A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU Relatório Final Iniciação Científica: Pós Graduação, Pesquisa e Extensão Professor Orientador: Dr. Mauro Araújo de Sousa. Por: Amanda G. França. 2012 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 Relatório Científico Nome: Amanda G. de França Email: [email protected] Telefone: 4472-8350 Unidade: FAFIL Colegiado: Ciências Sociais Projeto Título: A VONTADE GERAL E A LIBERDADE DE ROUSSEAU Duração do projeto Início: Janeiro de 2012 N.º de meses: 12 meses Valor Financiado: R$ 3161,76 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU NA RETÓRICA ATUAL INTRODUÇÃO O mundo em que vivemos hoje é difícil de ser imaginado sem nenhum tipo de controle. Mesmo no regime democrático e participativo, que é modelo preeminente de organização política mundial, a perspectiva a cerca do tema liberdade é relativa, insípida e contraditória. Conquistas sociais levam o homem a viver mais, expandindo em diferentes regiões do globo terrestre, seja nos campos da troca, do comércio, da comunicação, nas ideias e ideais, o seu modo de vida frente a tantos outros existentes. Esses e outros aspectos têm influenciado o conceito e a perspectiva humana do que entendemos como liberdade no presente histórico. Outra coisa: conceitos de direitos humanos e de liberdade, em suas mais variáveis esferas, é parte da mesma retórica, inibindo o que seria uma vida livre para muitos, isto é, quase tudo fica na área do distante vazio. O máximo que se pode pensar atualmente é na possibilidade de livre-arbítrio, liberdade é algo que jogamos para o idealismo mais que abstrato, torna-se inatingível enquanto ideal real nos dias atuais. Por ouro lado, atualmente há quem defenda a existência de sistemas de liberdades, ou seja, a existência de vários tipos de liberdade presentes no mundo democrático-capitalista atual, o que nos leva a pensar nas desastrosas tentativas de humanização do capital e nas inúmeras medidas de democratização do globo que nos foi apesentada ao longo da História. É certo que ambas as percepções não satisfazem, como na maioria dos sistemas políticos e econômicos, deixou-se de prezar pelo conceito de liberdade e seus efeitos práticos, liberdade é um mero tópico citado em diálogos econômicos, reduzindo ainda mais a percepção das sociedades capitalistas em relação ao seu próprio sistema que os escraviza. 1 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 De fato, essa discussão não é inédita, muito menos exclusiva e original, o que é liberdade e o que nos faz livres têm sido objeto de estudo de grandes pensadores, o tema é abordado de diferentes formas por: Platão, Aristóteles, Maquiavel, Hobbes, Locke, Espinosa, Montesquieu, Rousseau, Kant, Hegel, Marx, entre outros pensadores que apontaram formulações teóricas sobre o tema. Os fundamentos do termo liberdade não dispensam relação estreita com a história, com a filosofia, com a política e a economia. O problema é levantado nesses patamares no período clássico, medieval e moderno. Distante, podemos observar que o conceito de liberdade perpassa a história, de forma não tranquila. Hoje, alguns ainda se questionam, se ela existe, se já existiu, ou se ela ainda é possível. Embora reconhecidos os números da vasta bibliografia sobre o tema, o objetivo deste trabalho é reunir as formulações teóricas realizadas por Rousseau, promovendo na reflexão de sua obra o que diz respeito ao conceito de Liberdade e Vontade Geral elaborados pelo filósofo. Avaliando distâncias e proximidades, antagonismos e paradoxos, relacionando suas formulações teóricas com o que temos hoje como “ideal de liberdade”, tentando empreender o entendimento e a contribuição do Contrato Social para a sociedade atual e, perante esses quesitos, procederemos à costura política entre os conceitos. Nessa articulação, a Filosofia Política de Rousseau nos direciona do auxílio dos seus antigos debates, aos debates da nossa atualidade, a qual percorre, em uma espécie de letargia política, da qual pretendemos nos afastar. É notável o interesse de Rousseau nos padrões de controle e relações de poder entre os homens. Para Rousseau liberdade é o aspecto de maior relevância da vida política e social, mas, sua concepção é aplicada de maneira e em contextos distintos, assim, para entendermos sua proposta, é preciso avalia-la em toda essa diversidade. Outros estudiosos investiram no conceito, porque nós não investiríamos? 1.1. COMO DESIGNAR O HOMEM NÃO ESCRAVO: BREVES COLOCAÇÕES DAS POSSIBILIDADES DO CONCEITO DE LIBERDADE Eleuteros é o termo grego utilizado para designar possuidor de liberdade. As concepções de liberdade manifestaram-se em diversos períodos da filosofia grega, e é adotada por diferentes escolas. O homem livre é o não submetido? Ou, o ser capaz de fazer algo por si mesmo? A concepção grega de liberdade é designada por três termos, eleutheria, enkrateia e autarkéia. Esses termos denotam cada um, uma visão diferente da liberdade para os gregos, mas, encontram-se ligados de forma intrínseca. A noção de liberdade para a Filosofia Socrática e Clássica carrega em si a possibilidade de decisão, de autodeterminação e de responsabilidade. O conceito abordaria assim, a noção de capacidade de fazer algo, junto à forma de eliminação. Porém, desde início de sua concepção o termo Liberdade e ao ser livre, implica também a assunção de obrigações. Liberdade como ausência total, geral e desenfreada de algum tipo limitação, tal é vista pelo senso comum, não denota de uma noção específica dos gregos, em seus primórdios. 2 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 A eleutheria emerge como oposição entre os cidadãos e os escravos e indica que a liberdade está ligada ao poder político e à lei, de forma que é livre não quem age fora da lei, mas quem age conforme a lei. O que influenciou Rousseau e também Montesquieu em seu livro “Espírito das Leis”. A enkrateia significa autoconhecimento e autocontrole voltando o olhar para o domínio das paixões e dos instintos, a eudaimonia. Muito comum no pensamento da Filosofia Helenística e em especial nos Estoicos no período Pós-Socrático. As concepções adotadas pelas escolas socráticas possuem maior ênfase na liberdade pessoal. O efeito é observado na filosófica estoica aonde o exterior, a “sociedade”, os fenômenos da natureza e até mesmo as paixões, são considerados como instrumento de opressão. Nestes termos, liberdade consistira em “dispor de si mesmo”. O homem livre, usando a concepção estoica, atém “as coisas que estão em nós”, ou ainda citando Sêneca, ao que “está em nossa mão”. Liberdade como liberdade para si mesmo é a ideia concebida também por Epiteto e Marco Aurélio, ninguém poderia tirar-lhe a livre escolha. Essa concepção também apresenta a liberdade como consagração da “contemplação”, diminuindo a importância da ação. Desta forma chega-se a noção de liberdade como a consciência da necessidade realizada pelo ser de razão, que chega a compreensão de um destino, esse ato abstrato é extremamente libertador. O ideal de autonomia na perspectiva de liberdade é de estirpe Platônica e Aristotélica, tal como toda a concepção que veremos adiante. A autarkéia é o termo que permite pensar a liberdade concebendo o homem como um ser de relação ou, como escreveu Aristóteles: “Zoon Politikon” (animal político), presente nas obras “Política” como na “Ética a Nicômaco”. Somente a relação entre esses termos possibilitam ao homem a felicidade que seria o fim desejável para o individuo livre. Então, observamos que existe um objetivo que se relaciona com o termo liberdade, a felicidade. Em Aristóteles encontramos a ideia de liberdade da qual ordena de alguma maneira a ordem natural e moral regida pela noção de fim e finalidade. Todos os processos tendem naturalmente para um fim, a felicidade. O processo característico do homem para se chegar a este fim é a ação voluntária, ou seja, ações produzidas e livres de coações e ignorância. A ação moral é a soma da liberdade de vontade e de escolha, e assim é concebida a noção aristotélica de livre-arbítrio. Não haveria liberdade de escolha se a vontade não fosse livre, e esta não seria livre se não pudesse escolher ou eleger. Nos dois momentos da liberdade aristotélica destacados aqui, admitem-se paradoxos, principalmente no tocante a liberdade de escolha, o que fez com que associasse liberdade à operação da razão, em que, conhecendo-se o bem, não se pode deixá-lo. No período medieval, alude-se a liberdade em sentido teocêntrico, pois nesse período é forte a influência do cristianismo sobre as ações humanas. A partir desse momento, o problema da liberdade adquire maior complexidade, pois se questiona sobre o fim do homem e seu destino. As 3 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 questões gregas de liberdade foram temas das discussões cristãs. O uso do livre-arbítrio para o bem e para o mal foi amplamente discutido pela filosofia Cristã. A maior parte das questões a cerca da liberdade humana no sentido cristão foram trabalhadas por Santo Agostinho. Para o filósofo livre-arbítrio seria a possibilidade de eleição, e liberdade como realização do bem. O primeiro está ligado ao exercício da vontade inclinada com ou sem o auxilio de Deus, a questão passa a ser como o homem pode usar seu livre-arbítrio para ser livre. A inclinação para o bem é o primeiro passo apresentado, assim como, a conciliação da liberdade de eleição do homem com a presciência divina. São Tomás de Aquino também traz suas concepções, o filósofo assinala que o homem goza de livre-arbítrio ou liberdade de escolha. Possui naturalmente vontade, livre de coação. O filósofo acrescenta que o que aciona a vontade é o intelecto, capaz de apreender o objeto de sua vontade. O autor não reduz liberdade às concepções do livre-arbítrio, embora, a concepção de liberdade seja, de certo modo, eliminada de sua teoria, sendo posteriormente chamada de “espontaneidade”. A espontaneidade seria o movimento natural do homem para o bem. A liberdade de Aquino é uma liberdade baseada na escolha e uma escolha consistente na transcendência, movido também pelo intelectualismo com tipologia aristotélica. Quando se pensa a liberdade do homem perante um Ser Supremo, o livre-arbítrio passa a ser questionado. A concepção de que todas as coisas que existem estão ordenadas a um fim, elevou a essas discussões. Porém, não deixam de ser uma discussão teleológica, fruto das teologias medievais, daí o recorte medievo. Não podemos deixar de citar o problema persistente na idade média, entre liberdade e necessidade, que suscitou os debates libertários. O determinismo da Natureza é trabalhado por autores como Spinoza, e em parte por Leibniz e Hegel. Suas concepções fundamentavam-se em seguir a própria natureza e esta sim, estaria em harmonia com a realidade. Seja no determinismo de Spinoza, ou na tentativa de conciliação dos conceitos de liberdade e determinismo em Leibniz, citamos também, o “ser livre” de Hobbes, Locke e Voltaire, não nos esquecendo de dizer das discussões que giram em torno do livre-arbítrio chega-se a Kant e sua maneira de enfrentar todas essas colocações. No período renascentista a questão liberdade é impregnada de assertivas contratualista, adquire valor político antropocêntrico em um viés mais secularizado. Assim, o homem é livre na medida em que pode escolher fazer ou não alguma coisa, mas, essa “liberdade” possui gradações, pois, não ser coagido por nenhuma força exterior é muito difícil. Neste período a liberdade é “garantida” pelo Estado, que possui poder sobre os indivíduos e tem o dever de manter a ordem e fazer o bem a todos. Em outras palavras: trata-se de uma liberdade política. Kant preocupava-se em saber como era possível a necessidade e a liberdade. Para o filósofo não se podia compreender o problema sob uma única e determinada esfera. Dentro do conceito do domínio dos fenômenos, ou seja, o da Natureza em que há um determinismo completo, 4 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 aonde não se pode admitir a existência de liberdade. Em contrapartida, no domínio do número, ou seja, do reino moral, a liberdade ganha roupagem moral aonde não se pode não haver liberdade. A liberdade é postulado de moralidade e segundo Kant trata-se de uma causalidade pela liberdade de caráter positivo, não é uma realidade e sim um ato que coloca a si mesmo como livre. Hegel concebe liberdade como “liberdade de ideias”, não consistente no livre-arbítrio. Metafisicamente segundo o filósofo, liberdade é autodeterminação. Trata-se de uma determinação racional do próprio ser, em última instância, do ser em si mesmo. A liberdade é a autolibertação manifestada em todas as fases de desenvolvimento da ideia. Marx aborda a questão do ponto de vista social e histórico, sustentando o conceito de liberdade no determinismo natural e social, defendendo a possibilidade de que o homem alcance a liberdade por meio de “salto para a liberdade”, que veremos mais detalhadamente adiante. O Período Contemporâneo da Filosofia é o período que mais nos ateremos, é no inicio do período que a filosofia de Jean-Jacques Rousseau ganha cenário e destaque. Ora, para Rousseau os indivíduos são desiguais, e a causa é propriedade privada, esse é o fator primordial da diferença social. Assim, a burguesia dá origem à ideia de liberdade individual, uma liberdade dada pela propriedade. Por isso, o filósofo propõe um Estado em que se deposite uma vontade geral para a regulamentação desta liberdade, vejamos detalhadamente essas proposições. 1.2. A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU No decurso do conceito liberdade nos contextos sociais e políticos, Rousseau inicia sua concepção na obra “Discurso Sobre a Origem e a Desigualdade entre os Homens”, afirmando que os homens detêm a capacidade de frear seus impulsos e iniciar uma ação deliberada não impulsiva que visa um objetivo futuro. Essa capacidade é o que diferenciaria os homens dos animais. Segundo o autor: O homem tem alguma participação em suas próprias operações, em seu caráter como agente livre. Uma besta escolhe e recusa por instinto, o homem a partir de um ato de livre-arbítrio; logo a besta não pode desviar-se da regra que lhe foi prescrita, mesmo quando seria vantajoso fazê-lo (DISCURSO SOBRE A ORIGEM E A DESIGUALDADE ENTRE OS HOMENS; p.53). Relacionado a esta concepção, podemos ressaltar a noção de mal e bem moral que o filósofo atribui aos homens. É do homem a responsabilidade por seus atos, porém, a controversa ocorre na admissão do “mal” como responsabilidade exclusiva do homem, não sendo como o “bem” ato advindo do Deus criador. É possível verificar que, segundo a filosofia, a liberdade segue determinados aspectos, como observamos brevemente no item anterior, e com Rousseau filósofo, não é diferente. “Mas a ordem social é um direito sagrado que serve de base a todos os outros (ROUSSEAU; 2006 p. 10)”. Primeiramente, liberdade para Rousseau, é precedida de ordem, de uma ordem civil que é 5 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 inviolável e qualquer ação que perturbe de alguma forma essa ordem, não é legítima, a legitimidade é dada pela Vontade Geral, como ainda detalharemos. Eis o ponto central da teoria de Rousseau no tocante à liberdade, à ordem, enquanto questão social. Seguindo com sua concepção de liberdade, Rousseau observa que a Liberdade Comum é uma consequência da natureza humana, é intrínseca a todos os homens. Temos por Liberdade Comum a primeira lei, em que, todo individuo protege a própria vida, sendo único juiz dos meios para zelar sua conservação. Segundo Rousseau, os homens viram que não era possível conservarem-se a si mesmos e aos seus bens no estado natural no qual se encontravam. Observaram também, que não poderiam surgir novas forças em si mesmas para manter-se, vislumbrando assim, uma única solução, a união. “Faço contigo um contrato, todo ele a teu encargo e todo em meu proveito, que haverei de observar enquanto me aprouver e que tu observarás enquanto me aprouver (ROUSSEAU, 2006, p 19)”. A união promoveria a conservação, a perpetuação, a sobrevivência e a segurança de que necessitavam os indivíduos. A agregação das forças permite-os agir de comum acordo colocandoos em um único movimento. A força e a liberdade surgem como os primeiros instrumentos para a conservação dos homens, para que não haja negligência desses instrumentos, a solução apontada por Rousseau é o Contrato Social. Ora, como os homens não podem engendrar novas forças, mas apenas unir e dirigir aquelas que existem, não lhes resta outro meio, para se conservar, senão formando por agregação uma soma de forças que possa levá-los à resistência, colocá-los em movimento por um único móvel e fazê-los agir de comum acordo (ROUSSEAU; 2006, p. 22). Na distinção entre liberdade natural e civil, o autor aponta que a primeira tem por limite a força dos indivíduos. Na segunda, a liberdade passa ser limitada pela Vontade Geral e a posse. Há também a liberdade moral, única capaz de tornar os homens senhores de si. Dessas delimitações é possível concluir a pluralidade conceitual referente à liberdade percorrida pelo autor em sua obra. Sempre haverá uma grande diferença entre submeter uma multidão e reger uma sociedade”. Todo homem submetido a um só é escravo e não um povo e seu chefe. Trata-se de um aglomerado, mas não uma associação; não há nisso bem público ou político (Rousseau, 2006, p. 20). A associação civil restringe a liberdade natural, diante desse fenômeno, a liberdade que Rousseau dedica a explanar, em essência, o que seria uma liberdade que escraviza. Uma liberdade “discricionária”, ou seja, uma liberdade sem limites escravizaria os homens. As pessoas passam a alienarem-se a si mesmas em uma sociedade não fundamentada no pacto social. Rousseau chama essa atitude de “propósitos agressivos”. Os homens alienam suas necessidades e a sua própria natureza, primeiro com o objetivo de garantir superioridade individual, 6 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 agindo contra o “verdadeiro bem”, que é o coletivo. Tais propósitos agressivos contrariam os interesses corporativos e criativos, que prometem a satisfação real das necessidades humanas. Entrar em conflito com a própria natureza e o próprio bem torna o individuo alienado. A alienação como o “eu” adquirido, em conflito com o “eu” verdadeiro, sustenta-se no conceito de “Bondade Natural” do homem, defendendo a posição de que não faça parte do “bem” humano à necessidade de dominar seu semelhante, as posições ocupadas hierarquicamente na sociedade, a princípio, poderia harmonizar-se com as necessidades deste “eu” verdadeiro. Os homens, de início, não tiveram outros reis senão os deuses, nem outro governo, senão o teocrático. Foi necessária uma longa alteração de sentimentos e ideias para que se pudesse aceitar o semelhante por senhor e iludir-se admitindo que isso fosse um bem (ROUSSEAU, 2006; p. 145) A famosa proposição de Rousseau de que o “homem é naturalmente bom e a sociedade é quem o corrompe”, refere-se à predisposição humana, inata a todos os homens, para à virtude. O coração do homem seria imaculado, criado por Deus, e as inclinações malignas seriam efetuadas por outros indivíduos que comprometem esta integridade natural. Embora inconsistente, é baseado nessas proposições que Rousseau constrói sua teoria de um Estado benigno. Enquanto numerosos homens reunidos se consideram como um só corpo, não têm senão uma só vontade que não se relaciona com a conservação comum e o bem-estar geral. Então todas as molas do Estado são vigorosas e simples, suas sentenças são claras e luminosas; não há interesses escusos, contraditórios; o bem comum mostra-se por toda parte com evidência e requer somente bom senso para ser percebido (ROUSSEAU 2006, p.120). É da transformação de uma identidade distinta, particularizada dos indivíduos, resultante em uma identidade social que renuncia certos direitos, que Rousseau defende a tese do Contrato Social. O filósofo sustenta a existência de um Estado quando certo número de pessoas estão submetidas a um conjunto comum de regras que gerenciam seu comportamento, sob algumas penalidades. Assim, na obra o autor ressalta que liberdade não é falta de limites ou subordinação. Limite e autoridade são legítimos ao conceito de liberdade do autor. A obediência a si mesmo prescrita é a liberdade para Rousseau. Assim como a natureza estabeleceu limites à estrutura de um homem bem formado. Além dos quais só produzem gigantes ou anões, assim também, em relação a melhor constituição do Estado, estabeleceu limites á extensão que pode ter, a fim de que não seja demasiado grande para poder ser bem governado, nem demasiadamente pequeno para poder manter-se por si mesmo. Em todo corpo político há um máximo de forças que não poderia ser ultrapassados... (ROUSSEAU, 2006; p.55). 7 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 O que os homens perdem com Contrato Social é sua liberdade natural e seu direito ilimitado do que possam adquirir. Como podemos notar todo contrato termina com base em limitações, pois, se todos tivessem o direito de fazer o que bem interessam ninguém mais teria liberdade, o que mais uma vez lembra Montesquieu, na relação entre os poderes e desses cidadãos, ou seja, valem as leis. Enquanto o povo é obrigado a obedecer e obedece, faz bem; tão logo possa sacudir o jugo e o sacode, faz ainda melhor, porque, recuperando sua liberdade por meio do mesmo direito com o qual foi arrebatada dele, ou esse lhe serve de base para retomá-la ou não se prestava em absoluto para tirá-la dele (ROUSSEAU; 2006, p. 10). O cidadão consente a todas as leis. Mesmo àquelas que são aprovadas sem seu apoio, inclusive aquelas que o punem quando ele ousa infringi-las (ROUSSEAU 2006 p.124). É justamente no tocante a legitimidade das regras comuns que Rousseau elabora a teoria da Vontade Geral, da Autoridade e Corpo do Soberano, “o pacto social confere ao corpo político um poder absoluto sobre todos os seus membros, e é, esse mesmo poder que, dirigido pela vontade geral, recebe o nome de soberania (ROUSSEAU, 2006; p. 40)”. É no papel de cidadãos que os seres humanos adquirem sua capacidade plena. Ao tornar-se cidadão, torna-se também portador de direitos e títulos, e isso é agir a partir da compreensão moral do significado do eu, de sua própria necessidade de bem. A autoridade soberana deve ser composta por todos os membros adultos da comunidade, nenhum procedimento é legitimo se não for consentido racionalmente e ponderado por todos os membros. A autoridade do corpo soberano de Rousseau deriva de todas as regras autorizadas por todos os membros ou instituições autorizadas como os magistrados, por exemplo. Ao tornar-se parte do corpo soberano o individuo passa a considerar apenas os interesses comuns. ... Que é, pois, um ato de soberania? Não é uma convenção do superior com o inferior, mas uma convenção do corpo com cada uma de seus membros, convenção legítimas, porque tem por base o contrato social; equitativa, porque é comum a todos; útil, porque não tem outro objeto senão o bem geral; e sólida, porque possui como fiadores a força do público e o poder supremo. Enquanto os súditos não estiverem sujeitos a tais convenções, não obedecerão a ninguém, mas unicamente à própria vontade de perguntar até onde se estendem os respectivos direitos do soberano e dos cidadãos é até que ponto estes pode empenhar-se consigo mesmo, cada um para com todos para cada um deles (ROUSSEAU, 2006; p.42). Um governo arbitrário só é legítimo se o povo de cada geração fosse senhor de admiti-lo ou rejeitá-lo, o que torna este governo não arbitrário. Para Rousseau não existe a possibilidade de um governo despótico em sua teoria política. Um povo é um povo quando se entrega a um rei, mas torna-se uma associação quando o faz, pois o ato da entrega é um ato civil e supõe uma 8 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 deliberação pública. As convenções públicas é o que obriga uma parte pequena da sociedade a submeter-se a escolha de um grande número. A força antigamente exercida pelas autoridades é transformada em direito e a obediência em dever. Nenhum poder físico é moralmente aceito para o filósofo, o direito moral supera sempre e inevitavelmente a força. Não se deve obediência a força, mas segundo o autor devem-se obediência as autoridades legítimas. Assim sendo Rousseau estabelece uma fonte e uma base de autoridade legítima entre todos os homens. “Quando o Estado é instituído, a residência prova consentimento. Habitar o território é submeter-se à soberania (ROUSSEAU 2006; p.124)”. Assim, gozar de autoridade advém da satisfação de certos critérios essencialmente morais para Rousseau, que incluem a garantia ao membro desta comunidade proteção física e dos bens e reconhecimento como parte integrante do corpo social, essa é a soberania do povo que defende o filósofo. Nesses termos, trona-se apropriada a autoridade do Estado na teoria de Rousseau. Não há senão uma lei que, por sua natureza, exige um consentimento unânime. É o pacto social, porque a associação civil é o ato mais voluntário do mundo. Uma vez que todo homem nasceu livre e senhor de si mesmo, não há quem possa, sob qualquer pretexto, sujeitá-lo sem sua permissão (ROUSSEAU 2006, p.124). A liberdade civil dos cidadãos e a propriedade de tudo o que possuem, somente podem ser garantidas desse modo, o que demonstra perfeitamente o movimento conceitual que explicamos nos parágrafos acima, isto é, a limitação que à liberdade natural do homem possui, proporcionou o surgimento de outro tipo de liberdade, a Liberdade Convencional, que tem, como na primeira, vantagens e desvantagens. “Concorda-se que tudo aquilo que cada uma alimenta em virtude do pacto social de, de seu poder, de seus bens, de sua liberdade, seja somente a parte de tudo aquilo cujo uso interessa a comunidade (ROUSSEAU, 2006; p. 40)”. Estamos diante de uma liberdade conquistada através da cidadania. Só tenho liberdade individual por intermédio da minha liberdade como cidadão. Por causa da minha liberdade como cidadão, é que não posso e não devo ferir o Contrato. Então podemos concluir que a liberdade individual é dirigida pela liberdade civil. A liberdade reina na dimensão da Vontade Geral realizada em plenitude enquanto contrato social, uma associação civil, que se revela na obra do autor, como o ato voluntário em prol do bem comum. Segundo Rousseau, à vontade geral é o mecanismo que com base no contrato social, que coloca os diferentes interesses do povo em termos de igualdade, através das leis, visando sempre o bem comum. “Cada um de nós põe em comum sua pessoa e todo o seu poder sob o supremo comando da vontade geral e haverá de receber ainda cada membro como parte indivisível do todo (ROSSEAU, 2006; p. 23)”. 9 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 Não estamos pesquisando um conceito claro e bem definido, mas podemos supor que a Vontade Geral se trata de um consenso unânime de equidade de direitos. Objetiva sempre o bem comum. Seria a base de estrita reciprocidade de direitos e obrigações, por onde deve ser organizado todo sistema social. “Isso supõe, é verdade que todos os caracteres da vontade geral estão ainda na pluralidade; e quando cessarem de nela estar, seja qual for o partido que se tome, não haverá mais liberdade (ROUSSEAU 2006, p.125)”. É possível perceber que a Vontade Geral não é uma constante e que há variações, a lei da ordem pública nas assembleias consistiria em fazer com que esta vontade seja interrogada e respondida. A manifestação da vontade geral se faz através das leis, dando voz aos interesses comuns, exercida por meio da participação dos cidadãos nas deliberações. Quando uma lei é proposta na assembleia do povo, o que se pergunta não é precisamente se eles aprovam a proposição ou a rejeitam, mas se está ou não de acordo com a Vontade Geral, que é a deles. Cada um, ao dar seu voto, profere seu parecer a respeito e do cálculo dos votos se extrai a declaração da Vontade Geral. Quando, portanto a opinião contrária a minha vencer, isso não prova outra coisa senão que eu me enganei e que aquilo que eu imaginava ser a Vontade Geral não era. Se a minha opinião particular tivesse prevalecido, eu teria feito outra coisa em vez daquilo que eu queria e então, eu não teria sido livre (ROUSSEAU; 2006, p.124-125). Ressaltarmos que há diferenças no conceito de Vontade Geral, que se divide pelo menos três vezes: Vontade Particular, Vontade Corporativa e Vontade da Maioria. a) Vontade Particular: Corresponde aos interesses privados de cada indivíduo, que visa o proveito particular. b) Vontade Corporativa: Se trata dos interesses comuns de grupos particulares, mas, estranhos ao Estado, ou a maioria de fato. c) Vontade de todos ou da maioria: é o conceito que se alia a liberdade de todos contra todos, expressando a vontade de um rebanho. A aparente impossibilidade da proposta de Rousseau é fundamentada em uma lógica complexa. Explica o autor que, quando os interesses particulares principiam-se aos coletivos, o vínculo social afrouxa-se, enfraquecendo o Estado. Daí o destaque para a palavra “constante”, pois a vontade da maioria termina, muitas vezes, no contrário da vontade geral, fazendo o Estado agir contra a Vontade Geral. O que resulta na Vontade da Maioria não enquanto vontade geral, pois, do contrário, isso não aconteceria. Por isso, é que o Estado burguês não refletiria o bem comum, ou a Vontade Geral, mas, ideologicamente, a Vontade da Maioria manipulada. Rousseau admite a existência de interesses particulares e o predomínio destes em certas ocasiões, porém, os motivos secretos que guiam as decisões tornam o indivíduo um não cidadão. Colocações de caráter contraditório estão presentes em toda obra, o autor tem a contradição como característica marcante de seu trabalho (grifo nosso). Cria e destrói sua própria teoria, concorda e discorda de si mesmo. A Vontade Geral seria uma constante ou estaria em transformação? Seria um fator intrínseco aos indivíduos ou sofreria influência externa? 10 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 Um Estado assim governado necessita de bem poucas leis e, à medida que se torna necessário promulgar novas, essa necessidade é percebida por todos... O vício inerente ao corpo político tem-se, por assim dizer, dois Estados num só. O que não é verdade em relação a dois juntos é verdade para cada um separadamente (ROUSSEAU; 2006, p. 120). Ora, a base da teoria rousseauana é o Contrato Social, e tem como objetivo primordial o bem-estar geral, como já ressaltamos por vezes. Trata-se do direito e do dever de todos para com todos. “Os compromissos que nos ligam ao corpo civil só são obrigatórios porque são recíprocos e sua natureza é tal que, ao cumpri-los, não se pode trabalhar para os outros sem trabalhar também para si mesmo (ROUSSEAU, 2006; p. 41)”. Dessa maneira indivíduos tenderiam a apresentar tal vontade reta se vivenciassem o contrato social sob a luz de Rousseau. O que deixa implícita a impossibilidade de contradição na teoria da Vontade Geral quando a analisamos com base na Teoria do Corpo Político desenvolvida pelo autor. No entanto, sempre existe o perigo de a Vontade da Maioria não estar voltada para a Vontade Geral (em prol do bem público). O interesse privado não pode ser outro que não o coletivo (grifo nosso, o qual indica os cuidados com o conceito de Vontade Geral) os governantes não tem como agir contra o povo, justamente pela relação sistemática e orgânica estabelecida pela teoria do corpo político. Tacitamente, explícito no Contrato Social, está à força que mantém em vigor o acordo, trata-se da premissa de que: “quem se recusar a obedecer à vontade geral, a isso será obrigado por todo corpo”. Quem se recusar a obedecer á vontade geral a isso será obrigado por todo corpo, o que apenas significa que será forçado a ser livre. Porque essa é a condição que, ao dar ao cidadão à pátria, protege-o de toda a dependência pessoal, condição que promove o artifício e o jogo da máquina política que é a única a tornar legítimas as obrigações civis, as quais, sem isso, seriam absurdas, tirânicas e sujeitas aos maiores abusos (ROUSSEAU, 2006; p.27). Defende o autor que “Excetuando o bem particular, se quer o bem geral em seu próprio interesse, tão ardorosamente como qualquer outro (ROUSSEAU, 2006; p. 145)”. É a igualdade civil que lhe permite fazer esta afirmação. Isso abre espaço também, para que o Estado haja sempre em nome do bem comum quando a Vontade Geral não expressar isso e, sim, expressar uma Vontade da Maioria de cunho não coletivo. Nesse caso, haverá sempre diferença entre os termos. Assim, a vontade geral não é mais a vontade de todos, desde que os indivíduos não atribuam o valor preciso a seu voto de modo a interferir no bem coletivo por intermédio de seu interesse particular (grifo nosso). Nesse momento percebemos que no conceito vigora a melhor opinião, e esta vence através de disputas, debates, dissensões e, por muitas vezes, tumulto e elevação dos interesses. Só é possível um desejo ser totalmente contra a Vontade Geral se o indivíduo se encontra fora da associação. Uma vez fora do Estado acentua-se o bem particular e não o coletivo. Uma vez 11 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 dentro da associação, ainda que os desejos se mostrem divergentes, tem como objetivo o bem social e passa a compor a totalidade. Assim sendo, observamos que a Vontade Geral constrange a individualidade e faz com que, por intermédio da associação civil, os homens sigam uma mesma vontade que permita ao bem-estar coletivo perpetuar-se. Nesse sentido, a Vontade Geral é sempre reta, porque todos integram uma constante positiva. O corpo social não poderia desejar outra coisa que não fosse o seu próprio bem. A Vontade Geral é uma maioria que sabe o quer para o bem de todos e, a Vontade da Maioria seria uma maioria egóica, individualista. O que a nós parece, um simples jogo entre os termos, que produz um mesmo resultado. Esta liberdade moral positiva nos remete ao fato de que a obediência à Vontade Geral nada mais significa ou exige, que um esforço moral e civil diante de uma condição humana igualitária jurídica e politicamente. É possível compreender a Vontade Geral como um cálculo matemático-social, a soma das vontades particulares resulta em vontades coletivas por intermédio dos votos e, expressa na formulação das leis. Extrai-se das particularidades a Vontade Geral que, segundo Rousseau prevalece sempre e é contra a Vontade da Maioria, de cunho diverso ao bem comum. Assim, a Vontade Geral seria a vontade que domina em um tempo e espaço específico. Novas necessidades percebidas tornam obsoletas leis que foram desenvolvidas para seu suprimento. As leis se modificam de acordo com as necessidades inerentes em determinada sociedade, assim, torna-se necessário promulgar novas leis. Neste caso, a Vontade Geral seria guiada pela necessidade comum a determinados indivíduos. E a solução para o bem comum seria suprir o maior número de necessidades ou, a maior parte dos indivíduos que possuam tal necessidade. Os homens, iguais diante da lei, promovem certa solidariedade com relação aos direitos e deveres mútuos. Ora, como não relevar os direitos humanos? Por acaso as leis civis que impedem de alguma maneira, que o homem cometa atos prejudiciais a outros homens, diminui a liberdade? E mais, e diante de outros aspectos em que não incluem ameaças morais ou físicas, promovem-se os mesmos cuidados positivos? Rousseau alerta-nos que o uso da liberdade é protegido pela existência de limites (leis), e a resposta de tais questões complexas nos evidenciam o possível auxílio que os estudos referentes aos temas aqui propostos podem nos ofertar. O pensamento moderno é cheio de assertivas a cerca do direito, da liberdade e da igualdade entre os homens, principalmente associados os termos que propomos estudar neste trabalho às tendências democráticas da modernidade. Nesse cenário, destacamos algumas observações realizadas por Nietzsche no tocante as ideias da modernidade. Nietzsche é declaradamente antidemocrático, seu posicionamento é franco e evidente. É crítico do pensamento moderno e contra ideia de igualdade associada à tendência democrática 12 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 moderna. Assim, podemos incluir as contribuições que Nietzsche nos trás a respeito do pensamento de Rousseau. Rousseau, como vimos, é partidário do contrato social, da igualdade entre os homens perante a lei. Para Nietzsche as ideias de Rousseau estão equivocadas desde sua base. Perdoe este velho filósofo, que não pode resistir à maldade de pôr o dedo sobre artes-de-interpretações ruins: mas aquela “legalidade da natureza”, de que vós físicos falais com tanto orgulho, como se... – só subsiste graças a vossa interpretação e “filologia” ruim – não é nenhum estado de coisas, nenhum “texto”, mas somente um arranjo ingenuamente humanitário e uma distorção de sentido, com que dais plena satisfação aos instintos democráticos da alma moderna! “por toda parte igualdade diante da lei- nisso a natureza não está de outro modo nem melhor do que nós”: um maneiroso pensamento oculto, em que mais uma vez está disfarçada a plebeia hostilidade contra tudo o que é privilegiado e senhor de si, do mesmo modo que um segundo e mais refinado ateísmo. “Ni dieu, ni maître”- assim quereis vós também: e por isso, “viva a leis natural!”... (KSA 5.37, Para além de bem e mal, §22 (RRTF)). O filósofo procura demostrar à tendência ilógica de tratar o semelhante como igual, que propõem a lógica dos fundamentos da modernidade. Os mecanicistas se curvam ao impulso democrático da modernidade ao defenderem a existência de leis da natureza. Para Nietzsche, as leis, ou seja, o direto mantem as relações de forças e consequentemente a desigualdade, pois constituem graus de poder. Assim sendo, a desigualdade é a condição necessária para que o direito exista, já que um direito é sempre um privilégio. Eis um ponto contraditório da filosofia política rousseauniana. A desigualdade dos direitos é a primeira condição para que haja direitos. – Um direito é um privilégio. Em sua forma de ser, cada um tem também seu privilégio... Quanto mais elevada, mais dura se torna a vida... Uma civilização elevada é uma pirâmide: somente subsiste com uma base larga, sua condição primeira é uma mediocridade forte e sadiamente consolidada... A injustiça nunca está na desigualdade dos direitos, mas na reivindicação de direitos “iguais”... (O Anticristo, §57). A relação entre civilização e moralidade seria motivo destaque das análises de Nietzsche, que odeia a moralidade rousseauniana, segundo o autor, Rousseau, ao uniformizar sua moralidade determina uma concepção de igualdade astuta, eco da igualdade entre os homens perante Deus. O mesmo aconteceria com o conceito de liberdade vivido pelo ideário político postulado de doutrina moral que advém Rousseau, trata-se apenas de uniformização e nivelamento, mas não de “igualdade” em si, vai ressaltar Nietzsche. Esse é o principal argumento da crítica do autor a democracia moderna. Eu também falo em "retorno à natureza", apesar deste retorno não envolver propriamente um retrocesso, mas uma ascensão - ascender até a natureza e a naturalidade elevadas, livres, mesmo terríveis, uma tal que joga, que tem o direito de jogar com grandes tarefas... Para falar alegoricamente: Napoleão foi um exemplo de "retorno à natureza", tal como a compreendo (por exemplo, in rebus tacticis; ainda mais, como sabem os militares, 13 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 estrategicamente). – Mas Rousseau: para onde queria propriamente retornar? Rousseau, este primeiro homem moderno, idealista e canalha em uma única pessoa; que tinha a necessidade da "dignidade" moral, para perseverar em seu próprio aspecto; doente de uma vaidade e de um autodesprezo desenfreados. Também este aborto, que se alocou em meio ao umbral do novo tempo, queria o "retorno à natureza" - para onde, uma vez mais indago, Rousseau queria retornar? Eu odeio Rousseau ainda na revolução: ele é a expressão históricomundial para esta dualidade de idealista e canalha. A farsa sanguinária, com a qual esta revolução transcorreu, sua "imoralidade", não me importa muito: o que odeio é a sua moralidade rousseauniana - as assim chamadas "verdades" da revolução, com as quais ela sempre ainda produz efeito e convence tudo o que há de raso e mediano para si. A doutrina da igualdade!... Mas não há nenhum veneno mais venenoso: pois ele parece estar sendo pregado pela própria justiça, enquanto é o fim da justiça... "Aos iguais algo igual, aos desiguais algo desigual - este seria o verdadeiro discurso da justiça: e, o que segue daí, nunca tornar igual o desigual". - O fato das coisas terem girado em torno daquela doutrina da igualdade de maneira tão terrível e sangrenta entregou a esta "ideia moderna" por excelência uma espécie de glória e uma aparência de chama, de modo que a revolução enquanto peça teatral seduziu mesmo os espíritos mais nobres. Isto não é por fim nenhum motivo para apreciá-la mais... Crepúsculo dos ídolos: Incursões de um Extemporâneo, §48.). Como vemos, a relação entre civilização e moralidade seria motivo de destaque na análise de Nietzsche, no que diz respeito ideia de igualdade associada à tendência democrática moderna, o autor combate essa ideia de igualdade, suas colocações contra Rousseau advêm justamente da doutrina propagada pelo filósofo contratualista da igualdade civil, que pretende promover o retorno ao estado natural. Para Nietzsche, Rousseau teria se equivocado ao estabelecer erroneamente a relação entre causa e efeito, entre a civilização e a moralidade. A “boa moralidade” é para Nietzsche a responsável pelo caráter decadente de nossa civilização. Se é verdade que nossa civilização é, por si mesma, algo de deplorável, vocês têm a possibilidade de prosseguir com suas conclusões com Rousseau: “Esta civilização deplorável é causa de nossa má moralidade”, ou de concluir invertendo a fórmula de Rousseau: “Nossa boa moralidade é causa desta deplorável civilização”. Nossos conceitos sociais do bem e do mal, fracos e efeminados, sua desmesurada preponderância sobre o corpo e a alma, acabaram por enfraquecer todos os corpos e todas as almas e por alquebrar os homens independentes, autônomos, sem preconceitos, os verdadeiros pilares de uma civilização forte: em toda parte onde ainda hoje encontramos a má moralidade, vemos as últimas ruínas desses pilares.” Há, portanto, paradoxo contra paradoxo! A verdade não pode estar, a qualquer preço, dos dois lados: estará ela em geral de um lado ou de outro? Convém examinar! (Aurora, §163). É da ideia do evitar confrontos, é da ação insidiosa e da preservação a qualquer preço da própria existência, que nascem as ideias modernas e suas estratégias, segundo Nietzsche. Rousseau propõe a uniformidade a sua moralidade, precisamente um nivelamento gregário, que contribuiu fortemente para da Revolução Francesa. O que soaria mais cristão do que Liberdade, Igualdade e Fraternidade? Nietzsche assume por moralidade a doutrina da igualdade, que promove sedução aos 14 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 “espíritos medíocres” e mina a crença na hierarquia. Na medida em que se abandona a preocupação com a hierarquia, tem-se que abrir mão das diferenciações. (ANSELL-PEARSON, 1992). Liberdade é parte de um ideário político, doutrina moral. “Conceberam os homens como livres”, logo, a noção de vontade livre é inventada, pela casta sacerdotal, pelo ideário da cristandade aristocrática guerreira, o motivo para isso? Tornar os homens culpados e obter o direito de afligir lhes punições, essa é a concepção nietzschiana. Como se os homens tivessem possibilidade de escolher, colocou-se a vontade livre como algo que se poderia adquirir, associado a essa ideia, o filósofo coloca a noção de livre-arbítrio, que encarnou a ideia de que caberia a coletividade permitir aos homens fazerem suas escolhas escolhendo as convenções, assim mantinham o seu lugar na organização social (MARTON, 1990). Assim, o que vemos é a coletividade jugando o comportamento dos homens, a noção do livre-arbítrio deu aos homens a cresça de que agem e pensam livremente, quando obedecem a regras sociais [regras que os próprios homens colocam para si, de acordo com o pensamento de Rousseau]. Ressalta Nietzsche, trata-se de um exílio voluntário o tão rebuscado discurso de Rousseau sobre a Associação Civil e Corpo Político. Estamos diante do “Animal de Rebanho” do “Animal Gregário” Nietzschiano. Crítica da noção advinda da pregação cristã, de que todos os homens são irmão, filhos do mesmo pai criador. Nietzsche demonstra extremo desprezo à imposição do que é uniforme, e critica a democratização, o socialismo, o anarquismo, pois os avalia nesses termos de valores. Todas essas propostas de estrutura política seriam fruto das ideias modernas de nivelamento, assim como, a Revolução Francesa, feita para se exigir e impor agregariedade, como ferramenta continuadora das ideias do cristianismo. O foco da crítica de Nietzsche é a análise dos valores, base pela qual toma todas as demais estruturas. Em Marx, a base de análise é diferente, mas obter possíveis relações e discordâncias entre as duas concepções (Nietzsche e Marx), com relação os temas abordados, é válido. Diferentemente de Nietzsche que toma suas análises sob os aspectos dos valores, em Marx, toda problemática da Liberdade, da Vontade Geral, da Democracia, dentre outras questões da modernidade, são tomadas sob interpretação politicista por grande parte dos marxistas, principalmente pelos que seguiram as vias de um socialismo democrático. Mas, vale ressaltar que, para Marx, a dimensão política não é o componente essencial, ou um princípio de inteligibilidade e de estruturação da sociedade. O Estado não funda a sociedade enquanto sociedade, ele não é essencial e não é parte ineliminável na sociedade. Ele, o Estado, não é para Marx um instrumento necessário e fundamental para a eliminação das desigualdades sociais. Nesse sentido, Marx, não seria nem contra e nem a favor da democracia, pois não estaria em busca de uma forma possível e Estado. 15 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 Pois bem, o ser social de Marx possui seu fundamento ontológico no trabalho, o que também submete todas as demais formas de sociabilidade, uma vez que, o trabalho é o fator de transformação da natureza para a criação de bens à subsistência dos homens. O fundamento ontológico e metodológico de Marx é a base para que se possam compreender todas as suas propostas, incluindo as com relação ao Estado e da Democracia. Para o autor o Estado tem sua origem na existência da propriedade privada e das classes sociais. Seguindo os preceitos de Marx, conclui-se que a democracia enquanto forma política, nada mais é do que expressão de uma determinada forma de trabalho. Assim sendo, não podemos desconectar do capital a democracia na sua forma moderna. Nas minhas pesquisas cheguei à conclusão de que as relações jurídicas – assim como as formas de Estado – não podem ser compreendidas por si mesmas, nem pela dita evolução geral do espírito humano, inserindo-se pelo contrário nas condições materiais de existência de que Hegel, à semelhança dos ingleses e franceses do século XVIII, compreende o conjunto pela designação de ‘sociedade civil’; por seu lado, a anatomia da sociedade civil deve ser procurada na economia política. [...] A conclusão geral a que cheguei e que, uma vez adquirida, serviu de fio condutor dos meus estudos, pode formular-se resumidamente assim: na produção social da sua existência, os homens estabelecem relações determinadas, necessárias, independentes da sua vontade, relações de produção que correspondem a um determinado grau de desenvolvimento das forças produtivas materiais. O conjunto destas relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base concreta sobre a qual correspondem determinadas formas de consciência social (MARX in: Crítica da Economia Política, 1973, p.28). No mundo moderno a forma especifica de trabalho que funda o capitalismo é a relação capital-trabalho que, por sua vez, se põe sob as mais variadas formas, requerendo necessariamente uma forma política de garanta sua reprodução social, ou seja, que mantenha o trabalhador como trabalhador assalariado e o capitalista como detentor dos meios de produção, essa forma politica é a democracia e o meio é o Estado para Marx. “A existência do Estado e a existência da escravidão são inseparáveis” para Marx, em Glosas críticas ao artigo o rei da Prússia e a Reforma Social, p.81. Ora, a base do conjunto de objetivações democráticas segue os mesmos preceitos do contrato de trabalho, que pro sua vez serve para a manutenção capitalista. Um contrato de trabalho carrega em si o momento da desigualdade real e a igualdade formal, um contrato assim exige para sua efetivação que ambas as partes sejam livres, iguais e proprietárias. A justiça e a política colocam os homens em estado de igualdade, e estes “não são coagidos a realizarem o contrato”, por isso, livres. Iguais, porque a troca é equivalente e ambos são proprietários, um da força de trabalho e outro das forças produtivas e capital. A sociedade capitalista considera nas suas mais favoráveis condições de desenvolvimento, oferece-nos uma democracia mais ou menos completa na República democrática. Mas, essa democracia é sempre comprimida no 16 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 quadro estreito da exploração capitalista; no fundo, ela não passa nunca da democracia de uma minoria, das classes possuidoras, dos ricos. A liberdade na sociedade capitalista continua sempre a ser, mias ou menos, o que foi nas Repúblicas da Grécia antiga: uma liberdade de senhores fundada na escravidão (LENIN in: O Estado e a Revolução, 1978, p.107). A consolidação e a expansão do Capitalismo estão intimamente ligadas ao ambiente democrático, que por sua vez carrega também contradições, nesse sentido a democracia passa a ser mais ampla ou mais restrita. A democracia seria para Marx a expressão formal do conteúdo da desigualdade gerada pela relação capital-trabalho, sendo a mesma, forma de perpetuação das desigualdades sociais e sua reprodução. O que observamos em Marx é a preocupação com a origem, com a natureza, com a função social e os limites do pensamento democrático, que estamos estudando desde início deste trabalho com base no pensamento de Rousseau. O discurso contratualista pode ser entendido com base no pensamento marxiano, como podemos ver. A democracia no sentido que estamos vendo aqui é uma forma de liberdade moderna necessariamente limitada, isso se deve a propriedade privada, raiz da desigualdade. A existência da propriedade privada necessariamente nos remete a existência da exploração do homem pelo homem, e a consequência necessária para isso é a impossibilidade enfrentada pelos homens de serem efetivamente livres, ainda que se pense no domínio da maioria sobre a minoria, a democracia sempre será uma forma limitada de liberdade, que pode ser ampliada, mas nunca integralizada em sua totalidade. Liberdade plena estaria no domínio livre e consciente, coletivo e universal do processo de produção e, a partir dele, sobre o conjunto do processo social. O objetivo é a eliminação da exploração do homem pelo homem, cuja última forma, é o capitalismo para Marx. Somente quando o homem individual recupera em si o cidadão abstrato e se converte, como homem individual, em ser genérico, em seu trabalho individual e em suas relações individuais; somente quando o homem tenha reconhecido e organizado suas “forces propres” como forças sócias e quando, portanto, já não separa de si a força social sob forma de força política, então somente se processa a emancipação humana (Marx in: A QUESTÂO JUDAICA; 1991,p.52). Obviamente a liberdade de Marx é para além da democrática, sendo sua forma mais plena, que implicada também, para além do trabalho associado como sua base material. A liberdade nesse domínio (do trabalho associado, I.T) só pode constituir nisto: o homem social, os produtores associados regulam racionalmente o intercambio material com a natureza, controlam-no coletivamente, sem deixar que ele seja a força cega que os domina; efetuando-nos com o menor dispêndio de energias e nas condições mais adequadas e mais condignas com a natureza humana. Mas, esse esforço situar-se-á sempre no reino da necessidade. E a condição fundamental desse desenvolvimento humano é a redução da jornada de trabalho (MARX, O Capital, 1974, p. 942). 17 18 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 A Marx interessa pensar uma forma de sociabilidade em que os homens possam ser plenamente livres e não penas mais livres. O que ocorre no pensamento de Rousseau é justamente a impossibilidade de se ser completamente livre, nas bases rousseauniana só existe a possibilidade de ser mais livre, mas, jamais, completamente livre. Os discursos democráticos do livre, não livres, ou do mais livre também têm sido assistidos atualmente. Considerando a importância e o impacto que o trabalho de Amartya Sen atualmente conquistou em seu livro Desenvolvimento como Liberdade, observamos que, o que pesamos ser parte obsoleta e ultrapassada do pensamento de Rousseau, produto da crítica de Nietzsche e Marx que resumimos muito rapidamente neste trabalho, ainda vive no pensamento filosófico-políticoeconômico atual, se tem posto como tentativa de manutenção da democracia e da humanização do capital. Laureado com o Prêmio de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel de 1998, o economista indiano afirma logo no prefácio da edição brasileira lançada em 2000 de “Desenvolvimento como Liberdade”, que: Vivemos em um mundo de opulência sem precedentes, mas também privação e opressão extraordinárias. O desenvolvimento consiste eliminação de privações de liberdade que limitam as escolhas e oportunidades das pessoas de exercer ponderadamente sua condição cidadão. de na as de De acordo com os conceitos de Sen, o desenvolvimento econômico é um processo de expansão das liberdades reais. O mundo que vivemos é um mundo de riquezas, magnificiência, de classes abastadas, de produção abundante, mas, há persistência de pobreza e de necessidades essenciais não supridas. De acordo com o autor o quadro é mais devasto que o previsto, e ameaçam a sustentabilidade de nossa vida econômica e social, seja em países ricos ou pobres, em maior ou menor grau. A teoria proposta pelo autor busca o reconhecimento do papel de diferentes formas de liberdade no combate dos males econômicos e sociais estudados pelo autor na obra. Os indivíduos são agentes centrais para que as mudanças ocorram, porém, o autor chama a atenção para uma questão relevante, em que a condição de agente de cada um é restrita e limitada pelas oportunidades sociais, politicas e econômicas que dipõem cada um dos indivíduos. Na perspectiva é acentuada a complementaridade entre as condições de agente individual e as disposições sociais, o que coloca em evidência sua concepção de reconhecimento e centralidade da liberdade individual e da força das influências sociais sobre o grau e alcance desta liberdade. A liberdade individual para autor é um comprometimento social. A obra trás a expansão das mais variadas formas e sistemas de liberdade como principal fim e meio de desenvolvimento individual e coletivo. Para o autor, “o desenvolvimento consiste na A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 eliminação de privações de liberdade que limitam as escolhas e as oportunidades das pessoas de exercer ponderadamente sua condição de agente [Introdução]”. A eliminação das privações de liberdade substanciais é para o autor, constitutiva de desenvolvimento. “A importância intrinseca da liberdade humana em geral. Como bem objetivo supremo do desenvolvimento, é acentuadamente suplementado pela eficácia instrumental de liberdades espeicíficas na promoção de liberdades de outros tipos”. Assim, assume-se na teoria que liberdades econômicas e políticas reforçam-se mutuamente. O mesmo ocorre com oportunidades sociais de educação e assistência médica, que complementam oportunidades individuais de participação econômica e política. Esse jogo é o que dá força para as iniciativas em vencer as privações, é na identificação dessas inter-relações, entre certos tipos de liberdade como: oportunidades econômicas, liberdades políticas, facilidades sociais, garantias de transparência e segurança protetora, que a obra de Amartya Sen salienta a necessidade de uma análise integrada das atividades econômicas, sociais e politicas, envolvendo-se nesta multiplicidade de instituições relacionamdo-se de forma interativa. O livro baseia-se em cinco conferências realizadas pelo economista, como presidente do Banco Mundial em 1996. Trata-se de uma obra geral sobre desenvolvimento e as razões práticas que o fundamentam, e tem objetivo principal a discussão pública. Pois bem, assistimos por parte de Sen uma tentaiva de humanização da economia com objetivo de desenvolvimento humano, ou seja, o autor tenta remontar a relação do homem atual com a liberdade e a desigualdade. O que permite o autor “preferir” o governo democrático ao autoritário, por simplesmente diminuir os graus de desigualdade, mas não eliminá-la. A liberdade que autor defende passa pelo desenvolvimento como fim e como meio, e desenvolvimento de todo tipo, econômico e o humano inclusive. Defender diferentes tipos liberdades, o permite afirmar que “a natureza da liberdade possue muitos aspectos”, e que não há contradição em afirmar que alguns países possuem mais liberdades que outros e que indivíduos são amsi livres que outros. Ou seja, a proposta mais evidente da teoria do Sen é manter a liberdade desigual, que assina seus primórdios na antiguidade e ganha corpo estrutural na teoria de Rousseau, já que se assumem diferentes tipos de liberdades interligadas, relacionando-se entre si, todo tempo. Para o autor, questionar se há ou não liberdade, não é a pergunta certa a ser feita na atual conjuntura, pois liberdade não é uma questão de “zeros e uns”, então, assim sendo, atemo-nos a “melhor liberdade” como estrátégia mais viável nos ofertada pelo sistema capitalista desde seu inicio, até os dias de hoje. A porposta de desenvolvemto de Sen visa o aumento dos recursos humanos a serviço do capital, é otimização, manutenção e aumento do capital humano a serviço do próprio capital. Por isso, sua visão de liberdade é com base em opulencias. CONSIDERAÇÕES FINAIS 19 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 Muitos estudiosos investiram no conceito de Liberdade e em investigar os mecanismos que regem a sociedade como a Vontade Geral de Rousseau. Investir nos temas ainda é propício, dentro e fora da academia. Se o máximo que se pode pensar atualmente é na possibilidade de livre-arbítrio, liberdade é algo que jogamos para o idealismo mais que abstrato, torna-se inatingível enquanto ideal real nos moldes atuais, como os defendidos por Sen. A existência de defesas de sistemas de liberdades, ou seja, a existência de vários tipos de liberdade presentes no mundo democrático-capitalista atual, como faz Amartya Sen, relaciona-se com toda a filosofia desenvolvida por Rousseau. A ordem, as leis, os órgãos de controle do Estado, a forma política democrática e participativa proposta enquanto questão social que vimos Rousseau serve a Sen, quase três séculos depois, e servem para o desenvolvimento teórico das formas de controle social da nossa atualidade. Pode-se dizer que Sen, defende o passado, o presente e o futuro com as mesmas bases metodológicas e filosóficas propostas pelo ideário rousseauniano, e ainda é possível relacioná-lo há outra série de pensadores do mesmo período, ou anterior ou posterior a ele. É certo que as percepções a cerca do tema aqui trabalhados, por si, não satisfazem, como na maioria dos sistemas políticos e econômicos, deixou-se de prezar pelo conceito de liberdade e seus efeitos práticos, liberdade é um mero tópico citado em diálogos econômicos como os de Sen, reduzindo ainda mais a percepção das sociedades capitalistas em relação ao seu próprio sistema que os escraviza. A melhor liberdade ou o mínimo de liberdade, não é liberdade. Talvez seja mais precisa a conclusão a cerca do que não é liberdade, do que formular proposições a cerca do ela é. Ora Marx descreve que a liberdade plena estaria no domínio livre e consciente, coletivo e universal do processo de produção e, a partir dele, sobre o conjunto do processo social. O objetivo é a eliminação da exploração do homem pelo homem, cuja última forma é o capitalismo. Assim, pensar em capitalismo junto à liberdade é pensar como Amartya Sen. É pressupor a não superação do capital e da democracia, uma vez que, a consolidação e a expansão do Capitalismo estão intimamente ligadas ao ambiente democrático, e o contrário também é verdadeiro. Sen, aposta na dilatação das formas e da sensação democrática por parte do oprimido, são formulações feitas para se exigir e impor agregariedade, impor o que é uniforme e não igualdade de fato, como vista na crítica nietzscheana. É prorrogar, implantar e fazer crescer a noção do livrearbítrio nos homens, e a cresça de que agem e pensam livremente, quando obedecem a uma minoria. A desigualdade ainda é a condição necessária para que o direito exista, o Estado exista, o Capital exista. Observamos que toda a proposta de liberdade gerada atualmente, destacando a de 20 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 Sen, utilizada aqui, não passa de uniformização e nivelamento, mas não de “igualdade” em si, como nos ressaltou o pensamento de Nietzsche. Liberdade é exílio voluntário? É ordem a si mesmo prescrita? Por ventura, é a ONU quem no responderá isso? BIBLIOGRAFIA ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. 2a ed. São Paulo: Mestre Jou, 1982. ANSELL-PEARSON, K. Nietzsche contra Rousseau: A Study of Nietzsche’s Moral and Political Thought. Cambridge University Press, 1996. ARISTÓTELES. Política. Os Pensadores. São Paulo, Nova Cultura, 1999. BLACKBUM, Simon. Dicionário Oxford de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,1997. CHAUÍ, Marilena. Espinosa: Uma Filosofia Da Liberdade, Editora Moderna: 1999. CASSIRER, Ernest. 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São Paulo: Nova Cultural, 1999 (Coleção Os Pensadores). OMNES, Roland. Filosofia da Ciência Contemporânea. São Paulo, UNESP, 1996. PLATÃO. Os Pensadores. São Paulo, Nova Cultura, 1999. ROUSSEU, Jean-Jaques. O Contrato Social. São Paulo, Escala Educacional: 2006. ___________________; Discurso sobre a Origem da Desigualdade entre os Homens. São Paulo, Nova Cultural, 1999 (Coleção Os Pensadores). RUBY, Christian. Introdução À Filosofia Política. São Paulo, UNESP: 1998. 22 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 23 SEN, Amartya Kumar. Desenvolvimento Como Liberdade. São Paulo, Companhia das Letras: 2000. SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia Do Trabalho Científico. São Paulo, Cortez: 2007. WEBER, Tadeu. Hegel: Liberdade, Estado E História. Rio de Janeiro, Vozes: 1993. WOLLMANN, S. O Conceito de Liberdade no Leviatã de Hobbes. Porto Alegre, Edipucrs: 1994. WRIGHT, Ernest Hunter, The Meaning of Rousseau. London: Oxford University Press, 1929. GUILLERM, A. e BOURDET, Y. Autogestão: Uma Mudança Radical. Rio de Janeiro, Zahar, 1976. VIANA, Nildo. O Pensamento Político de Rousseau. In: BARBOSA, Walmir (org.). Estado e Poder Político – Do Pragmatismo Político à Ideia de Contrato Social. Goiânia, Ed. da UCG, 2005. 2. Síntese dos resultados obtidos Produção técnica e científica Quantidade Tipo Produto tecnológico* Processo ou técnica* Software Cartas, mapas e similares Desenvolvimento de material instrucional Maquete Curso de curta duração ministrado Manutenção de obra artística Editoração Organização de evento Relatório de pesquisa Trabalhos técnicos Outros (especificar) didático ou 4 (dois) 4 (dois) 2° Participação I Simpósio de Pesquisa do Publicação de Artigo nos anais do Simpósio Grande ABC. de Pesquisa do Grande ABC Monitoria de Filosofia I, II e III Formação de recursos humanos Tipo Quantidade Alunos de Aperfeiçoamento ou Especialização Alunos de Graduação/Iniciação Científica 1 (um) Orientação concluída Tipo Monografia de conclusão curso de aperfeiçoamento especialização Trabalho de iniciação científica Trabalho de conclusão de curso de graduação Quantidade ou 1 (um) 2 (um) A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 2.1. BENS PATRIMONIÁVEIS: Os livros listados abaixo foram adquiridos de Sebos e livrarias, para a formação de uma biblioteca pessoal. ABBAGNANO,Nicola. Dicionário de Filosofia, São Paulo: Mestre Jou, 1982. BLACKBURN, Simon. Dicionário Oxford de Filosofia, Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997. ARISTÓTELES. Obras Incompletas. Coleção Os Pensadores, Nova Cultural, São Paulo, 1999. FERRATER MORA, José: Diccionario de Filosofía, Madrid, Alianza, 1979. HOBBES, Thomas. Leviatã ou Matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil. 2 ed. São Paulo: Abril cultural, 1979. (Coleção Os Pesadores). MARX, Karl. Obras Incompletas. Coleção Os Pensadores, Nova Cultural, São Paulo, 1999. MONTESQUIEU, Charles Louis de Secondat; Do Espírito Das Leis. Trad. Fernando Herique Cardoso e Leôncio Martins Rodrigues. Coleção Os Pensadores. 3 ed. Abril Cultural, São Paulo: 1985. MILL, Stuart. Ensaio Sobre Liberdade. São Paulo: Escala. NIETZSCHE, Friedrich. Obras Incompletas. Coleção Os Pensadores, Nova Cultural, São Paulo, 1999. OMNES, Roland. Filosofia da ciência Contemporânea. São Paulo, UNESP, 1996 PLATÃO. Diálogos. Coleção Os Pensadores, Nova Cultural, São Paulo, 1999. ROUSSEU, Jean-Jaques; O Contrato Social. Trad. Ciro Mioranza. Série Filosofar. Escala Educacional. São Paulo: 2006. ROUSSEAU, Discurso sobre a origem da desigualdade entre os homens, (1753). São Paulo, Nova Cultural, 1999 (Coleção Os Pensadores). SEN, Amartya Kumar. Desenvolvimento Como Liberdade. Trad. Laura Teixeira Motta; Rev. Téc. Ricardo Doniselli Mendes. Companhia das Letras. São Paulo: 2000. VOLTAIRE, François Marie Arouet de, Cartas Inglesas; Tratado de Metafísica; Dicionário Filosófico; O Filósofo Ignorante; 2 ed. São Paulo: Abril cultural, 1978. (Coleção Os Pesadores). 24 A LIBERDADE E A VONTADE GERAL DE ROUSSEAU - Amanda França - 2012 25 3. Impactos e utilidade dos resultados obtidos. Econômico: Responder a uma reflexão sobre o conceito de liberdade também nos remete a situação econômica. Na teoria de Rousseau a propriedade privada dá inicio ao Estado e suas formas tal como nos são apresentados hoje. Social: Promover dimensões da Associação Civil nos dias de hoje é um exercício preciso. A idéia é articular o tema “liberdade” conceitualmente em trono de certas bases da Filosofia Política Rousseau. Ainda hoje a noção de liberdade é anunciada comumente em seu núcleo, no pensamento moral, os sistemas cognitivos do homem até então buscam uma concepção universal do tema. Visamos à diminuição das inúmeras colocações empíricas sobre o que venha ser liberdade, ou como e quando um indivíduo é realmente livre. Ambiental: Quando conhecemos melhor certas dimensões da vida humana, passamos atuar de maneira mais inteligente no ambiente que vivemos. De certo que os conceitos de liberdade muito se relacionam com as questões ambientais. Saber o que e como somos livres, nos traz a possibilidade de não interferir de forma destrutiva ou desmedida no ambiente em suas mais variadas esferas. Científico: Temos como objetivo também, a publicação de um artigo relacionado ao tema, até o final deste projeto, a partir de um trabalho monográfico. Cremos que com tempo e recursos conseguiremos este feito, com melhor qualidade escrita e teórica. 3.1. Dificuldades encontradas/sugestões Os prazos de entrega de livros e outros materiais da Biblioteca da Fundação Santo André para os alunos em iniciação científica deveriam ser maiores. O sistema de renovação poderia ser feito pela internet. 3.2. Perspectivas Cremos responder a demanda criada pelos dois pré-projetos apresentados de maneira satisfatória. Local e data: Santo André 14 de Dezembro de 2012 Assinaturas: Responsável pelo projeto (Nome e assinatura) Pró-Reitor de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão