DA NÃO NECESSIDADE DE DEPÓSITO E REGISTRO DA CCT NA SRTE DO MINISTÉRIO DO TRABALHO PARA A VALIDADE E EXIGIBILIDADE DA MESMA. No âmbito do Distrito Federal instalou-se uma controvérsia sobre a validade da CCT celebrada entre o Sindicato dos Empregados do Comércio do DF SINDICOM-DF e o Sindicato do Comércio Varejista do DF - SINDIVAREJISTA. O foco da controvérsia é a recusa da SRTE do Ministério do Trabalho e Emprego em aceitar o depósito da norma, o que ocorre em razão de irregularidade formal na atualização do cadastro da entidade patronal. A controvérsia não pode ser admitida, não havendo outra possibilidade senão a de reconhecer como válido e imediatamente exigível o instrumento celebrado em maio de 2014. Efetivamente, em 1943 a CLT reuniu a legislação esparsa que cuidava de direitos sociais, trazendo, ainda, várias conquistas para os trabalhadores. Ao longo de mais de 40 anos era a única fonte de normas de direito do trabalho. Entre estas normas estava a obrigação de depositar a Convenção Coletiva de Trabalho ou o Acordo Coletivo de Trabalho nos órgãos regionais do Ministério do Trabalho ou no Departamento Nacional do Salário, quando fosse o caso de instrumento com validade nacional, regramento contido no art. 614. Com promulgação da Constituição de 1988, veio à luz a regra do inciso XXVI do art. 7º, que inclui entre os direitos fundamentais dos trabalhadores o reconhecimento aos acordos e convenções coletivas de trabalho. Tal inovação, hierarquicamente superior à regra da CLT, aliada àquela constante do inciso I do artigo 8º da mesma Carta, que prevê a não interferência e a não intervenção do Estado nos Sindicatos, afastou de vez a obrigatoriedade de depósito e registro de um ACT ou de uma CCT no Ministério do Trabalho e Emprego (SRTE) como condição para validade dos ajustes estabelecidos entre os representantes de empregados e de patrões. Para a doutrina, a incompatibilidade da Consolidação das Leis do Trabalho com a Constituição de 1988 teve como consequência a não recepção de diversos dispositivos da primeira pela última, uma verdadeira revogação tácita. No caso específico do art. 614, diante das previsões dos dispositivos constitucionais já mencionados, não há como sustentar a necessidade de depósito e registro da CCT para a validade e exigibilidade da mesma. Na evolução da legislação e da doutrina, hoje fala-se em prevalência do negociado sobre o legislado, admitindo-se, ainda que o raciocínio não tenha sido completamente aceito, que haja flexibilização de direitos através de normas de acordos ou convenções coletivas. Segundo o Jurista CELSO RIBEIRO BASTOS “as normas contrárias à Constituição não são recepcionadas, mesmo que sejam contrárias apenas a normas programáticas e não ofendam nenhuma preceptiva.” No mesmo sentido são as conclusões da Professora MARIA HELENA DINIZ para quem “Deve haver compatibilidade de um dispositivo legal com a norma constitucional. Havendo contradição entre qualquer norma preexistente e preceito constitucional, esta deve, dentro do sistema, ser aferida com rigor, pois é indubitável o efeito ab-rogativo da Constituição Federal sobre todas as normas e atos normativos que com ela conflitarem. As normas conflitantes ficam imediatamente revogadas na data da promulgação da nova Carta. Não sendo nem mesmo necessárias quaisquer cláusulas expressas de revogação. Tal ocorre porque, com a promulgação da Lei Maior, cria-se uma nova ordem jurídica, à qual devem ajustar-se todas as normas, sejam elas gerais ou individuais.” Para o Ministro MAURÍCIO GODINHO DELGADO um dos institutos jurídicotrabalhistas mais afetado pela dinâmica da sociedade e pelo advento da Constituição Cidadã de 1988, é sem dúvida, o da negociação coletiva. Disse o mencionado ministro e professor: “No estudo da caracterização da convenção e acordo coletivos, é fundamental, em primeiro plano, estabelecer-se a exata extensão das modificações constitucionais de 1988 no Direito Coletivo do país. É que os dois diplomas negociais coletivos estão tipificados em texto normativo da Consolidação, que sedimentou, como se sabe, o modelo corporativista autoritário estruturado nas décadas de 1930 e 1940 no Brasil. Embora o Título VI da CLT (Das Convenções Coletivas do Trabalho) tenha, de fato, sofrido nova redação em 1967, através do Dec.-Lei nº 229/67, tal mudança ainda se fez sob império de inspiração autoritária, em face do Regime Militar inaugurado em 1964.” A defesa da revogação tácita do art. 614 da CLT pela Constituição Federal tem como lastro a liberdade sindical (art. 8º, I da CF) a viga mestre do sindicalismo. Diante das garantias do Art. 8o, I, e do inciso XXVI do Art. 7o, impõe-se o reconhecimento da revogação tácita do Art. 614 da CLT pela Constituição Federal, o que que deve ser feito até mesmo em razão da hierarquia das normas, sendo inconcebível que a eficácia da regra constitucional seja submetida a norma menor e flagrantemente incompatível com as inovações da nova ordem constitucional. O ilustre CHRISTOVÃO PIRAGIBE TOSTES MALTA não deixa espaço para dúvidas ao afirmar: “Convenções e acordos coletivos. Quando os interessados chegam à elaboração de norma coletiva sem o pronunciamento dos Tribunais, isto é, sem que seja necessário o dissídio coletivo, determina a CLT 614 que uma via da convenção ou acordo seja depositada no Departamento Nacional do Trabalho. Após a vigência da Carta Magna de 1988, no entanto, prevalece o entendimento de que o depósito é desnecessário, em face da autonomia de que os sindicatos gozam.” A jurisprudência atual vem entendendo também que o depósito da negociação coletiva no Ministério do Trabalho é de todo dispensável. Vejamos: “EMENTA: CONVENÇÃO COLETIVA - REGISTRO NO MTB - VALIDADE - As formalidades anteriormente exigidas para a validade das convenções coletivas, como o registro e o depósito de cópias no Ministério do Trabalho foram abolidas pela Constituição Federal de 1988. Assim, as convenções firmadas pelas partes têm validade a partir da sua instituição.” (TRT 3ª R. - 5ª T. - RO/5136/95 - Rel. Juiz Bolívar Viégas Peixoto - DJMG 26.08.1995). “EMENTA: CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO - REGISTRO - O depósito para registro da Convenção Coletiva junto ao Ministério do Trabalho constitui formalidade que não interfere no seu conteúdo: sua ausência traduz mera infração administrativa, incapaz de comprometer a eficácia da norma coletiva.” (TRT 3ª R. - Seção Especializada em Dissídios Coletivos - Ação Anulatória 4/99 - Relª Alice Monteiro de Barros - DJMG 16.06.2000). O TST também entendeu ser dispensável o registro da negociação coletiva no Ministério do Trabalho para que a mesma tenha eficácia: “(...) II - Diferenças salariais. Acordo de Compensação. Validade A atual Constituição da República deixa clara a intenção de atribuir maior importância às pactuações coletivas, como se verifica no seu artigo sétimo, inciso seis, treze e representativos das categorias econômicas e profissional, apenas não autoriza o seu descumprimento, vez que as normas previstas no artigos seiscentos e quatorze da CLT não podem prevalecer sobre o espírito da Lei Maior. Revista patronal conhecida e desprovida.” (TST - 2ª T. - RR 173.456 - 1995 - Rel. Min. Moacyr Roberto Tesch Auersvald Decisão 04.09.1996). As inovações carreadas para o mundo jurídico pela CF de 1988 revela não ser possível afirmar a ausência de eficácia da negociação coletiva tão-somente baseado na inexistência de depósito, quando a mesma está sendo ou já foi cumprida pelas partes acordantes. Tal se torna mais incompreensível quando se constata que a vontade dos signatários do instrumento coletivo está sendo ignorada em razão de mera formalidade, o que vem em prejuízo de milhares de empresários e de milhares de trabalhadores. Outro aspecto que não pode ser esquecido é que no âmbito do Direito do Trabalho prevalece oprincípio da primazia da realidade sobre a forma, haja vista que se todas as partes durante todo o pacto laboral atuaram com base na existência e na validade do acordo coletivo de trabalho, não cabe à justiça desconstituí-lo com base em artigo revogado tacitamente. O STJ, recentemente, também proferiu julgamento entendendo ser desnecessário o depósito da negociação coletiva para trazer eficácia à mesma conforme se percebe abaixo: “PROCESSUAL CIVIL E TRABALHISTA - VIOLAÇÃO AO ART. 535 OMISSÃO - INEXISTÊNCIA - ACORDO COLETIVO -TRABALHO NOS FERIADOS - AUSÊNCIA DE REGISTRO NA DELEGACIA REGIONAL DO TRABALHO - MULTA - AUTO DE INFRAÇÃO - INSUBSISTÊNCIA EQUÍVOCO DA DRT NA IMPOSIÇÃO DA PENALIDADE – (....) 4 - O fato de o acordo coletivo não ter sido oportunamente registrado na DRT constitui mera formalidade, exigida apenas para fins de controle, não servindo de suporte à imposição de multa por infringência às regras da CLT.” (STJ - REsp 572.452/SC - Segunda Turma - DJ 01.03.2004 - Rel. Min. Castro Meira). Com essas considerações, recomendamos aos entes sindicais SINDICOM-DF e SINDIVAREJISTA-DF), aos comerciantes e aos empregados que cumpram integralmente a CCT celebrada em maio, posto que todas as previsões estão em plena vigência, sendo exigíveis para todos os efeitos legais. Antonio Alves Filho