam nos seus relacionamentos um envolvimento com diálogo,
confiança, respeito, e também uma relação de companheirismo para enfrentar os
problemas na vida conjugal (PERLIN e DINIZ, 2005). Conforme menciona Reis
(1992), a união do casal se faz com uma relação de amizade, companheirismo e
respeito, contribuindo para que os sujeitos dividam seus projetos e interesses em
comum. Clara também confirma o diálogo como sua presente expectativa sobre o
casamento: “Os dois decidirem as coisas juntos. Os dois conversarem”. Podemos
perceber que as entrevistadas separadas demonstram uma postura que nos remete
as transformações que vêm acontecendo em relação à conjugalidade. Relembrando
51
Féres-Carneiro (1998), a conjugalidade seria um casal que contém duas
individualidades com desejos e vontades distintas. Por isso, podemos entender o
que o autor Giddens (1993) assinala como a reflexividade na contemporaneidade,
pois os indivíduos em busca de sua individualidade acabam provocando alterações
em suas relações conjugais podendo até provocar a dissolução conjugal. Assim,
verificamos que as participantes da entrevista vislumbram o diálogo, como um
projeto individual, e que de certa forma elas querem buscar em suas relações
matrimoniais. Entende-se então que as pessoas querem atender a questões
individuais com seus companheiros, mas vivendo uma relação de conjugalidade.
A constituição de família apareceu novamente nas expectativas das
mulheres separadas sobre o casamento. Assim, a categoria foi assinalada por três
das cinco entrevistadas. Entende-se que, apesar de estarem separadas, essas
mulheres relacionam o casamento com a possibilidade de constituição de família.
Maria, que atualmente está namorando, desabafa: “A gente fala em trabalhar para
construir uma casa, uma família. Eu tenho a esperança de dar certo. Agora a gente
tem outra cabeça. A minha cabeça mudou bastante depois do meu casamento”.
Independentemente de estarem separadas, as participantes apontam a vontade de
recasamento e associam a união à construção de uma nova família. (BERTOLLO,
2007). Os dados do IBGE (2002) também corroboram com a fala de Maria, pois os
gráficos trazem um número crescente de recasamento.
Quanto ao que se refere às expectativas de casamentos para mulheres
casadas e separadas, notamos diferenças em relação às respostas das
entrevistadas. De acordo com suas falas, observa-se que as expectativas das
mulheres casadas e separadas acerca do casamento estão pautadas nas suas
representações sociais, haja vista que a conjugalidade para as mulheres desta
pesquisa é um fenômeno que aparece em constante construção e reconstrução, em
relação às suas histórias, o que possibilita dar sentido ao fenômeno casamento a
partir das suas experiências e relações sociais. (JODELET, 2001).
52
4.3 IDENTIFICAR A PERCEPÇÃO QUE MULHERES CASADAS E SEPARADAS
TÊM SOBRE CASAMENTO
Quadro Tabela 5 - Referente às respostas da percepção que mulheres casadas e
separadas têm sobre casamento
Categoria
Companheirismo
Diálogo
UCE
Mulheres
F
casadas
“... tem que
existir
4
companheirism
o.” (Paula)
“no casamento
tem que haver 3
conversa.”
(Lara)
Categoria
Diálogo
Companheirismo
Casamento
pautado na
fidelidade
UCE
Mulheres separadas
“... para dar certo é
preciso muita
conversa”. (Glória)
“... eu quero uma
pessoa que
planejasse alguma
coisa juntos e me
desse uma força.”
(Glória)
“... a traição acaba
com um casamento.”
(Clara)
F
5
3
3
Fonte: Elaboração da autora, 2009.
Em relação ao terceiro objetivo, que foi identificar a percepção que as
mulheres casadas e separadas têm sobre casamento, conclui-se que a percepção
mais evidenciada em relação ao casamento foi relacionada ao diálogo. Tal categoria
foi apresentada pelas mulheres casadas e pelas mulheres separadas dessa
pesquisa, apresentando frequência total de oito mulheres para dez das
entrevistadas. Cinco mulheres separadas apresentaram essa categoria, e três
casadas relataram que o diálogo é fundamental no relacionamento conjugal. Como
exemplo, eis o relato da fala de Carol, casada há 8 anos: “eu acho que dentro do
casamento o marido tem que ser um amigo, aquela pessoa que a gente possa
conversar de tudo, falar das tristezas e alegrias”. A fala da entrevistada vem ao
encontro do comentário de Reis (1992) sobre o enlace matrimonial, ou seja, um
casamento que perpassa por uma relação de amizade e companheirismo, no qual
os cônjuges possam estabelecer projetos e interesses em comum, proporcionado
uma união entre o casal.
Fazendo uma relação das categorias apresentadas na pesquisa com as
representações sociais, o principal foco da pesquisa, podemos perceber que as RS
53
das entrevistas estão apontando uma nova forma de vivenciar a conjugalidade, já
que antes vimos no contexto do casamento que as mulheres viviam numa relação
de aceitação e submissão em relação ao homem. Conforme Bertollo (et al., 2007),
as representações sociais referentes ao papel do homem e da mulher, dentro do
casamento na sociedade patriarcal, representava o homem como o provedor do lar,
e à mulher cabia o papel de uma esposa afetuosa, carinhosa, companheira e
compreensiva. Isso nos faz pensar que as relações estão modificando, pois,
atualmente, a mulher busca um parceiro para dividir projetos, sonhos, frustrações no
relacionamento e não mais um homem somente para sustentar a casa.
Pode-se entender que as representações sociais de casamento vêm se
alterando na sociedade contemporânea, pois depreende-se que as RS são
processos pelos quais os sujeitos atribuem sentidos de acordo com suas
experiências e relações. (JODELET, 2001). No entender de Lara “No casamento o
casal tem que saber conversar, não pode deixar para amanhã”. Desse modo,
compreende-se o pensamento da entrevistada, ou seja, para um casamento
duradouro, é necessário que haja a interação e a comunicação entre o casal.
O diálogo foi apontado como fundamental para as mulheres separadas na
manutenção das relações conjugais. A fala de Joana aparece incisiva em relação ao
diálogo no casamento: “... Acho que hoje se dura uma relação quando tem conversa.
Se eu casar novamente quero um marido que eu possa conversar”. Compreende-se
que a satisfação com o relacionamento demanda existência e possibilidade de se
escolher um parceiro para a união matrimonial, tornando possível a reciprocidade
conjugal. (FÉRES-CARNEIRO, 2003).
Percebe-se, portanto, através da fala de Joana, que “... um casamento
precisa ter muito diálogo entre o casal, onde o marido tem que escutar a mulher e a
mulher escutar o marido. Eu acho que o casal tem que decidir as coisas juntos”.
Dessa forma, o diálogo para a participante da pesquisa aparece como um fenômeno
de igualdade entre o casal. Pode-se então relacionar o diálogo ao conceito de
ancoragem, ou seja, ela, em seu relacionamento, quer tornar algo não-familiar em
familiar, possibilitando modificar conceitos abstratos em uma realidade concreta
(objetivação), no que se refere à vida conjugal com seu parceiro, ensejando a
oportunidade de atribuir um novo sentido ao fenômeno casamento. (OLTRAMARI,
2007 e MOSCOVICI, 1984 apud SÁ, 1996).
54
Complementando o diálogo, as mulheres casadas e separadas da pesquisa
pontuaram o companheirismo como parte da sua percepção de casamento.
Segundo a entrevistada Carol, “tem que haver uma relação de companheirismo,
onde um ajuda o outro”. Entende-se que para ela um relacionamento perpassa uma
relação de parceria, ou seja, uma união em que os cônjuges compartilham entre
eles. Constitui-se uma parceria sustentada pelo companheirismo, criando a
possibilidade
conjugalidade.
de
uma
convivência
(FÉRES-CARNEIRO,
de
duas
1998).
individualidades
Na
pesquisa,
unidas
a
pela
categoria
companheirismo foi apresentada por sete das entrevistadas, sendo quatro mulheres
casadas e três separadas.
Margarida relata: “casamento é os dois serem
companheiros, conversar bastante sobre tudo, trabalho, filhos e dia-a-dia”. No
relacionamento contemporâneo, existe uma preocupação e um envolvimento com
sentimento, onde a relação de companheirismo fornece a possibilidade de enfrentar
as dificuldades na rotina conjugal. (PERLIN e DINIZ, 2005).
A categoria infidelidade apareceu nas entrevistas das mulheres
separadas, onde, das cinco entrevistadas, três relataram que em sua percepção não
pode haver a traição no relacionamento. Aqui podemos observar uma mudança em
relação ao comportamento feminino, pois Matos (2000) afirma que a infidelidade
masculina era algo tolerável e aceito, ligada à virilidade. Já na sociedade
contemporânea, as mulheres não aceitam a infidelidade masculina, o que configura
a quebra do contrato amoroso. (MATOS, 2000).
Silvia relata que sua separação ocorreu em virtude de uma traição:
“apareceu outra pessoa na vida do meu marido e isso acabou com o nosso
relacionamento. Uma mulher traída é fogo. Eu senti muita dor quando eu fui traída”
Isso demonstra que a separação traz muito sofrimento para algumas mulheres.
(MARCONES, TRIERWEILER e CRUZ, 2006, FÉRES-CARNEIRO, 1998). A
infidelidade apareceu novamente como causadora da dissolução conjugal, visto que
antes era um fato aceitável pela sociedade, conforme foi apontado em nosso
referencial teórico. Lins (1996) e Bozon (2003) explicam que, a partir dos anos 90,
as mulheres já não aceitavam mais as relações extraconjugais, ocorrendo dessa
forma os rompimentos conjugais. Joana também relata em sua entrevista que a
traição foi um dos motivos para solicitar a separação: “eu não aceitei a traição (...)
não consegui mais. Sempre que ele saía de casa, eu já ficava desconfiada”. Na fala
de Joana, pode-se perceber a preocupação de ser traída, algo que não é tolerado
55
numa relação monogâmica tradicional, onde os cônjuges exigem exclusividade dos
companheiros, não admitindo relações de intimidade extraconjugais. (MATOS,
2000). Nota-se que no caso de Joana e Silvia houve traição por parte do cônjuge,
ocasionando a ruptura do casamento. Conforme citado no referencial teórico, na
cultura tradicional patriarcal, a infidelidade dos homens não apenas era admitida
como muitas vezes estimulada, já que estava ligada à masculinidade e à virilidade.
Em compensação, na cultura pós-tradicional com a igualdade entre os sexos, a
infidelidade conjugal se torna cada vez menos aceita pelas mulheres. (BOZON,
2003).
56
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa teve como objetivo compreender as expectativas que
mulheres casadas e mulheres separadas apresentavam a respeito do enlace
matrimonial. Fez-se um percurso das suas expectativas passadas e atuais, bem
como sua percepção sobre a conjugalidade. Entendeu-se que tais informações são
socialmente relevantes, pois contribuem para auxiliar profissionais que atuam com o
fenômeno casamento, sejam mediadores, advogados, assistentes sociais ou
psicólogos, pois, quanto mais informações obtenham, mais conteúdo de análise para
as suas práticas.
Para a melhor compreensão dos fenômenos que ocorrem em relação à
conjugalidade, sugerimos a realização de novas pesquisas relacionadas ao tema.
Seria interessante que um estudo semelhante a este fosse feito com mulheres da
mesma faixa etária, com perfil sócioeconômico diferente das pesquisadas, mulheres
recasadas, e também com homens, a fim de se fazer uma comparação entre os
resultados e verificar se esses diferentes aspectos influenciam nas expectativas de
conjugalidade. Esta pesquisa buscou retratar diferentes momentos relacionados ao
matrimônio, resgatando desde antes do compromisso conjugal propriamente
assumido, passando pelas questões que levaram à separação ou a permanência na
relação conjugal, para enfim, entender a forma como as mulheres compreendem o
fenômeno da conjugalidade.
As expectativas que as entrevistadas apresentaram ter antes de se
casarem estavam relacionadas à constituição de uma família, sendo a idealização
da família nuclear, visto que tal categoria foi apresentada por um número relevante
de mulheres da nossa pesquisa. Conclui-se, portanto, que a família, de acordo com
as entrevistadas, está diretamente ligada à conjugalidade. Sendo assim, a formação
da família faz-se como algo significativo na conjugalidade.
Por outro lado, as mulheres casadas apresentaram expectativas ligadas
ao ritual tradicional do casamento, no qual a confirmação do enlace matrimonial
sustenta-se na cerimônia do casamento, bem como o ritual religioso. Nota-se que
esse é um fator que ocorreu especialmente em relação às mulheres que possuem
um ideal religioso, acreditando que o cerimonial é a consumação da união do casal
perante a sociedade.
57
Em relação às mulheres separadas as expectativas que elas tinham sobre
a conjugalidade estava relacionada o casamento a uma fuga da família assim, elas
entendiam que com o casamento poderia melhorar suas vidas e achavam que o
matrimônio era uma chance de se tornarem mais felizes. Contudo, o casamento
para elas havia surgido como uma possibilidade de terem uma vida melhor com os
cônjuges
Nota-se que as mulheres separadas também tinham como expectativa a
conjugalidade vinculada à questão do amor romântico, o que pode fazer que tal
sentimento provocou nas entrevistadas uma ação sem reflexão, invadidas por um
sentimento de “loucura” e “paixão”. Assim, elas agiram por impulso, o que nos faz
pensar que o amor vinculado a paixão possa ter contribuído para a instabilidade no
relacionamento matrimonial e conseqüentemente, a dissolução matrimonial.
Em relação às expectativas apresentadas pelas entrevistadas no presente
momento sobre o enlace matrimonial, notamos que as casadas relacionam a união a
uma relação de confiança e também, uma união onde o casal compartilha tarefas.
Assim, compreende-se que as mulheres casadas da pesquisa buscam um
relacionamento pautado na igualdade entre os parceiros. Sendo notório que as
entrevistadas buscam um relacionamento pautado na conjugalidade contemporânea,
que prioriza uma igualdade maior de papéis, com um vínculo baseado no
companheirismo, reforçado pelo diálogo, pela negociação, enfim, pela reciprocidade
entre os cônjuges.
Entre as mulheres separadas, no diz respeito às expectativas que elas
têm no presente momento sobre conjugalidade, foi possível identificar características
relacionadas ao homem como figura central do enlace matrimonial, em que ele
ficaria como o provedor da casa. Pode-se notar que apareceu a centralidade na
figura masculina, resquícios de um casamento tradicional pautado em papéis bem
definidos entre os gêneros. Por outro lado, o sentimento de amor confluente
destacou-se como fator que faz parte da relação conjugal, algo que não se pode
desconsiderar nas entrevistadas separadas, sendo que é considerado pelas
entrevistadas como um sentimento que reforça a conjugalidade.
As mulheres separadas também relataram que têm como expectativas
atualmente a relação de diálogo, algo paradoxal ao relatado anteriormente, ou seja,
o casamento centrado no homem, mas entendemos que de alguma forma elas
querer uma relação de igualdade entre o casal, já que cada sujeito tem sua
58
individualidade e quer ser respeitado dentro da conjugalidade. Portanto, as
mudanças da conjugalidade fazem-se evidentes na contemporaneidade, ainda que
apareçam marcas de um casamento nos moldes tradicionais.
Em relação à percepção das mulheres casadas e separadas sobre o
casamento, foi possível notar evidências em relação às entrevistadas, pois o
companheirismo e o diálogo reaparecem como fatores significativos e necessários
ao enlace. Novamente evidenciaram-se as marcas de uma conjugalidade
contemporânea, em relação à união do casal, onde a individualidade e a igualdade
aparecem como forma de vivenciarem a conjugalidade entre eles. A infidelidade
masculina foi algo dito como não aceito pelas mulheres separadas, pois vimos que
anteriormente na sociedade patriarcal a relação extraconjugal era aceita pela
sociedade. Nos relacionamentos atuais, as mulheres pesquisadas não admitem a
traição, sendo para elas motivo de dissolução conjugal.
Assim, é possível afirmar que as mulheres conquistaram nas últimas
décadas um novo espaço na sociedade. Em decorrência disso, cada vez mais as
pessoas buscam relacionamentos, onde se estabelecem relações mais igualitárias
entre os conviventes. Isso se evidenciou ao longo da pesquisa, tanto em relação às
mulheres casadas quanto às mulheres separadas, pois procuram por um
relacionamento fundamentalmente pautado no companheirismo e no diálogo.
De maneira geral, os desejos foram unânimes entre as entrevistadas, no
sentido de se sentirem coadjuvantes de uma relação de igualdade, mudança pela
qual a mulher vem sendo responsável no decorrer dos tempos, através de
mudanças sócio-históricas, manifestação de movimentos feministas e o nível
crescente de informação e comunicação em tempos atuais. Compreende-se, assim,
que as mulheres vêm buscando relacionamentos nos quais possam participar
ativamente, dividindo projetos e interesses em comum com seus parceiros.
Todavia, algumas diferenças apareceram e podem ser entendidas como
características de um processo histórico de mudança que demanda tempo para
efetivamente se consolidar. Entretanto, as pessoas continuam se casando e apenas
se separam no momento que a relação deixa de satisfazê-las, pois ainda procuram
na conjugalidade a possibilidade de estabelecerem uma relação na qual a
individualidade possa ser respeitada. Assim, entende-se que o casamento ocupa de
fato um lugar de grande importância na vida das entrevistadas, e, mesmo tendo
passado por uma dissolução conjugal, essas mulheres continuam a acreditar no
59
casamento,
relacionando-o
à
família,
ao
amor,
à
realização
afetiva,
ao
companheirismo, à felicidade, e a uma oportunidade de estabelecerem a igualdade
entre o casal. Assim, podemos identificar que as pessoas continuam a acreditar no
casamento, desde que seja conforme uma das entrevistadas “[...] é preciso muito
diálogo...”.
60
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APÊNDICES
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APÊNDICE A – Termo de consentimento livre e esclarecimento
Termo de consentimento livre e esclarecimento
Eu, ___________________________________________, RG: ________________,
estou ciente de que participarei da pesquisa “As Representações Sociais da
Conjugalidade para Mulheres em Processo de Casamento e para Mulheres em
Processo de Separação ou Separadas”, sob orientação Prof. Dr. Leandro Castro
Oltramari, realizada pela acadêmica Ana Paula de Oliveira Ramos, estudante da 10ª
fase de Psicologia, para o desenvolvimento da pesquisa de TCC II em Psicologia.
Declaro ainda que tenho conhecimento de que a minha participação nessa fase do
projeto consiste em conceder entrevistas, que poderão ser gravadas sem
remuneração financeira.
Estou ciente que para participar deste estudo terei de responder a uma entrevista
que não me identificará, e cujo conteúdo será sobre minha vida conjugal. Fui
esclarecida também que poderei, a qualquer momento em que desejar, desistir de
minha participação, sem sofrer nenhum tipo de consequência por esta decisão.
Também fui informada de que, se precisar de maiores informações sobre esta
pesquisa, poderei obtê-las entrando em contato com o orientador ou a pesquisadora.
Este estudo tem caráter puramente científico e meus dados pessoais serão
mantidos em sigilo sendo garantido meu anonimato. Minhas respostas apenas serão
utilizadas para os propósitos deste estudo. Estou ciente de que minha participação é
totalmente voluntária e não terei direito a remuneração.
Assim, concordo em participar dessa pesquisa e que os resultados sejam divulgados
por meio de trabalhos acadêmicos científicos.
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Nome por extenso_________________________________________________
Local e data______________________________________________________
Contato da pesquisadora: Ana Paula de Oliveira Ramos
Telefone: 8414-6085
E-mail: [email protected]
Contato do orientador: Prof. Dr. Leandro Castro Oltarmari
Telefone: 8404-7559
E-mail: [email protected]
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APÊNDICE B – Roteiro de entrevista
ROTEIRO DE ENTREVISTA:
Mulheres casadas
1) Idade:
2) Escolaridade:
3) Profissão ou Ocupação:
4) Por quanto tempo está casada?
5) Namorou quanto tempo seu marido?
6) Você já teve algum convívio marital antes do atual?
7) Antes de se casar, qual era sua visão de casamento? Suas expectativas foram
correspondidas?
8) Segundo seu ponto de vista, o casamento mudou nos dias de hoje?
9) Você imagina passar o resto de sua vida com seu esposo?
10) Em sua opinião, o que faz durar um casamento?
11) Houve alguma cerimônia ou festa para celebrar o casamento?
12) Com que idade se casou? Tem filhos?
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Mulheres em processo de separação
1) Idade:
2) Escolaridade:
3) Profissão ou Ocupação:
4)Tem filhos?
5) Por quanto tempo esteve casada?
6) Você já teve algum convívio marital antes do atual?
7) Desde quando você está separada?
8) De quem foi a decisão de se separar?
9) Por que acha que acabou o casamento?
10) Você gostaria de ter outro casamento? Caso sim, como você gostaria que fosse
seu casamento?
11) Namorou por quanto tempo seu ex-marido?
12) Antes de se casar, qual era sua visão de casamento? Suas expectativas foram
correspondidas?
13) Em sua opinião, o que faz durar um casamento?
14) Houve alguma cerimônia ou festa para celebrar o casamento?
15) Com que idade se casou?
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