o
Pró-Reitoria de Graduação
Curso de Direito
Trabalho de Conclusão de Curso
RELEVÂNCIA DA IMUNIDADE DIPLOMÁTICA
Autora: Clarissa Zaidan Mourão de Oliveira
Orientador (a): Msc. Antônio Paulo Cachapuz de Medeiros
Brasília – DF
2012
CLARISSA ZAIDAN MOURÃO DE OLIVEIRA
RELEVÂNCIA DA IMUNIDADE DIPLOMÁTICA
Monografia apresentada ao curso de
graduação em Direito da Universidade
Católica de Brasília, como requisito parcial
para obtenção do Título de Bacharel em
Direito.
Orientador:
Msc.
Cachapuz de Medeiros
Brasília
2012
Antônio
Paulo
Monografia de autoria de Clarissa Zaidan Mourão de Oliveira, intitulada
―RELEVÂNCIA DA IMUNIDADE DIPLOMÁTICA‖, apresentada como requisito parcial
para obtenção do grau de Bacharel em Direito da Universidade Católica de Brasília,
defendida e aprovada em ____/____/ 2012, pela banca examinadora abaixo
assinada:
__________________________________________
Prof. Antônio Paulo Cachapuz de Medeiros
Orientador
Direito - UCB
__________________________________________
(Examinador)
__________________________________________
(Examinador)
Brasília
2012
Dedico este trabalho a Deus, Fiel e
Cuidadoso. Aos meus pais, Maria Teresa
e Alexandre, meu alicerce, meu orgulho. À
minha irmã e amiga, Isabela. Ao Marcelo
pela compreensão. Aos professores pelo
conhecimento transmitido. A todos os
meus amigos e colegas que juntos,
estivemos ajudando uns aos outros.
AGRADECIMENTOS
Um trabalho de conclusão de curso nunca é uma produção individual. A sua
criação envolve a participação direta ou indireta de muitas pessoas, e hoje agradeço
a todas elas. Aqui está o meu agradecimento especial.
A Deus, por estar sempre me iluminando e me ajudando a continuar.
Ao meu caro orientador, Professor Antônio Paulo Cachapuz de Medeiros,
pelo incentivo, pela experiência e grande conhecimento. Meu profundo respeito e um
grande obrigada diante de todo o aprendizado.
À Professora Luciana Mees, por estar sempre à disposição para retirar
qualquer dúvida, e sempre com uma grande compreensão. Obrigada.
Aos demais professores pelo auxílio e carinho.
A minha amada mãe por estar sempre ao meu lado me apoiando e
dedicando seu tempo. És digna de todo reconhecimento!
Aos meus amados pai e irmã, pelo grande suporte e incentivo, que fizeram
grande diferença na concretização deste trabalho. Muito obrigada.
Ao Marcelo pela compreensão e carinho. Seu suporte foi essencial.
A tantos outros que de certa forma me auxiliaram e torceram por mim.
A perfeição da própria conduta consiste
em manter cada uma sua dignidade sem
prejudicar a liberdade alheia. Voltaire
RESUMO
DE OLIVEIRA, Clarissa Zaidan Mourão. Relevância da Imunidade Diplomática.
2012. 73f. Trabalho de conclusão de curso (Graduação) – Faculdade de Direito,
Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2012.
O presente trabalho teve como linha mestra a abordagem sistemática do conjunto de
imunidades, garantias e privilégios confiados aos agentes diplomáticos sediados em
países estrangeiros, no exercício de suas funções, bem como as peculiaridades
inerentes ao cargo em questão. As relações internacionais sempre se fizeram
presentes nas civilizações, principalmente a partir da formação dos Estados
soberanos, quando se destacou a importância da instituição diplomática em caráter
permanente. Apresenta, ainda, as principais teorias e fundamentos jurídicos que
vêm a regulamentar o propalado instituto em seus variados aspectos, situações e
características. Finalizando com uma explanação detalhada de suas relevâncias,
assim como de abusos cometidos quando no uso de um suposto privilégio
diplomático, elencamos alguns casos que pudessem ilustrar a intrincada e suscetível
teia das relações entre representações de países fora de seus limites territoriais.
Contudo, o filão a que se ateve o direcionamento do presente trabalho foram
estudos direcionados na demonstração da necessidade dessas prerrogativas, as
quais têm o fito de aplainar o terreno das conversações e resoluções pacíficas entre
as nações. O presente texto teve como base de estudo a Convenção de Viena sobre
Relações Diplomáticas.
Palavras-chave:
Imunidades
diplomáticas;
Relevância;
Internacionais; Convenção de Viena; Democracia.
Estados;
Relações
ABSTRACT
DE OLIVEIRA, Clarissa Zaidan Mourão. The Relevance of Diplomatic Immunity.
2012. 73f. Trabalho de conclusão de curso (Graduação) – Faculdade de Direito,
Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2012.
This work was as line teacher the systematic approach of the set of immunities,
guarantees and privileges assigned to diplomatic agents based in foreign countries,
in the exercise of their functions, as well as the peculiarities of the post in question.
International relations have always been present in civilizations, mainly from the
formation of the sovereign States, when stressed the importance of diplomatic
institution on a permanent basis. It also presents the main theories and legal
foundations that comes to regulate the vaunted institute in its various aspects,
situations and characteristics. Finishing with a detailed explanation of its own, as well
as abuses when in the use of a supposed diplomatic privilege, we highlight some
cases that could illustrate the intricate and susceptible web of relations between
representations of countries outside of their territorial limits. However, the seam that
is abided by the direction of this work were directed studies in the demonstration of
need these privileges, which has the fit planning the terrain of talks and peaceful
resolutions among the nations. This text was used as a basis to study the Vienna
Convention on Diplomatic Relations.
Keywords: Diplomatic Immunities; Relevance; States; International Relations;
Vienna Convention; Democracy.
Sumário
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 10
CAPÍTULO I – A BASE DAS IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS .................................. 13
1. BREVES NOÇÕES HISTÓRICAS ...................................................................... 13
2. CORPO DA MISSÃO DIPLOMÁTICA................................................................. 19
2.1
O CHEFE DA MISSÃO ................................................................................ 21
CAPÍTULO II – IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS ....................................................... 25
3. AS IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS .................................................................... 25
3.1
INVIOLABILIDADE PESSOAL E DOMICILIAR ............................................ 29
3.2
IMUNIDADE JURISDICIONAL ..................................................................... 33
3.2.1
A IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO PENAL .............................................. 40
3.2.2
A IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO CIVIL ................................................. 42
3.2.3
A IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO EM MATÉRIA TRABALHISTA .......... 44
3.3
ISENÇÃO FISCAL........................................................................................ 47
3.4
EXCEÇÕES PARA A QUEBRA DA IMUNIDADE ........................................ 49
CAPÍTULO III – ABUSO E RENÚNCIA DAS IMUNIDADES ..................................... 50
4. O ABUSO DA IMUNIDADE DIPLOMÁTICA ....................................................... 50
5. RENÚNCIA ......................................................................................................... 52
CAPÍTULO IV – A RELEVÊNCIA DAS IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS ................... 56
6. IMPORTÂNCIA DOS PRIVILÉGIOS E IMUNIDADES ........................................ 56
7. CASOS RELEVANTES....................................................................................... 61
8. CONCLUSÃO ..................................................................................................... 66
9. REFERÊNCIAS .................................................................................................. 70
10
INTRODUÇÃO
A necessidade de se estabelecer relações entre os diferentes sujeitos de
Direito Internacional existe desde tempos remotos1, pois havia a carência de
regulamentar as relações existentes entre os povos e as sociedades, dentre elas, as
relações econômicas, políticas, religiosas, militares e outras. Buscava-se o
progresso da sociedade.
As relações entre os Estados são variadas e incluem, entre outros aspectos, o
estabelecimento de missões diplomáticas, a negociação e celebração de tratados
internacionais e, também, a visita de representantes estatais a fim de tratar de
assuntos de interesse comum.
Diante disso, cada Estado possui representantes que, com a competência
necessária, resolverão qualquer questão no âmbito externo, respeitando sempre as
normas e cultura pertinentes ao Estado onde desempenham suas funções.
A norma internacional vem, até os dias de hoje, ganhando novos contornos e
evoluindo passo a passo, acompanhando o desenvolvimento da sociedade que, a
cada, dia mostra uma necessidade diferente, uma lacuna a ser preenchida.
Reconhecendo sempre o princípio da igualdade jurídica dos Estados, que é o
caráter de regra internacional fundamental, a nossa Constituição no artigo 4°, inciso
V, preza a igualdade entre os Estados como princípio norteador para as relações
diplomáticas.
Partindo do preceito que os Estados não estão sós, no plano internacional,
temos empresas, organismos e sociedades internacionais e, a mais recente, que
seria a pessoa humana como objeto do Direito Público, que acarretam uma série de
deveres e direitos entre os Estados.2
1
ALEJANDRO J. Rodríguez Carrión. Leciones de Derecho Internacional Público, Madrid: Tecnos,
2002, pág. 353, ―en cualquiera de los modelos históricos de sociedad internacional, y no importa el
punto de arranque que se establezca en el nacimiento del Derecho internacional, ha existido
permanentemente la necesidad de relacionarse los diferentes sujetos de dich Derecho. La necesidad
ha sido tan sentida y, con frecuencia, de tal envergadura que posiblemente puede afirmarse que la
regulación de estas relaciones constituye no sólo la primera, en el tiempo, institución de Derecho
internacional sino que, más aún, puede señalarse igualmente como la institución más acabada y
perfilada de dicho ordenamiento‖
2
VIEIRA, Roberto D‘Oliveira. Artigo, A Necessidade de Revisão do Antigo Conceito de
Soberania. p. 2
11
A presente monografia vem tratar das imunidades e seus privilégios e da sua
grande importância para as relações no mundo, sendo que com o intuito de evitar
que regras diplomáticas entrem em conflito ficou acordado que haveria uma norma
maior hierarquicamente, surgindo, então, o tratado de direito internacional que é a
Carta das Nações Unidas.3
De início, o estudo incidirá sobre um breve embasamento histórico,
mostrando como e porque houve a necessidade da criação ou, melhor dizendo, da
efetivação das missões diplomáticas; analisará também a imunidade que alcança as
suas funções e o que a fez desenvolver-se e tornar-se um regime institucionalizado,
tal qual nos dias de hoje; abordará, ainda, os privilégios e imunidades do corpo
diplomático os quais têm por objetivo garantir o desempenho de suas funções,
diante da grande massa de relações diplomáticas entre os países,
Em um segundo momento, discorrerá sobre o assunto como um todo,
tratando as imunidades penais que são absolutas e não podem ser renunciadas,
bem como as civis, que não são absolutas, tendo suas exceções. Serão vistos os
abusos que podem ocorrer relativos à imunidade, diante do aumento das missões
diplomáticas, os grandes conflitos que daí surgem e como podem ser resolvidos;
quais as posições tomadas constantes na jurisprudência. Trataremos ainda da
grande importância desses privilégios para que as missões possam ser
desenvolvidas da melhor forma possível, bem como, para que leis muito diferentes
do país de origem do chefe de estado não o alcancem de forma punitiva.
Para finalizar, em um terceiro momento, a explanação de casos e decisões
concretas do dia-a-dia da atividade diplomática no mundo, que ocorreram nos
últimos tempos, as quais, sem a imunidade e os privilégios, poderiam ter se tornado
um grande problema para as relações internacionais. Vendo que por mais perfeita e
evoluída a norma internacional à procura da paz, haverá sempre alguma
interpretação equivocada, mas que, com o uso da diplomacia, pode e deve ser
resolvida.
Os privilégios e as imunidades andam lado a lado com a missão diplomática
com a finalidade de facilitar, de proporcionar um livre caminho para o exercício da
mesma, sendo que, tais atributos são dados à função e não ao indivíduo. No
3
ARTIGO 103 - No caso de conflito entre as obrigações dos Membros das Nações Unidas, em
virtude da presente Carta e as obrigações resultantes de qualquer outro acordo internacional,
prevalecerão as obrigações assumidas em virtude da presente Carta. Carta das Nações Unidas,
1945.
12
entanto, quando o funcionário estrangeiro faz uso impróprio de suas prerrogativas,
tal situação pode gerar pequenos atritos diplomáticos.
Portanto, vários doutrinadores, buscam conceitos acerca da segurança
dessas prerrogativas, investigam entendimentos, e se são corretamente aplicadas.
Mas tendo sempre em mente que há uma necessidade irrenunciável acerca das
imunidades e privilégios diplomáticos
O presente trabalho, busca apresentar o quão importante é a relevância das
imunidades, como meio de expandir as relações internacionais, solidificando o
entendimento de que essas prerrogativas são delegadas em função de garantir,
conforme já mencionado, a necessária independência para a execução dos seus
deveres oficiais, defendendo, por conseguinte, o interesse recíproco dos Estados.
13
CAPÍTULO I – A BASE DAS IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS
1.
BREVES NOÇÕES HISTÓRICAS
Como rudimento de uma solução diplomática para a manutenção da paz
entre fronteiras de civilizações antigas, temos o enlace do faraó Amenófis III com
uma princesa da terra de Mittani. Tal mulher, que mostrou possuir personalidade
marcante, tendo inclusive governado o Egito, por um breve período de tempo,
quando da morte de seu primogênito, era filha de um povo dominado, mas galgou o
mais alto degrau para uma mulher na estrutura social egípcia. A razão para ter sido
aceita como esposa real do faraó numa época em que estes só se casavam com as
próprias irmãs, foi por causa da posição geográfica estratégica daquele país, o qual
servia como ―escudo‖ para uma possível invasão dos hititas ou do povo da
Babilônia.
A primeira celebração de um ato diplomático que se tem notificado foi
realizada entre o Rei dos Hititas, Hattusil III e o Faraó Ramsés II, por volta de 1280 e
1272 a.C., que deu fim à guerra nas terras sírias, que na obra de Mazzuoli, cita-se
K.A. Kitchen, ao transcrever um pequeno trecho do acordo de paz, ex vi:
―No ano 21, primeiro mês do inverno, dia 21, sob a Majestade de Ramsés II.
Neste dia, eis que Sua Majestade estava na cidade de Pi-Ramese,
satisfazendo (os deuses...). Chegaram os (três Enviados Reais do Egito...)
junto com o primeiro e o segundo enviados Reais dos Hititas, Tili-Teshub e
Ramose, e o Enviado de Carchemish, Yapusili, carregando uma barra de
prata a qual o Grande Soberano dos Hititas, Hattusil III envia ao Faraó, para
pedir paz à Majestade de Ramsés
A partir desse dia, Hattusil, o grande chefe de Hatti, fez um tratado para
assegurar que a situação criada por Fra e pelo deus da tempestade
(Sutekh) para o país Egito com o país Hatti, de modo que nunca mais
existam hostilidades entre eles
O grande rei, o rei do país do Egito, não deve atacar jamais ao país Hitita
para se apoderar de uma parte (deste país). E Hattusili, o grande rei, o rei
do país Hitita, não deve atacar jamais ao país do Egito para se apoderar de
uma parte (deste país).
Se um inimigo estrangeiro marcha contra o país Hitita e se Hattusili, o rei do
país Hitita envia-me esta mensagem: "Vêem em minha ajuda contra ele",
Reamasesa, mai-Amana, o grande rei, o rei do país egípcio, tem que enviar
suas tropas e suas carroças a matar a este inimigo e a dar satisfação ao
14
país Hitita. Se um estrangeiro marcha contra o país do Egito e se
Reamasesa, o grande rei, o rei do país do Egito, teu irmão, envia a Hattusili,
o rei do país Hitita, a mensagem seguinte: "Vêem em minha ajuda contra
ele", então Hattusili, rei do país Hitita, deve enviar suas tropas e suas
carroças e matar a meu inimigo.
Se um homem ou dois fogem e vêm para o país Hatti para ser servidores de
outro, não serão desejados no país Hatti e serão enviados a Ramsés, o
4
grande soberano do Egito.‖
Demonstrar de forma histórica a diplomacia seria transcrever o quanto esta é
antiga e podemos ver que desde os primórdios ocorreram vários atos diplomáticos,
que foram evoluindo com o passar dos séculos, pois o mundo vivia em constante
guerra, seja por terra, honra ou família e vivia diante de uma grande sede de
conquista e egoísmo. Então, com a transformação das sociedades, surgiu a
necessidade de institucionalizar as relações entre grandes potências para que
pudesse haver uma regulamentação acerca da convivência e para a sobrevivência.
Após a 1ª Guerra Mundial coexistiam duas teorias sobre a imunidade estatal
nas jurisdições estrangeiras: a da imunidade absoluta e a da imunidade
restrita, ou relativa, que concedia imunidade aos Estados em relação a seus
atos soberanos ou públicos (jus imperii), mas recusava o privilégio a seus
atos privados ou comerciais (jus gestionis).
Esta segunda teoria foi ganhando terreno, suplantou a teoria clássica da
5
imunidade absoluta, que praticamente não mais influencia o direito atual.
Segundo Soder (1998):
Na seqüência, as Relações Internacionais perfilam em certos
entrosamentos, que decorrem dos atos das guerras, das religiões e dos
exercícios de comércio, motivando etapa singular de inter-relacionamentos,
mantidos posteriormente entre as civilizações e as convivências de seus
povos, quando tratados e acordos eventualmente iam sendo firmados,
culminando na formação do direito das gentes, vale dizer, no direito dos
povos, ou direito das nações, representando, por outro lado, relações de
poder e de conquistas dominantes dessas épocas, assinaladas por grandes
6
e curiosos impérios.
A origem da imunidade diplomática está na autonomia e na garantia de poder
exercer as suas funções tendo, inclusive, como intenção secundária, evitar uma
possível morte.
4
Tratado assinado para garantir a paz e a fraternidade onde o rei hitita, Hattousil III, mandou
emissários até Ramsés II. Relatando a missão diplomática. K. A. Kitchen. Paraoh Triumphant: The
Life and Times of Ramesses II, 2ª Ed. Cairo, Egypt American University in Cairo Press (ET all).,
1997, p. 75.
5
DOLINGER, Jacob. A Imunidade Jurisdicional dos Estados. Revista de Informação Legislativa,
ano 19, n. 76, out./dez. 1982, p. 10.
6
SODER, José. História do Direito Internacional. Frederico Westphalen: Ed. da Uri, 1998. P.29.
15
A história das imunidades e dos privilégios possui grande importância para a
articulação de novos rumos para as imunidades internacionais.
Sérgio Eduardo Moreira de Lima, citando Ragmar Numelin, disse:
Povos primitivos, apesar de seu nível elementar de desenvolvimento social,
teriam concebido procedimentos costumeiros aplicáveis a situações de
guerra sobre comércio entre comunidades, bem como ao envio de
mensageiros que conduziam negócios e eram reconhecidos como titulares
7
de liberdade de movimento e imunidade pessoal
Ainda Sérgio Eduardo Moreira de Lima:
A proteção de que gozava o emissário decorria de fatores religiosos e da
identidade que, então, prevalecia entre o poder temporal e o poder divino. O
enviado era considerado protegido pelos deuses, os quais, no entanto, nem
sempre exerciam sua proteção, de modo a evitar a prisão desses valiosos
8
reféns.
Imbuídos, inicialmente, de caráter religioso, foram, através dos tempos,
absorvidos pelo direito consuetudinário e por acordos bilaterais, até serem,
mais recentemente, incorporados a convenções internacionais e à
legislação de número crescente de países. Essenciais à condução das
relações entre Estados, essas prerrogativas permitem a seus
representantes exercer suas funções no Estado acreditado livres de
pressões locais. Podem eles, assim, comunicar-se com seus próprios
governos, negociar em seu nome, representá-los e defender seus
interesses nacionais de forma independente das autoridades do Estado que
9
os recebe.‖
Seguindo o princípio da igualdade, entendia-se que uma lei ditada por um
soberano não podia ser aplicada a outro soberano nem em seu representante direto.
O Direito das Gentes quer que os príncipes enviem embaixadores, e a
razão derivada da natureza das coisas não permite que estes dependam do
soberano ante o qual são acreditados, nem de seus tribunais. Eles são a
palavra do príncipe que os envia e tal palavra deve ser livre; nenhum
obstáculo deve impedir-lhes da ação. Por falar como pessoas
independentes, podem muitas vezes desagradar; poderia imputar-lhes
crimes se fosse permitido prende-lhes por dívida. Um príncipe, naturalmente
altivo, falaria assim pela boca de pessoas sujeitas a temer por tudo. É
necessário, portanto, recorrer com respeito aos embaixadores a razoes
emanadas do Direito das Gentes e não as regras de direito político. Se
abusam de seu caráter representativo, se deve dar por terminada sua
missão e despedi-lhes; também os pode acusar ante seu amo a fim de que
10
atuem como juízes ou cúmplice.
7
Moreira Lima, Sérgio Eduardo. Privilégios e Imunidades Diplomáticos, 2002,p.35
Moreira Lima, Sérgio Eduardo. Privilégios e Imunidades Diplomáticos, 2002,p.35
9
MOREIRA LIMA, op. cit., p.9.
10
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Brasília: Universidade de Brasília, 1982, livro XXVI,
cap.XXI).
8
16
Hildebrando Accioly, diz que ―no velho testamento, lê-se que David rei de
Judá e de Israel, fez guerra ao Ammonitas, porque estes prenderam e maltrataram
os embaixadores ou emissários que ele enviara ao rei Hanon‖ 11
Guido Soares, citando Harold Nicholson, disse:
Os embaixadores eram considerados protegidos pelo deus Hermes
(Mercúrio), que nem sempre exercia sua proteção de modo a evitar a prisão
de excelentes reféns que tais. (...). De igual forma, o proxena grego,
cidadão influente escolhido para representar o interesse dos estrangeiros
frente aos tribunais e autoridades locais (antecedente do moderno Cônsul),
certamente deveria ter algum privilégio que lhe possibilitasse e facilitasse a
missão de representar aqueles que têm a fala rouquenha.
Os representantes eram os grandes porta-vozes, frente às ―vozes concordes‖
da comunidade. ‖12 ―Às vezes estes enviados eram excelentes reféns, pois seu
resgate era sempre um preço alto a ser pago pelos governantes ou pelos chefes de
exércitos em confronto‖. 13
Na concepção medieval, o embaixador não é somente o representante dos
interesses específicos e exclusivos de um determinado potentado, mas
também dos interesses gerais da coletividade: gerencia um múnus publicum
14
do mais amplo corpo político.
A igreja Católica possuía a mais ampla imunidade diante todos os tribunais
locais. Possuía também um direito próprio, tribunal próprio. Seus templos, cemitérios
e outros locais dedicados ao culto, eram imunes à legislação local, tanto assim que
podiam dar asilo a pessoas perseguidas por autoridades legais.15
Imbuídos, inicialmente, de caráter religioso, foram, através dos tempos,
absorvidos pelo direito consuetudinário e por acordos bilaterais, até serem,
mais recentemente, incorporados a convenções internacionais e
à
legislação de número crescente de países. Essenciais à condução das
relações entre Estados, essas prerrogativas permitem a seus
representantes exercer suas funções no Estado acreditado livres de
pressões locais. Podem eles, assim, comunicar-se com seus próprios
governos, negociar em seu nome, representá-los e defender seus
11
ACCIOLY, Hildebrando. Tratado de Direito Internacional Público. 2. Ed. Rio de Janeiro: IBGE,
Serviço Gráfico, 1956, vol. I, p. 465.
12
Soares, Guido Fernando Silva. Das Imunidades de Jurisdição e de Execução. Rio de Janeiro
Forense, 1984,p. 2-3.
13
SOARES SILVA, G., F., Órgãos dos Estados nas Relações Internacionais: Formas da
Diplomacia e as Imunidades, Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 13.
14
BELLINI, V., Note Storico–Giuridiche Sulla Evoluzione Della Diplomazia Permanente, Milano:
ISPI, 1968, p. 10.
15
Soares, Guidos Fernando Silva. Das Imunidades de Jurisdição e de Execução. Rio de Janeiro:
Forense, 1984, p.3
17
interesses nacionais de forma independente das autoridades do Estado que
16
os recebe.
Com o desígnio de abranger todas as necessidades que, com o passar dos
séculos, começaram a existir, foi decidida a regulamentação de uma norma que viria
para concretizar as relações e missões diplomáticas no mundo. O surgimento da
Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas em 1961, fez com que normas
passadas ficassem superadas. As primeiras missões diplomáticas nasceram na
Itália, na metade do século XV, onde houve a consolidação de institutos como o uso
de embaixadas.
A Convenção de Viena de 1961 sobre Relações Diplomáticas tende a
estabelecer um justo equilíbrio entre duas normas contrapostas exigentes: de um
lado, aquela do Estado que envia; do outro, aquela do Estado que recebe.17
Atualmente existem duas convenções que estão em vigência, que é a
Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas de 1961 e a Convenção de Viena
sobre Relações Consulares de 1963, visando abranger todas as necessidades do
mundo moderno. Hoje, a quase totalidade dos Estados da comunidade internacional
é parte da citada Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas.18
As funções pertinentes às missões diplomáticas são bastante complexas, já
que envolvem relações entre países, o que, por si só, as torna, sob certo aspecto,
complicadas e delicadas. Ante a necessidade de uma regulamentação acerca das
funções das missões diplomáticas, foram estas elencadas no artigo 3° da
Convenção de Viena sobre as Relações Diplomáticas. Neste artigo foram
discriminados elementos criteriosos acerca das funções, quais sejam: a)
representação; b) proteção; c) informação; d) promoção; e) negociação. Com todos
esses elementos tornou-se possível a concepção da atividade diplomática como um
instituto de direito internacional, com normas que vieram facilitar o intercâmbio
político, comercial e social entre as diversas nações do mundo.
A representação é a finalidade da diplomacia, que seria o ato de agir, ao invés
de, ou em substituição a, pondera-se logo, sem o envolvimento, a responsabilidade
jurídica, ou seja, a atuação, nas mais diversas circunstâncias em nome do Estado
donde provém.
16
MOREIRA LIMA, op. cit., p.9.
Rocco, Vincenzo Sicari. O Direito das Relações Diplomáticas, Belo horizonte, 2007, p. 42
18
181 Países ratificaram a Convenção de Viena de 1961 sobre Relações Diplomáticas até o ano de
2002.
17
18
A informação, como explica a Convenção de Viena sobre relações
diplomáticas, no seu artigo 3.º, alínea, d, ―inteirar-se por todos os meios lícitos das
condições existentes e da evolução dos acontecimentos no Estado receptor e
informar a esse respeito o Governo do Estado acreditante‖, constitui uma das
fundamentais atividades do agente diplomático.
A negociação ocorre pelo fato de o agente diplomático se concentrar em
realizar atos de interesse comum, chegar a algum acordo acerca de algum problema
específico.
A promoção é a forma de estimular a atividade diplomática, a qual intensifica
a representação, incrementando negociações, procurando desenvolver as relações
entre Estados em todos os seus aspectos.
A proteção, que é o objeto de pesquisa deste trabalho, refere-se à que
protege os interesses do Estado acreditante. Cabe ressaltar que tal proteção é
obrigatória mesmo em caso de conflito armado ou de rompimento das relações
diplomáticas.
As denominadas missões especiais se referem às viagens oficiais do Chefe
de Estado19 ao exterior, para abordar temas referentes à nação de origem.
No Brasil foi graças a Alexandre de Gusmão, Duarte da Ponte Ribeiro e ao
Barão Do Rio Branco, que fomos reconhecidos pelos países vizinhos, o que foi de
suma importância na emancipação política do país, fazendo com que o Brasil ficasse
par e passo com o desenvolvimento das demais nações20. Como exemplo de um ato
diplomático temos o Tratado de Tordesilhas21.
19
Como ressalta Celso de Albuquerque Mello, ―o chefe de Estado goza de imunidade em virtude de
seu aspecto representativo. Ora, nós já vimos que os Estados gozam de igualdade jurídica, devendose aplicar o adágio ‗par in parem non habet judicium‘. O mesmo raciocínio podemos aplicar em
relação ao chefe do Estado, que é um órgão do Estado. Além desta razão jurídica, existem
considerações de ordem prática, como a conveniência, a reciprocidade e o desejo de se evitar
conflitos internacionais. Podemos acrescentar que as imunidades e privilégios concedidos ao chefe
de Estado e sua família têm também por fundamento ‗garantir o desempenho de sua funções‘. A
extensão desses privilégios e imunidades à comitiva do chefe de Estado é que pode ser considerada
como tendo a sua origem em uma ‗comitas gentium‘, a não ser que consideremos a comitiva como
equiparada ao ‗pessoal técnico e administrativo‘ da Missão Diplomática e, em consequência, tendo
também o fundamento dos seus privilégios e imunidades na necessidade de ‗garantir o desempenho
de suas funções‘‖. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 11.
ed. Rio de Janeiro: Renovar, v. 2, 1997, p. 1179.
20
P.B. CASELLA, Direito Internacional dos Espaços (São Paulo: Atlas, 2009, esp. Cap. XXVIII,
―fases da formação do território brasileiro: algumas lições de direito internacional‖, p. 756-776.
21
Que, em uma breve explicação, foi um tratado firmado entre Portugal e Espanha, para dividir e
evitar brigas entre as terras descobertas e as que ainda estavam por descobrir. A divisão foi feita pelo
papa em 1494.
19
O Brasil foi o primeiro país sul-americano a possuir Embaixadas. Coube ao
Barão do Rio Branco realizar as negociações que culminaram na abertura de nossa
Embaixada em Washington em 1903 e cujo primeiro titular foi o Embaixador
Joaquim Nabuco. Só muito mais tarde foram abertas Embaixadas em Paris (1919),
Londres (1920), Lisboa (1921) e Buenos Aires (1923).22
Representar o Brasil perante a comunidade de nações; colher as
informações necessárias à formulação da política externa; participar de
reuniões internacionais e, nelas, negociar em nome do país; assistir às
missões no exterior; proteger os compatriotas e promover a cultura e os
valores do povo brasileiro. Com esse mister, tratam dos assuntos mais
diversos. Desde paz e segurança até normas de comércio e relações
econômicas e financeiras, direitos humanos, meio ambiente, tráfico de
drogas e fluxos migratórios, passando, naturalmente, por tudo que diga
respeito ao fortalecimento dos laços de amizade e cooperação do Brasil
23
com seus parceiros externos.
A busca pela paz tornou-se o interesse mais importante entre as nações.
2.
CORPO DA MISSÃO DIPLOMÁTICA
O corpo da Missão Diplomática é formado por chefe da missão e membros da
missão, assim elenca o artigo 1° da Convenção de Viena sobre Relações
Diplomáticas:
Para os efeitos da presente Convenção:
a) "Chefe de Missão" é a pessoa encarregada pelo Estado acreditante de
agir nessa qualidade;
b) "Membros da Missão" são o Chefe da Missão e os membros do pessoal
da Missão;
c) "Membros do Pessoal da Missão" são os membros do pessoal
diplomático, do pessoal administrativo e técnico e do pessoal de serviço da
Missão;
d) "Membros do Pessoal Diplomático" são os membros do pessoal da
Missão que tiverem a qualidade de diplomata;
e) "Agente Diplomático" é o Chefe da Missão ou um membro do pessoal
diplomático da Missão;
22
G.E NASCIMENTO E SILVA. A Missão Diplomática, Rio de Janeiro: Editora Americana, 1971, p.
82-83
23
Instituto Rio Branco. Perguntas freqüentes. Disponível em:
<http://www.institutoriobranco.mre.gov.br/pt-br/perguntas_freq%C3%BCentes.xml>. Acesso em: 23
out. 2012.
20
f) "Membros do Pessoal Administrativo e Técnico" são os membros do
pessoal da Missão empregados no serviço administrativo e técnico da
Missão;
g) "Membros do Pessoal de Serviço" são os membros do pessoal da
Missão empregados no serviço doméstico da Missão;
h) "Criado particular" é a pessoa do serviço doméstico de um membro da
Missão que não seja empregado do Estado acreditante,
i) "Locais da Missão" são os edifícios, ou parte dos edifícios, e terrenos
anexos, seja quem for o seu proprietário, utilizados para as finalidades da
Missão inclusive a residência do Chefe da Missão.
A Convenção de Viena prevê expressamente em seu artigo 9º, que a pessoa
enviada ao Estado acreditante para exercer função na missão diplomática, pode ser
considerada persona non grata pelo Estado Acreditado, fazendo com que a pessoa
não seja aceita pela missão, tendo que ser retirada do país. O Estado possui o
direito de previamente não aceitar a pessoa destinada a tal cargo, e possui também
o direito de não prestar esclarecimentos, mas o que ocorre é que os Estados
normalmente prestam esclarecimentos, prezando as boas maneiras e, sejam
aqueles positivos ou negativos, é passado ao Estado estrangeiro o que lhe interessa
saber.
Artigo 4° da Convenção de Viena de 1961:
1. O Estado acreditante deverá certificar-se de que a pessoa que pretende
nomear como Chefe da Missão perante o Estado acreditado obteve
o Agrément do referido Estado.
2. O Estado acreditado não está obrigado a dar ao Estado acreditante às
razões da negação do "agrément".
Para Hildebrando Accioly:
Antes de efetuada a nomeação, o governo que resolve acreditar um agente
diplomático junto a outro governo deve solicitar desde a aceitação da
pessoa escolhida, ou, antes, deve informar-se confidencialmente, junto a
esse governo, sobre se tal pessoa será como se costuma dizer, persona
24
grata, como representante diplomático.
Já a Convenção de Havana de 1928, também sobre os funcionários
diplomatas, elenca em seu artigo 2º: 25
24
ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 1972.
p.128.
25
Estimando que uma convenção internacional sobre relações, privilégios e imunidades diplomáticas
contribuirá para o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações, independentemente da
diversidade dos seus regimes constitucionais e sociais; CONVENÇÃO DE HAVANA SOBRE
FUNCIONÁRIOS DIPLOMÁTICOS.
21
Os funcionários diplomáticos dividem-se em ordinários e extraordinários.
São considerados ordinários os que representam de maneira permanente o
Governo de um Estado perante o outro. "São extraordinários os
encarregados de Missão Especial, ou os que se acreditam para representar
o Governo em conferências, congressos ou outros organismos
internacionais.
Por isso a necessidade de entender cada categoria, mostrando qual a sua
função, o que possui de direito e quais seus deveres, mostrando o que a faz ser
hierarquicamente superior ou inferior a outra, para que no desenvolvimento das
missões não haja dúvidas ou problemas a serem enfrentados.
A base para as imunidades investidas às autoridades é dupla, pois, gozam da
imunidade por seu caráter representativo estatal, diante da necessidade de respeito
às ações soberanas estrangeiras e gozam também, pois necessitam garantir o
desempenho de suas funções, estando em território estrangeiro
2.1
O CHEFE DA MISSÃO
O direito de legação ativa é o direito de o Estado enviar para outros Estados
os
seus
representantes
diplomáticos.26
Mas
esse
direito
fica
sujeito
ao
reconhecimento pelos outros Estados soberanos.27
O Chefe de Missão28 diplomática é o agente de maior importância no corpo
diplomático, sendo o superior hierárquico de todos os membros da missão .29 Ele
representa o Estado juntamente com a soberania local.
Geralmente o Chefe de Missão30 é nomeado pelo Chefe de Estado, que
possui a qualidade de comunicar aos demais Estados seus respectivos
representantes.
26
SOARES, Albino de Azevedo. Lições de Direito Internacional Público. 4 ed. Coimbra: Coimbra
Editora Limitada, 1988, p. 361
27
VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Público. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 302.
28
O Chefe de Missão Diplomática permanente é a mais alta autoridade brasileira no país junto a cujo
o
Governo está acreditado. Artigo 43 da LEI N 7.501, DE 27 DE JUNHO DE 1986.
29
G. E. do Nascimento e Silva, Paulo Borda Casella e Olavo de Oliveira Bittencourt Neto. Direito
Internacional Diplomático. Convenção de Viena sobre relações diplomáticas na teoria e na prática,
p 223 e 225.
22
Cabe ao respectivo Estado comunicar aos demais Estados o nome do
indivíduo ou indivíduos, que revestem a qualidade de Chefe da Missão.
Diante do artigo 14 da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas os
Chefes da Missão são divididos em três classes: a) Embaixadores ou Núncios
acreditados perante Chefes de Estado, e outros Chefes de Missões de categoria
equivalente; b) Enviados, Ministro ou Internúncios, acreditados perante Chefe de
Estado; c) Encarregados de Negócios, acreditados perante Ministros das Relações
Exteriores.
O Estado pode negar e não conceder o agrément, ou já tendo concedido,
requerer a sua retirada. Nenhum Estado seria capaz de proceder e enviar um Chefe
de Missão sem requerer essa formalidade de aceitação. Isso se dá pelo fato de ser
contraditório, um Estado ter a obrigação de receber em seu país um indivíduo
malquisto.
Artigo 4° da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas elenca:
1. O Estado acreditante deverá certificar-se de que a pessoa que pretende
nomear como Chefe da Missão perante o Estado acreditado obteve
o Agrément do referido Estado.
2. O Estado acreditado não está obrigado a dar ao Estado acreditante às
razões da negação do "agrémen".
Disse Valério de Oliveira Mazzuoli, ―os Chefes de Estado são os responsáveis
pela mais alta direção dos negócios públicos nacionais, assim como pela dinâmica
das relações internacionais dos Estados que representam‖. 31
Os Chefes de Estados são os organizadores das relações internacionais do
Estado, devendo respeitar suas atribuições determinadas pelo direito interno.
Para o completo e perfeito funcionamento da missão diplomática, é
necessária a administração externa de funcionários especialmente treinados para a
30
No Brasil, segundo parágrafo único do artigo 44 da LEI No 7.501, DE 27 DE JUNHO DE 1986,
Excepcionalmente, poderá ser designado para exercer a função de Chefe de Missão Diplomática
permanente brasileiro nato, não pertencente aos quadros do Ministério das Relações Exteriores,
maior de 35 (trinta e cinco) anos, de reconhecido mérito e com relevantes serviços prestados ao país.
31
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 5ª Ed. São Paulo. 2011.
P.5583.
31
BONFILS, apud, Franco Filho, Georgenor de Sousa, op. cit., p.30
23
realização das funções, dada a sua complexidade.32 Suas funções e competências
são regidas pela Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, de 1961.
Ensina Guido Soares, ―e o agente do Estado frente aos órgãos de outras
pessoas de direito internacional clássico, com as funções clássicas de representá-lo,
negociar em seu nome e informar-se de assuntos que lhe dizem respeito‖ 33
Com esses agentes surgem também os atos diplomáticos, já transformados
em verdadeiras normas de conduta, que, caso violadas, acarretam grande
responsabilidade internacional para o Estado.
O parágrafo 2° do mesmo artigo mostra que as principais diferenças entre
Embaixadores e Ministros são de ordem protocolar. [...] A única diferença seria no
que concerne à precedência e etiqueta. [...] Trata-se de um artigo redundante, cuja
abolição se justificaria, pois pode ser tratada como uma repetição do artigo 18 da
mesma Convenção.
Um agente neste posto comanda a missão com plenos poderes, podendo
exercer a função também por tempo indeterminado.
Como afirma Oppenheim:
As razões pelas quais estes privilégios devem ser outorgados radicam em
que os enviados diplomáticos são representantes de seus Estados e da
dignidade destes ademais de não poder exercer suas funções
adequadamente se não desfrutam de semelhantes privilégios. Resulta obvio
que, se estivessem sujeitos a interferências comuns de ordem política ou
jurídica como qualquer outro indivíduo, e conseqüentemente fosse mais ou
menos dependentes da boa vontade do governo, ficariam sujeitos a serem
influenciados por considerações de ordem pessoal relativas à sua
segurança ou comodidade, a um gral tal, que materialmente lhes dificultaria
o exercício pleno de suas funções. É igualmente claro que se em sua
relação livre e plena com seus Estados, através de cartas, telegramas e
correios, estivessem sujeitos a interferências, os objetivos de sua missão
não poderiam ser cumpridos. Neste caso lhes resultaria impossível o envio
de informações independentes e secretas a seus Estados, e o recibo de
instruções similares de seus próprios países. Da consideração destas e
várias outras razões análogas, seus privilégios parecem ser atributos
34
inseparáveis da existência mesma dos enviados diplomáticos.
Com o passar dos séculos a imunidade do representante diplomático, deixou
de ser um atributo pessoal e passou a ser concedida em favor de resguardar a
função pública do agente. Passou a ser transferida da pessoa para a função
exercida, acompanhando a evolução, isso devido a que entre os Estados existiam
32
Cf. Raoul Genet. Traité de Diplomatie Et de Diplomatique, Tome I, cit., PP. 75-98.
Guido Fernando Silva Soares. Das imunidades de Jurisdição e de Execução, cit., p. 45.
34
OPPENHEIM, L. op. cit., p. 706.
33
24
várias tradições jurídicas diferentes, que nem sempre concordavam entre si e havia
uma necessidade da harmonia jurídica entre as nações, de estabilidade
internacional.35
Segundo Brownlie, Quando devidamente autorizados, entrar no território de
outro Estado e aí agir na sua capacidade oficial.36
Na Convenção de Viena sobre a Representação dos Estados, o seu artigo 30,
prevê para o Chefe da Missão e para os membros do pessoal diplomático da
Missão, ampla imunidade penal e civil, com suas exceções.
35
Sérgio Eduardo. Privilégios e Imunidades Diplomáticas. Brasília: Instituto Rio Branco: Fundação
Alexandre Gusmão, 2002. P. 33.
36
Ian Brownlie. Princípios de Direito Internacional Público, cit., p. 343. V. ainda, Dinh, Daillier &
Pellet, Direito internacional púplico, cit., PP. 461-464.
25
CAPÍTULO II – IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS
3.
AS IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS
As imunidades oferecem uma proteção integral ao representante do Estado
estrangeiro, seja em tempo de paz ou de guerra, que esteja atuando em nome de
seu Estado originário. Consiste basicamente na não-submissão a determinadas
normas.37
No dicionário acerca da imunidade:
Imunidade (latim immunitas, -atis) s. f.
1. Isenção de encargos, privilégio.
2. Prerrogativa de que gozam os membros de um Parlamento durante o
exercício do seu cargo.
3. [Biologia, Medicina] Propriedade de um organismo vivo de estar isento de
38
uma determinada doença.
As imunidades são, de fato, bastante antigas. De acordo com Celso de
Albuquerque Mello:
As imunidades e privilégios diplomáticos existem desde a Antiguidade,
quando os agentes diplomáticos se revestiam de um aspecto sagrado.
Em Roma, a violação de embaixadores romanos era dos motivos que
39
tornavam uma guerra justa.
Antigamente as imunidades eram baseadas na presunção de que um império
não possuía poder sobre o outro, teoria muito utilizada perante os tribunais do
século passado, o princípio par in parem non habet imperium vel judicium, ou seja,
no princípio da igualdade soberana das nações.40
37
CIAVARELI, Miguel Angelo Nogueira dos Santos. Imunidade Jurídica: Penais, Processuais,
Diplomáticas, Parlamentares. – São Paulo: Editora Juarez de Oliveira. 2003. p.117.
38
DICIONÁRIO PORTUGUÊS ONLINE. Imunidade. Disponível em:
<http://www.dicio.com.br/imunidade/>. Acesso em: 23 out. 2012.
39
. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 11 ed. Rio de
Janeiro: Renovar, v. 2, 1997, p. 1210
40
VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Público. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 312.
26
Nos tempos atuais, o móvel da necessidade de conceder ao agente a
imunidade é o fato de ele estar investido de uma condição funcional, necessitando,
para tanto, de um espaço jurídico e político que possibilite a sua atuação, em
segurança, no território estrangeiro.41
A imunidade diplomática é regulamentada pela Convenção de Viena sobre
Relações Diplomáticas (CVRD), sendo esta um tratado que foi elaborado pela
Conferência das Nações Unidas sobre relações e imunidades diplomáticas, em 18
de abril de 1961, no palácio Hofburg, em Viena, Áustria. Ela foi recepcionada, quatro
anos depois, no Brasil, no dia 8 de junho de 1965 por meio do Decreto nº 56.435,
visando tratar das relações diplomáticas entre os Estados, seus direitos e deveres,
bem como dispondo sobre os privilégios e imunidades dos membros das missões
diplomáticas. Hoje, aproximadamente, 150 países a seguem.
Conforme parte do preâmbulo da Convenção de Viena sobre Relações
Diplomáticas ―Reconhecendo que a finalidade de tais privilégios e imunidades não é
beneficiar indivíduos, mas, sim, a de garantir o eficaz desempenho das funções das
Missões diplomáticas, em seu caráter de representantes dos Estados‖
―A imunidade protege os diplomatas para que possam exercer suas funções
livremente sem o medo de serem intimidados por estarem em outro Estado, em um
país diferente‖, explica Pablo Sukienniek. 42
Concede-se a proteção no que se refere às imunidades e privilégios,
somente no âmbito exterior, não em seus Estados de origem onde, claramente, não
necessitariam dessa forma de auxílio.
A Imunidade é considerada um conditio sine qua non, para o relacionamento
dos Estados, desde suas origens.43 Conforme Montesquieu, os embaixadores
"representam a palavra do príncipe que os envia, e esta palavra deve ser livre.
Nenhum obstáculo deve obstar-lhes a ação"44
O termo imunidade se refere à prerrogativa de ser imune, ou seja, isento de
obrigações e encargos. É uma prerrogativa da qual alguém se vale para se escusar
de algumas obrigações legais.45
41
SOARES, Guido Fernando Silva. Orgãos dos Estados nas Relações Internacionais: Formas da
Diplomacia e as Imunidades. 1 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 63.
42
Disponível em < www.tvjustica.jus.br>. Acesso em 08 out. 2012.
43
LIMA, Sérgio Eduardo Moreira. Imunidade Diplomática: Instrumento de Política Externa. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2004. p.21.
44
MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Brasília: Universidade de Brasília, 1982. p. 521
45
LIMA, Sérgio Eduardo Moreira. Imunidade Diplomática: Instrumento de Política Externa. Rio de
27
O agente diplomata goza dos privilégios e imunidades previstos na
Convenção de 1961 perante o Estado acreditado e, ―a partir do momento em que
entrar no território para assumir o seu posto ou, no caso de já se encontrar no
referido território, desde que a sua nomeação tenha sido notificada ao Ministério das
Relações Exteriores ou ao Ministério em que tenha convindo‖.46
Segundo Alves, a imunidade ―consiste numa reserva ou limite imposto aos
Estados pelo direito internacional ao regular exercício das suas jurisdições nacionais
quando outros Estados forem partes em procedimentos judiciais‖ 47
Segundo Sérgio Eduardo Moreira Lima:
A palavra imunidade se origina do latim immunitas, immunitatis, qualidade
de imune, isto é, livre ou isento de encargos, obrigações, ônus ou penas. A
imunidade é prerrogativa, outorgada a alguém para que se exima de certas
imposições legais em virtude do que não é obrigado a fazer ou a cumprir
certos encargos ou obrigações determinados em caráter geral. É no campo
das relações internacionais que este conceito goza de maior relevância. A
imunidade diplomática consiste na soma de isenções e prerrogativas
concedidas aos agentes diplomáticos para assegurar-lhes, no interesse
recíproco dos Estados, a independência necessária ao perfeito desempenho
48
de sua missão.
Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva, quando fala, em seu livro, da
perspectiva do Direito Internacional aduz que:
Se o grande desafio do Direito internacional no século XX foi a
extraordinária ampliação de seu âmbito de atuação, a tarefa, não menos
importante para o século XXI será a busca dos mecanismos de
implementação, uma vez que a compreensão do papel e alcance do Direito
internacional somente se consolidará na medida em que se tenha
conscientização da absoluta impossibilidade e inadequação operacional dos
sistemas nacionais, isoladamente considerados, como unidades
autônomas, muitas vezes, se não antagônicas, ao menos colidentes, para
49
atender as necessidades do tempo presente.
Janeiro: Lumen Juris, 2004. p.22.
46
Artigo 39 da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas de 1961.
47
ALVES, Laerte Meyer de Castro. Imunidades de Jurisdição dos Estados Estrangeiros em
Matéria Trabalhista No Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 988, 16 mar. 2006. Disponível
em: < http://jus.com.br/revista/texto/8115/imunidades-de-jurisdicao-dos-estados-estrangeiros-emmateria-trabalhista-no-brasil> Acesso em: 18 out. 2012.
48
LIMA, Sérgio Eduardo Moreira. Imunidade Diplomática: Instrumento de Política Externa. Editora
Lumen Juris, 2004, p. 22
49
SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento. Manual de Direito Internacional Público / G.E. do
Nascimento e Silva e Hidelbrando Accioly. 15ª ed. rev. e atual. Paulo Barbosa Casella. São Paulo:
Saraiva, 2002.p. 78
28
As missões diplomáticas, geralmente, são chefiadas por um Embaixador. A
pessoa investida nesse cargo detém imunidades e privilégios, quais sejam:
inviolabilidade pessoal e da missão, imunidade de jurisdição cível e criminal, e
isenção fiscal.
Em uma assembléia da ONU, foi adotada a Resolução 885 (VII) que
determinou à Comissão de direito Internacional que priorizasse o estudo da
codificação das relações e imunidades diplomáticas, surgindo assim a Convenção
de Viena sobre Relações Diplomáticas, assinada em 18 de abril de 1961, tendo
como participantes 81 Estados. Foi, também, assinada, em 24 de abril de 1963, a
Convenção de Viena sobre Relações Consulares, onde se aprovou a imunidade de
jurisdição para as funções consulares.
A
imunidade dos agentes diplomáticos podem ser a da inviolabilidade
pessoal e domiciliar, da imunidade jurisdicional e da isenção fiscal. No que tange os
privilégios e imunidades consulares, são a inviolabilidade física e oficial, assim como
imunidade ao processo penal ou cível em seus atos de ofício. Não há imunidade
absoluta penal para os representantes, tampouco para seus familiares. Não há
imunidade de jurisdição, salvo nos atos de ofício.
A diferença referente aos agentes da missão e os funcionários do cônsul é
que a imunidade não se estende a seus familiares. A imunidade domiciliar dos
cônsules e funcionários abrange somente os serviços consulares.
Todas as pessoas que gozem dos privilégios e imunidade devem respeitar
as leis do Estado acreditado, constituindo o primado direito local, sendo este um
princípio indiscutível, cujo abuso pode importar em uma declaração de persona non
grata. Caso o Estado acreditado deixe a desejar por algum ato, isso estará
comprometendo sua responsabilidade internacional.
Francisco Rezek, disse:
Contudo, em todas as suas relações como o meio local deve o Estado
estrangeiro, por, por norma costumeira, e devem seus agentes diplomáticos
e consulares, por disposição expressa dos textos de Viena, conformar-se
com as prescrições do direito local.
Portanto em conseqüência de estudos, as prerrogativas mais importantes
29
são as decorrentes do exercício da função diplomática.50
Sérgio Eduardo Moreira Lima disse:
A imunidade é a prerrogativa outorgada a alguém para que se exima de
certas imposições legais em virtude do que não é obrigado a fazer ou a
cumprir certos encargos ou obrigações determinados em caráter geral. É no
campo das relações internacionais que esse conceito goza de maior
relevância. A imunidade diplomática consiste na soma de isenções e
prerrogativas concedidas aos agentes diplomáticos para assegurar-lhes, no
interesse recíproco dos Estados, a independência necessária ao perfeito
desempenho de sua missão. As imunidades e os privilégios diplomáticos
subtraem certas pessoas à autoridade e à competência jurisdicional do
Estado acreditado. São concedidos na base da reciprocidade, o que provou
ser a garantia mais efetiva na observância da regra. Considera-se que há
imunidade quando alguém não está sujeito a uma norma de Direto interno
ou à sua sanção; e que há privilégio quando uma regra especial de Direito
51
interno substitui a norma ordinária.
Para Biswanath Sen em seu livro ―A Diplomat's Handbook of International Law
and Practice ”para que fique assegurada a proteção ao diplomata, ou até mesmo ao
conceder essas prerrogativas, o Estado não conseguiria caso os escritórios
diplomáticos fossem espalhados por todo o país. 52
Mesmo em caso de caso de ruptura das relações diplomáticas entre dois
Estados ou se uma Missão é retirada definitiva ou temporariamente, o Estado
acreditado está obrigado a respeitar e a proteger, mesmo em caso de conflito
armado, os locais da Missão bem como os seus bens e arquivos.
3.1
INVIOLABILIDADE PESSOAL E DOMICILIAR
A inviolabilidade é a regra mais antiga da missão diplomática, seja ela
pessoal ou domiciliar, abrangendo não somente os chefes da missão diplomática,
mas também seus familiares, os chefes de governo, os ministros de relações
exteriores e o pessoal que os acompanha do país de origem.
50
Nascimento e Silva. A convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, 2. Ed, Brasília: MRE,
1978, p.19.
51
Sérgio Eduardo. Privilégios e Imunidades Diplomáticas. Brasília: Instituto Rio Branco: Fundação
Alexandre Gusmão, 2002. P. 34.
52
SEN, B. A Diplomat's Handbook of International Law and Practice. 3ª ed. Boston: Unitar.
Martinus Nijhoff Publishers, 1988.. p. 46.
30
Deve ser assegurado por parte do Estado acreditado que a inviolabilidade
pessoal do agente seja garantida, obrigatoriamente, não podendo ser exercido
nenhum ato coercitivo, ofensivo, violento ou de injúria para com o pessoal do agente,
por qualquer autoridade, nem por pessoa física.
Vale ressaltar que desde a assinatura da convenção de Viena em 1961,
foram evidenciados casos de violência, muitas das vezes de cunho terrorista, contra
o pessoal do agente e contra o próprio agente, criando um alerta maior para a
segurança destes. Foi em uma reunião da ONU que ficou acordado que os Estados
devem introduzir em suas legislações medidas-leis preventivas e repressivas contra
os autores de atentadso aos representantes dos Estados.53
Na imunidade domiciliar não podem ser violados os locais da missão, como
edifícios, casas, residência particular do agente diplomático, os locais residenciais do
quadro administrativo.
Sobre os bens, sempre ficou claro a inviolabilidade, incluindo a
correspondência, os arquivos, o salário, a conta bancária, os carros, os objetos
pessoais, os móveis entre vários outros, situados no local da missão.
Disse Vincenzo Rocco Sicari (2007):
A imunidade mais importante para a missão diplomática é a inviolabilidade
da sede e da residência particular dos agentes diplomáticos. [...] a missão
não poderia funcionar caso não tivesse abrigo das buscas policiais, pois
estas últimas, poderiam permitir o conhecimento de todos os segredos.
Ainda Vincenzo Rocco Sicari (2007):
Apesar de todos esses cuidados previstos na legislação no tocante à
inviolabilidade, tem-se registrado, nos últimos anos, a prática cada vez mais
freqüente da violação dos locais da missão diplomática por meio da
instalação dissimulada de microfones ou de escutas, nos muros dos
edifícios da sede ou da residência diplomática.
Com a inviolabilidade da sede da missão está também o direito ao asilo,
quando é cedido refúgio temporário, oferecido à pessoa perseguida pelas
autoridades locais, por razões políticas. Vale ressaltar que o direito de conceder asilo
é um direito discricionário. Segue uma razão humana e um Estado, ao realizar tal
ato, não pode esperar que ocorra o mesmo, não se trata de reciprocidade.
A faculdade do asilo, que não pode ser confundida com refúgio, o qual se dá
53
PRZETACZNIK. Protection of official of Foreing States According to International Law, 1983.
31
à perseguição de raça, religião, nacionalidade ou por pertencer a determinado grupo
social, ou ainda por se ter determinadas opiniões políticas, e, da mesma forma, não
pode ser confundida com o exílio, que significa a expatriação forçada ou por livre
escolha. Portanto não pode haver confusão entre os dois termos, já que o asilo
político se refere à proteção por um crime político.
A lei brasileira garante apenas a concessão do asilo político e a sua
concessão não preza somente a proteção da pessoa, procura também contribuir
para a paz social do agente que procura asilo, seja perseguido por motivos políticos
ou ideológicos. No artigo 4° da Constituição Federal, inciso X, elenca:
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações
internacionais pelos seguintes princípios:
[...]
X - concessão de asilo político.
Seguindo, o artigo 14, §§ 1° e 2° da Declaração dos Direitos Humanos das
Nações Unidas, elencam:
1. Todo ser humano, vítima de perseguição,
Tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países.
2. Este direito não pode ser invocado em caso de perseguição
legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários
aos objetivos e princípios das Nações Unidas.
O Brasil é parte da convenção de Caracas, acerca do asilo, desde 1957.54 O
fato de o Estado conceder asilo, não significa simpatia ou predileção ou até mesmo
sustento às ambições do asilado.
Existe a possibilidade de asilar perseguidos políticos que peçam guarida,
como ocorreu em 2009 onde o ex-presidente da República de Honduras Manuel
Zelaya se refugiou na embaixada brasileira após ter sido deposto em um golpe
militar ocorrido em 28 de julho do mesmo ano.
O asilo político não é obrigatório. O Estado pode conceder ou não o asilo. A
Áustria negou asilo a Markus Wolf, chefe dos serviços de espionagem da extinta
Alemanha oriental, escolhendo prendê-lo e entregá-lo às autoridades da Alemanha,
em 24 de setembro de 1991.55
Recentemente, o governo brasileiro acaba de deferir asilo político a um
54
Analisar sobre o tema,v. Marco Geraldo Monroy Cabra, Derecho internacional público, cit., pp. 636642.
55
REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. Editora Saraiva, 2008. p. 215.
32
terrorista italiano que foi condenado à prisão perpétua, conhecido com Cesare
Battisti. Battisti foi condenado à prisão perpétua em seu país pela pratica de quatro
assassinatos que ocorreram entre 1977 e 1979, quando liderava um grupo terrorista
denominado Proletários Armados pelo Comunismo (PAC). (AZEVEDO, 2009, p.01).
Há a necessidade de requerer o asilo, pois a pessoa chega ao país em que
requereu o asilo sem portar nenhum documento próprio, visto ou passaporte. Como
se fosse um deportado, após uma análise o Estado decidindo conceder o asilo
cuidará de suas documentações. O asilo político é na sua forma perfeita, um abrigo
territorial.
No tocante à imunidade da inviolabilidade do domicílio, a questão do asilo
político tem entrado em declínio por alguns motivos, como afirma a Corte
Internacional de Justiça no caso do Direito de Asilo (Colômbia/Peru):
A decisão de autorizar o asilo diplomático comporta uma derrogação à
soberania de um Estado. Ele subtrai um delinqüente à justiça daquele e
constitui uma intervenção em um domínio que releva exclusivamente a
56
competência do Estado territorial.
Caso exemplar de violação de missão diplomática foi quando a embaixada
norte-americana em Teerã em 1979 foi invadida. Onde a sede da missão diplomática
foi ocupada por estudantes iranianos, os quais tomaram como reféns vários
diplomatas estadunidenses. O que chamou mais a atenção neste caso foi que a
segurança do governo iraniano nada fez para impedir ou ainda dar fim àquela
invasão. Tal fato levou os Estados Unidos a romperem relações diplomáticas com o
Irã, as quais até os dias de hoje não foram restabelecidas.57
Segundo Celso de Albuquerque Mello, acerca da inviolabilidade disse:
É encarada como decorrente da necessidade de assegurar o desempenho
das funções diplomáticas da Missão estrangeira com liberdade. Ela abrange
a Missão Diplomática e as residências particulares dos agentes
diplomáticos. A inviolabilidade significa que nestes locais o Estado
acreditado não pode exercer nenhum ato de coação ex.: ser invadido pela
polícia, a não ser que haja o consentimento do chefe da missão. Do mesmo
58
modo, não pode ser efetuada uma citação dentro da Missão.
56
Caso relativo Do Direito de Asilo (Colômbia/Peru), decisão de 20 de novembro de 1950. In CIJ,
Recueil, 1950, p. 266-289.
57
LIMA, Sérgio Eduardo Moreira. Imunidade Diplomática: Instrumentos de Política Externa. Rio
de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2004, pp. 57-58.
58
MELLO,Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 15 ed., vol. II, Rio de
Janeiro: Ed. Renoar.p. 1385.
33
O dispositivo que prevê essa imunidade é o artigo 27 da Convenção de Viena
sobre Relações Exteriores:
1. O Estado acreditado permitirá e protegerá a livre comunicação da Missão
para todos os fins oficiais. Para comunicar-se com o Governo e demais
Missões e Consulados do Estado acreditante, onde quer que se encontrem,
a Missão poderá empregar todos os meios de comunicação adequados,
inclusive correios diplomáticos e mensagens em códigos ou cifra. Não
obstante, a Missão só poderá instalar e usar uma emissora de rádio com o
consentimento do Estado acreditado.
2. A correspondência oficial da Missão é inviolável. Por correspondência
oficial entende-se toda correspondência concernente à Missão e suas
funções.
3. A mala diplomática não poderá ser aberta ou retida.
4. Os volumes que constituam a mala diplomática deverão conter sinais
exteriores visíveis que indiquem o seu caráter e só poderão conter
documentos diplomáticos e objetos destinados a uso oficial.
5. O correio diplomático, que deverá estar munido de um documento oficial
que indique sua condição e o número de volumes que constituam a mala
diplomática, será, no desempenho das suas funções, protegido pelo Estado
acreditado.
6. O Estado acreditante ou a Missão poderão designar correios diplomáticos
"ad hoc". Em tal caso, aplicar-se-ão as disposições do parágrafo 5 deste
artigo, mas as imunidades nele mencionadas deixarão de se aplicar, desde
que o referido correio tenha entregado ao destinatário a mala diplomática
que lhe fora confiada.
7. A mala diplomática poderá ser confiada ao comandante de uma aeronave
comercial que tenha de aterrissar num aeroporto de entrada autorizada. O
comandante será munido de um documento oficial que indique o número de
volumes que constituam a mala, mas não será considerado correio
diplomático. A Missão poderá enviar um de seus membros para receber a
mala diplomática, direta e livremente, das mãos do comandante da
aeronave.
3.2
IMUNIDADE JURISDICIONAL
A imunidade jurisdicional59 faz com que os agentes diplomáticos fiquem
imunes na esfera civil e penal, a qual é absoluta e irrenunciável, onde os agentes
não podem ser presos ou processados. Este fato não impede que as autoridades
locais apurem o ato para fazer cessar o inquérito, sendo que, qualquer informação
obtida durante as investigações deve ser enviada às autoridades do país de origem
do agente, para que a justiça local tome as providências necessárias acerca do caso
59
Há autores mostram uma certa diferença entre ―imunidade de jurisdição‖ e ―imunidade jurisdicional‖,
na medida em que esta última se prestaria a designar tanto a imunidade de jurisdição propriamente
dita (processo de conhecimento), quanto a imunidade de execução.
34
em questão. Não alcança os crimes de competência do Tribunal Penal Internacional.
No caso ―The Schooner Exchange versus McFaddon‖, julgado nos Estados
Unidos, em 1812:
A jurisdição das cortes é um ramo do que a nação
possui como um Poder soberano e independente. A
jurisdição da nação dentro do seu próprio território é
necessariamente exclusiva e absoluta. Não é
susceptível de qualquer limitação, senão imposta por
ela mesma. Qualquer restrição a ela, que derive sua
validade de uma fonte externa, implicaria numa
diminuição de sua soberania, nos limites de tal
restrição e uma investidura daquela soberania, nos
mesmos limites em que aquele poder que poderia
60
impor tal restrição.
Paul Reuter mostra e analisa dois tipos de imunidades jurisdicionais, com
embasamentos jurídicos, o primeiro tipo de imunidade seria as imunidades
vinculadas ao s serviços diplomáticos e consulares; e o segundo, as imunidades
invocadas por um Estado em face da jurisdição dos tribunais de um Estado
estrangeiro ou de procedimentos de execução desse Estado.61
As suposições do primeiro tipo de imunidades jurisdicionais e o segundo
possuem em comum, que o titular como titular último da prerrogativa de imunidade,
o próprio Estado estrangeiro, de cuja existência decorre a existência de todos
aqueles privilégios.
A primeira ordem de imunidades tem por fundamento garantir o livre
desempenho das atividades dos agentes estrangeiros regularmente admitidos em
território local, e assegurar a inviolabilidade dos bens estatais estrangeiros situados
naquele território. Visa, portanto, garantir isenção e independência às atividades que
precisam ser exercidas por um Estado no território de outro.62
No segundo tipo, a chamada imunidade jurisdicional do Estado, é gozada
diretamente pelo seu titular o próprio Estado estrangeiro enquanto entidade jurídica,
tendo ido buscar respaldo na regra segundo a qual par in parem non habet iudicium.
Tais imunidades estão estabelecidas pelo direito internacional público,
60
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 4 ed rev., atual. e ampl.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p.493.
61
REUTER, Paul. ―Quelques réflexions sur la nature des immunités de l’Etat en droit
international public‖. In: ______. Le développement de l’ordre juridique internationale: écrits de droit
international. Paris: Ed. Economica, 1995, p. 102.
62
Moll, Leandro de Oliveira. Imunidades internacionais: tribunais nacionais ante a realidade das
organizações internacionais / Leandro deOliveira Moll.— Brasília : FUNAG, 2010. 2ª edição.p. 24.
35
encontrando-se codificadas, inclusive em normas universais.63
A imunidade de jurisdição penal e civil, do agente diplomático, vem
estabelecida como regra desde os séculos XVI e XVIII, pelo costume histórico e
jurídico,
onde
era
considerada
princípio
absoluto
da
inviolabilidade
do
representante.64
Na visão de Antenor Madruga Filho, a noção de jurisdição pode ser dividida
em lato sensu e stricto sensu. O lato sensu representando a jurisdição legislativa e
administrativa juntamente com a jurisdição judiciária, que é a que nos importa quanto
ao assunto da imunidade de jurisdição a que têm direito os representantes das
missões diplomáticas, buscando assim demonstrar que esta jurisdição lato sensu
seria uma forma de delimitar o espaço em que as funções estatais teriam validade. E
no stricto sensu, a jurisdição ao poder do judiciário.65
A imunidade de jurisdição penal não foi criada com o intuito de tornar o
agente impunível e na jurisdição civil não é sinônimo de irresponsabilidade. Quando
há casos que envolvem imunidade de jurisdição penal e imunidade de jurisdição
civil, como danos ocasionados por diplomatas na direção de veículos, no
entendimento de Nascimento e Silva, deve o Estado acreditante renunciar à
imunidade em matéria civil, para que o agente responda com uma indenização
pecuniária, caso em que a imunidade penal deve também ser mantida.66
Segundo o Estatuto de Roma de 1998, artigo 27, §2º:
As imunidades ou normas de procedimento especiais decorrentes da
qualidade oficial de uma pessoa; nos termos do direito interno ou do direito
internacional, não deverão obstar a que o Tribunal exerça a sua jurisdição
sobre essa pessoa.
Disse Arion Sayão Romita:
A imunidade de jurisdição dos Estados estrangeiros, no Brasil, não resulta
de tratados nem de convenções. Também não está prevista pela
Constituição nem por qualquer lei interna. O Brasil respeita o princípio por
63
REUTER, Paul. ―Quelques réflexions sur la nature des immunités de l’Etat en droit
international public‖. In: ______. Le développement de l’ordre juridique internationale: écritsde droit
international. Paris: Ed. Economica, 1995, p. 104.
64
Sérgio Eduardo. Privilégios e Imunidades Diplomáticas. Brasília: Instituto Rio Branco: Fundação
Alexandre Gusmão, 2002. P. 50.
65
MADRUGA FILHO, Antenor Pereira. A Renúncia a Imunidade de Jurisdição pelo Estado
Brasileiro e o Novo Direito da Imunidade de Jurisdição. Rio de Janeiro e São Paulo: Renovar,
2003, p.72.
66
Sérgio Eduardo. Privilégios e Imunidades Diplomáticas. Brasília: Instituto Rio Branco: Fundação
Alexandre Gusmão, 2002. P. 52.
36
força da mencionada regra costumeira. O costume é fonte do direito e, no
67
campo das relações internacionais, tem grande importância.
Os privilégios são concedidos aos agentes diplomáticos e às suas famílias,
desde que vivam sob a sua dependência, no exterior, e tenham o nome incluído na
lista diplomática.
Segundo Pino (2001):
A imunidade de jurisdição não se baseia no princípio da igualdade soberana
dos Estados, onde se depreende que nenhum Estado pode exercer
jurisdição sobre o outro par in parem non habet imperium, mas sim que há
uma necessidade de outorgar às missões diplomáticas e a seus membros
as liberdades necessárias para que possam levar a cabo sua missão com
independência. A imunidade de jurisdição ampara os agentes diplomáticos
contra ações civis ou penais que possam prejudicar o desenvolvimento de
68
sua incumbência.
Para garantia desses privilégios, o Estado acreditante deverá seguir uma
regra básica que é de não utilizar o espaço da missão diplomática para atividades de
cunho pessoal, bem como não exercer a função profissional ou comercial em cunho
próprio.
Entende Teixeira Paranhos:
Consiste a imunidade de jurisdição na subtração dos atos praticados por
agentes dos estados estrangeiros, em seu nome próprio ou em nome do
estado que representam, da jurisdição do país onde se encontrem
69
acreditados.
O artigo 42 da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas dispõe que
―O agente diplomático não exercerá no Estado acreditado nenhuma atividade
profissional ou comercial em proveito próprio‖70 admitindo-se, todavia, o exercício de
atividade intelectual e literária.71
67
ROMITA, Arion Sayão. Entes de Direito Público Externo. Aspectos da Competência. Revista
Síntese Trabalhista, Administrativa e Previdenciária, v. 13, p.8, jul. 2001.
68
MORENO PINO, Ismael. La Diplomacia. México: Fondo de Cultura Económica, 2001, p. 231.
69
PARANHOS,C.A.Teixeira. A Imunidade de Jurisdição dos Organismos Internacionais na Visão
do Supremo Tribunal Federal. In: Revista LTr, ano 47, p. 1063, Setembro, 1983.
70
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Tratados e Convenções. 5ª edição. Editora Renovar. p. 32.
Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas. 1961. artigo 42.
71
SICARI, Vincezo Rocco. O Direito das Relações Diplomáticas. Editora Del Rey, 2007. p. 158.
37
Oscar Vilhena Vieira (2000) disse:
A imunidade de jurisdição, reconhecida pelo Direito Internacional Público, é
aquela voltada à proteção da soberania dos Estados e de seus
representantes, sem a qual não há lugar para as relações diplomáticas. A
idéia original de absoluta imunidade de jurisdição deriva de um conceito
hobbesiano-maquiavélico, ex parte príncipe, de soberania. O princípio da
soberania vem, no entanto, passando por um processo, se não de erosão,
pelo menos de transformação. Os direitos humanos, nos últimos 50 anos,
constituem um dos elementos que vem pressionando o conceito tradicional
de soberania. Isso ocorre na medida em que se estabelece uma série de
limitações ao poder dos Estados que se vêem obrigados a prestar contas de
suas relações com os seus cidadãos a organismos internacionais. O
sistema internacional de direitos humanos, somado ao atual estágio de
desenvolvimento das democracias constitucionais, abre espaço para uma
perspectiva mais Rousseau-kantiani de soberania, ex parte popoli. A
soberania, dessa perspectiva ética, passa a ter uma razão fundamental, que
como apregoam os contratualistas. Ao Estado só é legitimo o exercício do
poder, enquanto este exercício estiver voltado à proteção dos direitos. À
medida que o Estado deixa de realizar as tarefas para as quais foi
72
constituído, deixa também de ser protegido pelas prerrogativas.
Vera Maria Jatahy, disse:
O princípio da imunidade de jurisdição é aquele segundo o qual esta deixa
de ser exercida em razão da qualidade do réu. Sendo a jurisdição o
exercício da soberania, um Estado soberano não tem como julgar outro
estado igualmente soberano sem o consentimento deste. Como
conseqüência o chefe de Estado goza de imunidade em razão de seu
aspecto representativo na condição de órgão estatal, assim como as
pessoas por ele designadas. A jurisdição normal fica também suspensa ao
ser estendido o privilégio pelo direito internacional a determinadas pessoas
73
físicas ou jurídicas em razão das funções internacionais que exercem.
A
imunidade
de
jurisdição
nasceu
da
necessidade
de
garantir
a
independência e estabilidade dos representantes de Estado, baseada na
extraterritorialidade74.75 Este princípio hoje já foi superado, tendo sido adotado o
fundamento do interesse da função, mas a imunidade de jurisdição é a imunidade
mais fiel e continua presente. ―A ficção da extraterritorialidade deve ser rejeitada por
ser vaga, inútil e perigosa‖.76
72
VIEIRA,Oscar Vilhena. Imunidade de Jurisdição e Foro por Prerrogativa de Função, Brasília,
Revista CEJ, n°11,p. 60, mai/ago. 2000.
73
JATAHY, Vera Maria Barrera. Do conflito de Jurisdições: a Competência Internacional da
Justiça Brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p.27-28.
74
Dominda também como exterritorialidade. Fato este que é a presunção fictícia do agente estar fora
de seu país, não estando subordinado às leis estrangeiras. Em um segundo plano, seria que o local
da missão diplomática, simboliza uma extensão do Estado acreditante.
75
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 5ª Ed. São Paulo. 2011.
P.527.
76
BONFILS, apud, Franco Filho, Georgenor de Sousa, op. cit., p.30
38
A teoria da extraterritorialidade foi abandonada devido às grandes críticas de
doutrinadores modernos, pois era considerada inexata e perigosa, tendo sido o
espírito de colaboração e o esforço conjunto entre os Estados que abriu o caminho à
limitação das imunidades, já que se fazia necessário equilibrar os direitos do Estado
acreditante e os deveres do Estado acreditado.
Por esse motivo a Convenção de Viena retirou esse termo da Convenção sobre
Relações Diplomáticas e, também, por que no século XIX, ocorreram vários crimes
comuns dentro das embaixadas, tornando assim muito difícil a responsabilização
destes agentes por estarem protegidos com base nessa teoria.77
Os agentes diplomáticos gozam de certas prerrogativas e imunidades de
relevante importância, que lhes são reconhecidas como condições
essenciais para o perfeito desempenho de suas respectivas missões. Desde
a época remota, foram os enviados diplomáticos cercados de grande
respeito e consideração. De tal modo que o direito internacional
contemporâneo, admitindo os aludidos privilégios, não faz mais, por assim
dizer, do que consagrar uma tradição generalizada. Desde o tempo de
Grócio até hoje, muito se tem invocado como fundamento das prerrogativas
diplomáticas, um exemplo é a ficção da extraterritorialidade. A opinião mais
corrente, porém, combate semelhante idéia, sustentando, com razão, que a
importância das ditas prerrogativas está na real necessidade de se
assegurar, aos que delas gozam, a independência necessária para a
execução dos seus deveres oficiais; decorrendo, pois, do interesse
78
recíproco dos Estados.
Grozio79 deu à teoria da extraterritorialidade uma importância muito grande na
história das doutrinas que fundamentaram as imunidades diplomáticas, devido ao
longo período de três séculos que ficou em vigor.
Segundo o direito das gentes, um embaixador representa, por uma espécie
de ficção, a pessoa de seu senhor, e igualmente, por uma ficção, se
considera que se encontra fora do território da potencia ante a que exerce
suas funções. Assim se desprende que não tenha que observar as leis civis
80
do país estrangeiro onde permanece como embaixador.
Segundo Cahier (1962)
Esta teoria justifica o fato de que o diplomata escapa ao poder do comando
do soberano territorial por uma ficção, em virtude da qual o agente é
77
LIMA, Sérgio Eduardo Moreira. Imunidade Diplomática: Instrumento de Política Externa. Rio de
Janeiro: Editora Lumen Juris, 2004, p. 29.
78
ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 1972.
p.108.
79
GROTIUS, H., Le Droit de la Guerra et de la Paix, Amsterdam, livro II, 1724, p. 540
80
GROCIO. Le droit de la guerre et de la paix. Amzterdam, 1724, livro II, cap. XVIII, p. 540.
39
suposto de nunca ter deixado o próprio território nacional; em outras
palavras, ele exercita as suas funções de diplomata acreditado junto de
outro Estado permanecendo no seu próprio país; fisicamente presente no
território do Estado acreditado, sendo juridicamente assente. Dessa teoria
de extraterritorialidade fictícia se passou à teoria da extraterritorialidade real
afirmando que a embaixada deveria ser considerada como um pedaço do
81
território nacional.
Com essa teoria, a missão somente entregaria à polícia estrangeira um
delinqüente que estivesse refugiado nela, mediante um processo de extradição.82
Partindo desse principio, o Superior Tribunal Federal, busca cada vez mais a
relativização referente à imunidade de jurisdição, pois caso o Poder Judiciário venha
a conhecer e julgar casos pertinentes a essa matéria o número de abusos irá
consequentemente diminuir.
Há a necessidade de se rever a imunidade civil e penal de que gozam os
diplomatas, seus familiares e membros do quadro administrativo e técnico
das embaixadas estrangeiras no Brasil. A defesa de uma revisão a estes
benefícios foi feita pela deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), presidenta
da CREDN, durante sessão, nesta quarta-feira, que deliberou pela
realização
de
audiência
pública
para
discutir
o
tema.
Ao aprovar requerimento da deputada, a comissão autorizou realizar
audiência pública para aprimorar as normas da Convenção de Viena, que
defere aos agentes diplomáticos imunidade penal, civil e administrativa,
instituída há 50 anos, lembra a deputada, ―no auge da guerra fria, num
tempo marcado pelas disputas de poder entre socialistas e capitalistas e
pela
enorme
desconfiança
entre
as
nações‖.
Os dias atuais exigem que se considerem o atual estágio de
desenvolvimento dos direitos humanos, defendeu a deputada. ―Ao contrário
de muitos países, onde a convenção é mitigada por outras normas jurídicas,
83
nós ainda não construímos uma lei interna que disponha sobre o tema‖.
Vale ressaltar que a existência dessas prerrogativas não exime o agente
diplomático da jurisdição do Estado de origem.
81
CAHIER, P., Le Droit Diplomatique Contemporain, Paris: Librairie Minard, 1962, p. 186.
SICARI, Vicenzo Rocco. As Relações Diplomáticas no Direito Internacional. Belo Horizonte
Editora, 2007, p.137.
83
Imunidade Diplomática em Debate. Disponível em:
<http://www.perpetuaalmeida.org.br/Noticias/515/164351/ImunidadeDiplomaticaEmDebate/>. Acesso
em: 23 out. 2012.
82
40
3.2.1 A IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO PENAL
Conforme a dissertação de Vincenzo Rocco Sicari sobre as Relações
Diplomáticas no Direito Internacional (2007):
―Conforme a jurisprudência dos Estados e a doutrina, em conseqüência da
imunidade de jurisdição penal, os agentes diplomáticos não podem ser
perseguidos perante os tribunais do Estado acreditado, nem serem
investigados por nenhuma autoridade judiciária ou de policia. Esta
imunidade é absoluta, valendo tanto para os atos realizados no exercício da
função diplomática quanto para os atos privados‖
Disse o professor italiano Conforti (2006):
[...] os crimes internacionais são normalmente realizados próprio pelos
órgãos supremos do Estado, seria absurdo negar que possa ser punido o
agente diplomático ou outro individuo (Chefe de Estado, Primeiro Ministro,
Ministro das Relações Externas) ao qual são reconhecidas às imunidades
diplomáticas, uma vez terminada a função. A pratica é, todavia, orientada
nesse sentido (as recentes opiniões da maioria dos juízes da House of
Lourds, sentença de 24 de março de 1999, ILM, 199, 581 e ss, no caso do
ex. Chefe de Estado chileno, general Pinochet).
Esta imunidade é absoluta e não pode ser renunciada. Alcança não somente os
atos realizados nas ações de ofício, mas também em feitos privados. Entrou em
vigor quando foi instaurado o Tribunal Penal Internacional em 2002. Está previsto
também que os agentes, ao término de suas funções, podem ser procurados,
perseguidos e intimados pelos atos de caráter privado que ocorreram durante sua
missão.
O artigo da Convenção de Viena, considerado um dos mais importantes é o
artigo 31, §1°, prevê, ―O agente diplomático gozará de imunidade de jurisdição penal
do Estado acreditado [...]‖
José Francisco Rezek, sobre a imunidade de jurisdição penal, disse, ―a
imunidade não impede a polícia local de investigar o crime, preparando a informação
sobre a qual se presume que a Justiça do Estado de origem processará o agente
beneficiado pelo privilégio diplomático‖84
84
REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. Editora Saraiva, 2008. p. 172.
41
Também a Corte Internacional de Justiça, na sentença de 4 de fevereiro de
2002 entre o Congo e a Bélgica (caso Yerodia), negou que a jurisdição por
crimes internacionais possa ser exercida sobre os beneficiários das
imunidades enquanto os mesmos estão na função, admitindo invés tal
85
exercício uma vez que a função termina.
Esse privilégio não significa tornar a pessoa do agente impunível, diante de
sua conduta, pois o artigo 41 da aludida convenção, força os beneficiários a
obedecer e respeitar as leis e regulamentos do Estado acreditado.
Diante de alguns acontecimentos, em 1984, no Reino Unido, foi feito um
estudo sobre a imunidade diplomática no Foreign Office86, cujo motivo especial
foram dois casos que provocaram uma grande movimentação da sociedade.
Segundo Sérgio Eduardo Moreira Lima:
O primeiro foi a morte de uma agente da polícia britânica e o ferimento de
outras 11 pessoas em conseqüência de disparos de arma de fogo
procedentes de uma das janelas do Bureau da Jamahiriya Árabe popular
Socialista da Líbia em Londres, durante uma demonstração realizada, em
frente àquele prédio, por grupos de oposição ao regime Líbio. Do incidente
resultou o rompimento das relações diplomáticas entre Londres e Trípoli. O
segundo consistiu no seqüestro do ex-primeiro ministro nigeriano Umaru
Dikko, exilado no Reino Unido, por membros da missão da Nigéria em
Londres, que tentaram despachá-lo para Lagos num engradado de madeira
identificado como ―bagagem diplomática‖, apreendido no aeroporto pelas
87
autoridades britânicas.
Gerald Kaufman, foi integrante da Câmara dos comuns do Parlamento inglês
em abril de 1986, disse:
Ainda mais alarmante são os relatos do uso de recintos diplomáticos ou de
malas postais diplomáticas para crimes importantes, sobretudo contrabando
de droga, e o aproveitamento da imunidade diplomática pessoal para
escapar à captura legal por outros crimes, particularmente violação e
88
assalto sexual.
HABEAS CORPUS - TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL - IMUNIDADE
DIPLOMÁTICA: GOZANDO O PACIENTE DE IMUNIDADE DIPLOMÁTICA,
GARANTIDA PELA CONVENÇÃO DE VIENA, CONCEDESE-LHE HABEAS
CORPUS FACE O TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. Acórdão:
CONCEDER A ORDEM PARA TRANCAR A AÇÃO PENAL. DECISÃO
89
UNÂNIME.
85
CIJ, Recueil, 2002, par. 56 ss, part. par. 61
Ministério dos Negócios Estrangeiros.
87
Sérgio Eduardo. Privilégios e Imunidades Diplomáticas. Brasília: Instituto Rio Branco: Fundação
Alexandre Gusmão, 2002. P. 18.
88
ASHMAN, Chuck; TRESCOTT,Pamela. Esacandalo: O Abso da Imunidade Diplomática.
Portugal: Puplicações Europa-America, 1986,. P., 14.
89
535490 DF, Relator: DEOCLECIANO QUEIROGA, Data de Julgamento: 18/06/1990, Turma
Criminal, Data de Publicação: DJU 03/04/1991 Pág. : 6.302.
86
42
Completa Rezek: ―o que se espera, por óbvio, é que retornando à origem o
diplomata responda pelo delito praticado no exterior‖
A obrigação de cooperar com as jurisdições penais internacionais é uma
necessidade, seu respeito condiciona a eficácia delas, por conseguinte a
sua razão de ser e, enfim, sua viabilidade. No entanto, ela traduz aspirações
a uma justiça penal internacional que deve ser conciliada com as realidades
da sociedade internacional, composta, sobretudo por Estados soberanos
preocupados em presumir sua independência. À imagem do direito
internacional, a obrigação de cooperar não é homogênea: seus elementos
constitutivos variam em função da jurisdição, do aspecto da cooperação e
90
do destinatário da obrigação levada em conta. (tradução do autor).
3.2.2 A IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO CIVIL
Ao contrário da imunidade tratada anteriormente, a imunidade civil gerou
vários debates e contradições entre doutrina e jurisprudência, haja vista que os
diplomatas, até o século XVII, eram submetidos aos tribunais no que concerne a
essa jurisdição.
Somente quando ficou estabelecida a divisão entre atos inerentes à função,
que são alcançados pela imunidade e atos particulares, que ficam a descoberto da
imunidade, é que as mudanças ficaram claras.
Ao contrário da imunidade penal, a imunidade cível, comporta algumas
exceções, que estão elencadas no artigo 31, §1°, alíneas a,b e c:
1. O agente diplomático gozará de imunidade de jurisdição penal do Estado
acreditado. Gozará também da imunidade de jurisdição civil e
administrativa, a não ser que se trate de:
a) uma ação real sobre imóvel privado situado no território do Estado
acreditado, salvo se o agente diplomático o possuir por conta do Estado
acreditado para os fins da missão.
90
―L´obligation de coopérer avec les juridictions pénales internationals est une necessité son respect
conditionne leur efficacité donc leur raison d´être et, à terme, leur viabilité. Néanmoins, elle traduit des
aspirations à une justice pénale internationale qui doivent être conciliées avec les realités de la
societé internationale, composte avant tout d´États souverains soucieux de présumer leur
independence. À l´image du droit international, l´obligation de coopérer n´est donc pas homogène:
ses elements constitutifs varient en fonction de la juridiction, de l´aspect de la coopération et du
destinataire de l´obligation pris en compte‖ (UBÉDA, 2000, p. 951).
43
b) uma ação sucessória na qual o agente diplomático figure, a titulo
privado e não em nome do Estado, como executor testamentário,
administrador, herdeiro ou legatário.
c) uma ação referente a qualquer profissão liberal ou atividade
comercial exercida pelo agente diplomático no Estado acreditado fora de
suas funções oficiais.
Em conformidade com o texto do artigo 31 da Convenção de Viena, são três
as exceções. A primeira delas recai sobre ações relativas a imóvel situado no
Estado acreditado, o qual não se destina à instalação da Missão Diplomática; a
segunda exceção recai sobre ações91 relativas a sucessão em que o agente
diplomático é parte interessada como pessoa privada; e a terceira exceção recai
sobre ações referentes a profissão liberal ou atividade comercial exercida pelo
diplomata fora das suas funções oficiais.92
[...] o propósito dos negociadores em Viena foi o de não estender a
imunidade às transações comerciais de caráter privado efetuado pelo
93
agente diplomático e assegurar ao reclamante um foro para sua ação[...].
Seguindo o princípio da imunidade à jurisdição, o agente diplomata não pode
prestar depoimento como testemunha em casos civis ou penais, em decorrência de
direito já elencado na Convenção de Viena. Mas deve o diplomata cooperar com as
autoridades locais previamente autorizados pelo Estado de origem, em caso de
crimes graves.
No ano de 1987, um funcionário civil de uma embaixada atropelou uma
menina de 9 anos de idade, brasileira, que estava voltando da escola na Estrada
Parque Dom Bosco em Brasília. O funcionário não prestou socorro. A vítima, que
faleceu no local, permaneceu por mais 30 minutos sem nenhum tipo de socorro.
Segundo testemunhas e o exame da perícia, o funcionário da embaixada trafegava
em alta velocidade. O acidente foi considerado homicídio culposo. Poucos meses
91
Num caso envolvendo um contrato de locação residencial celebrado por funcionário diplomático de
país estrangeiro, a 7a Câmara do 2o Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo decidiu pelo
prosseguimento da ação de despejo contra o diplomata. Ocorre, entretanto, que aplicou, para
resolver o caso, a Convenção de Viena sobre Relações Consulares, e não a sobre Relações
Diplomáticas, como deveria ser. Turma Julgadora da 7a Câmara do 2o Tribunal de Alçada Civil do
Estado de São Paulo. Apelação nº 315.423-6/00. Relator Juiz Garrido de Paula. j. 31 mar. 1992
(publicado na RT-683/119, set. 1992).
92
LAMBERT. Jean Marie. Curso de Direito Internacional Público. Parte Geral. Volume II. Editora
Kelps,
2001. p. 288.
93
LIMA, Sérgio Eduardo Moreira. Imunidade Diplomática: Instrumento de Política Externa.
Editora Lumen Juris, 2004. p. 48.
44
depois do ocorrido, o funcionário partiu definitivamente do Brasil, provavelmente por
solicitação do governo brasileiro. Por intermédio da família da vítima e o advogado
do funcionário, chegou-se a um acordo acerca do valor da indenização. 94
O caso acima demonstra que no ato praticado pelo funcionário da embaixada,
em matéria penal, ficou registrada a sua imunidade, mas em matéria civil, ele foi
condenado a pagar indenização. Foram encaminhados os autos do processo penal
ao país de origem do funcionário a fim de que ele fosse processado pela justiça
local.
3.2.3
A IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO EM MATÉRIA TRABALHISTA
O inciso I do artigo 114 da Constituição Federal de 1988, incluído pela Emenda
Constitucional n°45, 2004 prevê:
Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:
I as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito
95
público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
O artigo 114 da Constituição Federal de 1988 atribui a competência para
julgar96 tais atos na esfera trabalhista. Não podemos confundir competência com
94
Sérgio Eduardo. Privilégios e Imunidades Diplomáticas. Brasília: Instituto Rio Branco: Fundação
Alexandre Gusmão, 2002. P. 91.
95
Definição do que sejam os ―entes de direito público externo‖. Artigo 42 do Código Civil de
2002,elenca, são pessoas jurídicas de direito público externo os Estados estrangeiros e todas as
pessoas que forem regidas pelo direito internacional público.
96
93% dos casos julgados acerca da imunidade é sobre matéria trabalhista. Disse o embaixador
brasileiro Lúcio Pires de Amorim em 2001. ―Número total de ações: 570, das quais 528 são
trabalhistas, que representam 93% do total. No ano de 1999, por exemplo, deram entrada 62 ações
trabalhistas. Dentre os países ou representações de organismos internacionais com maior número de
ações figuram os Estados Unidos com 63 casos; INUD, Nações Unidas com 41 casos; Argentina com
26 casos; Japão com 23 casos; Espanha com 18 casos; Alemanha com 17 casos; Grã-Bretanha com
16 casos; e França com 14 casos. Para que tenham uma idéia, apenas 13 países e quatro
organismos internacionais, de um universo de praticamente 90 que mantém representações no Brasil,
não têm ajuizado contra eles quaisquer ações. Desses 13, curiosamente, quatro são países nórdicos
– a Santa Sé a Suíça – e três são centro-americanos – El Salvador, Nicarágua e Costa Rica.‖
(AMORIM, Lúcio Pires de. Imunidade de execução: a questão da exeqüibilidade de decisões judiciais
contra Estados estrangeiros. In: Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Jurídicos (Coord.).
Imunidade soberana: o estado estrangeiro diante do juiz nacional. v. 19. Brasília: CJF, 2001. p. 4445).
45
jurisdição. O STF já entendeu que não há mais imunidade de jurisdição em matéria
trabalhista.97 Não abrange o processo de execução, por causa da imunidade.
A maioria dos casos julgados na esfera trabalhista não envolve desrespeito às
leis brasileiras, mas sim erros em cálculos acerca das verbas trabalhistas acerca da
dispensa sem justa causa. Caso a autoridade diplomática seja citada a comparecer
em juízo, fica facultada essa ação.
Na esfera internacional, dispõe o art. 89 do Código de Processo Civil que
compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra
'proceder a inventário e partilha de bens, situados no Brasil, ainda que o
autor da herança seja estrangeiro e tenha residido fora do território
nacional'. Somente, portanto, se o brasileiro ou estrangeiro, falecido no
exterior deixar bens no Brasil é que o foro competente será o da Justiça
brasileira. Se os bens deixados estão localizados no exterior, o
processamento do inventário e partilha de bens situados no Brasil em país
estrangeiro, a sentença não terá validade no Brasil, nem induzirá
98
litispendência.
Entendimento do STF, em apelação Cível n°9.696-3-SP e no Agravo
Regimental n° 139.671.8-DF:
Não há imunidade judiciária para o Estado estrangeiro, em causa de
natureza trabalhista. Em princípio, esta deve ser processada e julgada pela
Justiça do Trabalho, se ajuizada depois do advento da Constituição Federal
de 1988 (art. 114). Na hipótese, porém, permanece a competência da
Justiça Federal, em face do disposto no § 10 do art. 27 do ADCT da
CF/1988, c/c art. 125, II, da EC 1/69. Recurso ordinário conhecido e provido
pelo Supremo Tribunal Federal para se afastar a imunidade judiciária
reconhecida pelo Juízo Federal de primeiro grau, que deve prosseguir no
julgamento da causa, como de direito (STF, Ac. 9.696-3-SP, Sydney
Sanches).
Estado Estrangeiro, Reclamação trabalhista ajuizada por empregados de
Embaixada. Imunidade de jurisdição. Caráter relativo. Reconhecimento da
jurisdição doméstica dos juízes e tribunais brasileiros (STF,AgRg 139.671.8DF, Celso de Mello, 1ª T.).
Estado estrangeiro. Imunidade de jurisdição. Ainda que se reconheça que o
art. 114, caput, da Constituição da República encerra, apenas, uma regra de
competência quanto aos entes de direito público externo, por não se poder
admitir que o legislador DOUTRINA 116 Rev. TST, Brasília, vol. 69, nº 1,
jan/jun 2003 constituinte dispusesse sobre a imunidade de jurisdição,
todavia, as Convenções de Viena não asseguram essa imunidade, que se
assentava nos Direitos das Gentes, de observância uniforme no plano
internacional. Entretanto, a comunidade internacional, com a quebra do
princípio por alguns países, não mais observa essa diretriz, quando o ente
de direito público externo nivela-se ao particular, em atos de negócio ou de
gestão. A imunidade persiste, pois, em se tratando de atos de império.
Recurso conhecido e a que se nega provimento. (Proc. TST RR
97
Julgado sobre o tema, v. RTJ 133/159 e RTJ 161/643-644.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume VII, Direito das Sucessões. Editora
Saraiva, 2009. p. 31.
98
46
107.679/94.9, Ac. 1ª T. 3.089/95, Rel. Min. Indalécio Gomes Neto, in
Trabalho & Doutrina, nº 8, mar. 1996, Ed. Saraiva, p. 208)
Orientação Jurisprudencial nº 416 da SDI – I do TST. Imunidade de jurisdição.
Organização ou organismo internacional.
As organizações ou organismos internacionais gozam de imunidade absoluta
de jurisdição quando amparados por norma internacional incorporada ao
ordenamento jurídico brasileiro, não se lhes aplicando a regra do Direito
Consuetudinário relativa à natureza dos atos praticados. Excepcionalmente,
prevalecerá a jurisdição brasileira na hipótese de renúncia expressa à cláusula de
imunidade jurisdicional.
Com a tendência à proteção do empregado, a Lei Orgânica da Previdência
Social Lei n° 3.807 em seu artigo 5° alíneas c e d:
Art. 5º São obrigatoriamente segurados[...]:
I - como empregados:
c) os que prestam serviço a missão diplomática ou repartição consular de
carreira estrangeiras e a órgãos a elas subordinados, no Brasil, ou a
membros dessas missões e repartições, excluídos os não brasileiros sem
residência permanente no Brasil e os brasileiros, que estejam amparados
pela legislação previdenciária do País da respectiva missão diplomática ou
repartição consular;
d) os brasileiros civis que trabalham para a União, no exterior, em
organismos oficiais brasileiros, ou internacionais dos quais o Brasil seja
membro efetivo, ainda que lá domiciliados e contratados, salvo se
segurados obrigatórios na forma da legislação vigente do País do domicílio;
99
Ainda na Referida Lei em seu artigo 69, §6, a respeito da sua contribuição à
previdência:
Art. 69. O custeio da previdência social será atendido pelas contribuições:
[...]
§6 Equiparam-se a empresa, para fins de previdência social, o trabalhador
autônomo que remunere serviços a ele prestados por outro trabalhador
autônomo, a cooperativa de trabalho e a sociedade civil, de direito ou de
fato, prestadora de serviços, o empregador doméstico, bem como a missão
diplomática estrangeira no Brasil e o membro desta missão, em relação aos
100
empregados admitidos a seu serviço.
A imunidade de jurisdição trabalhista está implícita na imunidade de jurisdição
civil.
99
Lei Orgânica da Previdência Social n° 3.807, de 26 de agosto de 1960.
Lei Orgânica da Previdência Social n° 3.807, de 26 de agosto de 1960.
100
47
IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO- ESTADO ESTRANGEIRO-CAUSA
TRABALHISTA - Com advento da constituição Federal de mil novecentos e
oitenta e oito, competente é esta Justiça Especializada para julgar os feitos
referentes a dissídios entre trabalhadores e empregadores envolvendo
entes de direito público externo. Não há que se falar em imunidade de
jurisdição para o estado estrangeiro em causa de natureza trabalhista.
101
Recurso de embargos conhecido e provido.
Em decisão recente, o Supremo Tribunal Federal, entendeu que:
Apesar do novo quadro delineado no plano do direito internacional e no
âmbito do direito comparado adotar a teoria da imunidade relativa de
execução dos Estados soberanos, sobretudo em litígios trabalhistas, os
bens afetos à missão diplomática e consular ficam imunes à execução
forçada. Dentre estes, estão inclusos os valores creditados em conta
corrente de Embaixada de Estado estrangeiro, devido à impossibilidade de
se distinguir os créditos de natureza comercial daqueles destinados
exclusivamente à manutenção e administração da própria Embaixada,
102
conforme precedentes desta Corte.
3.3
ISENÇÃO FISCAL
A isenção fiscal isenta os agentes diplomáticos do pagamento de todos os
impostos e taxas, pessoais ou reais, nacionais, regionais ou municipais. Prevendo
suas exceções, que estão no artigo 34 da Convenção de Viena de 196, alíneas a,
b,c,d,e,f:
1.
O agente diplomático gozará de isenção de todos os impostos e
taxas, pessoais ou reais, nacionais, regionais ou municipais, com as
exceções seguintes:
a) os impostos indiretos que estejam normalmente incluídos no preço
das mercadorias ou dos serviços;
b) os impostos e taxas sobre bens imóveis privados situados no
território do Estado acreditado, a não ser que o agente diplomático os
possua em nome do Estado acreditante e para os fins da missão;
c) os direitos de sucessão percebidos pelo Estado acreditado, salvo o
disposto no parágrafo 4 do artigo 39;
d) os impostos e taxas sobre rendimentos privados que tenham a sua
origem no Estado acreditado e os impostos sobre o capital referentes a
investimentos em empresas comerciais no Estado acreditado.
101
BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Imunidade de Jurisdição. Estado estrangeiro. Causa
trabalhista. Ac. 1.257, Decisão 20.03.1996, Tipo: E-RR 1.698, 1985, Região: 01, UF RJ, Embargos
em Recurso de Revista, Órgão Julgador, Seção Especializada em Dissídios Individuais, Turma: DI,
Relator Ministro Vantuil Abdala.
102
Recurso Ex-Officio e Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n. 282/2003-000-01000.1. Julgado em 14.12.2004. DJ, 29.04.2005.
48
e) os impostos e taxas que incidem sobre a remuneração relativa a
serviços específicos;
f) os direitos de registro, de hipoteca, custas judiciais e imposto de selo
relativos a bens imóveis, salvo o disposto no artigo 23.
O agente diplomático deverá ficar isento do pagamento de qualquer imposto
do país acreditado. Contudo, os impostos referentes às despesas pessoais e
particulares, o agente deverá pagar. Tudo que for relativo à parte pessoal poderá
ser taxado; tudo o que se referir à missão, terá isenção.
Ciavareli sustenta que:
Muito embora devidos tais tributos, se sobrevierem virtuais fatos criminosos
atinentes às relações tributárias, o agente diplomático persistirá imune,
respondendo somente em relação a eles às leis e jurisdição de seu país de
103
origem.
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
ART. 535 DO CPC. RECURSO ORDINÁRIO EXECUÇÃO FISCAL.
ESTADO ESTRANGEIRO. TAXAS DE LIMPEZA E ILUMINAÇÃO PÚBLICA.
IMUNIDADE FISCAL. IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. CONVENÇÕES DE
VIENA, DE 1961 E 1963. 1. Os Estados estrangeiros gozam de imunidade
de jurisdição e tributária, com esteio, respectivamente, nos arts. 23, da
Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, e 32, da Convenção de
Viena sobre Relações Consulares, estando, assim, isentos do pagamento
de tributos que recaiam sobre seu patrimônio ou lhes sejam exigidos pela
prestação não individualizada de serviços. Precedentes: RO n.º 49/RJ, Rel.
Min. José Delgado, DJU de 07/11/2006; RO n.º 46/RJ, Rel. Min. Francisco
Peçanha Martins, DJU de 13/02/2006; RO n.º 45/RJ, Rel. Min. Castro Meira,
DJU de 28/11/2005; RO n.º 35/RJ, Rel. Min. Teori albino Zavascki, DJU de
05/08/2004. 2. A prerrogativa institucional de imunidade absoluta de
jurisdição, em se tratando de matérias de ordem estritamente pública ou
tributária, alcança os Estados estrangeiros. 3. É indevida a cobrança de
taxas de limpeza e iluminação pública, porquanto declaradas
inconstitucionais em razão da ausência de especificidade. 4. Embargos de
declaração acolhidos sem efeitos infringentes. Acórdão: Vistos, relatados e
discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior
Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas a seguir, por unanimidade, acolher os embargos de
declaração, sem efeitos infringentes, nos termos do voto do Sr. Ministro
Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Denise Arruda
(Presidenta), José Delgado e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro
104
Relator.
103
CIAVARELI, Miguel Ângelo Nogueira dos Santos. Imunidades Jurídicas: Penais, Processuais,
Diplomáticas, Parlamentares. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003, p. 138.
104
43 RJ 2005/0066435-7, Relator: Ministro LUIZ FUX, Data de Julgamento: 24/03/2008, T1 PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 14.04.2008 p. 1.
49
3.4
EXCEÇÕES PARA A QUEBRA DA IMUNIDADE
Tratando-se de homizio de algum criminoso que, fugindo à perseguição em
flagrante, refugie-se na sede da uma embaixada, pode o policial bater à porta da
mesma e solicitar sua entrega; contudo, a fim de evitar mal-entendido, é preferível
comunicar o fato à autoridade policial competente, para que esta faça a solicitação.
Em geral, nos casos de crime comum, o agente diplomático manda fazer a entrega
do delinqüente ou facilita sua captura; tratando-se, todavia, de crime político, não é
obrigado a entregá-lo.105
O policial poderá, ainda, entrar na residência diplomática em caso de incêndio
e/ou algum outro sinistro que necessite de algum ato de proteção imediata, com a
permissão do chefe de estado.
O agente diplomático pode ser preso em caso de crime inafiançável, o que está
previsto nos artigos 323 do Código de Processo Penal106.
105
Manual Básico de Abordagem Policial/2000, Trabalho Técnico Profissional elaborado pela
equipe de Instrutores de Abordagem da PMBA. p.31.
106
Art. 323. Não será concedida fiança II - nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e
drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos; III - nos crimes cometidos por grupos
armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;
50
CAPÍTULO III – ABUSO E RENÚNCIA DAS IMUNIDADES
4.
O ABUSO DA IMUNIDADE DIPLOMÁTICA
A imunidade não tem como finalidade fazer o diplomata se sentir acima da lei,
acima de todos e do Estado. O fato da Convenção de Viena inibir as sanções do
Estado acreditado não implica na não observância das normas exigidas pela
legislação local.
Sobre as polêmicas acerca da imunidade, Sérgio Eduardo Moreira Lima
(2002) afirma:
As polêmicas sobre o assunto, entretanto, são próprias da complexidade
das relações internacionais e do aumento do número de seus agentes. De
um lado, há o alcance das prerrogativas diplomáticas, de outro, a proteção
adequada dos interesses internos dos Estados acreditados e dos seus
nacionais. Assim, especialmente em países juridicamente fortes e com uma
população ciosa de seus direitos, firmaram-se tendências revisionistas de
importantes princípios de Direito Internacional.
O aumento do número das missões diplomáticas teve como consequência
natural um aumento do número de funcionários diante do volume de assuntos com
que a diplomacia passou a lidar e da diversidade dos questionamentos que tiveram
que tratar107. Tais ocorrências poderiam gerar situações diplomáticas embaraçosas
e politicamente delicadas, o que poderia vir a ocasionar rompimentos entre missões
diplomáticas, afetando o relacionamento bilateral.
Para a resolução desses conflitos sempre é levado em conta o princípio da
reciprocidade, que está elencado junto com outros princípios na Carta das Nações
Unidas.108
107
Sérgio Eduardo. Privilégios e Imunidades Diplomáticas. Brasília: Instituto Rio Branco: Fundação
Alexandre Gusmão, 2002. P. 15.
108
São sete os princípios do Direito Internacional expressos na Carta das Nações Unidas e
sistematizados na Declaração de 1970: a) proibição do uso da força; b) solução pacífica de
controvérsias; c) não-intervenção nos assuntos internos dos Estados; d) dever de cooperação
internacional; e) igualdade de direitos e autodeterminação dos povos; f) igualdade soberana dos
51
Como exemplo da aplicabilidade do princípio da reciprocidade, temos um ato
que aconteceu em 2008, onde um grupo de brasileiros foi barrado no aeroporto de
Madri. O Ministério das Relações Exteriores, em nota, disse que as medidas
adotadas pela imigração da Espanha ferem o nível do relacionamento entre os dois
países.
A imunidade, conforme estudo histórico, está presente desde os primórdios
e se confunde com a própria história do Direito Internacional. Na Grécia antiga, por
exemplo, se considerava que os representantes de outras cidades eram
considerados protegidos por Zeus.
Considerada por muitos países a mais importante das prerrogativas, a
inviolabilidade da missão diplomática é uma regra aceita universalmente. ―(…) A
inviolabilidade dos locais da missão não é uma consequência da inviolabilidade do
chefe da missão, mas um atributo do Estado acreditante em virtude do fato de os
locais serem usados como sede da missão‖, comentou a Comissão de Direito
Internacional.
Ademais, a Convenção de Viena busca a prevenção de abusos por parte
dos privilegiados. De acordo com Lima (2002)
Diante de episódios de abuso da imunidade diplomática, para contornar
conseqüências agravantes, a função diplomática do agente pode ser
terminada pela remoção do agente para outro posto noutro Estado ou pelo
retorno ao País de origem, onde, face às circunstâncias, poderá responder
pelo delito segundo as leis locais. Não havendo iniciativa imediata do País
de origem, o Estado estrangeiro pode declarar o diplomata, persona non
grata, situação geralmente seguida de sua providencial remoção.
Prevendo alguns episódios acerca do abuso dessas prerrogativas, pode ser
determinada a remoção do agente.
Não havendo iniciativa imediata do País de origem, o Estado estrangeiro pode
declarar o diplomata, persona non grata, situação geralmente seguida de sua
providencial remoção, artigo 9 §1º e §2°:
§1°O Estado acreditado poderá a qualquer momento, e sem ser obrigado a
justificar a sua decisão, notificar ao Estado acreditante que o Chefe da
Missão ou qualquer membro do pessoal diplomático da Missão é
persona non grata ou que outro membro do pessoal da Missão não é
Estados; e g) boa-fé no cumprimento das obrigações internacionais. A Declaração de 1970 tratou a
Carta das Nações Unidas como fonte for mal do Direito Internacional.
52
aceitável. O Estado acreditante, conforme o caso, retirará a pessoa em
questão ou dará por terminadas as suas funções na Missão. Uma pessoa
poderá ser declarada non grata ou não aceitável mesmo antes de chegar ao
território do Estado acreditado.
§2° Se o Estado acreditante se recusar a cumprir, ou não cumprir dentro de
um prazo razoável, as obrigações que lhe incumbem, nos termos do
parágrafo 1° deste artigo, o Estado acreditado poderá recusar-se a
reconhecer tal pessoa como membro da Missão.
Não resta dúvida de que todo princípio geral pode dar lugar a abusos, as,
também, não há dúvida de que todo direito o pode também. No caso do
caráter absoluto da inviolabilidade da missão diplomática, entre o abuso do
direito e o abuso da exceção, este é mais perigoso nas relações entre os
109
Estados.
Tem-se registro de que nos últimos 10 anos, diplomatas nomeados
cometeram quinhentos e quarenta e seis crimes sérios. Destes crimes, quarenta por
cento foram roubos e os outros quarenta foram violações referentes à ingestão de
álcool e de drogas. 110
O professor francês Cahier ressalta que eventuais abusos perpetrados pelo
Estado acreditante serão facilmente regulados pelo princípio de reciprocidade que
reina nas relações diplomáticas.111
5.
RENÚNCIA
O artigo 32 da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas expõe:
1. O Estado acreditante pode renunciar à imunidade de jurisdição dos seus
agentes diplomáticos e das pessoas que gozam de imunidade nos termos
do artigo 37.
2. A renuncia será sempre expressa.
3. Se um agente diplomático ou uma pessoa que goza de imunidade de
jurisdição nos termos do artigo 37 inicia uma ação judicial, não lhe será
permitido invocar a imunidade de jurisdição no tocante a uma reconvenção
ligada à ação principal.
109
NASCIMENTO E SILVA, Geraldo Eulálio do. A Convenção de Viena sobre Relações
Diplomáticas. Rio de Janeiro: Ministério das Relações Exteriores, 1967, p. 107, apud MOREIRA
LIMA, op. cit., p. 47.
110 110
ASHMAN, Chuck; TRESCOTT,Pamela. Esacandalo: O Abso da Imunidade Diplomática.
Portugal: Puplicações Europa-America, 1986,. P., 47.
111
CAHIER, P., Le Droit Diplomatique Contemporain, Paris: Librairie Minard, 1962, p. 90.
53
4. A renuncia à imunidade de jurisdição no tocante às ações civis ou
administrativas não implica renúncia a imunidade quanto às medidas de
execução da sentença, para as quais, nova renúncia é necessária.
A Comissão de Direito Internacional diz que somente o Estado pode
renunciar à imunidade, pois o objetivo é fazer eficaz o desempenho das funções na
Missão Diplomática e não beneficiar o indivíduo. A imunidade, que está neste artigo,
em epígrafe, diz respeito à imunidade jurisdicional civil, penal e administrativa, sem
abranger a inviolabilidade pessoal do Agente.
A renúncia é um abandono não forçado e unilateral de um direito, cuja
eficácia é ex nunc e irrevogável, pela parte de quem detém o poder, onde afasta
imunidades e privilégios decorrentes da função em cargo diplomático.
Disse Ian Brownlie:
A renúncia pode ocorrer inter alia, por tratado, por comunicação
diplomática ou através da submissão efetiva a um processo instaurado
num tribunal nacional. Esta submissão voluntária à jurisdição não se
estende às medidas de execução. Não se deve deduzir que há renuncia,
em termos jurídicos, pelo fato de uma dada atividade ser comercial. Os
problemas da renúncia estão, evidentemente, relacionados com a
controvérsia sobre a extensão da imunidade, utilizando alguns tribunais a
112
doutrina da renuncia implícita para restringir a imunidade.
Para Gilmar Mendes, a soberania dá o direito de o corpo diplomático exercer
sua função com independência e praticar atos voluntários, como também mostra
uma autorização para que o Estado renuncie, o que o faz perder sua soberania e
suas prerrogativas em favor da interação social.113
As renúncias são incomuns, principalmente a renúncia da imunidade penal, o
que pode vir a acontecer caso ocorra algum crime cometido por um agente
diplomático, mas, caso aconteça, o agente não pode de maneira nenhuma invocar a
imunidade novamente. A renúncia só pode vir a ocorrer se for o Estado acreditante a
pedir a renúncia.
112
BROWNLIE, Ian. Princípios de Direito Internacional Público. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 1997, p. 361.
113
MENDES, Gilmar Ferreira. Imunidade de Jurisdição: Evolução e Tendencias. Revista CEJ, v.
19, 2001, PP. 24-25.
54
A renúncia será tácita na medida em que o Estado ajuíza ação em foro
estrangeiro ou que, sendo citado, comparece, defende-se no mérito e não levanta
declinatória de incompetência internacional da Justiça estrangeira. 114
Carlos Henrique Bezerra Leite disse:
A imunidade de jurisdição, segundo o entendimento que tem prevalecido,
alcança apenas o processo de execução, ou melhor, não permite a
expropriação dos bens do ente de direito público externo, salvo se este, por
tratado ou sponte sua, renunciar expressamente à imunidade de execução.
Como não houve alteração substancial pela Emenda Constitucional n°
115
45/2004, infere-se que não haverá mudança acerca das decisões.
Um dos abusos que vem ocorrendo com certa freqüência é de pelo fato da
mala diplomática também gozar de imunidade, há agentes diplomáticos e
familiares que usaram e usam esse tal direito para o transporte de produtos
entorpecentes, contrabando de armas, diamantes e outras pedras
116
preciosas, obras de arte. Como esse exemplo que segue.
Houve um caso na Embaixada do Quênia, em Londres, onde o terceiro
secretário do consulado foi detido por posse de entorpecentes. Ao ser provada a sua
ligação com a embaixada foi solto de imediato. O governo britânico instaurou uma
investigação e, com provas suficientes, ficou provado que as drogas que entravam
no país vinham por meio das malas diplomáticas. Mediante tal ato o presidente do
Quênia, Kenneth Kaunda, não tardou em renunciar à imunidade do terceiro
secretário, e, em nota pública, deu sua decisão:
A imunidade diplomática nunca se destinou a evitar a investigação de
crimes graves. Pessoalmente, tenho horror de toda droga que vicia. Ela
destrói os seres humanos. Creio estar agindo para proteger meu povo e
também o povo britânico e, na verdade, os povos de todo mundo [...]
Quando recebi o pedido de suspensão da imunidade, não hesitei um só
segundo. Disseram-me que se tratava de uma decisão quase sem
precedentes. Porém, nessa luta contra essa terrível ameaça, na qual todos
117
devem empenhar-se, estou convencido de que estou certo.
Relativamente à legitimidade para o ato de renúncia, é de se destacar que a
imunidade é conferida em favor do Estado acreditante, de modo que apenas
114
Moll, Leandro de Oliveira. Imunidades internacionais: tribunais nacionais ante a realidade das
organizações internacionais , apud,O silêncio do Estado não basta, por si só, para configurar a
renúncia tácita à imunidade de jurisdição. Nesse sentido: CARVALHO, Júlio Marino de. A renúncia de
imunidades no direitointernacional. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 674, dez. 1991, p. 33; e
também: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Apelação Cível n. 9.697. Tribunal pleno. Rel. Min. Djaci
Falcão. Julgada em 30.04.1986. Revista Trimestral de Jurisprudência, v. 118, pp. 77-79.
115
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. São Paulo: LTr,
2006. p. 229
116
MENDES, Gilmar Ferreira. Imunidade de Jurisdição: Evolução e Tendência. Revista CEJ, v.
19, p. 2, 2001.
117
Apud, Mcclanaban, op, cit, p 156 e 157.
55
este, na qualidade de legítimo titular, pode renunciá-la. De nenhum efeito,
118
portanto, a renúncia operada pelo próprio agente beneficiário.
Como exemplo, temos na jurisprudência norte-americana, o caso Ranollo,
onde a ONU renunciou à sua imunidade de jurisdição, diante de acidente causado
pelo motorista que conduzia o Secretário-Geral em excesso de velocidade pelas
ruas de Nova York, em 1946.119
O direito à renúncia se soma à regra de que um juiz nacional não pode aplicar
direito público estrangeiro.120
Concluindo, então, que a prerrogativa da imunidade de jurisdição sempre
caminhou junto à possibilidade de renúncia.
118
Imunidades Diplomáticas. Arthur César Cavalcante Loureiro. Disponível em:
<http://jus.com.br/revista/texto/12532/imunidades-diplomaticas#ixzz28vce70oa>. Acesso em: 10 out.
2012
119
SOARES, Guido Fernando Silva. Das imunidades de jurisdição e de execução. Rio de Janeiro:
Forense, 1984, pp. 170-171.
120
BROWER, Charles H. International immunities: some dissent views on the role of municipal
courts. Virginia Journal of International Law, v. 41, n. 1, 2000, pp. 66-69
56
CAPÍTULO IV – A RELEVÊNCIA DAS IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS
6.
IMPORTÂNCIA DOS PRIVILÉGIOS E IMUNIDADES
A importância da imunidade diplomática mostra o sentido de fortalecer os
meios pacíficos na solução de polêmicas, com o fim de aprimorar o potencial
nacional, não somente em um território externo, na defesa de seus interesses, mas
também como reflexo no âmbito interno.
Para Moreira (1996)
O mais importante instrumento da política internacional é, ainda hoje, a
diplomacia, que pode ser definida como uma ‗arte da negociação ou o
conjunto das técnicas e processos de conduzir as relações entre os
121
Estados.
Para o incremento das atividades relativas às missões diplomáticas é
necessário que o corpo diplomático tenha completa liberdade dentro do território
―desconhecido‖, que possui muitas das vezes leis completamente diferentes das de
seu país de origem. A real intenção para tais prerrogativas, não é a de beneficiar a
pessoa física, mas sim de desenvolver a missão diplomática da maneira mais
correta e transparente, possuindo garantias do Estado acreditado para seu livre
exercício. O princípio de reciprocidade que reina nas relações diplomáticas é a
permissão de um direito que não é previsto pelo direito comum.
Um Estado sempre mostrará seu ponto de vista, partindo da premissa de que
a sua visão está totalmente correta. Em contrapartida, o outro Estado tomará a
mesma atitude. Por esse motivo, os atos praticados por um Estado soberano não
podem ser julgado por outro, da mesma hierarquia, baseando-se na igualdade
jurídica, um princípio que iguala direitos e deveres, par in parem non habet judicium.
121
MOREIRA, Adriano. Teoria das Relações Internacionais. Coimbra: Almedina, 1996.,p.55
57
Como explanou Clóvis Beviláqua, ―em rigor não há direito à igualdade, mas
todos os Estados têm direitos iguais na comunhão universal‖122.
Para Rezek, um Estado passa a ser soberano quando não se subordina a
uma outra autoridade de igual hierarquia. O que não significa que, quando há
subordinação à jurisdição estrangeira em relação aos atos de gestão, a soberania
tenha sido comprometida.123
Segundo Jean Bodin, que em 1576, em seu livro Les Six Livres de la
Republique, o significado de soberania é o mesmo significado de república: a
soberania deve ser una, por ser indivisível; absoluta, pois não está subordinada a
nada nem ninguém, não fica sujeita a qualquer aprovação para a prática de algum
ato; e perpétua, uma vez que não sofre a ação do tempo.124
Victor Bulmer-Thomas, da entidade londrina de estudos da política externa
Chatham House, "Há momentos em que você precisa apoiar seus vizinhos, mesmo
que você talvez tenha algumas ressalvas, sabendo que da próxima vez vão apoiá-lo"
Caso o corpo diplomático ficasse a mercê das interferências do Estado
acreditado, poderia sofrer influências relativas a questões de segurança em um grau
que afetaria o exercício de suas funções. Nesse caso o exercício da imunidade teria
por fim o afastamento total de fatores que pudessem prejudicar o andamento dos
encargos diplomáticos. Podemos dizer que referidas normas são facilitadoras do
exercício do direito.
Os Estados soberanos possuem competências legislativas, judiciais e
administrativas.125
Em setembro de 1969, foi seqüestrado, no bairro do Botafogo, no Rio de
Janeiro, o embaixador americano Charles Burke Elbrick. Mais uma evidência da
necessidade dessas imunidades, ou melhor, da necessidade do Estado acreditado
proporcionar a devida segurança aos agentes diplomáticos.
Para os diplomatas, habituados às boas maneiras e às gentilezas dos
salões, a violência física é a forma menos indicada de se resolver um
problema. Para os terroristas, acostumados à subversão da ordem e à vida
clandestina, a violência física é uma das formas mais indicadas de se
122
BEVILÁQUA,Clovis. Direito Público, 2. Ed. São Paulo:Freitas Bastos,1939, p. 78.
REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: curso elementar. 11ª Ed.., São Paulo:
Saraiva, 2008 p. 224
124 124
BODIN, Jean. Les Six Livres De La Republique, 1993, págs 111 e segs, Le livre de poche,
Paris in MELLO, Celso de Albuquerque.Anuário...p. 11.
125
BROWNLIE,Ian. Princípios de Direito Internacional Público. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 1997, p. 319.
123
58
resolver um problema. Na semana passada, um diplomata e alguns
terroristas encontraram-se numa das ruas do bairro de Botafogo, no Rio de
Janeiro, e iniciaram uma convivência forçada de quatro dias que seria
encarada como um acontecimento extraordinário por todo o mundo. Como
nos bons filmes de suspense, a história começa com uma senhora de meiaidade olhando a rua pela janela de sua casa. Dona Elba Souto Maior é
casada com um militar e é irmã do Secretário de Segurança do Território de
Roraima. E talvez por isso alguns movimentos na calçada à sua frente lhe
126
parecem extremamente suspeitos.
Tem-se, portanto, que a imunidade depositada nesses agentes é realmente
um privilégio, uma vantagem conferida para que o governo local não crie obstáculos
durante a missão, pois não estão sujeitos ao ordenamento jurídico local, com livre
acesso e independência para executar seus atos. Disse Javier Pérez O titular dos
privilégios não é o agente da missão, mas sim o Estado.127
Aceitar todas essas prerrogativas é saber que nossas missões terão
resultados, pois estaremos dentro dos princípios que regem o Direito Internacional,
realizando relações pacíficas e positivas com todos que fazem parte do mundo
internacional.
Como base para essas prerrogativas, temos a teoria da necessidade
funcional, a qual está sempre evoluindo, abrangendo o caráter econômico,
tecnológico, religioso e ético, buscando a superação de falhas e o reconhecimento
de erros e lacunas.
A Teoria funcional permite realizar uma análise comparativa dos fenômenos
em diversas culturas. É capaz de produzir uma análise concreta da cultura
através das instituições e de seus aspectos. Recomendação a leitura dessa
obra a pesquisadores de campo isso significa, principalmente, equipar o
investigador de campo com uma perspectiva clara e instruções completas
com relação ao que observar e como registrar. Desse modo, o
funcionalismo insiste definitivamente em que possui validade fundamental
como análise preliminar da cultura e que fornece ao antropólogo os únicos
128
critérios válidos de identificação cultural.
Ainda acerca da teoria da necessidade funcional, Sérgio Eduardo Moreira
Lima disse:
126
Disponível em: <http://veja.abril.com.br/arquivo_veja/capa_10091969.shtml> . Acesso em: 08 out.
2012.
127
PÉREZ DE CUÉLLAR, Javier. Manual de Derecho Diplomático. 7. ed. México: Fondo de Cultura
Económica,1997. P 82. (tradução do autor)
128
Teoria funcional de Bronislaw Malinowski. Disponível em:
<http://www.webartigos.com/artigos/teoria-funcional-de-bronislaw-malinowski/56975/>. Acesso em: 25
out. 2012.
59
A tendência moderna é, no entanto, a de conceder privilégios e imunidades
ao agente diplomático na 'necessidade funcional': as imunidades são
outorgadas aos diplomatas porque, de outra forma, não poderiam exercer
com independência e adequadamente sua missão. Fossem eles sujeitos à
interferência legal e política ou à boa vontade do Estado acreditado ou de
seus nacionais, poderiam ser influenciados por considerações de segurança
e conforto num grau que os prejudicaria materialmente no exercício de suas
129
funções.
Como exemplo da importância de tais prerrogativas no exercício da função
diplomática, poderíamos imaginar uma embaixadora de país ocidental acreditada em
país de religião muçulmana onde as mulheres, em geral, não exercem cargos
públicos.
Do mesmo modo, antes da teoria da necessidade funcional, havia a teoria do
caráter representativo, onde a imunidade era baseada somente no fato do agente
diplomático representar o Estado na missão diplomática, sem delimitar os atos
referentes às suas funções e que seriam próprios para o uso dessas
prerrogativas.130
Moreira diz que:
A Diplomacia vai adquirindo reconhecida autonomia dentro do espaço
administrativo estatal, organizando-se em ministérios separados, enquanto
que os diplomatas passam a ser considerados como profissionais
portadores de conhecimentos especiais, constituindo então o denominado
131
corpo diplomático.
Caso o corpo diplomático ficasse à mercê das leis e costumes do Estado
acreditado, decerto não haveria segurança nas relações diplomáticas, já que as
questões de toda sorte estariam submissas às influências oriundas de postura
cultural/religiosa, podendo mesmo afetar a segurança física da mulher em questão.
A diplomata do sexo feminino poderia ser motivo de repúdio. Poderia não ser
aceita em alguns locais. Poderia até mesmo ser agredida ou presa, caso não
estivesse acobertada pelas regalias diplomáticas. A segurança de um representante
de outro País é exatamente o fato de ser do conhecimento geral que todo o corpo
diplomático tem sua liberdade e segurança física asseguradas pelo Estado
acreditante.
129
LIMA, Sérgio Eduardo Moreira. Imunidade Diplomática Instrumento de Política Externa. Rio
de Janeiro. Editora Lumen Juris, 2004. p. 32
130
LIMA, Sérgio Eduardo Moreira. Imunidade Diplomática Instrumento de Política Externa. Rio de
Janeiro: Editora Lumen Juris, 2004, p. 29.
131
MOREIRA, Adriano. Teoria das Relações Internacionais. Coimbra: Almedina, 1996.,p.53.
60
Como já visto a imunidade não se refere a pessoas e sim a Estados, no
sentido de que oferece garantias de livre circulação e livre expressão para que as
relações internacionais possam ocorrer de maneira pacífica e proveitosa, bem como
livre de entraves de natureza cultural, conceitual, religiosa ou preconceituosa.
Os diplomatas, oriundos de qualquer parte do mundo, estão afeitos ao convívio
entre homens e mulheres de idades, credos, raças e costumes diversos, devem
respeitar tais diferenças e saber transitar no nível que se encontra acima de
diferenças culturais pelo bem de nações e pela paz mundial.
A execução das funções de uma missão diplomática – órgão das relações
externas dos Estados não seria possível se o Estado acreditado não
garantisse a ela e aos seus componentes aquele complexo de tratamentos
necessários à sua liberdade, ao seu decoro, à sua independência e,
132
sobretudo, à sua segurança
São formas de garantia nas relações internacionais entre os Estados
soberanos, pressupõem a representação política desses Estados no
estrangeiro, decorrentes das necessárias atividades diplomáticas, que
regulam os interesses recíprocos das nações. Estão ligadas à necessidade
de se proteger os agentes ou representantes de países no estrangeiro, no
exercício de suas funções de diplomacia. O nomen juris delas, portanto, é
133
apropriado e aceito pela doutrina
Segundo Cicco Filho, as imunidades são essenciais para os representantes do
Estado acreditante, sendo evidente que as missões devem exercer as funções que
lhe são incumbidas, isentas de qualquer ameaça.134
Dedicar-se para a total funcionalidade de tais prerrogativas, seria também
reconhecer que as missões diplomáticas terão resultados ante a não interferência do
Estado acreditado, pois todos os agentes estarão livres para atuar em suas funções.
Em outras palavras, promover-se-ão relações amistosas entre todos que participam
deste incomensurável mundo que forma o Direito Internacional com conseqüentes
vantagens a todos os que destas prerrogativas usufruem, mas, com fincas no
instituto da reciprocidade, também as garantem aos demais Estados.
132
SICARI, Vicenzo Rocco. O Direito das Relações Diplomáticas. Editora Del Rey, 2007, p.123.
DOS SANTOS, Miguel Ângelo Ciavareli Nogueira. Imunidades Jurídicas. Editora Juarez de
Oliveira 2003, p.117.
134
CICCO FILHO, Alceu Jose. Relevância da imunidade diplomática. Rev. Jur., Brasília, v. 8, n. 79,
jun./jul., 2006, p. 63
133
61
7.
CASOS RELEVANTES
Na sequência, seguem casos concretos para que haja uma maior
compreensão da necessidade das imunidades e privilégios.
Como destaque para a realização deste trabalho, não podemos deixar de citar
uma pessoa que conseguiu inserir o Brasil no mundo internacional: José Maria da
Silva Paranhos Júnior, o Barão do Rio Branco, patrono da diplomacia nacional. Não
por acaso, quando faleceu, o jornal "A Noite" escancarou a manchete que pretendia
resumir o sentimento nacional. "A morte do Barão do Rio Branco é uma tragédia
nacional. Exercia suas funções com ética, segurança, a prudência associada à
firmeza, o equilíbrio, o comedimento, a moderação, o horror à prepotência, à
arrogância, ao excesso de ênfase e de retórica, o cuidado extremo de jamais jactarse, de não humilhar os adversários. Ainda não houve nenhum que se equiparasse
em termos de feitorias para o nosso governo. Conquistou para o Brasil o Amapá,
Palmas e Acre.‖
Um caso recente que aconteceu na Itália, onde um juiz bloqueou as contas do
consulado brasileiro no país, com o intuito de cobrir os custos do suposto calote de
uma empresa estatal brasileira acerca dos projetos do trem-bala, (até hoje não
foram desbloqueadas a contas), onde o tribunal de primeira instância da Itália conta
agora com o apoio da suprema corte em enfatizar que há essa dívida bilionária, a
qual o Brasil deve pagar. Segundo o porta-voz do governo italiano, a Itália se
comprometeu a apoiar o Brasil numa alternativa para o problema, já que o bloqueio
infringe a Convenção de Viena.
Neste mês de setembro, vêm acontecendo uma série de ataques a missões
diplomáticas dos Estados Unidos, na Líbia, Tunísia, Sudão, Egito e Iêmen, por
motivo de protestos religiosos pela divulgação de um filme que, segundo os
manifetantes, atinge a figura de Maomé. Na Líbia o ataque ao consulado americano
causou a morte do embaixador Christopher Stevens e de mais 14 pessoas, dentre
eles funcionários da embaixada e policiais da Líbia.
62
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, fez, na 64º Assembléia
Geral da ONU um discurso forte, baseado na defesa à liberdade de expressão, à
tolerância e contra qualquer forma de violência.
A maior arma contra o discurso do ódio não é a violência, é mais discurso.
Não há discurso que justifique violência. Não há palavras que justifiquem a
morte de inocentes"[...] "As pessoas irão me dizer coisas horríveis todos os
dias, e vou sempre defender seu direito de fazê-lo. (...) É dever de todos os
governantes falar contra o extremismo.
Uma senhora brasileira, que prestou serviços de lavadeira para o consulado
do Japão em Recife, impetrou ação contra o império japonês, na qual reivindicava
verbas trabalhistas que deixou receber. A representação diplomática não respondeu
à acusação, apenas invocou a imunidade de jurisdição. Somente depois de 15 anos
o processo foi decidido, mas a autora já havia falecido. Vale ressaltar que o presente
caso consiste na relação relativa à imunidade de jurisdição em matéria trabalhista.
O recurso extraordinário não foi conhecido. E o ministro do STF, Celso de
Mello, entendeu que a imunidade diplomática não pode ser invocada para o
descumprimento de obrigações trabalhistas.
— O Estado estrangeiro não dispõe de imunidade de jurisdição, perante
órgãos do Poder Judiciário brasileiro, quando se tratar de causa de natureza
trabalhista. Doutrina. Precedentes do STF (RTJ 133/159 e RTJ 161/643644).
— Privilégios diplomáticos não podem ser invocados, em processos
trabalhistas, para contestar o enriquecimento sem causa de Estados
estrangeiros, em injusto detrimento de trabalhadores residentes em território
brasileiro, sob pena de essa prática consagrar inaceitável desvio éticojurídico, incompatível com o princípio da boa-fé e com os grandes
postulados do direito internacional.
Em julho de 2000, o cônsul-geral de El salvador em Brasília se
beneficiou de suas prerrogativas consulares para importar um carro com isenção de
impostos. É prevista na Convenção de Viena que a isenção somente é válida caso o
automóvel sirva para uso da autoridade consular ou de seus familiares, sendo
permitida a venda para terceiros após três anos de uso, quando foi constatado que o
carro estava em posse de terceiros desde abril de 2001. O cônsul foi denunciado por
falsidade ideológica e descaminho. A representação diplomática salvadorenha, após
ser consultada pelo Ministério das Relações Exteriores, retirou os privilégios e
imunidades do cônsul, permitindo o prosseguimento da ação. Foi requerido e
63
negado o Habeas corpus, onde o cônsul argumentou a nulidade dos atos, praticados
pelas autoridades apontando falta de competência das autoridades brasileiras diante
da imunidade de jurisdição.135
Um caso um tanto insólito, foi quando o governo Britânico ameaçou
suspender a imunidade da embaixada do Equador em Londres, para poder capturar
Assange, que está abrigado desde junho na Embaixada com o intuito de escapar de
um processo de extradição para a Suécia, onde é acusado de crimes sexuais. Ele
diz temer que de lá seja transferido para os Estados Unidos, cujo governo o acusa
de ter violado leis por divulgar no site WikiLeaks milhares de documentos
diplomáticos confidenciais. Irritado, o governo do Equador concedeu asilo político ao
ex-hacker australiano.
Com esse episódio, a Grã-Bretanha pode estremecer ainda mais136 seus
laços diplomáticos com a America Latina, que repudiou a ameaça, uma vez que a
Grã-Bretanha busca relações com países Latinos de rápido crescimento. O governo
já está sendo acusado de arrogância colonial para com os latino-americanos.
137
Acho que tanto a questão das Falklands/Malvinas quanto o caso Assange
abalaram a imagem da Grã-Bretanha na América Latina, disse o chefe do
departamento de Assuntos Internacionais Latino-Americanos da London
School of Economics, Francisco Panizza.
É um dano à reputação, se você quiser, mas no momento está contido, e
não acho que os países da América Latina, exceto na altamente improvável
situação de a Grã-Bretanha invadir a embaixada equatoriana, irão tentar
138
exacerbar as tensões, acrescentou.
Dominique Strauss-Kahn, ex-diretor-gerente do FMI foi detido no ano de 2011
na cidade de Nova Iorque, minutos antes de embarcar para Paris, diante uma
acusação de abuso sexual, cometido horas antes com uma camareira no hotel em
que estava. Um tempo antes houve uma acusação parecida, feita por uma jornalista,
onde alegava ter sido vítima de um abuso sexual. Por pleito de sua própria defesa, o
135
Falsidade Ideológica. Disponível em:
<http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/48907/el+salvador+abre+mao+de+imunidade+e+
consul+sera+processado+no+brasil.shtml>. Acesso em: 05 out. 2012.
136
No caso da guerra da Malvinas, a Grã-Bretanha disse que não há discussão acerca da soberania
das ilhas. Não aceita negociações.
137
No aniversário de 30 anos da Guerra das Malvinas, que foi entre argentina e Reino Unido,
reascendeu o conflito, pois o governo argentino requereu a reabertura das negociações acerca da
soberania das ilhas e acusou o Reino Unido apo o envio de um navio Britânico, com o intuito de
militarizar a área. Essa guerra foi o começo da estremecida relação diplomática.
138
Disponível em:
<http://br.reuters.com/article/worldNews/idBRSPE87L06U20120822?pageNumber=2&virtualBrandCh
annel=0>. Acesso em: 08 out. 2012
64
acusado começou a cumprir prisão domiciliar. Em maio deste ano um juiz de Nova
Iorque, negou o pedido de anulação da queixa da camareira, por alegada violação
da sua imunidade diplomática. Na decisão foi lembrado que Strauss-Kahn renunciou
ao cargo dias após sua prisão, então não era funcionário do FMI, nem enviado
diplomático e nem agente diplomático, não havendo privilégio e nem imunidade a
gozar.
Em abril deste ano, houve uma acusação de assédio sexual contra um
diplomata iraniano, ocorrido em um clube no bairro da Asa Norte em Brasília, dentro
da piscina, onde o diplomata teria assediado crianças e adolescentes entre 9 a 14
anos. Fato este que originou certo desconforto entre Brasil e Irã. A Embaixada
Iraniana retirou o diplomata do país, mas o governo brasileiro cobrou providências
do Irã, que informou que o diplomata havia sido demitido. De acordo com a
Convenção de Viena, um diplomata não pode ser processado ou preso no Brasil.
Mas pode sofrer punições no Brasil se o país de origem retirar a imunidade
diplomática ou se ele for declarado persona non grata pelo governo brasileiro, sendo
expulso. No entanto, o diplomata não está isento de ser alvo de processo em sua
terra natal.139
Marcos Abizaie, pastor nigeriano foi suspeito de espancamento e estupro
contra uma mulher nigeriana, que também residia na casa oficial do embaixador da
Nigéria. A nigeriana Nkiruka Paciota Ownegbuna, prestou queixa na delegacia do
Distrito Federal e apresentava sinais de espancamento na face. O acusado alegou
possuir a imunidade diplomática, a qual não possuía por ser apenas um hóspede na
residência e ele poderia ser submetido a qualquer ato policial. A Embaixada não se
manifestou sobre o caso.140
No Habeas corpus 49.183 o Supremo Tribunal Federal reconheceu a
imunidade à jurisdição penal local num caso de injúria pelo cônsul da República
Dominicana em São Paulo contra o vice-cônsul do mesmo país, e expressa em
correspondência relativa ao desempenho de suas tarefas (1971). Já no habeas
corpus 50.155 o Supremo Tribunal Federal proclamou a competência da justiça de
139
Disponível em: <http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI5997924-EI5030,00Itamaraty+sem+imunidade+diplomatica+nigeriano+respondera+por+estupro.html>. Acesso em: 08
out. 2012.
140
Suspeito de Violentar Mulher na Casa do Embaixador da Nigéria
Disponível em: <http://www.africa21digital.com/comportamentos/ver/20027521-suspeito-de-violentarmulher-na-casa-do-embaixador-da-nigeria-nao-tem-imunidade-diplomatica> Acesso em: 09 out. 2012
65
São Paulo para processar o cônsul honorário do Chile, que praticara lesões
corporais numa discussão resultante de relações de vizinhança (1972).141
Neste caso acima, quando reconhecida que não havia imunidade ao cônsul,
poderia ter sido processado ou simplesmente ter renunciado ao privilégio, para que
o agente fosse julgado em seu Estado.
Nos vários casos expostos, podemos observar a real necessidade do
esclarecimento, de normas reguladoras claras, para que nunca haja equívoco em
atribuir imunidade a quem a quem não a detém por lei. Sempre haverá uma pessoa
que possa requerer tal privilégio sem mesmo possuí-lo, como visto vários casos
acima referidos. Precisamos entender quais são os limites, quais são as diretrizes,
bem como qual a interpretação que devemos dar à norma que pretendemos aplicar.
Deste modo, podemos perceber a relevância deste instituto, mostrando sua
grande eficácia, desde a evolução histórica até os casos práticos, no âmbito interno
e no internacional. Há uma finalidade de garantir o desempenho eficaz das missões
no exterior e, para isso, a norma deve ser aplicada de forma enérgica.
Destaca-se, igualmente, a intimidade dos doutrinadores com o assunto, como
se pode comprovar pela abundância de casos práticos apontados, pelas sugestões
indicadas, pelos cuidadosos estudos e conclusões a que chegaram os referidos
mestres, estudos esses que, avalizados pelos órgãos competentes, formarão as
fontes da jurisprudência necessária ao deslinde das questões que se apresentarem.
O fato das imunidades existirem não exclui a possibilidade de o agente
diplomático ser julgado. Como já foi dito, as imunidades agem no âmbito externo,
quando o agente diplomático está em exercício da sua função, mas ao retornar ao
seu país de origem ele continua sujeito às sanções locais.
Caso essas prerrogativas venham a ser utilizadas de forma abusiva, deverão
haver diligências no sentido de que sejam adotadas posições mais restritas e rígidas
quanto às imunidades e às prerrogativas diplomáticas.
141
REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. Editora Saraiva, 2008. p. 173.
66
CONCLUSÃO
O presente trabalho veio demonstrar a relevância da imunidade e de seus
privilégios, analisando a sua finalidade, que é de garantir o eficaz desempenho da
missão diplomática, considerando o lado histórico e jurídico da diplomacia.
Para que o Direito Internacional funcione e seja satisfatório em todos os
sentidos, existem as imunidades e seus privilégios como fundamento da norma, que
surgiu com o intuito de facilitar e garantir o desenvolvimento das funções nas
missões diplomáticas ao representar seus Estados.
Como já exposto, desde tempos remotos, existem registros dessas relações
entre Estados soberanos, já que nenhuma sociedade internacional pode viver
isoladamente. Sendo motivo de indagações teóricas dos grandes pensadores da
humanidade, para uma melhor interpretação.
Os primórdios de nossa civilização demonstraram o perigo pelo qual
passavam os emissários de notícias entre os povos, os quais, incontáveis vezes,
após sua missão perante o soberano estrangeiro, caso fossem portadores de más
notícias, terminavam com suas cabeças espetadas na ponta de uma lança ou
simplesmente tinham suas vidas ceifadas a fio de espada.
Podemos imaginar o pavor dos embaixadores das más novas quando se
postavam aos pés do soberano estrangeiro.
Alguns reis e imperadores, tais como o último imperador bizantino e o sultão
Saladino, os quais eram oponentes que se respeitavam e admiravam, a ponto do
último ter oferecido seus médicos particulares ao primeiro, o qual sofria de lepra já
em estado adiantado de sofrimento e que usava uma máscara de ouro para ocultar
a deformidade que já se apoderara de seu rosto. A comunicação entre os dois
monarcas se fazia de forma elegante e amistosa.
Não sendo, porém, essa a forma dominante de relações diplomáticas entre os
países no decorrer da nossa história, foram surgindo os embaixadores, figuras
ilustres e respeitadas como representantes dos governantes de então.
No entanto, para que se pudesse dar seguimento ao trabalho que, no
decorrer do tempo ficou cada vez mais elaborado e especializado, surgiu a
necessidade de alargar o campo de atuação com a necessária segurança para o
67
embaixador, seus familiares e ajudantes. Livrá-los de perseguições e do risco da
morte.
Existe uma grande possibilidade de que as missões diplomáticas tenham tido
a finalidade precípua de resolver conflitos no nascedouro, entre as cabeças
coroadas das nações antigas, para que guerras e desavenças dinásticas fossem
evitadas. Tal não foi o resultado, mas, de qualquer sorte, grandes resultados no que
se refere a desenvolvimento, conhecimento e progresso em geral foram alcançados.
Os pequenos grupos empunhando bandeiras brancas nos interstícios entre as
batalhas já eram o prenúncio da grande conquista que se tornou a Organização das
Nações Unidas, cujo objetivo é exatamente dirimir conflitos em seu nascedouro a fim
de se poupar vidas e sofrimento desnecessários e que só servem a interesses
imediatistas de poucos detentores de grandes riquezas e capital.
Congressos e conseqüentes convênios desenharam o que seria a futura
imunidade, como a temos hoje. Instituição absolutamente necessária para o
exercício a contento da missão que os agentes diplomáticos têm a desempenhar em
solo estrangeiro.
Exemplo de tal evolução foi o Congresso de Viena, ocorrido em 1815, onde,
pela primeira e única vez, redesenhou-se o mapa político de um continente que
havia sido expurgado de seus limites territoriais. O horror e o desgaste da guerra
haviam causado em uma Europa mais evoluída, a necessidade de resolver, pela
primeira vez na história mundial, diplomática e pacificamente uma questão de tal
monta.
Diante de diversas divergências que ocorreram no decorrer das décadas e
da evolução das necessidades humanas, transformou-se a missão diplomática em
instrumento de suma importância com vistos à conciliação, sempre na busca pela
segurança internacional entre os Estados e pela paz.
Para que as missões diplomáticas se desenvolvam a contento foi acordado
que na esfera internacional, todo Estado é igual e possui igual soberania, frisando
que também que todo individuo não deve burlar as leis que regulamentam o Estado
acreditado.
Apontou ainda que o papel das funções relativas às missões diplomáticas,
como órgão das relações externas dos Estados, não seria possível se não houvesse
garantias para a missão e para seus componentes, uma séria de tratamentos
68
necessários à sua liberdade, ao seu decoro, à sua independência e, sobretudo, à
sua segurança. Para que sejam executadas com maior independência e adequação.
A Imunidade diplomática veio para resguardar a função exercida pelo
representante diplomático, sendo que depende de cada país prevenir a ocorrência
de abusos que comprometam as missões, devendo o país no qual a missão está se
desenvolvendo empenhar-se na defesa de tais imunidades e privilégios.
O desenvolvimento das leis e convenções internacionais delineia as filigranas
dessas regras que, como qualquer regulamento, em qualquer Estado organizado,
permeia o comportamento dos cidadãos que, como se sabe, varia de acordo com
valores morais, de formação, de educação, de estrutura sócio-econômica, surgindo,
daí, as necessárias restrições e exceções, tais como as temos hoje.
Importante lembrar que na mesma proporção em que a codificação das
normas atribui uniformidade às imunidades, restringe-lhes seu sentido irrestrito, já
que estabelece situações em que as prerrogativas não podem ser invocadas. Existe
na atualidade uma tendência, por parte da maioria dos Estados, a limitar o regime de
privilégios.
Emergindo desse novo olhar sobre as imunidades, surge corrente doutrinária
recente no Direito Internacional que visa atingir, de forma prática, a imunidade do
representante de Estado.
Tal tomada de consciência, por parte da comunidade mundial, vem tendo
influência no processo de codificação em curso na Comissão de Direito Internacional
da ONU no sentido de aceitação da teoria de imunidade de jurisdição relativa do
Estado.
Com tal autoridade internacional e com base no consuetudinário princípio da
reciprocidade, que se reveste de grande importância no cenário das relações
internacionais, poderemos, então, esperar que nações que possuam os mais
avançados recursos tecnológicos, que detenham conhecimentos nunca antes
imaginados em todos os setores da ciência, da medicina, engenharia e de tudo que
a modernidade possa proporcionar de conforto às populações, tenham, de fato, a
possibilidade de pacificar toda e qualquer contenda que surja entre diferentes
perspectivas sobre um mesmo problema.
Eis o que esperamos do futuro: embaixadores da paz, missões de concórdia a
promover a união dos povos num trabalho de colaboração e troca de conhecimento
em todos os níveis da sabedoria humana, buscando dirimir as crises existentes.
69
Enfim, realizar este trabalho, contribuiu para um despertar maior acerca do
conhecimento das imunidades diplomáticas e seu grau de importância para a
manutenção da soberania estatal e para a consolidação das relações internacionais
num mundo cada vez mais integrado.
70
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Clarissa Zaidan Mourão de Oliveira