Grandes diretores de arte: No início dos anos 30 aconteceu uma revolução nas artes gráficas e no design de revistas. Designers europeus abraçaram os movimentos de arte modernistas como o cubismo, construtivismo, surrealismo e futurismo e, inspirados por esses movimentos, quebraram com a tradição do design formal e enfeitado predominante no início do séc. XX. Dois grandes artistas gráficos europeus – o russo Alexey Brodovitch e o russo-turco Mehemed Fehmy Agha – foram contratados pelas duas mais importantes revistas de moda americanas – Vogue e Harper´s Bazaar – influenciando daí por diante o design gráfico de revistas e estabelecendo o prestígio da função do diretor de arte. As duas revistas iniciaram nessa época uma rivalidade na disputa pela liderança das tendências da arte em revistas, rivalidade que existe até os dias de hoje. Esses dois artistas estiveram na vanguarda de um movimento que mudou para sempre a página impressa e influenciou o design gráfico em todo o mundo; redefiniram o papel do diretor de arte e criaram uma geração que por muitos anos fez revistas maravilhosas. Umas das principais inovações trazidas pelos dois foi a utilização da página dupla como uma unidade que poderia ser usada no sentido horizontal, ignorando a junção das páginas. Para eles, a página dupla naturalmente leva para outra unidade de duas páginas e cria uma continuidade que transcende as dimensões da folha de papel. No início dos anos 40, Agha foi substituído em Vogue por outro artista russo: Alexander Liberman, que assumiu a direção de arte também de Vanity Fair e, mais tarde, de todas as publicações da Condé Nast. Liberman deu às revistas uma abordagem jornalística e reconheceu que era preciso juntar as necessidades comerciais e de circulação com as artes plásticas. Nos anos 60, uma brasileira chegou a um lugar proeminente na lista dos grandes diretores de arte nos EUA: a carioca Bea Feitler, que ocupou lugar que poucos anos antes era de Alexey Brodovitch. Bea, em conjunto com a diretora de arte Ruth Ansel, influenciou as revistas americanas com sua energia e alegria. Nas últimas décadas o francês Fabien Baron tem sido o mais prestigiado entre os diretores de arte em todo o mundo. Alexey Brodovitch: Ele trabalhou quase 25 anos como diretor de arte da revista Harper´s Bazaar e, durante esse período, implantou as fundações do design da revista moderna. Passados 60 anos, sua marca está nas revistas de hoje e ele continua sendo uma referência para quem trabalha no mundo das artes gráficas e da fotografia. Brodovitch foi responsável por um dos movimentos mais ricos da história de Harper´s Bazaar do ponto de vista gráfico. De 1934 a 1958 fez dela uma publicação viva e imprevisível, que passou a ser lida por muitos que, como ele próprio, não tinham interesse em moda. Durante esses anos, ele inventou e reinventou a revista e, no processo, revigorou o design gráfico americano e inspirou um enorme grupo de artistas; diretores de arte e fotógrafos. Exerceu papel crucial na introdução nos EUA de um estilo de design gráfico moderno, desenvolvido na Europa nos anos 20, uma mescla de movimentos de vanguarda. Como professor, formou uma geração de designers. Lançou a carreira de grandes fotógrafos como Martin Munkácsi, Richard Avedon, Hiro e Art Kane. Seu primeiro assistente em NY foi o jovem Irving Penn, que nos anos 40 migrou para a Vogue, tornou-se um de seus maiores fotógrafos e é até hoje um dos seus grandes trunfos. São inumeráveis as características do design excepcional criado por esse grande inovador. Mudou para sempre os limites do que poderia ser feito com uma página de revista; tratava o seu espaço como um pintor trata a sua tela; via a página em 3 dimensões, e não em 2: fundos lisos, fotos grandes e tipografia eram justapostos dando profundidade à página. Ele comparava as páginas duplas com a sequência de um filme e usava o termo “fluxo” para descrever a narrativa e o ritmo das páginas. Deu a Harper´s Bazaar um sentido musical que transportava o leitor ao longo das páginas como uma série de passos de tango aqui, valsa acola, sapateado mais adiante. O espaço em branco era a sua marca registrada. As modelos flutuavam nele; títulos e textos tinham uma presença quase etérea. Ele estabeleceu um diálogo entre texto e imagem. Era um mestre em tipografia, mas seu tipo favorito era o Bodoni, que, aos poucos, tomou conta das páginas da Bazaar. É praticamente o modelo do diretor de arte da revista moderna. Foi ele que investiu esse cargo da total responsabilidade pelo visual da revista. Ele não se limitava simplesmente a organizar as fotografias, ilustrações e tipografia na página, mas assumia um papel ativo na concepção e contratação das artes gráficas e se especializou em descobrir e dar espaço a jovens talentos. A dupla formada por ele e a famosa diretora de redação Carmel Snow levou Bazaar a tomar a liderança em relação à sua concorrente Vogue. Mehemed Fehmy Agha: Arte e negócios Elegância era a palavra que definia seu trabalho como diretor de arte da Vogue, de 1929 a 1942. Embora dominasse a técnica e tivesse extremo bom gosto, foi a sua atitude de juntar arte com negócios que o tornou uma figura revolucionária. Antes dele, ninguém pensou que fosse possível atrair para uma revista comercial artistas como Matisse e Picasso. Era capaz de manter o rigor e o pragmatismo que o negócio demandava e ao mesmo tempo ter o respeito do mundo da arte. Sua integridade artística e profissional eram indubitáveis. Rigoroso e profissional, era ativo, obcecado pelos detalhes, centralizador, perfeccionista e dirigia seu departamento com disciplina. Uma de suas mais importantes inovações foi o uso do layout de página dupla. Até então, os diretores de arte trabalhavam as páginas do lado esquerdo e direito de maneira individual. Ele uniu as duas páginas ignorando o espaço em branco formado pelas margens internas das duas páginas espelhadas, no lugar onde a revista é grampeada ou colada. Inovou ainda ao eliminar os fios verticais entre as colunas e as bordas decorativas comuns na época; simplificou a tipografia – foi o primeiro a usar regularmente os modernos tipos sem serifa e títulos com letras minúsculas; aumentou o espaço em branco nas margens das páginas. Contratou o trabalho dos melhores fotógrafos da época: Edward Steichen, Cecil Beaton e Horst entre outros. Russo-turco, filho de um magnata do tabaco, nasceu na Ucrânia e foi educada em Kiev e Paris. Trabalhou na Vogue em Berlim e foi levado para os EUA em 1929 pelo editor Condé Nast para ser o diretor de arte da Vogue, Vanity Fair e House & Garden. Alexander Liberman: Audácia jornalística. Em 1943, substituiu Mehemed em Vogue, onde trabalhou por mais de meio século. A partir de 1962, assumiu a função de diretor editorial de todas as revistas da Condé Nast – quando orientou o renascimento de Vanity Fair; o lançamento de Self, Condé Nast Traveller e Allure; rejuvenesceu a Mademoiselle, Glamour e House & Garden. Ele transformou Vogue, de um elegante álbum para os ricos, numa revista contemporânea que abriu suas páginas para as imagens sexualmente audaciosas do fotógrafo Helmut Newton. Introduziu tipografia mais pesada e layouts cheios, tumultuados, estilo tabloide; deu uma abordagem jornalística ao design para atender às necessidades comerciais e de circulação. Dizia detestar espaço em branco e queria colocar um pouco de “brutalidade” nas páginas. Para ele, revista que não vendia não tinha razão de ser. Contratou como assistente Irving Penn, na época diretor de arte da loja Saks Fifth Avenue, que se tornaria mais tarde um fotógrafo renomado. Nasceu em Kiev em 1912, filho único de um magnata da madeira. Foi educado na Inglaterra e na França, estudou belas-artes na École Nationale des Beaux-Arts e depois arquitetura. Aos 19 anos, em Paris, conseguiu uma vaga no departamento de arte da revista semanal fotográfica Vu, predecessora de Life. Chegou aos EUA em 1941, refugiado da guerra na Europa. Podia ser maldoso, irresponsável e caprichoso; com frequência, reinventada a revista no caminho para a gráfica. Era famoso por contratar várias pessoas para o mesmo trabalho e deixar que guerreassem entre si. Foi ele quem contratou, em 198, Anna Wintour, atual diretora de redação de Vogue. Fotógrafo e escritor, manteve sempre uma carreira paralela como artista plástico. Bea Feitler: Uma brasileira no topo do design. Em 1963, 5 anos depois do lendário diretor de arte Alexey Brodovitch deixar Harper´s Bazaar, seu lugar foi ocupado por uma brasileira. Junto com sua colega Ruth Ansel, dirigiu a revista por 10 anos. Faz parte do Hall of Fame do Art Directors Club de NY. Além de Bazaar, ela criou ou redesenhou várias revistas, entre elas Ms., Rolling Stone, Self e Vanity Fair. Ela estava por trás dos antológicos trabalhos que a fotógrafa Annie Leibovitz fez dos Beatles, dos Rolling Stones e de outros astros de rock que se tornaram ícones da fotografia; desenhou vários livros premiados, pôsteres, figurinos de teatro e anúncios de publicidade. Nasceu no Rio em 1938, estudou na Suíça e desde a adolescência mostrou talento e entusiasmo pela arte. Ainda muito jovem, mudou-se para NY para estudar artes gráficas na Parsons School of Design. Voltou ao Brasil e deu início à sua carreira quando, junto com dois amigos, fundou o Estúdio G, especializado em pôsteres, capas de discos e livros. Em 1960, colaborou com a antológica revista Senhor. Em 1961, um professor seu na Parsons School, Marvin Israel, assumiu a direção de arte da Bazaar e a convidou para trabalhar com ele. Dois anos depois Israel deixou Bazaar e nomeou para substituí-lo suas duas assistentes: Bea Feitler e Reht Ansel, que, aos 25 anos, tornaram-se co-diretoras de arte da revista. Em 1972, Bea deixou a Bazaar para juntar-se a Gloria Steinem na criação e lançamento da revista Ms., onde vislumbrou a oportunidade de fazer um trabalho inovador. E conseguiu. Em 1980, tornou-se consultora de direção de arte da editora Condé Nast. Nessa posição, desenvolveu o Projeto da revista Self e de Vanity Fair. Em 1982, no auge de sua carreira e celebrada por seu trabalho, Bea perdeu a luta contra o câncer e se foi, aos 44 anos. Fabien Baron: O mais imitado há duas décadas. É conhecido por seu estilo provocador: minimalista, grandes espaços em branco, fotos em branco e preto com um corte dramático, letras enormes e embaralhadas. Esse estilo passou a ser o modelo da estética que transformou o jeito de apresentar os editoriais de moda e é largamente imitado. Em todas as revistas que trabalhou, entre elas, Vogue Italia, Interview, Harper´s Bazaar, Vogue Francesa e Arena Home – redesenhou as revistas de maneira radical. Nasceu na França em 1959. Filho de um artista gráfico e diretor de arte de vários jornais franceses, aos 12 anos já fazia seus próprios layouts. Estudou em Paris e foi trabalhar com seu pai. Em 1982 foi para NY e conseguiu um emprego na Condé Nast, primeiro na revista Self e depois na GQ. Assumiu seu primeiro cargo como diretor de arte na revista New York Woman em 1986. Ao mesmo tempo fazia trabalhos em freelancer para a loja de departamentos Barneys New York. Em 1988 foi convidado para ser diretor de arte na Vogue Italia. Lá desenvolveu a sua filosofia e sua marca registrada: uma palavra curta, enorme, ao lado de uma única imagem provocativa. Mas foi em 1992, quando convidado pela diretora de redação da Harper´s Bazaar, Lyz Tilberis, que consolidou sua posição no rol dos grandes do gênero. Em 1990 fundou a Baron & Baron, baseada em NY, e produzir campanhas de publicidade para Calvin Klein, Balenciaga e Mil Mil; embalagem de perfumes e bebidas, ambientação de lojas, logotipos, marcas e identidade visual para clientes como Burberry, Prada e Madonna. Em 2008 deixou o cargo de diretor de arte da Vogue francesa e durante um ano trabalhou no redesenho e reposicionamento da revista Interview, da qual sairia novamente cerca de uma ano depois, em janeiro de 2009.