14 - CONTRATO DE COMPRA E VENDA CC, Art. 481. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro. Compra e venda – Transmissão de coisa corpórea. Cessão de direito – Transmissão de coisa incorpórea. 14.1 - COMPRA E VENDA – Natureza OBRIGACIONAL CC, Art. 482. A compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço. O contrato de compra e venda consiste em um contrato translativo que não gera transmissão da propriedade. é: No nosso ordenamento jurídico, o que transmite a propriedade Bem móvel – Tradição Bem imóvel – Registro do CRI O contrato de compra e venda não transmite a propriedade. Ele gera efeitos obrigacionais: Obrigação de transmitir a propriedade. Em outras palavras, o contrato é translativo no sentido de trazer como conteúdo a referida transmissão, que se perfaz pela tradição nos casos que envolvem bens móveis ou pelo registro, nas hipóteses de bens imóveis. Maria Helena Diniz citada por Flávio Tartuce. ... no direito brasileiro, o contrato de compra e venda gera para os contratantes efeitos meramente obrigacionais: para o comprador impõe o dever de pagamento, enquanto para o vendedor gera, como consequência, a obrigação de transferir a propriedade da coisa para o comprador. Com isso, seguindo as pegadas de relevantes sistemas jurídicos que se perfilham ao modelo romano germânico, o direito brasileiro (CC, art. 481), expressamente, conferiu caráter obrigacional à compra e venda, negando-lhe eficácia translativa de propriedade (caráter real), como preferem os sistemas jurídicos que seguem o modelo franco-italiano. Nos ordenamentos que seguem o Código da França (art. 1.582 c/c 1.583) e da Itália (art. 1.470), a compra e venda é suficiente para a transferência de propriedade, produzindo eficácia real. Reduzida a termos simplórios, esta tese admite, aceita o contrato como mecanismo de aquisição de propriedade. Entrementes, em nosso direito positivo, esta figura contratual não é mecanismo hábil para a aquisição da propriedade. Ou seja, a compra e venda origina uma obrigação de dar, não operando a transferência da propriedade – que somente advirá com a tradição ou registro em cartório, seja móvel ou imóvel o seu objeto, respectivamente. ... Em sendo assim, no Brasil, a compra e venda produz, tão somente, efeitos obrigacionais, impondo ao vendedor o dever de transferir, posteriormente, a propriedade da coisa vendida. (...) Caso o vendedor não transfira, espontaneamente, o domínio do bem objeto do negócio, caberá ao comprador exigir, em juízo, através de uma ação de obrigação de dar coisa certa (caráter pessoal), sem que possa promover uma ação real, pois ainda não é titular da coisa. Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald O sistema brasileiro protege o COMPRADOR, através da TEORIA DOS RISCOS PELA PERDA OU DETERIORAÇÃO DA COISA. Se a compra e venda não transmite a propriedade do bem, seu DONO é o vendedor até que ocorrida TRADIÇÃO. Assim, segundo a regra res perit domino, o vendedor é o responsável por qualquer perda ou perecimento da coisa anterior à sua efetiva entrega. O contrato de compra e venda, além das obrigações principais de entrega da coisa e pagamento do preço, também impõe o cumprimento dos DEVERES ANEXOS provenientes do Princípio da boa-fé objetiva - Diretriz da Eticidade aplicada à relação contratual. 14.2 - CONTRATO DE COMPRA E VENDA – Elementos Partes e seu consentimento - consensus Coisa - res Preço - Pretium 14.2.1 - Partes e seu consentimento – consensus As partes devem ser CAPAZES e LEGITIMADAS. Se partes absolutamente incapazes não devidamente representadas – Contrato NULO. Se partes relativamente incapazes não devidamente assistidas – Contrato ANULÁVEL. Além de capazes, as partes devem ser legitimadas – Devem cumprir requisito específico para a prática de ato específico. Exemplos – Partes sem legitimação: CC, Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; (...) CC, Art. 1.649. A falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária (art. 1.647), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade conjugal. Parágrafo único. A aprovação torna válido o ato, desde que feita por instrumento público, ou particular, autenticado. CC, Art. 1.749. Ainda com a autorização judicial, não pode o tutor, sob pena de nulidade: I - adquirir por si, ou por interposta pessoa, mediante contrato particular, bens móveis ou imóveis pertencentes ao menor; II - dispor dos bens do menor a título gratuito; III - constituir-se cessionário de crédito ou de direito, contra o menor. O consentimento há de ser livre, espontâneo e de boa-fé – MANIFESTAÇÃO DE VONTADE LIVRE E DE BOA FÉ. Havendo vício, o contrato poderá ser nulo ou anulável: Erro, dolo, coação, lesão, estado de perigo (vícios do consentimento), fraude contra credores (Vício social) – Contrato de compra e venda anulável. CC, Art. 171, II. Simulação (Vício social) – Contrato de compra e venda NULO. CC, Art. 167 14.2.2 - Coisa – res A coisa deve ser: Lícita Possível Determinada (Coisa certa) ou determinável (coisa incerta indicada pela quantidade e pelo gênero/espécie). Alienável Compra e venda de coisa futura (Vendas sob encomenda): CC, Art. 483. A compra e venda pode ter por objeto coisa atual ou futura. Neste caso, ficará sem efeito o contrato se esta não vier a existir, salvo se a intenção das partes era de concluir contrato aleatório. Segundo a doutrina, pelo Princípio da boa-fé objetiva, na venda sob encomenda, o vendedor já deve ter a coisa à sua disposição no momento da realização do contrato. A coisa deve ser ALIENÁVEL. Ex: Bem de Família Voluntário – Inalienabilidade relativa. Contrato de compra e venda que tenha como objeto bem de família voluntário será NULO por ilicitude do objeto (CC, Art. 166, II) ou por fraude à lei imperativa (CC, Art. 166, VI) 14.2.3 - Preço – Pretium CC, Art. 315. As dívidas em dinheiro deverão ser pagas no vencimento, em moeda corrente e pelo valor nominal, salvo o disposto nos artigos subseqüentes. Em regra, o preço deve ser: certo e determinado, em moeda nacional corrente pelo valor nominal O preço deve ser em moeda nacional corrente. CC, Art. 318. São nulas as convenções de pagamento em ouro ou em moeda estrangeira, bem como para compensar a diferença entre o valor desta e o da moeda nacional, excetuados os casos previstos na legislação especial. Exceção: Decreto-lei 857/69 – Compra e venda internacional. O preço poderá ser cotado em ouro ou dólar, desde que conste o valor correspondente em Real, segundo CC, art. 487: CC, Art. 487. É lícito às partes fixar o preço em função de índices ou parâmetros, desde que suscetíveis de objetiva determinação. Dólar e ouro são exemplos de índices ou parâmetros suscetíveis de objetiva determinação (Preço por cotação). Preço por avaliação: CC, Art. 485. A fixação do preço pode ser deixada ao arbítrio de terceiro, que os contratantes logo designarem ou prometerem designar. Se o terceiro não aceitar a incumbência, ficará sem efeito o contrato, salvo quando acordarem os contratantes designar outra pessoa. Ex: Preço de bem imóvel avaliado por um especialista (corretor ou uma imobiliária). Preço por taxa de mercado ou de bolsa: CC, Art. 486. Também se poderá deixar a fixação do preço à taxa de mercado ou de bolsa, em certo e determinado dia e lugar. Havendo oscilação da taxa de mercado ou de bolsa na data determinada para a fixação do preço, levar-se-á em conta a média da variação. CC, Art. 488: CC, Art. 488. Convencionada a venda sem fixação de preço ou de critérios para a sua determinação, se não houver tabelamento oficial, entende-se que as partes se sujeitaram ao preço corrente nas vendas habituais do vendedor. Parágrafo único. Na falta de acordo, por ter havido diversidade de preço, prevalecerá o termo médio. Isso não configura hipótese de contrato de compra e venda sem preço! Pelo contrário! O artigo determina um preço para o caso do contrato não estabelecê-lo. Assim, sempre haverá um preço. CC, Art. 489 X Contratos de adesão CC, Art. 489. Nulo é o contrato de compra e venda, quando se deixa ao arbítrio exclusivo de uma das partes a fixação do preço. E os contratos de adesão?? Segundo Flávio Tartuce, o Art. 489 deveria ter sido excluído do Código Civil, pois não se encontra em consonância com a prática atual dos contratos de adesão, em que apenas uma das partes determina previamente o preço. Como ainda permanece tal dispositivo, este deve ser interpretado apenas como uma proibição do preço cartelizado (preço estabelecido por cartéis de empresas). 14. 3 - CONTRATO DE COMPRA E VENDA – Classificação O contrato de compra e venda é: contrato típico e nominado contrato bilateral ou sinalagmático contrato consensual contrato formal ou informal contrato oneroso contrato comutativo ou aleatório contrato de execução instantânea ou de trato sucessivo 14.3.1 - Contrato típico e nominado Possui regulamentação própria no Código Civil 2002, Arts. 481 a 532. 14.3.2 - Contrato bilateral ou sinalagmático Há direitos e deveres a cada uma das partes, sendo, portanto, credoras e devedoras entre si. Direito – Receber coisa Direito – Receber preço Comprador Vendedor Dever – Pagar preço Dever – Entregar coisa Mantém-se a bilateralidade do contrato de compra e venda mesmo nos casos de AUTOCONTRATO ou CONTRATO CONSIGO MESMO. O mesmo agente atua em nome e interesse próprio, e em nome próprio, mas no interesse de outrem (Ex. representante em um contrato de mandato): A – comprador (atua em nome próprio e interesse próprio) A – representante do vendedor B (atua em nome próprio, mas no interesse de B) CC, Art. 117. Salvo se o permitir a lei ou o representado, é anulável o negócio jurídico que o representante, no seu interesse ou por conta de outrem, celebrar consigo mesmo. Parágrafo único. Para esse efeito, tem-se como celebrado pelo representante o negócio realizado por aquele em quem os poderes houverem sido subestabelecidos. 14.3.3 - Contrato consensual CC, Art. 482. A compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço. Em regra, para que o contrato de compra e venda se aperfeiçoe basta o consenso entre as partes sobre o preço e a coisa, não havendo a necessidade de solenidades ou formalidades específicas. Há exceções como o CC, art. 108 – Contrato formal e solene. CC, Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País. 14.3.4 - Contrato formal ou informal Segundo Flávio Tartuce, formalidade é gênero, solenidade é espécie. Formalidade – Forma escrita Solenidade – Escritura Pública O contrato de compra e venda pode ser: Formal e solene – Segue a forma escrita, por escritura pública. Ex: Compra e venda de bem imóvel de valor superior a 30 salários mínimos - CC, Art. 108. Formal e não solene – Segue a forma escrita, mas não precisa de escritura pública. Ex: Compra e venda de bem imóvel de valor inferior a 30 salários mínimos. Todo contrato de compra e venda de bem imóvel seguirá a forma escrita, pois necessário para o registro no CRI. Informal e não solene – Não segue a forma escrita e nem a escritura pública. Ex: Compra e venda de bem móvel. 14.3.5 - Contrato oneroso A compra e venda gera benefícios e sacrifícios patrimoniais para ambas as partes. Um deles lucra o preço ajustado, mas perde um bem integrante de seu patrimônio, enquanto o outro acrescenta o objeto da avença ao seu acervo patrimonial, mas paga um valor determinado. Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald. Por ser a compra e venda um contrato oneroso, o vendedor se responsabiliza pelos vícios redibitórios e pela evicção, o que gera garantias ao comprador. CC, Art. 503. Nas coisas vendidas conjuntamente, o defeito oculto de uma não autoriza a rejeição de todas. Exceção: Universalidades (rebanho, biblioteca) em que os bens defeituosos são vários ou se o defeito de um deles compromete todo o conjunto (Par de brincos, cartas de baralho). 14.3.6 - Contrato comutativo ou aleatório Em regra, o contrato de compra e venda é COMUTATIVO por serem as prestações previamente conhecidas pelas partes, havendo uma “certeza recíproca das obrigações e direitos”. Eventualmente, a compra e venda pode ser um contrato ALEATÓRIO (Álea, sorte), no qual há a presença de riscos. Não há certeza quanto aos ganhos e perdas: Venda de coisas futuras quanto quantidade. CC, Art. 458 e 459. à existência e à Venda de coisas existentes, mas expostas a risco. CC, Art. 460. 14.3.6.1 - Venda de coisas futuras quanto à existência: VENDA DA ESPERANÇA QUANTO À EXISTÊNCIA DA COISA ou VENDA DA ESPERANÇA ou SALE OF A HOPE (Emptio spei) CC, Art. 458. Se o contrato for aleatório, por dizer respeito a coisas ou fatos futuros, cujo risco de não virem a existir um dos contratantes assuma, terá o outro direito de receber integralmente o que lhe foi prometido, desde que de sua parte não tenha havido dolo ou culpa, ainda que nada do avençado venha a existir. Não há a fixação de uma quantidade mínima. Alto risco. 14.3.6.2 - Venda de coisas futuras quanto à quantidade: VENDA DA ESPERANÇA QUANTO À QUANTIDADE DA COISA ou VENDA DA ESPERANÇA COM COISA ESPERADA (Emptio rei speratae) CC, Art. 459. Se for aleatório, por serem objeto dele coisas futuras, tomando o adquirente a si o risco de virem a existir em qualquer quantidade, terá também direito o alienante a todo o preço, desde que de sua parte não tiver concorrido culpa, ainda que a coisa venha a existir em quantidade inferior à esperada. Parágrafo único. Mas, se da coisa nada vier a existir, alienação não haverá, e o alienante restituirá o preço recebido. Há a fixação de uma quantidade mínima para a compra. Há um objeto mínimo. 14.3.6.3 - Venda de coisas existentes, mas expostas a risco: CC, Art. 460. Se for aleatório o contrato, por se referir a coisas existentes, mas expostas a risco, assumido pelo adquirente, terá igualmente direito o alienante a todo o preço, posto que a coisa já não existisse, em parte, ou de todo, no dia do contrato. CC, Art. 461. A alienação aleatória a que se refere o artigo antecedente poderá ser anulada como dolosa pelo prejudicado, se provar que o outro contratante não ignorava a consumação do risco, a que no contrato se considerava exposta a coisa. 14.3.6 - Contrato de execução instantânea ou de trato sucessivo Execução instantânea – Obrigação se cumpre por um ato único. Ex: Venda à vista. Execução por trato sucessivo – Prestação é cumprida de forma diferida no tempo. Ex: Venda a prazo 14.4 - CONTRATO DE COMPRA E VENDA – Riscos Os riscos se vinculam aos deveres. Quem tem o dever, responde pelos seus riscos: Direito – Receber coisa Comprador Dever – Pagar preço Comprador responde pelos riscos do PREÇO Direito – Receber preço Vendedor Dever – Entregar coisa Devedor responde pelos riscos da COISA Riscos quanto à coisa – correm pelo VENDEDOR até a efetiva entrega (Res perit domino). Riscos quanto ao preço – correm pelo COMPRADOR. CC, Art. 492. Até o momento da tradição, os riscos da coisa correm por conta do vendedor, e os do preço por conta do comprador. § 1o Todavia, os casos fortuitos, ocorrentes no ato de contar, marcar ou assinalar coisas, que comumente se recebem, contando, pesando, medindo ou assinalando, e que já tiverem sido postas à disposição do comprador, correrão por conta deste. § 2o Correrão também por conta do comprador os riscos das referidas coisas, se estiver em mora de as receber, quando postas à sua disposição no tempo, lugar e pelo modo ajustados. 14.5 - CONTRATO DE COMPRA E VENDA – Despesas Despesas com TRANSPORTE e TRADIÇÃO correm por conta do VENDEDOR. Despesas com ESCRITURA e REGISTRO correm por conta do COMPRADOR. CC, Art. 490. Salvo cláusula em contrário, ficarão as despesas de escritura e registro a cargo do comprador, e a cargo do vendedor as da tradição. Norma de ordem privada – Pode ser alterada contratualmente, podendo gerar assunção convencional ou socialização dos riscos. A divisão das despesas de transportes é comum na compra e venda internacional, por meio dos INCOTERMS (international Commercial Terms ou Cláusulas Especiais de Compra e Venda no Comércio Internacional). A título de exemplo, cite-se a cláusula FOB (free on board), pela qual o vendedor responde pelas despesas do contrato até o embarque da coisa no navio. Flávio Tartuce 14.6 - CONTRATO DE COMPRA E VENDA – Exceção do contrato não cumprido. CC, Art. 491. Não sendo a venda a crédito, o vendedor não é obrigado a entregar a coisa antes de receber o preço. 14.7 - CONTRATO DE COMPRA E VENDA – Local da entrega CC, Art. 493. A tradição da coisa vendida, na falta de estipulação expressa, dar-se-á no lugar onde ela se encontrava, ao tempo da venda. Norma de ordem privada – Pode ser alterada contratualmente. 14.8 - CONTRATO DE COMPRA E VENDA – Expedição da coisa CC, Art. 494. Se a coisa for expedida para lugar diverso, por ordem do comprador, por sua conta correrão os riscos, uma vez entregue a quem haja de transportá-la, salvo se das instruções dele se afastar o vendedor. Se comprador determina Responde pela coisa. erroneamente a expedição – Se o vendedor não cumprir as instruções dadas pelo comprador – Responde pela coisa. 14.9 - CONTRATO DE COMPRA E VENDA – Insolvência de uma das partes CC, Art. 495. Não obstante o prazo ajustado para o pagamento, se antes da tradição o comprador cair em insolvência, poderá o vendedor sobrestar na entrega da coisa, até que o comprador lhe dê caução de pagar no tempo ajustado. Aplicação da Exceptio non rite adimpleti contractus (CC, Art. 477) no contrato de compra e venda. Aplica-se também quanto à insolvência do devedor – Comprador poderá reter o pagamento até que lhe seja dada caução ou lhe seja entregue a coisa. Não sendo prestada a garantia, resolve-se o contrato por cláusula resolutiva tácita dependente de interpelação judicial. 14.10 – LIMITAÇÕES AO CONTRATO DE COMPRA E VENDA 14.10.1 – Compra e venda de ascendente para descendente CC, Art. 496. É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido. Parágrafo único. Em ambos os casos, dispensa-se o consentimento do cônjuge se o regime de bens for o da separação obrigatória. Visa proteger o núcleo familiar. De fato, as relações familiares entre pais e filhos, infelizmente, são assaltadas por turbulências, decorrentes do desamor, do desafeto, da mágoa e da ingratidão, dentre outros sentimentos indignos. Por isso, motivos diversos podem conduzir um ascendente a beneficiar um de seus descendentes, em prejuízo dos demais. Por isso, tende o ordenamento a estabelecer uma blindagem protetiva dos descendentes, evitando que o seu ancestral venha a frustrar fraudulenta ou simuladamente a sua perspectiva patrimonial, com escopo de beneficiar outro filho. Seria o caso do pai que, sabendo que uma eventual doação para o filho predileto implicaria, por lei, antecipação da herança que caberia a este no futuro, resolve vender a este descendente a um preço completamente irrisório. Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald De forma oposta, o contrato de DOAÇÃO entre ascendentes e descendentes não depende da autorização dos demais, afinal, o controle da liberalidade acontecerá após a morte do doador, por meio da colação, igualando-se as legítimas. CC, Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do que lhes cabe por herança. CC, Art. 2.003, caput. A colação tem por fim igualar, na proporção estabelecida neste Código, as legítimas dos descendentes e do cônjuge sobrevivente, obrigando também os donatários que, ao tempo do falecimento do doador, já não possuírem os bens doados. Querendo o ascendente beneficiar um de seus descendentes, pode o fazer através da doação, dispensando a posterior colação, desde que a liberalidade saia de sua parcela disponível. Além da autorização dos demais descendentes, é também necessária a autorização do cônjuge do vendedor, salvo se casados pelo regime da separação obrigatória de bens. A justificativa para tal necessidade se encontra no art. 1829 do Código Civil: A ordem de vocação hereditária. O cônjuge também é considerado como herdeiro necessário (CC, Art. 1.845), assim, também não poderá ser privado da legítima. Se o cônjuge for casado pelo regime da separação obrigatória de bens, desnecessária é a sua autorização, pois, segundo o CC, Art. 1.829, I, não há a concorrência do cônjuge com os descendentes se casado por tal regime. CC, Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares; II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III - ao cônjuge sobrevivente; IV - aos colaterais. A mesma ressalva não foi feita com relação ao cônjuge casado pelo regime da separação convencional de bens. Pela interpretação fria da lei, seria necessária a autorização desse cônjuge para a compra e venda entre descendentes e ascendentes e isso vem do próprio texto do CC, Art. 1.829, I, que não exclui a concorrência do cônjuge com os descendentes se casados pela separação convencional de bens, mantendo seus direitos sucessórios. Essa foi a interpretação do CC, Art. 1.829, I por muito tempo. Ocorre que hoje a jurisprudência vem mudando seu entendimento e afastando o direito sucessório do cônjuge casado pelo regime da separação convencional de bens, afinal, leva-se em conta a autonomia privada, a vontade das partes manifestada em vida. Se em vida as partes demonstraram a vontade de não comunicar seus bens, por que a lei os comunicaria após a morte? Interessante e oportuna a análise da decisão: STJ, Ac. unân. 3ªT., REsp. 992.749/MS, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 1.12.09, DJe 5.2.10, RSTJ 217:820. Pela nova posição jurisprudencial, dispensada também deve ser a autorização do cônjuge casado pelo regime da separação obrigatória de bens para a compra e venda entre ascendentes e descendentes. Havendo a compra e venda de ascendente para descendente sem as devidas autorizações, diz o CC, art. 496, que o contrato será ANULÁVEL. Sendo um contrato anulável, temos uma invalidade por nulidade relativa, ou seja, uma invalidade que afronta apenas interesses privados e não interesses públicos. Assim, essa anulabilidade (exercício do direito potestativo de desconstituir o contrato) poderá ser reclamada pelos legítimos interessados em um prazo decadencial de 2 anos contados a partir da celebração do negócio. Assim, acatada a tese da anulabilidade, as conseqüências mais evidentes da venda de ascendente a descendente, sem a anuência dos interessados, são as seguintes: i) possibilidade de ratificação do ato pelos familiares, através de posterior assentimento (CC, art. 176); ii) impossibilidade de constatação do vício pelo juiz ou pelo Ministério Público de ofício, havendo necessidade de ajuizamento de ação própria pelos interessados para a anulação do contrato (CC, art. 168); iii) a sentença produzirá efeitos ex tunc, desconstituindo-se retroativamente todos os efeitos transitórios até então produzidos (CC, art. 182); iv) o oficial do cartório de registro de imóveis não pode se recusar a lavrar a escritura pública, quando ausente a anuência de todos os interessados, por se tratar de interesse meramente privado e patrimonial. Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald Se judicialmente determinada a anulação, aquele ou aqueles que foram beneficiados pela compra e venda deverão restituir o bem ou o seu valor, não ocorrendo a solidariedade entre eles. 14.10.2 – Compra e venda entre cônjuges CC, Art. 499. É lícita a compra e venda entre cônjuges, com relação a bens excluídos da comunhão. Se casados pelo regime da comunhão universal de bens, essa possibilidade de compra e venda entre cônjuges estará restrita aos bens elencados no CC, art. 1.668 (Bens excluídos da comunhão universal), afinal, fora estes bens, os demais se comunicam. Não se pode comprar aquilo que já se possui. CC, Art. 1.668. São excluídos da comunhão: I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar; II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva; III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum; IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade; V - Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659. No regime da separação convencional de bens, a liberdade para a compra e venda entre cônjuges é praticamente total, afinal, em regra, os bens não se comunicam. Cuidado com o regime da separação obrigatória de bens, pela Súmula 377 STF: Súm. 377. No regime de separação legal de bens, comunicamse os adquiridos na constância do casamento. 14.10.3 – Compra e venda de bens sob administração CC, Art. 497. Sob pena de nulidade, não podem ser comprados, ainda que em hasta pública: I - pelos tutores, curadores, testamenteiros e administradores, os bens confiados à sua guarda ou administração; II - pelos servidores públicos, em geral, os bens ou direitos da pessoa jurídica a que servirem, ou que estejam sob sua administração direta ou indireta; III - pelos juízes, secretários de tribunais, arbitradores, peritos e outros serventuários ou auxiliares da justiça, os bens ou direitos sobre que se litigar em tribunal, juízo ou conselho, no lugar onde servirem, ou a que se estender a sua autoridade; IV - pelos leiloeiros e seus prepostos, os bens de cuja venda estejam encarregados. Parágrafo único. As proibições deste artigo estendem-se à cessão de crédito. 14.10.4 – Compra e venda de bens em condomínio CC, Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência. Parágrafo único. Sendo muitos os condôminos, preferirá o que tiver benfeitorias de maior valor e, na falta de benfeitorias, o de quinhão maior. Se as partes forem iguais, haverão a parte vendida os comproprietários, que a quiserem, depositando previamente o preço.