A música como instrumento essencial para aprendizagem Diego Camargo Saraiva1 Naura Martins2 Resumo: Este estudo quer analisar a importância do auxílio da música no ensino de outras disciplinas. Por ser uma arte tão antiga e particular, a música acabou sendo objeto de inúmeros estudos científicos durante a evolução da humanidade e tais circunstâncias demonstraram em que medida ela era uma disciplina que envolvia, em seu espectro interno de relações próprias, referências de outras disciplinas. Palavras-chave: Ensino. Música. Importância. Aprendizagem. Abstract: This study wants to examine the importance of music aid in education in other subjects. Being an art so old and particular, music has become the object of many scientific studies during the evolution of humanity and these circumstances have demonstrated to what extent it was a subject that involved in its internal spectrum of own relationships, references from other subjects. Keywords: Teaching. Music. Importance. Learning. A origem da música ainda não é bem defina. Podemos dizer que foi na Grécia que nasceu nossa civilização. Aí, como em toda parte, fazia-se música para as necessidades da religião, da magia, da medicina, da guerra, e também para o prazer pessoal e de outros. A música dos gregos vem da Mesopotâmia, Ásia Menor, Egito... “As múltiplas reproduções em ânforas e a documentação literária na Ilíada e na Odisséia de Homero (sec. VIII a.C) nos dá uma ideia mais exata da música”. (A MÚSICA, 1993, p. 7). A música como arte de combinação dos sons é praticamente tão antiga quanto o ser humano, posto que o próprio ato comunicativo verbal é uma sequência de combinações sonoras e, portanto, em certa medida, poderia ser considerado música (FERREIRA, 2010). É praticamente impossível discutirmos sobre a comunicação verbal oral dos homens pré-históricos, pois, diferentemente da comunicação verbal escrita, não há registro algum dessa época. Assim, não é impossível, mesmo que improvável, considerarmos mesmo que, já nos primórdios da humanidade, a música tenha servido de subsídio para as primeiras manifestações verbais orais da humanidade. Quem garante que o homem não pensou primeiro em cantar, talvez imitando os pássaros, antes de pensar em falar? E que assim sua voz servia para comunicar-se com os outros - homens e animais – com mais eficácia que seus 1 2 Graduando em Letras. Professora orientadora. Revista EnsiQlopédia – FACOS/CNEC Osório Vol.9 – Nº1 – OUT/2012 – ISSN 1984-9125 Página 16 gestos, por exemplo? Eis aí a música atuando como auxiliar no aprendizado de outras coisas que não dela mesma. Ferreira (Ibid) nos traz um exemplo interessante ao qual devemos refletir: o modo em que um boiadeiro pastoreia pelas fazendas brasileiras uma pequena boiada que não exija necessariamente a utilização de seu berrante. Tal fato, segundo o autor, ocorre com a voz do boiadeiro entoando melodias curtas, nas quais os fonemas que pronuncia ficam no limiar entre a linguagem verbal, que ele mesmo e seus semelhantes da espécie humana reconhecem, e a linguagem “verbal” (ou, antes, sonora ou musical) que seu gado e ele mesmo (em parte), pelo convívio, reconhecem. Seguindo ainda na exploração do exemplo anterior, Ferreira (2010) nos mostra também, o condicionamento a que algumas curtas melodias podem levar qualquer animal racional ou irracional. O autor cita algumas ocorrências que são comuns e cotidianas: “a campainha de nossa casa, o apito do juiz de futebol, o assobio para o cão, as palmas para o artista, as palavras de ordem entoadas para um pelotão de soldados etc” (FERREIRA, Ibid., p. 24). Infelizmente, nos últimos anos, até uma bela melodia de Beethoven, toscamente executada, tornou-se para nós, sinônimo de “caminhão do gás”. Como se percebe nesses exemplos, a combinação sonora constantemente é utilizada como suporte ou subsídio para a memorização e para o aprendizado de qualquer coisa em nossa vida. Hoje sabemos a relação íntima que a música tem, principalmente, com disciplinas de artes, de língua portuguesa, de língua inglesa, de psicologia, de religião entre outras, mas isso não a limita, pois, mantém sempre alguma afinidade com outras tantas, mesmo que não estejam ligadas diretamente ao campo da sonoridade. Segundo Ferreira (Ibid.), quando propomos trabalhos para serem desenvolvidos com a música em sala de aula, é óbvio que as disciplinas que têm mais proximidade com ela, que também se ocupem, de algum ponto de vista, com os sons, levarão certa vantagem na facilidade de aplicação e desenvolvimento dos trabalhos em relação a outras, mas isso não denota impossibilidades para disciplinas menos afinadas com a música. O autor salienta que, é importante que o professor leia e reflita sempre sobre aquilo que lê, pois um trabalho proposto em uma disciplina que não aquela na Revista EnsiQlopédia – FACOS/CNEC Osório Vol.9 – Nº1 – OUT/2012 – ISSN 1984-9125 Página 17 qual é especialista poderá inspirar-lhe novas ideias que sejam adequadas à sua área de atuação. Quanto a educar, a ensinar outras disciplinas tendo o auxílio da música, é algo que pode ser feito de muitas maneiras, de acordo com o assunto que se pretenda abordar. Existem poucos livros em língua portuguesa, que se proponham a discutir a questão da utilização da música na escola tradicional como subsídio para o aprendizado escolar de disciplinas diversas. [...] a persuasão e a eficiência da música no ensino não se questiona, mas, além de tal técnica de ensino nunca ter sido formalizada, a não ser com relação a alunos com algum tipo de deficiência, não devemos nunca esquecer que a música, nem por sonho, restringe-se apenas a isso. Tratase de uma arte extremamente rica e dispõe de farto e vasto repertório acessível em qualquer lugar do nosso planeta [...] (FERREIRA, 2010, p. 26). Nossa vida é cercada de sons e de músicas. É preciso aprender a ouvir e, se possível, também cantar e tocar. “Daí que ensinar, ou aprender ouvindo música, é um accelerando” (FERREIRA, Ibid., p. 26). Quando ligamos o rádio para ouvir música; quando, entre amigos, se põe um disco para criar ambiente e se estar melhor em conjunto; quando, numa festa, homens e mulheres se agitam como loucos ou ondulam suavemente acompanhando o ritmo e o som; quando a banda toca o hino nacional; quando, na igreja os sons convidam os fiéis à meditação; quando o refrão de uma música é feito de maneira a levar todo grupo a participar do canto... Em todos esses casos, e em muitos outros, a música funciona como estímulos de comportamento, seja porque quem a dirige quer induzir a fazer alguma coisa, seja porque nós próprios nos servimos dela para nos estimularmos. Pfutzenreuter (1999) menciona que a música contribui para o desenvolvimento cognitivo e pessoal do ser humano. O aluno que tem a oportunidade de fazer experiências musicais amplia a sua forma de expressão e de entendimento do mundo em que vive, dessa forma possibilita o desenvolvimento do pensamento criativo. Ferreira (op. cit., p. 17), complementa caracterizando a música como, “além da arte de combinar sons, uma maneira de exprimir-se e interagir com o outro e Revista EnsiQlopédia – FACOS/CNEC Osório Vol.9 – Nº1 – OUT/2012 – ISSN 1984-9125 Página 18 assim devemos compreendê-la”. Todo mundo, num momento ou noutro, sente vontade de cantar: é a vontade de nos exprimirmos. Segundo Snyders (1994), a experiência mais familiar aos jovens é a da música, que toma conta deles. O autor menciona que os jovens sabem bem que a música não os prende apenas de um determinado lado, não os atinge só em um determinado aspecto deles mesmos, mas toca o centro de sua existência, atinge o conjunto de sua pessoa, coração, espírito, corpo. O autor ainda salienta que, A influência que a música exerce sobre nós remete-nos evidentemente a seu poder sobre o corpo; ela coloca o corpo em movimento, faz com que ele vibre de forma não comparável às outras artes; e é o fato de estarem escritas em nosso corpo que dá tanta acuidade às emoções musicais; por seu enraizamento psicológico, a própria música atinge uma espécie de existência corporal (SNYDERS, 1994, p.85). Os alunos mal chegam a refrear os gestos e a controlar os movimentos aos quais a música os incita. Continuando o que diz os estudos de Pfutzenreuter (op. cit), no que diz respeito ao papel do professor, entendemos que para fazer um bom uso das músicas em sala de aula é necessário que, o professor conheça o contexto em que foram escritas, para assim poder trabalhar um determinado tema; é necessário haver um debate sobre o conteúdo da canção e a relação com o cotidiano dos alunos, contribuindo assim para o processo de construção do conhecimento. Deve se ter em mente que todas as composições estão inseridas em uma atmosfera ideológica. Além disso, as letras e melodias musicais expressam reações, sentimentos e pensamentos de quem as compõem, características de determinado período da história da sociedade - uma prova disso são as músicas: Roda Viva; Cálisse; Alegria, Alegria; Domingo no Parque; Caminhando (Pra não dizer que não falei de flores). Como afirma Medina (1973), qualquer grupo humano necessita dispor de símbolos que expressem seus valores, precisa de cânones aceitáveis e aceitos de interpretação da realidade vivida. Essas dimensões podem e devem ser aproveitadas pelo professor com o objetivo de despertar em seu aluno a consciência crítica e a sensibilidade à música. Medina afirma ainda que embora letra e música não andem isoladas, é a análise da letra que permite o exame de caráter social. Nessas letras devem-se encontrar Revista EnsiQlopédia – FACOS/CNEC Osório Vol.9 – Nº1 – OUT/2012 – ISSN 1984-9125 Página 19 valores expressos, embora não seja isso, necessariamente, uma razão para que sejam ouvidas. Hoje, podemos perceber a influência do contexto nas músicas do compositor Gabriel “O Pensador”; no funk, que mostra a maneira como a sociedade vê o corpo feminino e a própria mulher; no tecno, que surgiu juntamente com a expansão da tecnologia; na música dos presidiários, que descreve sentimentos e situações da vida que levam nas prisões, entre outros. Pensando a situação das composições musicais atuais, vê-se a importância do professor tentar mostrar a influência que o meio exerce na música, para que seus alunos aprendam a discernir sobre o que tem qualidade ou não, pensar a realidade em que vivem, desenvolvendo a criticidade e evitando que tornem-se pessoas alienadas, meros consumidores do que a mídia e os sistemas de comunicação de massa lhes impõe. Através de canções, o aluno explora o meio circundante e cresce do ponto de vista emocional, afetivo e cognitivo. Assim ele cria e recria situações que ficarão gravadas em sua memória, e que poderão ser reutilizadas quando adultos. (PFUTZENREUTER, 1999). Por isso, o trabalho com a música deve ser cauteloso sendo importante que o professor a use não somente para trabalhar gramática, - o que geralmente ocorre mas em outras áreas da língua como produção de texto, interpretação crítica, discussões sobre os temas presentes nas letras, como já foi mencionado, ou até mesmo para descontração. O desafio ao se ensinar uma língua é unir a aprendizagem à emoção e abrir caminhos para explorar o prazer de aprender. Essa conexão é uma tentativa de integrar o domínio cognitivo e o afetivo. Podemos representar a aprendizagem como a formação de novas conexões entre os neurônios, as células do cérebro. Essas conexões, estabelecidas pelos neurotransmissores, são causadas, tanto por fatores genéticos como por informações que chegam ao cérebro através do meio ambiente, como imagens, sons, cheiros, etc. Um elemento importante para ampliar essa “fiação” do cérebro é a presença do prazer na atividade. Se a criança, jovem ou Revista EnsiQlopédia – FACOS/CNEC Osório Vol.9 – Nº1 – OUT/2012 – ISSN 1984-9125 Página 20 adulto não gostar do que estiver fazendo, se a aula for cansativa, a aprendizagem diminuirá ou deixará de ocorrer (PRADO, 1998). Rosin e Tinoco (apud DOMMEL e SACKER, 1986) ressaltam que a proposta não deve ser a de um ensino de língua centrado somente na música. Chegam até mesmo a destacar que tal atitude banalizaria esta privilegiada estratégia de ensino. A inserção cultural, a depreensão de um novo vocabulário, o aperfeiçoamento da compreensão auditiva e aprendizado de tópicos gramaticais são, na teoria destes autores, alguns dos objetivos capazes de serem alcançados através do uso da música, mas também os emocionais porque criam um contexto favorável ao aprendizado e fazem com que o aluno traga para dentro da sala de aula a sua sensibilidade, as suas experiências e suas habilidades criativas, assim ele consegue se expressar e se expor de maneira mais espontânea. Segundo os parâmetros curriculares nacionais (2006) é necessário reforçar a herança estética e artística dos alunos de acordo com seu meio ambiente, para que desenvolvam competências em múltiplos sistemas de percepção, avaliação e prática da arte. Valoriza-se, assim, o repertório do aluno, especialmente dos jovens em contato com as mídias, priorizando a análise dos ritos subjacentes ao modo de vestir, falar, aos gestos de cumprimento e às preferências esportivas. A identificação com o hip-hop pode ser dada como exemplo desses ritos na esfera urbana, com suas manifestações como grafite, tatuagens, preferências musicais, esportivas, danças de rua, etc. A educação – seja na área de ciência, de linguagem ou de arte especificamente – nunca é neutra. Embora haja um corpus de conhecimento que identifique cada uma dessas áreas, é nas suas contextualizações que esses conhecimentos adquirem sentidos e significados diferentes. Modo de ação produtiva do homem, ela é fenômeno social e parte da cultura. Está relacionada com a totalidade da existência humana, mantém íntimas conexões com o processo histórico e possui sua própria história, dirigida que é por tendências que nascem, desenvolvem-se e morrem, e às quais correspondem estilos e formas definidos (NUNES, 1991, p. 1 apud PCNEM, 2006, p. 181). Revista EnsiQlopédia – FACOS/CNEC Osório Vol.9 – Nº1 – OUT/2012 – ISSN 1984-9125 Página 21 Por meio da arte não produzimos apenas textos avulsos sobre temas variados. Tal como ocorre na ciência, na filosofia e na religião, a arte é um tipo particular de narrativa sobre o ser humano, a natureza e o cosmos, sintetizando as visões de mundo de cada época e cultura. Referências A MÚSICA: Instrumentos musicais e história da música. Lisboa: Forma, 1993. FERREIRA, Martins. Como usar a música em sala de aula. São Paulo: 7.ed. Contexto, 2010. MELO, Cimara. Música popular brasileira e literatura: Um estímulo interdisciplinar através dos textos. 2004. Disponível em: <http://www.ensinounivate.br>. Acesso em: Março/2011. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Parâmetros Curriculares Nacionais. Linguagens, Códigos e suas Tecnologias – Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2006. OLIVEIRA, Aline Renata. A música no ensino de língua portuguesa. Disponível em: <http:// www.uepg.com.br>. Acesso em: Abril/2011. PEREIRA, Érica. O ensino da língua portuguesa com música. Disponível em: <http:// www.planetaeducação.com.br>. Acesso em: Março/2011. SIMON, Marisa. Um debate sobre o ensino de música na escola. Dois pontos: Sendo e Pertencendo, n. 5, Osório, Abril de 2010. SNYDERS, Georges. A escola pode ensinar as alegrias da música? Trad. Maria José do A. Ferreira. São Paulo: 2. ed. Cortez, 1994. Revista EnsiQlopédia – FACOS/CNEC Osório Vol.9 – Nº1 – OUT/2012 – ISSN 1984-9125 Página 22